“O que se faz agora com as crianças é o que elas farão depois com a sociedade”. Karl Mannheim
As unidades de geração desenvolvem perspectivas,
reações e posições políticas e afetivas diferentes em relação a um mesmo dado problema.
O nascimento em um contexto social idêntico, mas em um período específico, faz
surgirem diversidades nas ações dos sujeitos. Outra característica é a adoção
ou criação de estilos de vida distintos pelos indivíduos, mesmo vivendo em um
mesmo âmbito social. Em outras palavras: a unidade geracional constitui uma
adesão mais concreta em relação àquela estabelecida pela conexão geracional.
Mas a forma como grupos de uma mesma conexão geracional lidam com os fatos
históricos vividos, por sua geração, fará surgir distintas unidades geracionais
no âmbito da mesma conexão geracional no conjunto da sociedade. Na
verdade, inicialmente, a classe médica em geral acaba por marginalizar as
ideias de Freud; seu único confidente durante esta época é o médico Wilhelm
Fliess. Depois que o pai de Freud falece, em outubro de 1896, segundo as cartas
recebidas por Fliess, Freud, naquele período, dedica-se a anotar e analisar
seus próprios sonhos, remetendo-os à sua própria infância e, no processo,
determinando as raízes de suas próprias neuroses. Tais anotações tornam-se a
fonte etnográfica para a obra “A Interpretação dos Sonhos”.
Durante o curso
desta autoanálise, Freud chega à conclusão de que seus próprios problemas eram
devidos a uma atração por sua mãe e a uma hostilidade em relação a seu pai. É o
que constitui o famoso “complexo de Édipo”, que se torna o “coração”, por assim
dizer, na concepção da teoria de Freud sobre a origem da neurose em todos os
seus pacientes investigados. Nos primeiros anos do século XX, são publicadas
suas obras em que contém suas teses principais: “A Interpretação dos Sonhos” e
“A psicopatologia da vida cotidiana”. Freud já não mantinha mais contato nem
com Josef Breuer, nem com Wilhelm Fliess. No início, as tiragens das obras não
animavam Freud, mas logo médicos de vários lugares: Eugen Bleuler, Carl Jung,
Karl Abrahams, Ernest Jones, Sandor Ferenczi, demonstram respaldo às suas ideias
e passam a compor o “Movimento Psicanalítico”. O filme Kids
é odrama norte-americano de 1994, escrito
por Harmony Korine, dirigido por Larry Clark e produzido pelo cineasta Gus Van
Sant. Apresenta Chloë Sevigny,
Leo Fitzpatrick, Justin Pierce e Rosario Dawson. O filme tem como escopo um dia na vida de um grupo de jovens ditos sexualmente
ativos de Nova Iorque. Demonstra seu comportamento diante do consumo de sexo e
drogas em meados dos anos 1990.
O filme tem como protagonista um skatista em
busca de sexo e drogas. Nova York serve como representação de cenário irradiado
do conturbado mundo dos adolescentes. Que indiscriminadamente consomem drogas e
quase nunca praticam sexo de forma segura. Um garoto, que idealiza seu deseja só
transar com virgens. E uma jovem, que só teve um parceiro, mas é soropositivo.
Este arquétipo serve de base para as tramas paralelas e bem articuladas que
ilustram, como em qualquer ser humano, que poderá prejudicar seriamente sua
vida se não estiver bem orientado sexualmente. Mas isto é, pela má utilização
da informação global (quase) impossível! O
conceito de archetypus só se aplica indiretamente às noções concietuais de représentations
collectives, na medida em que designar apenas aqueles conteúdos psíquicos que
ainda não foram submetidos a qualquer elaboração consciente. Representam,hic et nunc, um dado anímico imediato. Como
tal, o arquétipo difere sensivelmente da fórmula historicamente elaborada.
Especialmente em níveis mais altos dos ensinamentos secretos, aparecem sob uma
forma que revela seguramente a influência da elaboração consciente, a qual
julga e avalia. Sua manifestação imediata, como a encontramos em sonhos e
visões, é mais individual, incompreensível e ingênua do que nos mitos. O
arquétipo representa, em essência,um
conteúdo inconsciente, que se modifica através de sua conscientização e
percepção, assumindo matizes que variam de acordo com a consciência individual
na qual se manifesta.
Do
ponto de vista dos impactos sociais muitas sessões de “Kids” sofreram tentativas
de boicote, como ocorrera há décadas com o filme: “Last Tango à Paris”. Na Grã-Bretanha, onde o Parlamento condenou o
filme, era comum ver manifestantes do lado de fora dos cinemas. Nos Estados
Unidos, a produção recebeu uma classificação etária de não recomendado para
menores de 17 anos - algo particularmente irônico, considerando que “Kids”
tinha como uma de suas produtoras a Miramax, na época propriedade da gigante
Walt Disney. A controvérsia gerada entre os executivos foi tão grande que o
estúdio foi, sob certas condições sociais, forçado a criar uma empresa à parte,
a “Shining Excalibur Pictures”, com a finalidade mercadológica de distribuir a
obra mundialmente. Em Kids, o próximo filme que vai indignar os guardiões da
moralidade americana, as crianças são uma praga. Os adolescentes, muitos ainda
no ensino fundamental, não conseguem sobreviver por uma hora sem violar várias
dezenas de leis e convenções: eles furtam, bebem, usam drogas, roubam dinheiro,
chutam gatos, espancam e talvez assassinem um estranho e se envolvem em uma
interminável, caça irracional por sexo, sem camisinha. A solução
dificilmente seria aceita hoje. - “Seria impossível fazer esse filme agora”,
afirmou Korine ao tablóide Guardian. – “Não teria como ninguém sair impune disso
tudo”.
Larry Clark é um cineasta genial.
Não é de hoje que o autor de Kids, Another Day in Paradise, ou ainda “Ken
Park” fascina e gera polêmica em torno de seus filmes onde aborda a vida dos
teens de maneira crua e sem tabus. Do alto de seus 69 anos, Clark esbanja
vitalidade e têm os dois pés bem fincados na era digital. Seu último filme,
Marfa Girl, que recebeu o grande prêmio da sétima edição do Festival de Roma.
Cansado do sistema de distribuição hollywoodiano o diretor decidiu ir direto ao
encontro de seu público lá onde ele está, ou seja, na rede internet. – “Os
adolescentes passam seu tempo na frente do computador, seja para organizar uma
saída ou para paquerar então é lá que o filme estará também”. Filmado na cidade
de Marfa, Texas – aquele vilarejo do deserto que tem a “loja-escultura” da
Prada – o filme narra a história de amor de Adam, 16 e de sua vizinha Donna,
23. Os conflitos étnicos e sociais entre as comunidades artísticas brancas e
hispânicas e a presença constante da polícia de imigração servem de pano de
fundo à trama cinematográfica. O Serviço de Imigração e Controle de Aduanas dos
Estados Unidos da América (U. S. Immigration and Customs Enforcement - ICE) é
uma agência policial subordinada hierarquicamente ao Departamento de Segurança
Interna (United States Department of Homeland Security - DHS), responsável por
detectar, investigar e corrigir vulnerabilidades relacionadas à fronteiras,
infraestrutura, transportes, e economia.
Em Kids,
o cineasta Larry Clark realiza um recorte
de geração (cf. Mannheim, 1993; cf. Weller, 2010) em que prevalece a perspectiva
do “enclausuramento”. Ao supostamente buscar uma interferência constante do ambiente
dentro do filme. Ou, ao querer simplesmente atualizar o mundo dos jovens. Ou
ainda, diante da tensão de um mundo que já existia independentemente dele. Acabou
retendo a adolescência nova-iorquina numa tragédia de aniquilamento simultaneamente
de dentro e de fora. Os adolescentes de “Kids” não podem ser imaginados como
experimentos de laboratório aos quais se dão todos os tipos de substância, resultando
no imobilismo absoluto e, em última análise, na morte precoce. Enquanto a
maioria dos adultos está indiferente a essa questão, tema nevrálgico da
modernidade – o sexo, o cineasta se põe dentro dela. Deixa-se envolver com
fascínio e preocupação. Os personagens de “Kids” consomem drogas. Participam de
orgias para preencher um tempo que, na modernidade vagueia livre.
