sábado, 29 de abril de 2017

George Harrison - Bangladesh & Rock da Filantropia.

                                                                                                    Ubiracy de Souza Braga

“Pode ser que não apareçam todos, mas se 10% deles vier, será ótimo. Hare Krishna”. George Harrison

                                               
           Bangladesh: Nação Bengali, oficialmente República Popular do Bangladesh, é um país asiático, circundado quase por inteiro pela Índia, exceto ao  sudeste, onde tem fronteira com Myanmar, e ao sul, o litoral no golfo de Bengala. O país está listado entre as economias do grupo “Próximos Onze”. A capital do país é Daca. O nordeste da Índia tem fronteiras com o Bangladesh em três lados. Muitos dos aspectos físicos e culturais do Bangladesh são partilhados com Bengala Ocidental, um estado da Índia vizinho ao Bangladesh e Bengala Ocidental que formam uma região reconhecida como Bengala. Bangladesh era reconhecido pelo nome de Bengala Oriental. O atual nome Bangladesh significa “nação bengali”, ou “nação de Bengala”. Existe vida vegetal em abundância no clima quente e úmido. A maior parte do país é composta por planícies baixas, fertilizadas pelas enchentes dos rios e cursos d`água que as cruzam. Os rios, durante a época das cheias, depositam solo fértil ao longo de suas margens. Mas muitas dessas enchentes também causam grande destruição nos vilarejos rurais. Bangladesh em análise comparada é o 8º país do mundo em número humano com cerca de 150 milhões de habitantes.

O rápido crescimento populacional do país trouxe um sério problema de superpopulação. O território do país é um pouco maior do que o estado brasileiro do Amapá, mas o número de habitantes é, aproximadamente, 220 vezes maior. Os habitantes locais são chamados “bengaleses” ou “bengalis”, que representam 98% da população total de Bangladesh. Cerca de 85% dos habitantes são muçulmanos o que torna Bangladesh o 3º maior país de maioria muçulmana, sendo a quase totalidade do restante composta de hindus. A Constituição declara Bangladesh um estado secular, ao mesmo tempo que estabelece o islã como religião oficial. Como uma potência média na política mundial, Bangladesh é uma “democracia parlamentar unitária e uma república constitucional que segue o sistema Westminster de governança”. O país está dividido em oito divisões administrativas e 64 distritos. A região conhecida por Bangladesh foi governada, em períodos da sua história, por hindus, muçulmanos e budistas. Tornou-se parte do Império Britânico, quando o Reino Unido, em 1858, assumiu o controle político da Índia. Os sangrentos conflitos entre hindus e muçulmanos provocaram a divisão da Índia em duas nações, em 1947, quando se tornou independente. O Paquistão é formado pelo Paquistão Ocidental e Oriental, criado pelas regiões nordeste e noroeste da Índia.

A maioria da população nas duas áreas é composta de muçulmanos. Bangladesh conquistou sua Independência do Paquistão em 1971, depois da guerra civil de nove meses entre o Paquistão Ocidental e o Paquistão Oriental. De 1947 a 1971, a região que hoje é Bangladesh foi o Paquistão Oriental. Mais da metade da população do Paquistão morava lá. Há muito tempo a região é caracterizada por uma grande pobreza. A maioria dos habitantes é composta de agricultores pobres, que se esforçam para tirar seu sustento de pequenos lotes de terra. Muitos dos trabalhadores das cidades ganham apenas alguns centavos por dia. Cerca de 52,1% da população com mais de 15 anos não sabem ler nem escrever. Apesar de Bangladesh continuar enfrentando os desafios da crise de refugiados ruaingas, corrupção, e os efeitos adversos da mudança climática, o país é uma das economias emergentes e líderes de crescimento do mundo. A economia de Bangladesh é a 39ª maior do mundo em Produto Interno Bruto nominal, e a 29ª maior por PPP. A percentagem da população urbana de Bangladesh é inferior à da maioria das nações do sul da Ásia. Somente cerca de 18% da população, vive nas cidades. Apesar disso, Daca, a capital e maior cidade do país, é considerada uma das maiores cidades do mundo, em termos de população, tendo mais de 7 milhões de habitantes dentro de seus limites e mais de cinco milhões nas cidades e povoados periféricos.

