domingo, 5 de julho de 2015

Rita Lee: Música, TeVeLeezão, Paz & Muito Amor.

Ubiracy de Souza Braga*

                                                                                                  Me aposento dos shows, mas da música nunca”. Rita Lee (2012) 

Rita Lee se apresenta no Green Move Festival, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

                Rita Lee Jones Carvalho, reconhecida artisticamente como Rita Lee, nasceu em São Paulo, em 31 de dezembro de 1947. É uma cantora, compositora, atriz e instrumentista brasileira. Do ponto de vista social e econômico, vendeu mais de 55 milhões de cópias de discos, revelando-se a cantora brasileira de maior venda de discos na história da música do país. Ao longo de sua carreira, foi premiada com mais de 10 discos de ouro, 30 discos de platina e 5 de diamante. Conhecida como “Rainha do Rock Brasileiro”, construiu uma carreira que começou com o rock, mas que ao longo dos anos flertou com diversos gêneros musicais, como o tropicalismo, o pop rock e a música latina, criando um hibridismo pioneiro entre gêneros internacionais e nacionais. Politicamente ela: a) foi presa grávida; b) perseguida pelos “picaretas da censura”, entre censores e fingidores (cf. Lima, 1988), c) tomou “todas as coisas imagináveis”, d) cantou a menstruação, e) o sexo e f) a menopausa. E fez de seu grito de guerra: “Eu sou fêmea!”. Além disso, a maior roqueira do país assume que “mente a idade” (de 65 para 67), para parecer mais conservada, fala sobre o primeiro orgasmo, o diagnóstico de bipolaridade e a tristeza com a morte de Chorão - alguém que, como ela, “conheceu o inferno”.
“Flagra” é uma canção de Rita Lee e Roberto de Carvalho que fala de cinema, fazendo várias referências a atores e filmes, na forma de trocadilhos, tais como: “Se a Deborah Kerr que o Gregory Peck/Não vou bancar o santinho/Minha garota é Mae West/Eu sou o Sheik Valentino!”. Em 1982 a canção foi o hit do momento, e também a preferida do cantor e ex-parceiro de Rita Lee, em “Os Mutantes”, Arnaldo Baptista que, naquele ano, recuperava-se do uso excessivo de drogas ditas ilícitas pelas autoridades. A canção foi música-tema de abertura da telenovela da Rede Globo: “Final Feliz”, de Ivani Ribeiro, onde a letra era ilustrada por imagens de um cinema onde personagens famosos assistiam a conhecidas cenas de beijo de filmes que protagonizaram. O beijo de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman, em “Casablanca” representou uma cena que ilustrava o clipe de abertura da novela “Final Feliz”, cuja trilha sonora teve como tema a canção “Flagra”. Rita Lee é uma mulher iluminada.


Do ponto de vista ideológico (amplificação) e cultural (refinamento) Rita Lee é uma das artistas que mais influenciou os músicos do Brasil que vieram a usar guitarra, a partir de meados dos anos 1970, sobretudo as mulheres, em particular. Ex-integrante d`Os Mutantes (1968-1972) e do Tutti Frutti (1973-1978), participou de importantes revoluções no mundo da música, da arte, da política e da sociedade. Suas canções, em geral são regadas com uma “ironia ácida”, ou, com “uma reivindicação da independência feminina”, no sentido que Simone de Beauvoir emprega, ipso facto têm emplacado nas paradas de sucesso, sendo: “Ovelha Negra”, “Mania de Você”, “Lança Perfume”, “Esse Tal de Roque Enrow”, “Agora Só Falta Você”, “Baila Comigo”, “Banho de Espuma”, “Desculpe o Auê”, “Erva Venenosa”, onde curiosamente, nos shows, Rita Lee canta essa música vestida de serpente, o que endossa esse sentido, e mesmo em “Amor e Sexo”, “Reza”, entre outras, as mais famosas, além de ter lançado um álbum comumente visto como fundamental na história do rock brasileiro, “Fruto Proibido” (1975), considerado por alguns como sua obra-prima. Isto é importante.