O filme tem o
mérito de um “engagement”, sem fatalismo, sem estratégia de choque. Mas
utilizando uma linguagem realista, o filme abre o cenário cinematográfico com
Telly, um Don Juan pálido e esquelético, deflorando uma adolescente, e termina
com um estupro embalado por drogas em uma festa. Não existe julgamento
moral, apenas um olhar que observa à distância. Para Sigmund
Freud (1972) e Claude Lévi-Strauss (1962), o tabu expressara um sentimento
coletivo sobre um determinado comportamento dicotômico, num ambiente entre
amigos, de um lado, e inimigos, do outro, funcionando de uma forma articulada
entre dois condicionamentos comportamentais - biológico e cultural ou vice-versa.
Assim o tabu seria expresso de forma diferente das regras sociais, que são uma
construção cultural típica de sociedades mais complexas. Os tabus da linguagem
dividem-se em três grupos, de acordo com o uso ou a motivação psicológica: uns
são devido ao medo, outros a um sentimento de delicadeza e outros, ainda, a um
sentido de decência e decoro. Os tabus de medo têm a ver com
o pavor aos seres sobrenaturais, que impuseram tabus sobre seus nomes, como o demônio. As criaturas e as coisas vulgares dotadas de qualidades
sobrenaturais podem tornar-se alvo de terror e tabus.
Analogamente quando o filme: Le Dernier Tango à Paris estreou nos Estados Unidos da América em 1975 foi diante de uma enorme
controvérsia. O frenesi da imprensa populista em torno dele gerou enorme
interesse do público (cf. Aslan, 2010), assim como grande condenação moral,
típica de norte-americanos, levando a reportagens de capa nas duas maiores
revistas semanais do país. A revista “Time” – que colocou o ator Marlon Brando
na capa: “Last Tango in Paris Cover Story” – e “Newsweek” – “Tango: The Hottest
Movie” em 12 de fevereiro, 1973. O Village Voice descreveu “passeatas de
comitês de moralidade na porta de cinemas” e “mulheres bem vestidas vomitando”
(cf. “Last Tango in Paris: Can it arouse the
same passions now?”. In: “The
Independent”). Vincent Canby, crítico do jornal “The New York Times”, descreveu
o contexto sexual do filme como “a expressão artística da era de Norman
Mailer”. O principal centro do escândalo foram às cenas de sexo anal, onde “Paul”
sodomiza “Jeannie”, com manteiga “como lubrificante”. E quando pede a ela “que
enfie os dedos em seu cu”, ou, “prometa fazer sexo com um porco”, provando sua
devoção.
A prestigiada crítica de arte Pauline Kael, da revista The New Yorker, deu ao filme um dos mais entusiásticos endossos de sua
carreira profissional, considerando que ele tinha “mudado a face de uma forma
de arte, um filme que as pessoas esperam por ele há muito, muito tempo, desde
que filmes existem”. Seu elogio, vindo de alguém tão comedida neles e com tanto
prestígio na chamada indústria cultural, foi republicado pela United Artists
num anúncio do filme em página dupla na edição dominical do New York Times. Na versão que foi
mostrada na pré-estreia mundial, no Festival de Cinema de Nova York, havia uma
cena em que Paul afugentava de seu apartamento um vendedor de bíblias,
colocando-se de quatro e latindo como um cachorro. A cena foi elogiada pela
crítica de cinema Pauline Kael na revista New Yorker, mas Bertolucci decidiu
cortá-la da edição final.
Uma semana depois “a polícia confiscou todas as
cópias por ordem da Justiça e Bernardo Bertolucci foi processado por
obscenidade”. Robert Altman assistiu declarou que saiu da sala de projeção e
disse a si próprio: - “Quem vai se preocupar se eu fizer um novo filme? Minha
vida pessoal e artística nunca mais será a mesma”. A
década de 1990 começou com o colapso da União Soviética e o fim da Guerra Fria,
sendo esses seguidos pela consolidação da democracia, globalização e
capitalismo global. Fatos marcantes para a década foram a Guerra do Golfo e a
popularização do computador pessoal e da Internet.
Otimismo e esperança seguiram o colapso do Comunismo, mas os efeitos colaterais
do fim da Guerra Fria estavam só começando, como o advento terrorista em regiões
do 3° Mundo, especialmente na Ásia. O 1° Mundo experimentou crescimento
econômico estável durante toda a década. O Reino Unido, depois de uma recessão
em 1991-92 e a desvalorização da libra, conseguiu 51 bimestres seguidos de
crescimento que se seguiram no novo século.
Até nações com menor
representatividade no mercado econômico mundial, como a Malásia, tiveram
aperfeiçoamentos gigantescos. Mas deve-se notar que a economia dos Estados
Unidos da América permaneceu relativamente, sem crescimento econômico superavitário durante a primeira metade da
década. Contudo, dependendo do ponto de vista, muitos países,
instituições, companhias e organizações consideraram os anos 1990 como tempos
prósperos. Politicamente, foram anos de democracia expansiva. Os antigos países
do Pacto de Varsóvia logo saíram de regimes autoritários para governos recentemente
eleitos. Ocorreu com países economicamente em desenvolvimento como Taiwan, Chile,
África do Sul e Indonésia. Apesar da prosperidade e democracia, houve um lado
maléfico significativo. Na África, o aumento nos casos de doenças sexualmente
transmissíveis e inúmeras guerras levaram á diminuição da expectativa de vida
interrompendo o crescimento econômico. Em ex-nações soviéticas com a queda do socialismo Leste europeu, houve fuga de
capital e o Produto Interno Bruto (PIB) decrescente. Crises financeiras denominadas para países “em desenvolvimento”, permanecem e foram comuns depois de 1994, disseminados pela
globalização.
E eventos trágicos como as guerras dos Bálcãs, genocídio de
Ruanda, a Batalha de Mogadíscio e a 1ª guerra norte-americana do Golfo Pérsico, assim
como a demanda e propaganda contra o terrorismo, levou ao “choque de Estado”, para se referirem aos militares norte-americanos contra civilizações
Iraque, Irã etc. Mas esses fatos sociais e políticos foram apenas rememorados com
relevância na década de 2000. A cultura jovem aceitou o “Grunge” como mídia.
Passou a ser diversificada se ramificando em “tribos” num universo social muito
diverso do que decorreram desde o superficialismo e consumismo até a militância
ambientalista e antiglobalizante dos dias atuais. A expressão nas roupas e
através de tatuagens e “piercings” também fora marcante, bem como o consumo de
drogas com o surgimento do “ecstasy” ligado a cultura de música eletrônica o
aumento no consumo de maconha na classe média em geral. O jovem se
viu envolvido cada vez mais com sexo precoce. Foi vitima do aumento da
violência e descaso de políticas públicas nas esferas sobre
juventude nos centros urbanos.
O grunge tornou-se comercialmente bem-sucedido na
primeira metade da década de 1990, devido principalmente aos lançamentos das
célebres “Nevermind”, do Nirvana e “Tem”, do Pearl Jam. O termo grunge – que em seu sentido original significa “sujeira” ou “imundície” em inglês – descreve tanto o estilo visual do cabelo desgrenhado, roupas velhas e folgadas de bandas e fãs, quanto o som saturado e distorcido das guitarras que dão o tom agressivo as músicas. O sucesso dessas bandas
impulsionou a popularidade do chamado rock alternativo e fez do “grunge” seu estilo
musical e a forma mais popular de “hard rock” neste período de viragem estética e musical. No entanto, muitas
bandas “grunges” estavam desconfortáveis com tal popularidade. Apesar de a
maioria das bandas “grunges” ter se separado ou desaparecido no final da década
de 1990, sua influência continua a afetar o rock contemporâneo. A popularidade
do “grunge” começaria a diminuir em meados de 1990. Das grandes bandas que
deram vida ao movimento musical, só estão ativas em 2013: “Alice in Chains”, “Mudhoney”,
“Soundgarden”, “The Melvins” e “Pearl Jam”.