          George Harrison foi um artista inglês, cuja carreira abrangeu diversas áreas. Músico, compositor, ator e produtor de cinema, Harrison atingiu fama internacional como guitarrista dos Beatles. Por vezes referido carinhosamente como “o Beatle quieto”, Harrison, com o passar do tempo, tornou-se um admirador do misticismo indiano, introduzindo-o aos Beatles, assim como aos seus fãs do Ocidente. Após a dissolução da banda, ele teve uma muito bem-sucedida carreira solo. Também obteve sucesso como membro do Traveling Wilburys e como produtor de cinema e musical. Harrison ocupa a 11ª posição da lista “Os 100 Maiores Guitarristas de Todos os Tempos”, da revista Rolling Stone. Durante sua carreira, o músico usou vários pseudônimos, entre eles: Arthur Wax, Carl Harrison, George Harrysong, George O`Hara, Hari Georgeson, Nelson Wilbury e Spike Wilbury. Além de músico, também foi um importante produtor musical e cofundador da corporação HandMade Films. Como produtor de cinema criou o selo Bangladesh e colaborou com artistas como Monty Phyton e Madonna.


            Harrison nasceu em Liverpool, na Inglaterra, em 25 de fevereiro de 1943, o último de quatro filhos de Harold Hargreaves Harrison e sua esposa Louise, nascida Louise French. Possuía raízes irlandesas, uma vez que seu avô materno, John French, nascera no Condado de Wexford, na Irlanda, imigrando para Liverpool, onde se casou com a jovem do subúrbio londrino, Louise Woollam.  Tinha uma irmã, Louise, de mesmo nome de sua mãe, nascida a 19 de agosto de 1931, e dois irmãos, Harry, nascido a 1934 e falecido nos anos 1990 e Peter, nascido a 1940 e falecido em 2007. Sua mãe, Louise (1911-1970), trabalhava em uma loja de Liverpool e Harold (1909-1978), seu pai, era um motorista de ônibus que, anteriormente, havia trabalhado como dispensário de barcos na White Star Line. Sua família era de formação católica. Nasceu na casa aonde viria a morar pelos seus primeiros seis anos de vida, o número 12 da Arnold Grove, situada em Wavertree, Liverpool. Em 1950, uma modalidade de “council house” foi oferecida à família, que se mudou para o número 25 da Upton Green, em Speke.
            No começo dos Beatles, George Harrison era visto pelo outros membros do grupo como um garoto, por ser o mais jovem dentre eles. Ele foi o primeiro Beatle a ir aos Estados Unidos da América, quando visitou sua irmã Louise em Benton, Illinois, em setembro de 1963. Em 1964, ele voltaria aos Estados Unidos com os Beatles, época em que eles se apresentaram no programa de TV, Ed Sullivan Show. Durante esta visita, Harrison ganhou uma guitarra modelo “360/12” da Companhia Rickenbacker; esta guitarra de 12 cordas fez parte de vários solos de George por volta de 1965. Durante o auge da beatlemania, George ficou conhecido como o “quiet Beatle” (“Beatle tímido”), devido a sua maneira introspectiva e tendência a falar pouco durante as entrevistas. Apesar da imagem de “beatle tranquilo”, a maioria dos amigos, como Eric Idle, membro do Monty Python, assegura que na intimidade ele era muito falante, contradizendo a imagem vulgarizada que a imprensa especulava a seu respeito. Harrison escreveu a primeira canção em 1963, “Don`t Bother Me”, no 2° álbum dos Beatles.   
         Historicamente foi a partir de 1965 que George Harrison começou a contribuir  frequentemente com composições para o grupo. No álbum Help! ele lançou duas composições próprias: “I Need You” e “You Like Me Too Much”. Um importante marco em sua carreira aconteceu durante a turnê norte-americana de 1965, quando David Crosby, do grupo The Byrds, introduziu George à cultura indiana através do trabalho do músico Ravi Shankar. George ficou fascinado pelo som indiano e se tornou um dos maiores responsáveis pela popularização da música indiana nos anos 1960. Após comprar um sitar, ele introduziu pela primeira vez na música pop um instrumento indiano, na canção “Norwegian Wood” do álbum Rubber Soul. Após essa experiência, escreveu algumas canções que utilizaram outros instrumentos indianos como a tabla e o sitar. Entre essas canções destacam-se “Love you too”, do álbum Revolver (1966) e “Within you without you”, do Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967). Ainda em 1967, ele foi responsável pela inclusão de Ravi Shankar no Festival Pop de Monterey.
            O Monterey International Pop Music Festival ocorreu de 16 a 18 de junho de 1967 no Monterey County Fairgrounds, em Monterey, na Califórnia, nos Estados Unidos da América. Foi organizado pelos produtores Loud Adler e Alan Pariser, o músico John Phillips do The Mamas & the Papas e o publicitário Derek Taylor. Entre os membros da comissão do festival, estavam integrantes dos Beatles e dos Beach Boys. Os artistas se apresentaram de graça, com toda a renda sendo doada a instituições de caridade. Mais de 200. 000 pessoas compareceram ao festival, considerado o começo do Verão do Amor dos hippies. Monterey foi a primeira apresentação nos Estados Unidos do magnífico guitarrista Jimi Hendrix que “foi agendado devido à insistência de Paul McCartney, The Who e Ravi Shankar,” e a estreia para o público de Janis Joplin e Otis Redding que morreria tragicamente  meses depois.
         Muitos executivos de gravadoras estavam na plateia, e a maioria das bandas ganhou contratos de gravação depois de suas apresentações no festival. Outros grupos também foram notados por sua não aparição - os Beach Boys não puderam comparecer devido a problemas com a recusa do vocalista Carl Wilson de se registrar no festival, e o músico britânico Donovan teve seu visto recusado por ter sido pego com drogas em 1966. Monterey foi o 1º grande festival de rock do mundo, na realidade, o primeiro festival de roque do mundo, o Fantasy Fair and Magic Mountain Music Festival, havia acontecido uma semana antes, em Mount Tamalpais, no Condado de Marin, e tornou-se modelo para futuros festivais, principalmente o Festival de Woodstock. O festival corporificou a imagem sociológica da “Califórnia como espelho da contracultura”. O festival também foi tema de um aclamado documentário de D. A. Pennebaker, intitulado Monterey Pop, foi um cineasta e documentarista norte-americano do Direct Cinema. Eles tornaram importantes artistas performáticos, especialmente músicos e políticos são os principais temas de seus documentários. No começo dos anos 1960 Pennebaker, juntamente com Richard Leacock e Robert Drew, fundou a Drew Associates. Em 1963 Leacock e Pennebeker deixaram a empresa para formar a própria produtora. Esta produtora, Pennebaker Hegedus Filmes, realizou documentários de influência na cultura pop norte-americana e de resto na Europa.   