O grupo musical “Os Mutantes” iniciou suas atividades em 1966, como um trio, quando se apresentaram no programa: “O Pequeno Mundo de Ronnie Von” TV Record. O grupo foi batizado como “Mutantes” pelo próprio Ronnie Von, antes da estreia na TV. O grupo até então se chamava “Os Bruxos” e a sugestão veio do livro: “O Império dos Mutantes”, de Stefan Wul, que Ronnie estava lendo na época. O grupo logo se tornou um dos principais expoentes da nova MPB influenciada pela “Tropicália” até terminar em 1978, com apenas Sérgio Dias como integrante original. Ao longo destes doze anos, foram gravados nove álbuns - sendo que dois deles, “O A e o Z” e “Tecnicolor”, foram lançados apenas na década de 1990. Foi nessa década que ocorreu o reconhecimento no cenário do rock nacional e internacional a importância dos Mutantes, como um dos grupos mais criativos, dinâmicos, radicais e talentosos da era psicodélica e da história da música mundial. Em 2006, a banda se reuniu, sem Rita Lee ou Liminha, mas contando com a presença de Arnaldo Baptista e com Zélia Duncan nos vocais. No ano seguinte, Arnaldo e Zélia se desligaram da banda, mas Rita Lee continua  sob a liderança de Sérgio Dias, único membro restante da formação original.
   
            Etnograficamente o show no centro cultural Barbican, numa noite chuvosa de segunda-feira em Londres, o primeiro em 33 anos dos Mutantes com os irmãos Serginho e Arnaldo Baptista e o baterista Dinho, foi um triunfo para esta geração de brasileiros. O grupo tocou todas as músicas mais importantes dos cinco primeiros discos e várias faixas em inglês do álbum: Technicolor e conquistou a plateia com seu alto astral – como nos velhos e sempre bons tempos. A noite começou nervosa. O promotor musical do Barbican, Bryn Ormrod, subiu ao palco, pediu desculpas pelo atraso e anunciou que Serginho Dias Baptista iria testar a guitarra, enquanto os técnicos faziam os últimos acertos no som geral. Serginho subiu ao palco, vestido de mosqueteiro, com colante bege e uma longa echarpe branca. Ele tentou tirar som da guitarra, mas nada aconteceu. Três técnicos, todos ajoelhados no palco, tentaram solucionar o problema. Os minutos passaram, Serginho desistiu, deu de ombros e voltou para a coxia.
Com uma carreira gloriosa que alcança os 50 anos, Rita Lee passou da inovação e do gueto musical do final dos anos 1960 e anos 1970, para as baladas românticas de muito sucesso nos anos 1980. Já cantou com praticamente todos os músicos mais prestigiados do país, de Elis Regina a Cássia Eller, ambas mortas tragicamente pelo uso de um coquetel que provocou overdose. Em 1976, ela começou um relacionamento afetivo com o guitarrista Roberto de Carvalho e desde então ele tem sido o parceiro de suas mais conhecidas e belas canções, como “Doce Vampiro” e a acompanhou em todas suas apresentações em shows ao vivo. Casaram-se no civil em 1996 e tiveram o filho Beto Lee, também guitarrista, que tem tocado com os pais. É vegetariana e defensora dos direitos dos animais. Em 2008, a revista Rolling Stone promoveu a “Lista dos Cem Maiores Artistas da Música Brasileira”, onde Rita Lee ocupa o 15° lugar.
                Nascida na capital paulista, Rita Lee é a filha mais nova do dentista Charles Fenley Jones, e de Romilda Padula Jones. Seus pais tinham outras duas filhas: Mary Lee Jones e Virgínia Lee Jones. Rita nasceu e cresceu no bairro da Vila Mariana, onde viveu por muitos anos, até o nascimento de seu filho. O bairro é especial a Rita, já que lá ela tem uma grande parte de todas as melhores lembranças de sua vida.  Ela foi educada no colégio francês paulistano Liceu Pasteur, e fala fluentemente português, inglês, francês, espanhol e italiano. Também chegou a cursar Comunicação Social na Universidade de São Paulo em 1967, na mesma turma da atriz Regina Duarte, mas deixou a universidade durante o 1° período. Durante a infância, teve aulas de piano com a musicista clássica Magdalena Maria Yvonne Tagliaferro, mais conhecida como Magda Tagliaferro, nascida em Petrópolis, a 19 de janeiro de 1893 e morta no Rio de Janeiro, em 9 de setembro de 1986, pianista brasileira e francesa, considerada uma das grandes pianistas do século XX (cf. Revista Época, 2010).