No cinema da década de 1990, o “pop” casa-se com o
clássico. A palavra de ordem é diversidade: “O Silêncio dos Inocentes” entra
para a história da cultura ao ganhar os cinco principais Óscares; “A Lista de
Schindler” emociona de forma chocante multidões de pessoas pelo mundo
cosncientizado pelo holocausto; “Forrest Gump”, com o homem diante da guerra e
da morte, apresenta um astro definitivo, Tom Hanks; Quentin Tarantino é
revelado como um dos grandes gênios da modernidade e muda o rumo dos
acontecimentos ao revolucionar com o extraordinário “Pulp Fiction”; “Um Sonho
de Liberdade” emociona com uma das mais belas histórias do cinema; e Sharon
Stone cruza fatalmente suas pernas na sedução erótica de “Instinto Selvagem”. A
plateia se toca e se eletriza com histórias sensíveis, como a representação “The
Piano” e “Magnolia”. Tom Hanks ganha duas estatuetas Óscares consecutivos e Julia Roberts se torna “a
musa da década” ao estrelar a saborosa “Pretty Woman”. No Brasil, o cinema é
novamente reinventado e “Central do Brasil” conquista a crítica ocidental,
vencendo o Festival de Berlim e o Globo de Ouro. A cultura brasileira tornou-se
mais valorizada, com a “ressurreição” do cinema e a boa recepção de músicos
brasileiros no exterior. O esporte também passou relativamente por bons
momentos, com 25 medalhas olímpicas e títulos mundiais no futebol masculino e
basquete feminino.
Bibliografia geral consultada.
MÁRQUEZ, Gabriel
García, La Increíble y Triste Historia de
la Cândida Eréndira y de su Abuela Desalmada. Colombia: DeBols!llo, 1972; DE MARCHI, Luigi, Wilhelm Reich: Biografía de una idea. Barcelona: Península, 1974;
REICH, Wilhelm, La Función del Orgasmo.
Buenos Aires: Paidós, 1974; Idem, O Combate Sexual da Juventude. 2ª edição. Lisboa: Editor Antídoto, 1978; DELEUZE,
Gilles, Cinéma I – l`Image-Mouvement.
Paris: Éditions Minuit, 1983; ALBERONI, Francesco, O Erotismo, Fantasias e Realidades do Amor e da Sedução. São Paulo: Editor Circulo do Livro, 1986; FAUSTO NETO, Antonio,
Mortes em Derrapagens – Os Casos Corona e Cazuza. Rio de Janeiro: Editor
Rio Fundo, 1991; MANNHEIM, Karl, “El Problema de las Generaciones”. In: Revista Española de Investigaciones
Sociológicas, n° 62, pp. 193-242; 1993; BARROS, Myriam Moraes Lins de (Organizadora), Velhice
ou Terceira Idade? Estudos Antropológicos sobre Identidade, Memória e Política.
Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1998; HERNÁNDEZ, Fernando, “¿ De qué Hablamos quando Hablamos de Cultura Visual?”. In: Educação & Realidade, 30 (2):
9-34, jul./dez. 2005; ASLAN, Odette, O Ator no Século XX. São Paulo: Editora Perspectiva,
2010; WELLER, Wivian, “A Atualidade do Conceito de Gerações de Karl Mannheim”.
In: Soc. estado. Vol. 25 n° 2. Brasília May/Aug. 2010; BENTES, Arone do
Nascimento, O Patrimonialismo como Cultura Institucional no Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas. Tese de Doutorado em Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Manaus:
Universidade Federal do Amazonas, 2015; KLOTZ-SILVA, Juliana, Hábitos Alimentares e Comportamento: Do que Estamos Falando? Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Alimentação, Nutrição e Saúde. Centro Biomédico. Instituto de Nutrição. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2015; entre outros.
_______________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).
“Para
um artista, o fracasso e o sucesso são iguais. Os dois são impostores”.
Antônio Abujamra
O
sentido de fabuloso comparativamente
ao sentido artístico, filosófico, estético e jornalístico de Antônio Abujamra
pode ser compreendido ao romance de Juan Rulfo,
“Pedro Páramo”, adaptado à cena pelo Teatro Meridional, que os
escritores do que viria a ser conhecido como “realismo mágico” ou “fantástico”
vieram beber inspiração. A história passa-se numa aldeia fantasma, na cercania da fazenda da Meia-lua, num território do
México oitocentista dominado por quatro gerações de Páramos. Juan Preciado vem
em busca do pai, Dom Pedro, mas encontra apenas morte, de lugares algures no
túmulo que nos é narrada. A obra mistura magia e realidade, mortos e vivos
convivendo entre si. Pesadelos, delírios, memórias, vozes do além, os
fragmentos não se distinguem claramente, nem se separam bem dos pensamentos do
leitor, tal é o poder de sugestão de Juan Rulfo que, narrados, misturam-se nos
sonhos de quem os lê. Por ironia do destino, no programa “Provocações”,
Abujamra sempre perguntava ao entrevistado como gostaria de morrer, ante as
respostas repetidas vezes “em casa, dormindo”.
Em primeiro lugar, talvez tenham sido os desafios
característicos de uma época da história que transformaram a cultura da América
Latina em um vasto arsenal de fatos surpreendentes, insólitos, brutais,
incríveis, encantados; isto é, “uma profusão de fantasias, maravilhas e
barroquismos”. Os impasses e as façanhas de uma época permitem reler o passado
e o presente. É como se um novo horizonte iluminasse de repente todo o vasto
mural da história, revelando fatos e feitos que adquire outro movimento, som,
cor. O romancista pode ser um cronista “fora do tempo”, narrando o imaginado e
o acontecido segundo a luz que o ilumina. Ele pode representar
“um estilo de olhar” quando o realismo mágico é “superação
do realismo social, crítico”. Tem sido visto como um estilo novo.
Poema: “Tabacaria”, de Fernando Pessoa por Antônio Abujamra, no Programa “Provocações”.
Emerge de uma época em que ele estaria esgotado, ou
revelando limitações. A fabulação do artista, então, cria outros meios de
expressão, abre horizontes novos à imaginação. Entre as soluções formais mais
frequentes, podem-se citar: a desintegração da lógica linear de consecução e de
consequência do relato, através de cortes na cronologia fabular, da
multiplicação e simultaneidade dos espaços da ação; caracterização polissêmica
dos personagens e atenuação da qualificação diferencial do herói; maior dinamismo
nas relações entre o narrador e o narratário, o relato e o discurso, através da
diversidade das localizações, da auto-referencialidade e do questionamento da
instância produtora da ficção. Muitos reconhecem que a transição do realismo
social ao mágico ocorre simultaneamente à redescoberta das culturas de índios e
negros. São crenças, tradições, estórias, lendas e mitos que expressam outras
formas de ser, outros sentidos da vida e trabalho, do tempo e espaço.
Em segundo lugar, o ceticismo científico tem relação
com o ceticismo filosófico, mas eles não são idênticos. Muitos praticantes do
ceticismo científico não são adeptos do ceticismo filosófico clássico. Quando
críticos de controvérsias científicas, terapias alternativas ou
paranormalidades são ditos céticos, isto se refere apenas à postura cética
científica adotada. O termo cético é usado atualmente para se referir a uma
pessoa que tem uma posição crítica em determinada situação, geralmente por
empregar princípios do pensamento crítico e métodos científicos, melhor
dizendo, o ceticismo científico para verificar a validade de ideias. Os céticos
veem a evidência empírica como importante, já que ela provê provavelmente o
melhor modo de se determinar a validade de uma ideia. Apesar de o ceticismo
envolver o uso do método científico e do pensamento crítico, isto não
necessariamente significa que os céticos usem estas ferramentas constantemente.
Os céticos são frequentemente confundidos com, ou até
mesmo apontados como, cínicos. Porém, o criticismo cético válido em oposição a
dúvidas arbitrárias ou subjetivas sobre uma ideia, origina-se, contudo, de um
exame objetivo e metodológico que geralmente é consenso entre os céticos. Note
também que o cinismo é geralmente tido como um ponto de vista que mantém uma
atitude negativa desnecessária acerca dos motivos humanos e da sinceridade.