Outro marco importante na vida de George ocorrera durante as filmagens de Help! em 1965, nas Bahamas. Na época, ele começou a se interessar pela religião hindu ao ler um livro sobre reencarnação. Em 1966, ele e sua mulher Pattie Boyd foram à Índia, onde ele conheceu vários gurus, locais sagrados e estudou o sitar. De volta à Inglaterra, George conheceu Maharishi Mahesh Yogi e começou a desenvolver a meditação transcendental. Influenciados por George Harrison, os Beatles foram à Índia fazer meditação espiritual em 1968. Em 1969, produziu o single “Hare Krishna Mantra”, interpretado por devotos do templo londrino de Radha-Krishna. No mesmo ano, ele e John Lennon conheceram Bhaktivedanta Swami Prabhupada, fundador da Sociedade Internacional para a Consciência de Krishna (ISKCON). Pouco depois, Harrison abraçaria a tradição Hare Krishna, em particular o canto de mantra usado como meditação privada e chamado japa-yoga, talvez similar ao Rosário na tradição católica. “Hare Krishna” é uma abreviação do famoso maha-mantra: - “Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare”. Esse antiquíssimo mantra, encontrado nos Upanishads, é uma invocação direta a Deus, em amor e devoção. Hare é uma invocação ao aspecto feminino de Deus (Deus Mãe). Krishna é um nome de Deus que significa “o todo atraente”. E Rama é outro nome de Deus que significa “a fonte do prazer”. Esse mantra, é um chamado a Deus em Seu aspecto masculino e feminino, todo-atraente, a fonte de todo prazer – ou seja, Deus reconhecido como bom, que possa ser desejado, a pessoa mais amorosa e amável.
Bangladesh, oficialmente República Popular do Bangladesh é um país asiático, rodeado quase por inteiro pela Índia, exceto à sudeste, onde tem uma pequena fronteira terrestre com Myanmar, e ao sul, onde tem litoral no Golfo de Bengala. O país está listado entre as economias chamadas “Próximos Onze”. A capital do país é Daca. O nordeste da Índia tem fronteiras com o Bangladesh em três lados. Muitos dos aspectos físicos e culturais do Bangladesh são partilhados com Bengala Ocidental, um estado da Índia vizinho ao Bangladesh. Na verdade, o Bangladesh e Bengala Ocidental formam uma região da Ásia conhecida como Bengala. O Bangladesh era historicamente conhecido pelo nome de Bengala Oriental. O atual nome Bangladesh significa “nação bengali” ou “nação de Bengala”. Existe vida vegetal em abundância no clima pari passu quente e úmido da região. A maior parte do país é composta por planícies baixas, fertilizadas pelas enchentes dos rios e cursos d`água que as cruzam. Os rios, durante a época das cheias, depositam solo fértil ao longo corredor de suas margens. Mas muitas dessas enchentes cíclicas também causam grande destruição nos vilarejos rurais.                              
Há muito tempo a região é caracterizada por uma grande pobreza. A maioria dos habitantes é composta de agricultores pobres, que se esforçam para tirar seu sustento de pequenos lotes de terra. Muitos dos trabalhadores das cidades ganham apenas alguns centavos por dia. Em torno de 52 % da população com mais de 15 anos não sabem ler nem escrever. Aproximadamente 85% dos habitantes são muçulmanos, sendo a quase totalidade dos restantes compostas de hindus. A percentagem da população urbana de Bangladesh é inferior à da maioria das nações do sul da Ásia. Somente em torno de 18% da população vivem nas cidades. Apesar disso, Daca, a capital a maior cidade do país, é considerada uma das maiores cidades do mundo estatisticamente em termos de população, tendo mais de sete milhões de habitantes residindo dentro de seus limites e mais de cinco milhões nas cidades e povoados periféricos. Bangladesh é um país dito “subdesenvolvido”, mas tem uma economia de mercado em rápido crescimento. É um dos principais exportadores mundiais de têxteis e vestuário, bem como peixes, frutos do mar e juta, além de ter indústrias emergentes competitivas internacionalmente em áreas como construção naval, ciências da vida e tecnologia. O país também tem um setor empresarial social forte e é considerado largamente em economia como sendo de fato o “berço das microfinanças”.        
Com o crescimento etnográfico de suas composições, George Harrison começou a ter dificuldades de incluí-las nos álbuns dos Beatles, pois John Lennon e Paul McCartney tinham um vasto material a ser incluído e não sobrava espaço social para suas composições. Durante a gravação do álbum The Beatles de 68, por exemplo, George teve três músicas excluídas: “Sour Milk Sea”, “Not Guilty” e “Circles”, além de quatro músicas incluídas: “While My Guitar Gently Weeps”, “Piggies”, “Savoy Truffle” e “Long, Long, Long”. As discussões entre os membros dos Beatles tornaram-se mais frequentes após a morte do empresário Brian Epstein, em 1967. Durante as gravações do álbum The Beatles (1968), George tentou abandonar a banda. Entre 1968 e 1969, Paul McCartney não percebeu a mudança culturalmente com a apreensão das técnicas indianas em Harrison e se  mostrava irritado com a forma com a qual tocava sua guitarra durante as gravações.
A tensão entre ambos se torna evidente durante os ensaios preliminares mono do projeto Get Back, no Twickenham Studios; descontente com a situação toda entre os Beatles, George Harrison abandonou o grupo em 10 de janeiro de 1969, mas retornou a seu trabalho em 22 do mesmo mês, depois de reuniões de negócios com os outros Beatles. O projeto etnomusicológico resumiu-se, sendo gravado no Apple Studios em multi-tracks e lançado como documentário sob o título de “Let It Be”, onde se pode ver Harrison dizendo a Paul: - “Tocarei o que queiras que toque ou não tocarei nada se não queiras que toque nada”. Porém, antes do fim dos Beatles, George Harrison já havia lançado dois álbuns solo: Wonderwall Music, de 1968, e Electronic Sound, de 1969. O primeiro com músicas instrumentais foi trilha sonora do filme homônimo. O álbum contou com a participação de Ringo Starr e Eric Clapton, todos, inclusive George usando pseudônimos. O segundo, considerado um “álbum experimental”, trouxe várias músicas tocadas em sintetizador Moog e uma capa com um desenho de sua própria autoria. Em 1970, o fim dos Beatles é anunciado e cada um segue sua démarche.
  