               Por um período de seis anos, Rita Lee foi, com Arnaldo Baptista e Sérgio Dias, integrante da banda: Os Mutantes, cantando, tocando flauta e percussão, além de performances bissextas no sintetizador, no banjo e manipulando “bizarrices” como um gravador portátil, como na música: “Caminhante Noturno” e uma bomba de dedetização, em “Le Premier Bonheur du Jour” e sendo letrista. Em 1967, a banda acompanhou Gilberto Gil no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record na apresentação da canção antológica: “Domingo no parque”. Foram gravados seis álbuns, tendo o primeiro, de 1968, como uns dos álbuns mais importantes da história da música brasileira, que deram origem a hits como: “A Minha Menina”, “Dom Quixote”, “Balada do Louco”, “Dois Mil e Um”, que representa o difusionismo antropológico, a primeira música a diluir o sertanejo com rock`n roll e o mais relevante: “Ando Meio Desligado”. Foi uma das músicas mais tocadas e vendidas do ano de 1970. Entre 1968 e 1972, Rita Lee foi casada com o companheiro de banda Arnaldo Baptista, o divórcio seria assinado somente com a tardia Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, pelas razões que são plenamente conhecidas e dispensa-nos de comentários.
Rita Lee participou das novelas ditas globais como: “Top Model”, “Vamp”, “Celebridade” e “Ti ti ti” e do sitcom: “Sai de Baixo”. Além de ter sido uma das apresentadoras do programa “Saia Justa” e ter apresentado os programas: “Tvleezão” e “Madame Lee”. Em “Os Trapalhões” (1977) interpretou uma fotógrafa em um concurso de miss, tema envelhecido e cada vez mais fora de cena na modernidade que “vagueia livre”.  Em “Top Model” (1989), escrita por Walther Negrão e Antônio Calmon, Rita Lee era Maria Regina, “a esotérica Belatrix”, uma das ex-mulheres do surfista Gaspar, interpretado por Nuno Leal Maia. Em “Vamp” (1991), também escrita por Calmon, Rita Lee era a roqueira-vampira “Lita Ree”, amiga da protagonista Natasha, interpretada por Cláudia Ohana, em um show fictício, dentro da novela, Cláudia e Rita, Natasha e Lita, cantaram juntas o grande sucesso “Doce Vampiro”.
Ainda nos anos de 1991, Rita Lee teve um programa na MTV Brasil intitulado: “TVLeeZão”. Em 1997, participou do sitcom: “Sai de Baixo” no episódio “Presepada de Natal”, Rita era Scarlet Antibes, uma prima de Caco Antibes, interpretado por Miguel Falabella. Em abril de 2002, passa a co-apresentar o programa de televisão “Saia Justa”, no canal pago GNT, o globosat, ao lado de Mônica Waldvogel, Marisa Orth e Fernanda Young, Rita Lee se despediu do programa em maio de 2004. Em “Celebridade” (2003), Rita Lee fez uma participação especial, “como ela mesma”, como se expressa a mídia, e contracenou com Maria Clara, interpretada por Malu Mader. De setembro a dezembro de 2005, comandou ao lado do marido Roberto de Carvalho, o talk-show: “Madame Lee”, também através do canal pago GNT. Em maio de 2010, é convidada pelo diretor Jorge Fernando para regravar seu sucesso de 1985, “TiTiTi”. A música foi usada na abertura do remake da novela “Ti Ti Ti” no horário das 19 horas. Rita Lee fez uma participação no último capitulo da novela, fazendo um show, cantando a música de abertura da novela: Se pintar um negócio na China/Corre e vê se eu estou lá na esquina/E se estiver, vê se me deixa em paz/Eu quero mais é ficar bem longe desse tititi/Pouco milho pra muito bico/Muita caca pra pouco penico/Não vou procurar sarna pra me coçar/Então desgrude e vai à luta e chega de blá blá blá.../Volta e meia, meia volta, volver/Saio de fino pra ninguém perceber/Essa galinhagem é mais chata que gilete/Nada mais furado do que papo de tiete/Tititi,tititi,tititi,tititi,tititi/Essa galinhagem é mais chata que gilete/Nada mais furado do que papo de tiete”.