Apesar de as duas posições não serem mutuamente exclusivas, céticos também
podem ser cínicos. Cada um deles representa uma afirmação fundamentalmente
diferente sobre a natureza do mundo. De outra parte, os céticos científicos
constantemente recebem também, acusações de terem a “mente fechada” ou de
inibirem o progresso científico. Isto ocorre devido às suas exigências de
evidências cientificamente válidas. Os céticos, por sua vez, argumentam que
tais críticas são, em sua maioria, provenientes de adeptos de disciplinas
pseudocientíficas, cujas visões de mundo não são adotadas ou suportadas pela
ciência ocidental convencional.
Contudo, a ciência moderna é construída “sob um pé
limiar”, talvez, entre o ceticismo e a credulidade. Por um lado, a ciência deve
estar sempre aberta a novas ideias, desde que apoiadas em evidências
científicas, mas que posteriormente devem ser comprovadas, de modo a assegurar
a veracidade de seus resultados. Sempre que uma nova hipótese é formulada ou
uma nova alegação é realizada, toda a chamada “comunidade científica” se
mobiliza de modo a comprovar sua viabilidade teórica e prática. Como em
qualquer outro plano, quanto mais incomuns forem às novas ideias e invenções,
mais resistência tende a enfrentar durante seu escrutínio por meio do método
científico. Uma consequência disso é que vários cientistas através da história,
ao apresentarem suas ideias, foram inicialmente recebidos com alegações de
fraude por colegas que não desejavam ou não eram capazes de aceitar algo que
requereria uma mudança em seus pontos de vista estabelecidos como pontos de
vistas.
Antônio Abujamra estudou filosofia e jornalismo na
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC-RS-, onde iniciou
sua carreira como ator, em meados dos anos 1950, na peça “Assim é se lhe parece”,
de Pirandello, no Teatro Universitário de Porto Alegre. A estreia profissional
ocorreu em 1961, ano em que dirigiu “Raízes”, de Arnold Wesker, com Cacilda
Becker. No mesmo ano, dirigiu a peça “José de Parto à Sepultura”, de Augusto
Boal, no Teatro Oficina. Como diretor, foi um dos principais da original TV
Tupi e, como ator, teve atuação destacada. Na década de 1980, engaja-se na
recuperação do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), com destaque para “Os Órfãos
de Jânio”, de Millôr Fernandes, e “Hamletto”, de Giovanni Testori, sendo esta
dirigida por ele no TBC e em Nova York, para o Theatre for the New City. Participa da revolução cênica efetivada
nas décadas de 1960 e 1970, caracterizando seu trabalho artístico pela ousadia,
inventividade e espírito provocativo.
Nas décadas de 1980 e 1990, desenvolve espetáculos em
que crítica e lúdico se fundem num ceticismo bem-humorado, que é o eixo de sua
personalidade. Como Diretor em TV (1968-1997), como ator (1967-2-011), no
cinema (1989-2012). Entre seus trabalhos em teatro encontram-se “Volpone”, de
Ben Johnson; “Hair”, de Gerome Ragni e James Rado; “A secreta obscenidade de
cada dia”, de Manuel Antonio de la Parra; “Retrato de Gertrude Stein quando
homem”, de sua autoria e “O inferno são os outros”, de Jean-Paul Sartre. Em
1998, esteve na cidade de Monte Carlo, principado de Mônaco, ao lado de
celebridades como Claudia Cardinale, Annie Girardot e Yehudi Menuhin, compondo
parceria no júri do Festival Mundial de
Televisão, com o brilho de ser o único latino-americano convidado. Comandou
o programa “Provocações”, da TV Cultura, no ar desde 6 de agosto de 2000, onde
adotou um estilo próprio de fazer entrevistas. O último programa foi exibido no
feriado do mártir Tiradentes, tendo o Eduardo Sterblitch como convidado. Antônio
Abujamra foi quem levou o ator Othon Bastos para a televisão, depois do grande
sucesso do ator ao interpretar “Corisco” no filme: “Deus e o diabo na terra do
sol”, de Glauber Rocha. Era pai do também ator e músico André Abujamra. As atrizes
Clarisse Abujamra e Iara Jamra são suas sobrinhas.
Do ponto de vista técnico-metodológico, forma-se em
filosofia e jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul - PUC/RS, Porto Alegre, em 1957. Inicia-se como crítico teatral e, paralelamente,
faz suas primeiras incursões como ator e diretor no Teatro Universitário, entre
1955 e 1958, nas montagens: “O Marinheiro”, de Fernando Pessoa, “À Margem da
Vida” e “O Caso das Petúnias”, de Tennessee Williams, “A Cantora Careca” e “A
Lição”, de Eugène Ionesco, e Woyzeck, de Georg Büchner. Viaja à Europa, em 1959,
como bolsista, estudando língua e literatura espanholas, em Madri. Faz estágio
em Villeurbanne, na França, com o diretor Roger Planchon, acompanhando as
montagens “Henrique IV”, de William Shakespeare, e “Almas Mortas”, de Nicolas
Gogol; e com Jean Villar, em “A Resistível Ascensão de Arturu Ui”, de Bertolt
Brecht, no Théâtre National Populaire,
TNP, em Paris. Estagia ainda no prestigioso Berliner
Ensemble, em Berlim.
Na primeira metade dos anos 1980, Abujamra se engaja
no projeto de recuperar artisticamente o Teatro
Brasileiro de Comédia - TBC. Inaugura novas salas e implanta um movimento
que faz vir à luz alguns novos autores e diretores. Entre seus espetáculos mais
significativos no TBC estão: Os Órfãos de Jânio, de Millôr Fernandes, 1981;
Hamletto, de Giovanni Testori, 1981, peça que ele dirigirá mais duas vezes: no
próprio TBC, 1984, e em Nova York, para o Theatre for the New City, 1986; “Morte
Acidental de um Anarquista”, de Dario Fo, 1982; e “A Serpente”, de Nelson
Rodrigues, 1984. Um dos maiores sucessos de sua carreira, “Um Orgasmo Adulto
Escapa do Zoológico”, de Dario Fo, 1984, traz um solo virtuosístico que projeta
a atriz Denise Stoklos para uma carreira internacional e é aplaudido em vários
festivais fora do Brasil.
Em 1987, encerrado o projeto do TBC, Abujamra dirige,
para a Companhia Estável de Repertório
- CER, de Antonio Fagundes, a superprodução “Nostradamus”, de Doc Comparato,
grande êxito de bilheteria. Enfim, aos 55 anos de idade, Abujamra inicia sua
carreira de ator. Em dois anos, atua em duas telenovelas e três peças e é
premiado pelo desempenho no monólogo “O Contrabaixo”, de Patrick Süssekind,
1987. No ano seguinte, encena mais uma colaboração com Nicette Bruno e Paulo
Goulart, “À Margem da Vida”, de Tennessee Williams. Em 1991, recebe o Prêmio Molière pela direção de “Um Certo Hamlet”,
espetáculo de estreia da companhia “Os Fodidos Privilegiados”, fundada por
Abujamra para ocupar o Teatro Dulcina, no Rio de Janeiro. Vale lembrar que “Provocações” é um programa da TV Cultura às terças-feiras às 23h30. Era reprisado nas madrugadas das quintas-feiras às 4h30. Apresentava entrevistas instigantes e provocativas, com ênfase no entrevistado, com intervenções fabulosas de Antônio Abujamra.
O apresentador também lia textos e recitava poemas de pessoas famosas ou não. Além disto, há o quadro de pensamento“Vozes das
ruas”, no qual transeuntes expressavam suas opiniões acerca de diversos
assuntos. A trilha sonora de abertura foi elaborada pelo filho de Abujamra, o músico
e ator André Abujamra. O programa, que estreou em 6 de agosto de 2000, tem
duração média de 25 minutos. Ficou no ar até 28 de abril de 2015 devido a morte
de seu apresentador Antônio Abujamra com 82 anos de idade. Dentre seus
principais entrevistados estão: Eduardo Sterblitch Rita Cadillac, Ratinho, Eva
Wilma, Clóvis Rossi, Clodovil Hernandes, Tom Zé, Juca Kfouri, Mino Carta,
Cristiane Torloni, Rubens Ewald Filho, José Celso Martinez Corrêa, Dom Paulo
Evaristo Arns, Miguel Arraes, Ariano Suassuna, Silvio de Abreu, Paulo Autran,
Norma Bengell, Pitty, Marisa Orth, Luiza Erundina, Mário Bortolotto, Maguila,
Paulo Vanzolini, Ziraldo, Agnaldo Timóteo, Caco Barcellos, Luiz Gonzaga
Belluzzo, Mônica Iozzi e a atriz e cantora Elza Soares.