Após a separação do grupo, em 1970, ofuscado por anos por John Lennon & Paul McCartney, George Harrison lançou grande parte do material que havia acumulado e iniciou sua carreira artística solo. O primeiro álbum de George, All Things Must Pass, de 1970, foi um sucesso de crítica e de público. É considerado por muitos como o melhor disco de um ex-Beatle e um dos melhores discos da história. O álbum era triplo, quando lançado em vinil, o primeiro álbum triplo da história do rock que em CD, se tornou duplo. O álbum atingiu o primeiro posto das paradas de sucesso britânicas e norte-americana, incluía sucessos como as músicas “My Sweet Lord”, “Isn`t It a Pity” e “What is Life”. Anos mais tarde a canção “My Sweet Lord”, presente no álbum, lhe trouxe problemas devido a uma acusação de violação de direitos autorais. A canção era bem parecida com “He`s so Fine”, single de 1963, do grupo The Chiffons. George negou a acusação, mas em 1976, foi condenado por ter inconscientemente “plagiado a canção”. As discussões sobre os pagamentos aos danos causados levaram o caso até 1990. Durante este período, violando os preceitos éticos legais, o empresário dos Beatles, Allen Klein, comprou a editora Bright Tune, dona dos direitos de “He`s so Fine”, e trocou de lado, entrando na justiça contra George Harrison - obviamente para poder capitalizar nos pagamentos dos danos que Harrison eventualmente teria que fazer a Editora. Anos depois, Harrison comprou os direitos de ambas canções: “He`s So Fine” e “My Sweet Lord”. Quando o álbum foi remasterizado em compact disc, a música ganhou uma versão nova chamada “My Sweet Lord 2000”.
O Concerto para Bangladesh, em inglês: “The Concert for Bangladesh” foi um Evento constituído por dois (02) shows beneficentes organizados por pelo ex-beatle George Harrison e por Ravi Shankar. Os dois shows ocorreram na tarde e na noite de 1° de Agosto de 1971 no Madison Square Garden, em Nova York, e foram assistidos por mais de 40.000 pessoas. Foi o primeiro evento beneficente desse porte na história social da música e contaram com vários artistas consagrados como Bob Dylan, Eric Clapton, Ringo Starr, Billy Preston e Leon Russel. O concerto arrecadou no total US$243.418,51 que foi administrado pela UNICEF - O Fundo das Nações Unidas para crianças, em inglês: United Nations Children's Fund, é um órgão das Nações Unidas que tem como objetivo promover a defesa dos direitos das crianças, ajudar a dar resposta às suas necessidades e contribuir para o seu desenvolvimento. Rege-se pela Convenção sobre os Direitos da Criança e trabalha para que esses direitos se convertam em princípios éticos permanentes e em códigos de conduta internacionais para as crianças. Sua sede está localizada na cidade de Nova Iorque, nos Estados Unidos. As vendas do álbum e do compact disc continuam a beneficiar o fundo de George Harrison para a UNICEF.
O UNICEF tem como objetivo promover os direitos e melhorar a vida de todas as crianças, em todas as situações. Iniciou suas atividades em dezembro de 1946, como um fundo de emergência para ajudar as crianças de todo o mundo, que sofreram com as consequências da guerra, formado por um grupo de países reunidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). Mas alguns anos depois, milhões de crianças de países pobres continuavam ameaçadas pela fome e pela doença. Em 1953, o UNICEF tornou-se uma instituição permanente de ajuda e proteção a crianças de todo o mundo, e é a única organização mundial que se dedica especificamente às crianças. Está presente em 193 países. Em termos genéricos, trabalha com os governos nacionais e organizações em programas de desenvolvimento em longo prazo nos setores chave da saúde, educação, nutrição, água e saneamento e também em situações de emergência, ajudar a dar resposta às suas necessidades básicas e contribuir para o seu pleno desenvolvimento.