             Entre 1986 e 1992, escreveu quatro livros infantis, tendo como protagonista o rato cientista, Dr. Alex. Em 2013 Rita Lee lança o livro: “Storynhas”, desenvolvido a partir de vários textos seus no Twitter durante sua passagem pela rede e ilustradas por Laerte. Os fãs de Rita Lee conhecem o humor de sua estrela. Ao longo dos anos, se acostumaram com as histórias desbocadas e surpreendentes que Rita conta em sua página do Twitter. São narrativas cômicas, ternas, tristes, biográficas, melancólicas, críticas, ferrenhas, raivosas e doces, às vezes tudo isso numa mesma história - ou numa mesma frase. Já Laerte muitas vezes não precisa de frases. Seu estilo, tão icônico e marcante quanto uma canção de Rita Lee, atravessou gerações se renovando com frescor e graça. Seja nas tiras, nas histórias longas ou nas ilustrações, os desenhos de Laerte carregam personalidade, humor, drama e política, com doses de filosofia e metafísica. A imaginação de Rita Lee e o traço de Laerte em “Storynhas” marca o encontro desses grandes artistas, numa obra inusitada e escandalosamente divertida. Criado a partir dessas minis histórias, “Storynhas” é um divã aberto para o pensamento anárquico, filosófico e deslumbrante da cantora. - “Atenção: pode conter rock‘n’roll”.
Em março, “Reza”, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, é confirmada como o primeiro single oficial, sendo disponibilizado em download digital no iTunes. No dia 15 de março, “Reza” alcança o 1º Lugar entre as músicas mais vendidas na categoria MPB no iTunes, “Reza” também está entre as mais vendidas de todo o iTunes Brasil. Ela aparece em 9º Lugar, na frente de sucessos como: “Moves Like Jagger”, do Maroon, e “Set Fire to the Rain”, de Adele. No dia 16 de março, “Reza” ultrapassou na loja brasileira do iTunes, o sucesso “Ai, Se Eu Te Pego”, de Michel Teló, no número de downloads do “Top Chart Music”, parada das músicas mais vendidas. Rita Lee é a brasileira mais bem colocada no ranking. No dia 26 de março, a música “Reza” entrou para a trilha sonora da novela Avenida Brasil da Rede Globo. O CD teve sua pré-divulgação no site da cantora e também no perfil oficial no Facebook no dia 2 de abril, onde foram divulgados os nomes das músicas e também trechos das músicas que estarão no novo álbum, o CD conta com 14 músicas, e a partir do dia 3 de Abril está disponível para a pré-vendas no iTunes. O novo disco de Rita Lee concorreu ao “MTV Vídeo Music Brasil”, “Top 100 Brazil” e está concorrendo ao XIII Grammy Latino.
Deus me proteja da sua inveja/Deus me defenda da sua macumba/Deus me salve da sua praga/Deus me ajude da sua raiva/Deus me imunize do seu veneno/Deus me poupe do seu fim/Deus me proteja da sua inveja/Deus me defenda da sua macumba/Deus me salve da sua praga/Deus me ajude da sua raiva/Deus me imunize do seu veneno/Deus me poupe do seu fim/Deus me acompanhe/Deus me ampare/Deus me levante/Deus me dê força/Deus me perdoe por querer/Que Deus me livre e guarde de você/Deus me acompanhe/Deus me ampare/Deus me levante/Deus me dê força/Deus me perdoe por querer/Que Deus me livre e guarde de você/Deus me perdoe por querer/Que Deus me livre e guarde de você/Deus me livre e guarde de você/Deus me livre e guarde de você”.