Enfim, TV Cultura é uma rede de televisão brasileira
com sede em São Paulo, capital do estado homônimo. Emissora de televisão
pública e comercial de caráter educativo e cultural, foi fundada em 20 de
setembro de 1960 pelos Diários Associados
e reinaugurada em 15 de junho de 1969 pela Fundação Padre Anchieta, sediada na
capital paulista, gerando programas de televisão educativos que são
transmitidos para todo o Brasil via satélite e através de suas afiliadas e
retransmissoras em diversas regiões do Brasil. É mantida pela Fundação Padre Anchieta,
uma fundação sem fins lucrativos que recebe recursos públicos, através do
governo do estado de São Paulo, e privados, através de propagandas, apoios
culturais e doações de grandes corporações. No dia 30 de janeiro de 2015, o
instituto de pesquisa britânico Populus
divulgou que a importante e reveladora notícia que a TV Cultura brasileira “é o segundo canal de maior qualidade do
mundo, atrás apenas da BBC One”, o principal canal de televisão da BritishBroadcastingCorporation no Reino Unido. Foi inaugurado a 2 de novembro de 1936 como BBC TelevisionService, e foi o primeiro serviço regular de teledifusão considerado tecnologicamente com um alto nível de resolução.
Bibliografia geral consultada.
DUVIGNAULD, Jean, Sociologia do Comediante. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1972; CASTRO, Silva, La
Lettera sulla Scoperta del Brasile di Pero Vaz de Caminha. Pádua:
Università di Padova, 1984; WEILLER, Maurice, “Para conhecer o pensamento de
Montaigne”. In: Ensaios de Montaigne. Brasília: UnB/Hucitec, 2ª edição.
Vol. III, 1987, pp. 3-135; MICHALSKI, Yan, “Antônio Abujamra”. In: Enciclopédia
do Teatro Brasileiro Contemporâneo/CNPq. Rio de Janeiro, 1989; LUIZ, Macksen,
“Hamlet para Brasileiro Ver”. In: Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 16
junho de 1991; PEREIRA, Maria Lúcia, “Quem é esse Diretor?”. In: O Inspetor
Geral. Direção de Máximo Gorki; texto Maria Lúcia Pereira. São Paulo, 1994;
CAMPOS, Regina Salgado, Ceticismo e Responsabilidade: Gide e Montaigne na
obra Crítica de Sérgio Milliet. São Paulo: Editora Annablume, 1996; SANDRONI,
Paula, Primeiras Provocações: Antônio Abujamra e o Grupo Decisão.
Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Teatro. Rio de Janeiro:
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2004; HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich, Fenomenologia do Espírito. 4ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2007; EVA, Luiz Antônio
Alves, A Figura do Filósofo: Ceticismo e Subjetividade em Montaigne. São
Paulo: Edições Loyola, 2007; GINOT, Isabelle; MICHEL, Marcelle, La Danse au
XXe Siècle. Paris: Éditions Larousse, 2008; SILVA, Daniel Furtado Simões da, O Ator e o Personagem: Variações e Limites no Teatro Contemporâneo. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Artes. Escola de Belas Artes. Belko Horizonte: Universidade Federal de Minas Grais, 2013; OLIVEIRA, Natássia Duarte
Garcia leite, Teatro Dialético em Terras Estranhas - A (In)diferenciação
entre Sujeito e Objeto na Formação Cultural. Programa de Pós-Graduação em
Educação. Faculdade de Educação. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2013;
PINTO, Pedro Arnaldo Henrique Serra, Eu, o Outro e a Nossas Circunstâncias:
O Legado de Stanislavski para uma Formação Teatral Eticamente Comprometida.
Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas. Salvador:
Universidade Federal da Bahia, 2013; BENEVIDES, Lourdinete Silva, Abriam-se
as Cortinas: A História da Informação Teatral em Aracaju, Sergipe (1960-2000).
Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Aracaju: Universidade
Federal de Sergipe, 2015; entre outros.
_________________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Ubiracy
de Souza Braga* “Eles [os políciais] precisavam matar alguém
naquele dia”. Patrícia Armani da Silva
O
trabalhador brasileiro Jean Charles de Menezes, de 27 anos, foi morto na
estação de Stockwell, no metrô de Londres, em 22 de julho de 2005. Confundido
com o terrorista etíope Hussain Osman, um dos autores dos ataques
fracassados no dia anterior na capital britânica, o eletricista levou sete
tiros na cabeça, disparados pela polícia metropolitana, a Scotland Yard. O
crime ocorreu duas semanas depois dos atentados de 7 de julho de 2005 em
Londres. Cerca de 30 horas depois da morte do eletricista brasileiro, seu
verdadeiro nome e nacionalidade foram divulgados pelas autoridades britânicas,
que “admitiram que o eletricista não carregava explosivos”. No dia 27 de julho,
o corpo de Jean Charles foi trazido para o Brasil e velado na igreja matriz de
Gonzaga, em Minas Gerais, onde mora sua família. Apesar de reconhecer a fatalidade
do ocorrido, a polícia britânica defendeu seus subordinados e atribuiu os
erros da operação a duvidosos equívocos cometidos pelo brasileiro, como ter
fugido ao ver os oficiais e visto vencido. No
dia 1º de outubro deste ano, a Justiça britânica deu início ao julgamento do
caso, com a Scotland Yard sendo acusada de violar as normas de saúde e
segurança, por ter realizado uma operação antiterrorista no metrô sem assegurar
na esfera política segurança dos cidadãos. O etíope naturalizado britânico era
o homem que a polícia realmente procurava em 22 de julho. Participou da
tentativa de explodir bombas em trens do metrô de Londres no dia anterior, e,
quando fugiu, deixou para trás uma carteirinha de academia de musculação que
levou à polícia ao prédio de apartamentos em Tulse Hill, o mesmo em que morava
Jean Charles. Agentes da polícia acabaram confundindo o brasileiro com Hussain.
Em meio à comoção pela morte de Jean Charles, o etíope fugiu para Roma, onde
morava um irmão. Foi preso dias depois na capital italiana e extraditado para o
Reino Unido. Em julho de 2007, Hussain foi condenado a 40 anos de prisão.
Durante
o julgamento, ele afirmou ter sido coagido pelos outros comparsas a participar
da operação. Ian Blair ficou no centro da tempestade gerada pelas disparidades
grosseiras entre a versão oferecida inicialmente pela polícia para as
circunstâncias da morte e os fatos que emergiram. O endosso público dado pelo
comissário às alegações de que Jean Charles teria tentado escapar dos policiais
que o seguiam - na verdade, o brasileiro sequer percebeu ser alvo -, foi
particularmente danoso à reputação de Blair. O comissário da Scotland Yard se
recusou a aceitar os pedidos para que deixasse o cargo. Mas em 2008, depois de
ser atacado publicamente pelo prefeito de Londres, Boris Johnson, viu-se
forçado a renunciar. Em 2010, Blair ganhou um título de lorde, uma decisão que
gerou protestos da família de Jean Charles. Depois de várias investigações, a
Justiça britânica decidiu que nenhum policial seria responsabilizado pela
morte. As identidades dos policiais jamais foram divulgadas. Em 2008, um dos
homens que atiraram em Jean Charles, identificado apenas como “C12”, prestou
depoimento na presença da mãe do brasileiro. Teve dificuldade para controlar
suas emoções e mais uma vez disse estar agindo com a informação de que o
eletricista mineiro era Hussain. Quatro anos mais tarde, veio à tona que um dos
técnicos da equipe britânica de hóquei nas Olimpíadas de Londres, Andy
Halliday, era um dos policiais armados que fazia parte da equipe para
Stockwell. Mas ele era o “C3”, que não disparou contra o brasileiro. A família
entrou com ação na Corte Europeia de Direitos Humanos, na França, para que a
polícia seja investigada criminalmente. O processo poderá durar meses a ser
analisado pelo tribunal.