O evento gigantesco foi gravado por câmeras e lançado em cinema. Em 2003 foi lançada uma edição especial em DVD duplo com inúmeros extras. A produção do disco triplo e da edição sonora do filme ficou a cargo do famosíssimo Phil Spector, que havia desenvolvido a técnica denominada “wall of sound”, que foi usada no disco All Things Must Pass, produção esta motivo de discórdias entre o produtor e o músico. O disco triplo ganhou um prêmio Grammy na época, que foi recebido pelo baterista Ringo Starr. Já o filme do concerto apresentou uma mescla das duas apresentações Madison Square Garden. Existia uma desconfiança e uma tensão acerca da aparição de Bob Dylan, que apesar de ter ensaiado com Harrison, não havia dado certeza da presença. O mesmo quase ocorreu com Eric Clapton, que estava passando por um momento difícil em razão de seu crescente vicio em heroína e cocaína. Após este show, Clapton se auto exilou em sua mansão retornando somente em 1973, marcado por um evento no Teatro Rainbow em Londres, organizado por Pete Townsend do The Who. O evento é marcante pelo fato de unir dois ex-membros dos The Beatles.  Após a realização do concerto, houve outros incluindo um concerto no mesmo Madison Square Garden em 1972, em prol às crianças incapacitadas da instituição capitaneada por George Rivera.
Bibliografia geral consultada.
BERTOLDI, Maria Teresa Jorgens, A Comunicação Visual do Beatles como Sedução no Imaginário Social e Cultural. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2009; OLIVEIRA, Miriam Santos Ribeiro, A Nação e seus Imigrantes: Análise do Discurso Nacionalista Hindu Contemporâneo sobre Comunidade Hindu Ultramarina. Tese de Doutorado em Sociologia. Departamento de Sociologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012; ADAMI, Vitor Hugo da Silva, O Pensamento Coletivo Hare Krishna e seus Modos de Instrumentalização: Um Estudo sobre Comunidades Globalizadas e Identidades Locais. Tese de Doutorado. Espanha: Universitat Rovira Virgili, 2013; ALENCAR, Bruno Maia de, All You Need is Love: O Processo de Formação de uma Banda Ghost. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Comunicação. São Paulo: Universidade Paulista, 2015; SAES, Diogo Xavier, A Retórica dos Beatles: A Visualidade e as Relações Multissensoriais entre Música, Imagem e o Contexto Sessentista nas Capas dos Discos dos Beatles de 1965 a 1968. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Comunicação. Centro de Educação, Comunicação e Artes. Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2015; VIOLIN, Marcelo Henrique, Hari`son: Uma Interpretação Histórica das Canções Devocionais de George Harrison de 1970 a 1973. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História Social. Centro de Letras e Ciências Humanas. Londrina: Universidade Estadual de Londrina, 2017; MIRANDA NETO, Affonso Celso de, Eram os Deuses Guitarristas? Heróis e Mitos no Imaginário Social da Cultura de Massa. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação. Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017; GRANATYR, Jones, Modelo Afetivo de Confiança e Reputação Utilizando Personalidade e Emoção. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Informática. Curitiba: Pontifícia Universidade Católica do Paraná, 2017; BALDELLI, Debora, Práticas Espirituais e Expressivas no Contexto Migratório: Uma Etnografia do Movimento Hare Krishina na Cidade de Lisboa. Instituto de Etnomusicologia. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2017;  entre outros.