No dia 4 de novembro de 2012 Rita Lee fez o show que marcou sua volta aos palcos com a apresentação no “Green Move Festival”, no qual também se apresentaram as bandas: Titãs e Jota Quest. Na apresentação a cantora surpreendeu o público “ao abaixar a calça e virar para o público que assistia ao show”. Aproveitando o gancho do carnaval que vai fazer em Salvador para homenagear os anos 1970, a cantora Claudia Leitte apresentou um show durante o “Festival de Verão de Salvador”, com destaque para uma homenagem à Rita Lee, um dos ícones da década. Rita Lee fez um show no dia 25 de janeiro de 2013, no vale do Anhangabaú, show que faz parte da comemoração dos 459 anos da cidade de São Paulo. – “Daqui eu não saio”, disse Rita Lee, sobre a cidade onde nasceu. Sobre o show a cantora disse: - “Com esse show abre-se a celebração de meus 50 anos trabalhando com música; participei de algumas bandas; tenho trocentas composições; já fiz 1 bilhão setecentos e dezenove milhões e setenta mil shows; entre outros figurinos já me vesti de noiva, boba da corte, presidiária e Nossa Senhora Aparecida; há 36 anos sou casada com Roberto de Carvalho meu maior parceiro musical e pai dos meus 3 filhos”. Em abril de 2013, Rita Lee concede uma rara e franca entrevista à revista “Marie Claire”, em que diz que o grande tabu da mulher atual é o envelhecimento. – “Para envelhecer com dignidade, a mulher tem de ter desapego. É muito complexo!”.
Atualmente, a atriz Mel Lisboa protagoniza o espetáculo Rita Lee Mora ao Lado - com duração de 90 minutos, roteiro e texto de Debora Dubois, Márcio Macena, que também assinam a direção, e Paulo Rogério Lopes - que é uma adaptação teatral do livro “Rita Lee Mora ao Lado – Uma Biografia Alucinada da Rainha do Rock”, do escritor Henrique Bartsch. O musical conta no elenco com 13 atores e dançarinos vivendo os personagens Mick Jagger, João Gilberto, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Raul Seixas, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal Costa, Ney Matogrosso, Cazuza e Nelson Mota. Uma banda de cinco músicos é outro destaque da montagem. No repertório estão reunidas 40 canções, entre as quais sucessos como Ovelha negra, Menino bonito, Panis et circensis, Ando meio desligado, Agora só falta você, Caso sério e Banho de espuma.   
Em entrevista para a revista Marie Claire (RMC, 04/2013), Rita Lee respondeu as seguintes perguntas: Você cantou a menstruação em “Cor-de-Rosa Choque” e a menopausa, em “Menopower”. Hoje, de qual tabu feminino falaria? - Do envelhecimento. Às vezes, me olho no espelho e falo: - “Essa não sou eu!”. Para envelhecer com dignidade, a mulher tem de ter desapego. É muito complexo! Minha cabeça está registrada com 17 anos... Se me perguntarem a idade, é capaz de eu dizer: “Dezes... não, 67!”. Preciso olhar no espelho e falar: - “Rita, você está ótima. Não se queixa, não reclama! O corpinho tá bom. Aceite-se, goste-se”. Costumo dizer que tenho 67, tendo 65, e as pessoas falam: “como você está bem”. RMC - É verdade que “Cor-de-Rosa Choque” quase foi barrada pela censura militar por falar de menstruação? - Lembro vagamente disso... (risos). Mas o que mais vem à memória com a Solange (Hernandes, diretora do Departamento de Censura Federal na ditadura) é a saia justésima de ir até ela, humilde, com fitinha K-7, e ela botar para ouvir, pegar a letra e ficar interpretando... Numa das vezes, ela ouviu uma letra com a palavra “arco-íris” e encasquetou que era uma crítica à ditadura! - MC Achei registros antigos de uma música sua “Gente Fina é Outra Coisa”, que não foi liberada pelo DOPS. Diziam os censores: - “Na letra, uma jovem insurge-se contra o pátrio-poder (...) apresenta conotação anárquica”. RL Ai, que ótimo! Eles falavam isso sobre mim? Que currículo maravilhoso! (risos) Onde você pegou isso? Jesus Christ! Eu nunca soube que tinha esses documentos aí... - RMC - Existe até um levantamento do governo que aponta que você foi a artista mais vetada, com 14 músicas, seguida de Aldir Blanc e Juca Chaves. RL - Jura? Gente, não sabia de nada disso! Adorei. Me lembro de uma música, “X-21”, que eu falava da época da minha prisão, em 1976, e que também proibiram...”.                