A
Scotland Yard é a sede central ou quartel general da Polícia Metropolitana de
Londres (Metropolitan Police Service). Popularmente, o termo New
Scotland Yard é usado como metonímia para designar a Polícia Metropolitana ou a
polícia judiciária de Londres. O nome deriva da sua antiga localização, na
Great Kew Scotland Yard, uma rua situada em Whitehall. A exata origem do nome é
desconhecida, mas, segundo uma hipótese, no local se encontrava a missão
diplomática dos reis da Escócia, antes da União de 1707 entre Inglaterra e
Escócia. Outra possibilidade é que, durante a Idade Média, o local pertencesse
a um homem chamado Scott, ou ainda que as diligências para a Escócia saíam
dessa rua. No século XVII, vários prédios governamentais instalaram-se no
local. Os arquitetos Inigo Jones e Christopher Wren também moravam lá. Entre
1649 e 1651, o poeta John Milton viveu lá durante o período republicano da
Commonwealth of England, sob o governo de Oliver Cromwell. A Polícia
Metropolitana foi constituída em 29 de setembro de 1829, pelo ministro do
interior da época, Sir John Peel, mediante a implementação de um ato do
Parlamento. Em 1829 a polícia instalou-se no prédio de número 4 da Whitehall
Place, na área conhecida como Great Scotland Yard. Em verdade é uma rua do distrito de St. James, em Westminster, Londres, que liga a Northumberland Avenue e Whitehall. É reconhecida como a localização da entrada traseira da sede original do Serviço Metropolitano de Polícia de Londres, com respectivo o nome de Scotland Yard. O
prédio também acabou ficando reconhecido como “Scotland Yard”.
Em 1890, a sede
da Polícia Metropolitana mudou-se para Victoria Embankment, recebendo a
denominação New Scotland Yard. O prédio seria ampliado em 1907 e 1940. Desde
1967, a sede da New Scotland Yard está localizada em 10 Broadway, na região
administrativa de Westminster, perto do Palácio de Westminster, onde estão
instaladas as duas Câmaras do Parlamento do Reino Unido. A Polícia
Metropolitana de Londres, também reconhecido como Met é a força
responsável pelo policiamento de toda a Grande Londres, com exceção da “Square
Mile” - a área da City, que possui sua própria força policial, a City of London
Police. A sede da Met fica no prédio da New Scotland Yard, na região
administrativa de Westminster. Além da Met e da City of London Police, a Grande
Londres conta também com a British Transport Police, responsável pelo
policiamento dos sistemas de trem e metrô, a saber: London Underground,
Tramlink e Docklands Light Railway. O chefe da Polícia Metropolitana de Londres
é o Comissário de Polícia da Metrópole, geralmente chamado de Comissário.
O cargo foi ocupado pela primeira vez por Sir Charles Rowan e por Sir Richard
Mayne, conjuntamente. Desde 27 de janeiro de 2009, o ocupante do cargo é Sir
Paul Stephenson, que sucedeu Sir Ian Blair. Notabilizou-se por seus membros da corporação policial não
portarem armas, sendo utilizadas somente em casos especiais.
Sociologicamente o racismo consiste no preconceito e na discriminação com base em percepções sociais baseadas em diferenças biológicas entre os povos. Muitas vezes toma a forma de ações sociais, práticas ou crenças, ou sistemas políticos que consideram que diferentes raças devem ser classificadas como inerentemente superiores ou inferiores com base em características, habilidades ou qualidades comuns herdadas. Também pode afirmar que os membros de diferentes raças devem ser tratados de forma distinta. Alguns analistas sociais consideram que qualquer suposição de que o comportamento de uma pessoa está ligado à sua categorização racial é inerentemente racista. Não importando se a ação social é intencionalmente prejudicial ou mesmo de intenção pejorativa, porque estereótipos necessariamente subordinam a identidade individual (o sonho) à identidade coletiva de grupo (os mitos, os ritos, os símbolos). Na sociologia e psicologia, algumas definições não incluem apenas as formas conscientemente malignas de discriminação. Entre as formas para definir o racismo está a questão de se incluir aquelas não são intencionais. Como as que revelam preferências ou habilidades dos outros com base em estereótipos raciais, ou formas simbólicas e/ou institucionalizadas de discriminação, como a circulação de estereótipos étnicos pelas mídias sociais. De fato, aparentemente na Scotland Yard, 11% dos 31 mil policiais são de minorias étnicas. Entre a população de Londres, o índice é em torno de 40%. A questão das relações raciais na Scotland Yard é espinhosa, sobretudo depois de, em 1999, um inquérito público sobre a morte de Stephen Lawrence, um adolescente negro assassinado na região leste de Londres, denunciar uma “cultura institucional de racismo na força” pela maneira como agentes lidaram com o caso - foram constatadas falhas nos primeiros socorros a Lawrence e irregularidades na investigação.
O Esquadrão Especial para manifestações infiltrou oficiais disfarçados entre grupos ativistas. A polícia não confirma os nomes das famílias que teriam sido contactadas depois das investigações, alegando respeito à privacidade das pessoas. Mas reportagens em alguns órgãos da mídia britânica afirmam que não só a família de Jean Charles, como outras que estavam em campanha por justiça no país também teriam sido espionadas, como a do adolescente assassinado Stephen Lawrence, membros da campanha Justice4Jean, de Cherry Groce, morta em Brixton em 1985 e Rick Reel, morto em um ataque racista em 1997. Embora essas famílias não tenham sido os alvos primários das investigações, as informações colhidas sobre elas acabaram mantidas indevidamente. A ação sobre parentes de Jean Charles teria sido uma das últimas do SDS. Pouco depois, em 2008, quando autoridades do grupo antiterrorismo da Metropolitan Police souberam da existência das operações da unidade especial, o SDS foi desativado. Segundo o Guardian e o Channel 4, a polícia teria contactado algumas dessas famílias, entre elas a de Jean Charles para informá-las sobre a vigilância indevida. Relatório independente da sindicância que está feita sobre a atuação do SDS, divulgado em Londres, faz duras críticas à atuação da polícia, ao apontar “falta de gerenciamento e supervisão de processos e controles em relação à retenção, armazenamento e descarte de investigações da inteligência que continham informações que agora podem ser consideradas ‘instrução colateral’”. O documento, contudo, afirma que não há qualquer crítica em relação aos oficiais que estavam simplesmente desempenhando o papel para o qual foram treinados. Normalmente, durante investigações, a polícia acaba reunindo dados considerados colaterais, que teriam de ser descartados após um certo período. O brasileiro foi confundido com um suposto terrorista que teria participado um dia antes de um ataque frustrado à rede de transportes de Londres. O brasileiro foi morto com 7 tiros. A família foi indenizada em 10 mil libras. A imprensa britânica quer ir à justiça em função das investigações irregulares.
No dia 22 de julho de 2005, o brasileiro Jean Charles,
eletricista, então com 27 anos, foi
alvejado com sete (07) tiros na cabeça em um vagão na estação de metrô de
Stockwell. A Scotland Yard, polícia metropolitana de Londres, foi considerada
culpada pelos erros na ação. No mês passado, a família de Jean Charles entrou
com uma ação na Corte Europeia de Direitos Humanos buscando punição para os
envolvidos ainda inocentados pela justiça. Em sua versão, a polícia alegou
acreditar que Jean Charles fosse Osman Hussain, um imigrante etíope que, na
véspera, participara de um atentado terrorista frustrado ao metrô de Londres, no
dia 21 de julho, numa ação político-ideológica ligada aos atentados de 7 de
julho que deixaram 52 mortos. Segundo a polícia, Hussain vivia no apartamento
21 da Scotia Road, no bairro de Tulse Hill, Jean morava no número 17. A
Scotland Yard foi considerada culpada pela Justiça britânica em 2007 pelos
erros na operação pagando uma multa de £ 175 mil. Em 2009, chegou a um acordo
de indenização com os pais do brasileiro em torno de £ 100 mil, cerca de R$ 286
mil. Vale lembrar que do ponto de vista jurídico nenhum policial membro da corporação ligado à ação política de extermínio foi condenado.