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Previdência Social - Tempo de Trabalho & Assistência em Migalhas.

                                                                                          Ubiracy de Souza Braga

“A greve, no fundo, é a linguagem dos que não são ouvidos”. Martin Luther King


                                     
             Estudos recentes têm demonstrado cada vez com maior clareza do ponto de vista técnico-metodológico (pesquisa empírica) e científico (teoria) que, o avanço da idade não determina a deterioração da inteligência, pois ela está associada à educação, ao padrão de vida, a vitalidade física, mental e emocional. Também é preciso perder a inculcação ideológica de preconceito sobre a idade cronológica das pessoas. Vale fazer um alerta importante, talvez, só na América do Sul estima-se que no início deste novo milênio mais de 30 milhões de pessoas estarão com idade acima de 60 anos. No Brasil, só o Estado de São Paulo representará quase três (03) milhões de pessoas ou cerca de 8% dessa população. O aumento desta população tende a expandir ainda mais nas próximas décadas, o que justifica o interesse e a preocupação da sociedade e do governo em criar políticas públicas para tratar questões sociais ligadas à velhice. Trata-se de um processo individual, simultaneamente social, cultural e de evolução natural, indiscutível e inevitável sobre a morte (cf. Ariès, 1988), para qualquer ser humano, dando sentido e forma à vida. Fase em que ocorrem mudanças biológicas, fisiológicas, psicossociais, econômicas e políticas que compõe o cotidiano da vida das pessoas.
Em muitas culturas e civilizações, principalmente as orientais, o velho, o idoso é visto com respeito e veneração, representando uma fonte de experiência, de seu valioso saber acumulado ao longo dos anos, da prudência e da reflexão. Enquanto em outras, o idoso tem como representação social estigmas em torno de noções como: “o velho”, “o ultrapassado” e psicologicamente “a falência múltipla do potencial do ser humano”. No dia 17 de agosto de 1986, o jornal O Estado de São Paulo, por ocasião do falecimento de Mãe Menininha do Gantois e da grande presença de pessoas em seu sepultamento, escreveu em seu Editorial: “a importância exagerada dada a uma sacerdotisa de cultos afro-brasileiros é a evidência mais chocante de que não basta ao Brasil ser catalogado como a oitava economia do mundo, se o País ainda está preso a hábitos culturais arraigadamente tribais”. Dois pesos e duas medidas: a) o preconceito étnico e racial; b) o preconceito sobre a velhice; c) o preconceito contra o fato de ser mulher, para lembrarmo-nos de John Lennon & Yoko Ono que advertiam: “woman is the nigger of the world”, publicado em seu álbum “Sometime in new york city” (1972).