Vestida para matar em pleno climatério/A velha senhora só vai ficar mocinha no cemitério/Chega de derramamento de sangue,/Cinquentonadolescente/Quem disse que útero é mangue,/Progesterona urgente/Menopower pra quem foge às regras/Menomale quando roça esfrega/Menopower pra quem nunca se entrega/Melancólicas vocês são piegas/Haja fogacho pra queimar essa bruxa em idade média/Em mulher não se pode confiar com menos/De 1000 anos de enciclopédia/O chico é tão incoerente, me deixa tiririca ao chegar/O chico quando vem é absorvente e quando/Falta só rezando pra baixar/Menopower pra quem foge às regras/Menomale quando roça esfrega/Menopower pra quem nunca se entrega/Melancólicas vocês são piegas/Tampax, tabelinha, ora pírulas, ora díu/Diafragma, camisinha, vão pra mãe que não pariu/Chega do creme de aveia perereca da vizinha/Chega do bom caldo e ´sustância` da galinha/Menopower pra quem foge às regras/Menomale quando roça esfrega/Menopower pra quem nunca se entrega/Melancólicas vocês são piegas”.
Enfim, trata-se de uma clara alusão ao aumento das dificuldades adaptativas incrementada com o passar dos anos na vida para algumas pessoas. Se, em tempos anteriores quando todas as circunstâncias existenciais eram mais satisfatórias, quando toda potencialidade vital era plena, quando o futuro era ainda distante e quando a solidão não tinha sido experimentada, em sua forma radical através do preconceito dos jovens, mesmo assim a pessoa passava por momentos de franca dificuldade adaptativa. No envelhecimento quando se fazem sentir inúmeras dificuldades, a capacidade adaptativa anterior nem sempre tende a estar piorada. As características trazidas pelo indivíduo à vida, à sua constituição se tornarão, desta forma independe de nossas vontades, mas exuberantes com o envelhecimento. Não queremos perder de vista  que o envelhecimento ativo foi definido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas. O termo ativo refere-se, além da capacidade física e da participação na reprodução da força de trabalho e processo de trabalho inserido, que necessariamente podem contribuir no desenvolvimento do indivíduo idoso nas questões sociais (isolamento/participação), econômicas (trabalho), espirituais (criação)  e civilidade.
Referências bibliográficas. 

JUNG, Carl (Organizador), O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2008; BAY, Eduardo Kolody, Qualquer Bobagem: Uma História dos Mutantes. Dissertação de Mestrado. Instituto de Ciências Humanas. Departamento de História. Brasília: Universidade de Brasília, 2009; SANTOS, Daniela Vieira, Não Vá se Perder por Aí: A Trajetória dos Mutantes. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia. São Paulo: Universidade Estadual Paulista, 2008; SANTOS, José Antônio Barbosa Alves dos, “A Imagem da Mulher pela Escolha Lexical de Rita Lee”. In: XIII Simpósio Nacional e III Simpósio Internacional de Letras e Linguística. Uberlândia - MG, 2011; ALMEIDA, Alexandre Paz, Entre a Pessoa e o Indivíduo: Dilemas da Sociologia Relacional de Roberto DaMatta. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba 2011; SANTOS, José Antônio Barbosa Alves dos, As Faces de Eva: O Universo Feminino no Léxico de Rita Lee. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filologia e Língua Portuguesa. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2013; Entrevista: “Rita Lee: Mostrar a Bunda é Normal. Envelhecer é que é Tabu”. In: http://revistamarieclaire.globo.com/2013/04; GOHL, Jefferson William, Esse tal de Roque Enrow! A Trajetória de Rita Lee de Outsider ao Mainstream (1967-1985). Tese Doutorado em História. Brasília: Universidade de Brasília, 2014; MELLO, Denielle Naiara Perotti, Texto, Música e Cena de Elis Regina em Alô, Alô Marciano de Rita Lee e Roberto de Carvalho. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Música. Escola de Música. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2014; TAVOLARO, Sérgio, “A tese da singularidade brasileira revisitada: desafios teóricos contemporâneos”. In: Dados. Rio de Janeiro, vol. 57, nº 3, pp.633-673, 2014; OTERO, Luiz Gomes, Rita Lee e os 40 Anos do Fruto Proibido. In: https://www.resenhando.com/2015/07; LEAL, Silvana Righi, Viva-voz - Especial Rita Lee: Uma Leitura Analítico-Descritiva sobre o Programa Televisivo. Trabalho de Conclusão de Curso de Bacharelado em Jornalismo. Santa Maria: Centro Universitário Franciscano, 2015; entre outros. 

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* Sociólogo (UFF) e Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).

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