O diretor da polícia política, Ian Blair, desgastado pelo caso, deixou o cargo em
2008. Dois anos depois, o militar Ian Warwick Blair, virou Lorde, “Baron Blair
of Boughton”, após nomeação para uma cadeira na Câmara dos Lordes, a câmara
alta do Parlamento britânico. A “House of Lords” representa na esfera política
a câmara alta do parlamento do Reino Unido. O parlamento também inclui a Coroa
britânica e a Câmara dos Comuns. Além de executar funções legislativas, a
Câmara dos Lordes mantinha até 1° de outubro de 2009 alguns poderes judiciais:
ela era a mais alta corte de apelação para a maioria dos processos no Reino
Unido. Estas funções judiciais não eram executadas por toda a câmara, mas por
um grupo com experiência legal reconhecido como “Lordes da Lei”. A
Câmara dos Lordes não era a única corte de último recurso no Reino Unido. Em
casos especiais, esse papel era cumprido pelo Muito Honorável Conselho
Privado de Sua Majestade. O ato da reforma constitucional 2005 transferiu as
funções judiciais dos lordes à Corte Suprema do Reino Unido.
Os
detalhes sobre a operação policial que resultou na morte do eletricista brasileiro, a
reação de parentes e amigos e o inquérito que apurou a responsabilidade dos
órgãos de segurança pública trouxeram à tona vários personagens que hoje estão
diretamente identificados com o caso. Jean Charles se transformou num símbolo
da luta de Organizações Não-Governamentais - ONGs de direitos humanos que cobram mais responsabilidade da polícia
britânica em ações envolvendo o uso de agentes armados. O brasileiro também foi
tema de produções artísticas, incluindo um filme sobre sua vida, estrelado por
Selton Mello. Jean Charles ganhou ainda um memorial na estação de Stockwell,
que virou uma espécie de atração local. A citação mais famosa ao brasileiro foi
feita pelo músico Roger Waters, um dos fundadores do grupo de rock progressivo
Pink Floyd durante turnê pelo Brasil, em 2012, o músico exibiu fotos no telão e recebeu os pais em um show em Porto Alegre. Que
a morte do brasileiro Jean Charles de Menezes por agentes armados da Polícia
Metropolitana de Londres, a Scotland Yard, em 22 de julho, foi causada por uma
sucessão de erros, já consta em uma série de investigações. Mas para o
ex-superintendente para o distrito de Hackney, Leroy Logan, a tragédia ocorrida
na estação de metrô teve também a influência do que ele define como racismo
institucionalizado.
Leroy Logan, um dos mais graduados oficiais negros que já
passaram pela corporação, se refere especificamente a um problema crucial na
operação que resultou na morte do brasileiro com sete tiros na cabeça no
interior de um trem do metrô na estação de Stockwell: o momento em que agentes
da Scotland Yard confundiram o eletricista mineiro com Osman Hussain, um
imigrante etíope que, na véspera, participara de um atentado frustrado ao metrô
de Londres - uma tentativa de repetir os ataques de 7 de julho, que mataram 56
pessoas e feriram mais de 500 na capital britânica. - “O racismo
institucionalizado da polícia ajudou a matar Jean Charles. O erro de
identificação que foi cometido jamais teria ocorrido se mais policiais de
minorias étnicas fizessem parte da corporação. Sobretudo, dos esquadrões de
operações especiais, como os que estavam a cargo da operação em que ele morreu.
É muito mais fácil aderir a estereótipos e fazer especulações quando um órgão
com tanta responsabilidade como a polícia não está inserido na realidade de sua
sociedade. Confundir aquele rapaz com um africano é o maior exemplo disso”,
afirma Logan, em entrevista à BBC Brasil. Membro fundador e ex-presidente da
Associação de Chefes Negros de Polícia, o britânico, que foi o comandante da
operação de segurança de Londres durante as Olimpíadas de 2012, diz ainda que o
desequilíbrio na corporação é um obstáculo para que novas mortes de inocentes
sejam evitadas. - “Uma polícia que não representa a comunidade em que opera vai
ter menos condições de acumular inteligência e evitar erros”, explica Logan,
que é patrono de ONGs de monitoramento de jovens de minorias étnicas e que já
foi condecorado pela rainha Elizabeth 2ª por sua militância em prol da
igualdade racial.
É reconhecido socialmente
por ser um dos lugares mais pobres e afetados pelo crime urbano de Londres.
Apesar disso é um lugar de contrastes consideráveis. O sudoeste do município é
adjacente ao centro de Londres e próximo à urbanização de Broadgate. Nesta
parte foram instalados alguns escritórios dentro dos limites do município.
Também no sudoeste se encontram Hoxton e Shoreditch, peças chave da cena
artística de Londres e lugar de numerosos clubes, bares, lojas e restaurantes,
muitos dos quais se concentram em Hoxton Square. O desenvolvimento de
Shoreditch e Hoxton provocou o aumento do preço do terreno na área, de tal
forma que as construtoras buscaram outras partes do município para seu
desenvolvimento uebano. A maior parte espacial de Hackney é de caráter urbano e
em lugares como Dalston se encontram grandes urbanizações junto a outras
urbanizações privadas. Para
o ex-superintendente para o distrito de Hackney, Leroy Logan, a tragédia
ocorrida na estação de metrô de Stockwell teve também a influência do que ele
define como racismoinstitucionalizado. – “O racismo institucionalizado da
polícia ajudou a matar Jean Charles. O erro de identificação que foi cometido
jamais teria ocorrido se mais policiais de minorias étnicas fizessem parte da
corporação. Sobretudo, dos esquadrões de operações especiais, como os que
estavam a cargo da operação em que ele morreu. É muito mais fácil aderir a
estereótipos e fazer especulações quando um órgão com tanta responsabilidade da polícia não está inserido na realidade de sua sociedade. Confundir aquele
rapaz com um africano é o maior exemplo disso”, afirma o ex-policial negro Leroy
Logan, em entrevista por telefone à BBC Brasil. Racismo institucional tem como representação social qualquer sistema de desigualdade que se baseia em processos sociais de descriminação de raça ou de etnia que pode ocorrer em instituições tradicionais geralmente como órgãos públicos governamentais, corporações empresariais privadas e universidades públicas ou privadas. O termo historicamente foi introduzido pelos ativistas norte-americanos Stokely Carmichael e Charles V. Hamilton do movimento social Black Power no final de 1960. A definição dada por William Macpherson em seu relatório sobre o assassinato de Stephen Lawrence é “o fracasso coletivo de uma organização em fornecer um serviço adequado e profissional às pessoas por causa de sua cor, cultura ou origem étnica”. A força do racismo institucional está em capturar as maneiras pelas quais sociedades inteiras, ou seções delas, são afetadas pelo racismo, ou talvez por legados racistas, muito tempo depois dos indivíduos racistas terem desaparecido
Membro
fundador e ex-presidente da Associação de Chefes Negros de Polícia, o
britânico, que foi o comandante da operação de segurança de Londres durante as
Olimpíadas de 2012, diz ainda que o desequilíbrio na corporação é um obstáculo
para que novas mortes de inocentes sejam evitadas. – “Uma polícia que não
representa a comunidade em que opera vai ter menos condições de acumular
inteligência e evitar erros”, explica Logan, que é patrono de ONGs de
monitoramento de jovens de minorias étnicas e que já foi condecorado pela
rainha Elizabeth 2ª por sua militância em prol da igualdade racial. Na Scotland
Yard, 11% dos 31 mil policiais são de minorias étnicas. Entre a população de
Londres, o índice é de 40%. A questão das relações raciais na Scotland Yard é
espinhosa, sobretudo depois de, em 1999, um inquérito público sobre a morte de
Stephen Lawrence, um adolescente negro assassinado na região leste de Londres,
denunciar uma “cultura institucional de racismo na força” pela maneira como
agentes lidaram com o caso - foram constatadas falhas nos primeiros socorros a
Lawrence e irregularidades na investigação. Em uma entrevista recente para um
documentário da BBC, o comissário da Scotland Yard, Bernard Hogan-Howe, admitiu
haver alguma justificativa concreta nas acusações de racismo contra a força.