Maria Escolástica da Conceição Nazaré (1894-1986), conhecida como Mãe Menininha do Gantois, foi uma Iyálorixá brasileira, filha de Oxum. Nasceu em 1894, no dia de Santa Escolástica, na Rua da Assembleia, entre a Rua do Tira Chapéu e a Rua da Ajuda, no Centro Histórico de Salvador, tendo como pais Joaquim e Maria da Glória. Descendente de escravos africanos, ainda criança foi escolhida para ser Iyálorixá do terreiro Ilê Iyá Omi Axé Iyamassê, fundado em 1849 por sua bisavó, Maria Júlia da Conceição Nazaré, cujos pais eram originários de Agbeokuta, sudoeste da Nigéria. Foi apelidada Menininha, talvez por seu aspecto franzino, o corpo comprido e magro de menina. - “Não sei quem pôs em mim o nome de Menininha. Minha infância não tem muito que contar. Agora, dançava o candomblé com todos desde os seis anos”. Por um curto período, enquanto a jovem se preparava para assumir o cargo, sua mãe biológica, Maria da Glória Nazareth, permaneceu à frente do Gantois. Foi a quarta Iyálorixá do Terreiro do Gantois e “a mais famosa de todas as Iyálorixá brasileiras”. Iyalorixá ou Iyá (mãe) ou ainda, Yalaorixá é uma sacerdotisa e chefe de um terreiro de Candomblé Ketu. Iyá no dialeto Yorubá significa (mãe), bem como a junção Iyaiyá (mamãe) ou Iaiá, tendo o mesmo significado de mamãe, senhora, forma carinhosa de falar com a mãe, ou senhora da fazenda muito usada pelos escravos, como consta na narrativa etnológica de Gilberto Freyre, durante o período da passagem do trabalho de mão-de-obra escrava para mão-de-obra assalariada. Fora utilizada em segmentos das religiões afro-brasileiras, principalmente no Candomblé. 
A Previdência Social no Brasil possui mais de um século de história social e política como instituição.  Tem como ponto de partida Lei Elói Chaves, regulamentada com o Decreto n° 4.682 de 1923. Ela criou a Caixa de Aposentadoria e Pensões para empregados de empresas ferroviárias, estabelecendo assistência médica, aposentadoria e pensões, válidas também para seus familiares. Em três anos, a lei seria estendida para trabalhadores de empresas portuárias e marítimas. Na década de 1930, através da promulgação de diversas normas, os benefícios sociais foram sendo ampliados para a maioria das categorias de trabalhadores, dos setores público e privado. Foram criados institutos de previdência para gestão e execução da seguridade social brasileira. As Caixas de Aposentadoria e Pensões instituídas pela chamada Lei Elói Chaves, de janeiro de 1923, beneficiavam poucas categorias profissionais. Após a Revolução de 1930, o Ministério do Trabalho passou a tomar providências para que essa garantia trabalhista fosse estendida a um número significativo de trabalhadores.
                       