Logan
também demonstra preocupação com o desfecho judicial do caso Jean Charles, em que
a Scotland Yard escapou de ações criminais e teve apenas que pagar uma multa
por violações à legislação de segurança pública. Na opinião do ex-policial, que
se aposentou, em 2013, o resultado reforçou uma cultura de impunidade, apesar
de a polícia também ter sido criticada em pontos específicos como versões
desencontradas dos fatos apresentados após a morte do brasileiro. – “Houve uma
campanha de desinformação e de difamação de Jean Charles. Refiro-me
especificamente ao relato de que ele tinha entrado correndo na estação de metrô
e pulado as roletas para fugir da perseguição de policiais. É o mesmo padrão que marcou a versão da polícia para a morte de Mark Duggan, seis
anos mais tarde”, rebate Logan, aludindo ao caso que, em agosto 2011, foi o
estopim para os violentos distúrbios que aterrorizaram Londres. Ao contrário de
Jean Charles, Duggan, morto pela polícia, tinha ligações com gangues do norte
da capital. Os dois casos resultaram em vereditos sem punições, apesar de depoimentos terem expostos várias irregularidades.
Protesto em Londres marca dez anos da morte de Jean Charles. Foi a
aparição de Ian Blair que me deu a impressão de que algo errado tinha acontecido, afirma Logan, pois ele não
costumava participar dos comunicados para a imprensa. A versão de que eles
demoraram tanto para perceber que tinham matado o homem errado não poderia
jamais se sustentar, e foi o que ficou provado. Logan também critica o comando
da Scotland Yard pela maneira como lidou administrativamente com seus agentes após reconhecidos os atentados de
7 e 21 de julho. O ex-superintendente acredita que faltou passar tranquilidade
para os policiais que atuavam em operações de maior sensibilidade, como a
Kratos, criada para lidar com atentados suicidas. – “Sei que era um momento de
tensão e emocionalmente forte, mas quando a polícia deixa de agir com frieza,
as chances de erro aumentam. Durante o período dos atentados eu conversei
várias vezes com os policiais de minha jurisdição para que tivesse calma e
respeitassem as pessoas. Mas os policiais de modo geral me pareceram muito
tensos, e com o estresse você tende a fazer ainda mais suposições”.
E suas
preconcepções se intensificam, afirma Logan. A expressão Operação Kratos designa um conjunto de táticas desenvolvidas pela Polícia Metropolitana de Londres (conhecida como Met) para lidar com suspeitos de terrorismo suicida. O aspecto mais notável da Operação Kratos é a orientação de atirar na cabeça do suspeito, sem aviso prévio. Foi desenvolvida pouco depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, parcialmente com base em consultas a agências de Israel e do Sri Lanka. Uma equipe da Polícia Metropolitana visitou Israel, Sri Lanka e Rússia, para conhecer a experiência desses países em ataques suicidas. Cientistas do governo britânico também foram consultados. Pouco se sabia sobre essas táticas até que o eletricista brasileiro Jean Charles de Menezes foi morto por engano pela polícia londrina, em 22 de julho de 2005, pouco depois dos ataques ao sistema de transportes de Londres. Conquanto o nome Operação Kratos não tenha mais sido usado pela Polícia Metropolitana, contudo, táticas similares ainda estão sendo aplicadas. Após dez anos da morte do mineiro, no dia 10 de junho,
a família de Jean Charles teve sua sua primeira audiência no Tribunal Europeu
dos Direitos Humanos, onde contesta a decisão da Justiça britânica de não
processar criminalmente os policiais responsáveis pela morte do brasileiro. “Há
dez anos nossa família luta por Justiça para Jean, porque nós acreditamos que
os policiais deveriam ser responsabilizados pela morte dele", afirmou em
comunicado Patricia Armani da Silva, prima de Jean Charles. “Nada poderá
trazer Jean de volta, mas esperamos que essa ação possa mudar as leis para que
outras famílias não tenham que enfrentar o que passamos”. O caso
apresentado na corte de Estrasburgo se baseia no artigo segundo da Convenção
Europeia dos Direitos Humanos. Ele determina investigações apropriadas de
mortes ocorridas nos 28 países da União Europeia. O inquérito público britânico
que investigou o caso concluiu erroneamente que nem a Scotland Yard, como instituição, nem
os policiais poderiam ser responsabilizados criminalmente pelo incidente. A
Scotland Yard, também reconhecida por New Scotland Yard ou Yard é a sede
central ou quartel general da Polícia Metropolitana de Londres (Metropolitan
Police Service).
O termo New Scotland Yard é usado como metonímia
para designar a Polícia Metropolitana ou a polícia judiciária de Londres. Como vimos, o nome deriva da sua antiga localização, na Great Kew Scotland Yard, uma rua
situada em Whitehall. A exata origem do nome é (des)conhecida, mas, segundo uma
hipótese, no local se encontrava a missão diplomática dos reis da Escócia,
antes da União de 1707 entre Inglaterra e Escócia. Outra possibilidade é que,
durante a Idade Média, o local pertencesse a um homem chamado Scott, ou ainda
que as diligências para a Escócia mantinham comunicação de saída dessa rua. A Polícia Metropolitana foi
constituída em 29 de setembro de 1829, pelo ministro do interior, Sir
John Peel, mediante a implementação de um ato do Parlamento. Em 1829 a polícia
instalou-se no prédio de número 4 da Whitehall Place, na área reconhecida como
Great Scotland Yard. O prédio também acabou ficando reconhecido como
“Scotland Yard”. Em 1890, a sede da Polícia Metropolitana mudou-se
para Victoria Embankment, recebendo a denominação New Scotland Yard. O prédio
seria ampliado em 1907 e 1940. Desde 1967, a sede da New Scotland Yard está
localizada em 10 Broadway, na região administrativa de Westminster, perto do
Palácio de Westminster, onde estão as Câmaras do Parlamento do
Reino Unido. Era considerada a melhor policia do mundo.
Sistemas
de reconhecimento facial vêm sendo implementado ao redor do mundo.
Países da Ásia, da Europa e das Américas avançam na utilização desses sistemas
nas mais diferentes áreas, que vão desde usos privados a usos públicos em
termos de segurança pública, mobilidade urbana e gestão de pessoas. Entretanto,
a implementação de tais sistemas não é feita sem muito se questionar a que
servem tais softwares. Alguns estudos têm demostrado que os algoritmos, entendidos
como um modelo matemático que busca a resolução de um problema específico, que
orientam o trabalho de tais sistemas, entregam resultados discriminatórios e
racistas, possuindo grandes dificuldades em reconhecer e diferenciar faces
negras, especialmente de homens e de mulheres negras. Ipso facto, algumas
questões que merecem atenção especialmente na segurança pública. Isso porque há
uma incompatibilidade visível entre sistemas e o uso do reconhecimento para
identificar suspeitos por crimes em vários países há algum tempo. A discussão
se concentra na linha tênue entre os avanços na segurança pública e a restrição
da liberdade e da privacidade dos cidadãos. Em meio a isso, sobram dúvidas
sobre como os dados são armazenados e qual a eficiência dos sistemas adotados
por autoridades. Mesmo sem uma regulação específica para o uso do
reconhecimento facial na segurança pública, é possível encontrar vários casos análogos
de órgãos de segurança pública que implementam sistemas de segurança para
comparar fotos de suspeitos com registros de bancos de dados.
Bibliografia geral consultada.
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Hierarchius. Essai sur le Systeme de Castes. Paris: Éditions Gallimard,
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de Direitos Humanos no Sistema da Segurança Pública: Um Estudo a partir do
Estatuto da Igualdade Racial. Dissertação de Mestrado. Faculdade de
Direito. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012; Artigo: “Família quer justiça pela morte de Jean Charles”. In: Diário
do Nordeste. Fortaleza, 23 de julho de 2015; entre outros.
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).