Desta forma, foi criado o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM) em junho de 1933, ao qual se seguiram o dos Comerciários (IAPC) em maio de 1934, o dos Bancários (IAPB) em julho de 1934, o dos Industriários (IAPI) em dezembro de 1936, e os de outras categorias profissionais nos anos seguintes. Em fevereiro de 1938, foi criado o Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado (IPASE). A presidência desses institutos era exercida por pessoas livremente nomeadas pelo presidente da República. Após 1945, os Institutos de Aposentadoria e Pensões expandiram suas áreas de atuação, que passaram a incluir serviços na área de alimentação, habitação e saúde. Essa ampliação de funções, vinculadas às categorias de trabalho, porém, não foi acompanhado da necessária reformulação da sua gestão financeira, o que acarretou sérios problemas ocorridos posteriormente. A falta de um planejamento central foi também responsável por graves disparidades na qualidade do atendimento oferecido às diversas categorias profissionais. Em 1960, foi criada a Lei Orgânica de Previdência Social, inclusiva, teve como objetivo unificar a legislação referente aos institutos de aposentadorias e pensões já beneficiando todos os trabalhadores urbanos. Os trabalhadores rurais passariam a ser contemplados em 1963.  
Em 1966, com a alteração de dispositivos da Lei Orgânica da Previdência Social, foram instituídos o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, com indenização para o trabalhador demitido que também pode ser usada para quem puder comprar sua casa própria, articulado ao Instituto Nacional de Previdência Social - INPS que reuniu os seis institutos de aposentadorias e pensões existentes. Em 1974, foi criado o Ministério da Previdência e Assistência Social. Até então, o tema ficava sob o comando do Ministério do Trabalho e Emprego. A extensão dos benefícios da previdência aos trabalhadores com a Constituição de 1988, passou a garantir renda mensal vitalícia a idosos e portadores de deficiência, desde que comprovada a baixa renda e que tenham qualidade de segurado. Em 1990, o INPS mudou de nome para ser chamado de Instituto Nacional de Seguridade Social.
Seguridade Social é gênero e previdência social é espécie. A Seguridade Social envolve a previdência, saúde e assistência social.  A previdência social é política pública integrante da Seguridade Social. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Seguridade e previdência não se confundem. Dispõe o Artigo 194, da Constituição Federal (1988) que a “seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. Assim, percebe-se que a seguridade social abrange a previdência social, mas também a saúde e a assistência. A saúde, nos termos do artigo 196, Constituição Federal, “é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Todos, portanto, segundo Constituição temos direito à saúde. 
Mas a assistência fica restrita a quem dela necessitar. A previdência, por sua vez, além de ser de filiação obrigatória, tem caráter contributivo, ou seja, quem não contribuir não terá direito aos benefícios desta.  Quanto à seguridade social, compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizá-la, com base nos seguintes objetivos: universalidade da cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações trabalhadoras urbanas e rurais; seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; irredutibilidade do valor dos benefícios; equidade na participação no custeio; diversidade da base de financiamento; e caráter democrático e descentralizado da administração pública, mediante gestão quadripartite, com participação social dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos respectivos órgãos colegiados.
Conforme previsto no artigo 195, da Constituição Federal: A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das contribuições sociais: do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o Art. 201; sobre a receita de concursos de prognósticos; do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. Observa-se uma ampla abrangência nesse financiamento público, justamente porque a seguridade social deverá atender tanto a saúde, como a assistência e a previdência social. 
Em primeiro lugar, a maioria das pessoas associa as palavras trabalho e emprego como se representassem valores econômicos idênticos. Apesar de estarem ligadas, essas palavras possuem significados diferentes. O trabalho é mais antigo que o emprego. O trabalho existe desde o momento que o homem começou a transformar a natureza e o meio ao seu redor. Desde o momento que o homem começou a fazer utensílios e ferramentas. Por outro lado, o emprego é algo recente na história da humanidade. É um conceito que surgiu por volta da Revolução Industrial. É uma relação social entre homens que vendem sua força de trabalho, e homens que compram essa força de trabalho pagando a capacidade de trabalho pelo valor-trabalho em um salário. O trabalho é essencial para o funcionamento de todas as sociedades existentes. O trabalho é responsável pela produção de alimentos e outros produtos de consumo da sociedade. Sendo assim, sempre existirá o trabalho. O conceito, a classificação e o valor social atribuído ao trabalho tem sua base sociológica e são referidos às questões culturais.
Cada sociedade cria um conceito próprio, divide o trabalho em certas categorias e atribui-lhe um determinado valor social. Quando essas condições se alteram, a consciência sobre o trabalho concreto e abstrato também se altera. Sobretudo, sob a forma como uma sociedade decide quem vai organizar o trabalho e quem o realizará. A forma como o produto, a riqueza, produzida pelo trabalho social é distribuída entre os membros da sociedade, determina as divisões do trabalho através das classes sociais, no campo e na cidade. O trabalho é o principal fator que determina as condições de existência na sociedade. Assim, enquanto existir uma sociedade, dizia Marx, existirá trabalho, pois aquela não existe sem esta, embora o mesmo possa não ser verdadeiro em relação ao emprego. Fica claro que compreender o trabalho e o emprego é importante conjunturalmente. Mas é mais importante ainda entender o trabalho quando a sociedade encontra-se em um processo reformista de conservação das estruturas de poder, como o golpe de Estado de 17 de abril de 2016 que afeta os níveis econômico e político; pois o trabalho certamente será influenciado e influenciará as mudanças sobre a sociedade.
A exploração do trabalho não é mais aquela como resultado da acumulação de capital nos séculos XIX ou XX. Por isso, é preciso mudar a forma de fazer política.  O trabalho que Marx com razão considera necessário consome apenas uma fração da jornada de trabalho. Outra porção, bem mais significativa que no passado recente em função do avanço da produtividade e da degradação da força de trabalho (cf. Braverman, 1976) condicionada em última instância pelo processo social de  globalização, representa o tempo socialmente útil no qual o trabalhador produz um valor superior à sua própria remuneração e que já não é mais, na concepção marxista, trabalho necessário, mas excedente, substância da mais-valia. Trata-se da única fonte real de lucro, sob a forma de juros, dividendos e outros. Embora isto não transpareça nos fatos sociais e econômicos e aparências enganadoras da chamada “terceirização”, em que o trabalho parece gerar mais dinheiro no bolso do trabalhador. 

Uma pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre “Envelhecimento no Século 21” demonstrou que, “entre os idosos, a segurança financeira representa a maior preocupação para a manutenção da vida”. Nas últimas décadas, o Brasil demonstrou que a sua população com idade avançada deve aumentar estatisticamente em um ritmo mais rápido do que o previsto devido à queda da fecundidade e ao aumento da expectativa de vida do brasileiro, que subiu para 74, 9 anos, segundo dados do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Assegurar o bem-estar da população mais velha e equilibrar as contas da seguridade social é hoje um desafio político. Atualmente o governo brasileiro alega que o sistema previdenciário não seria sustentável ao longo dos próximos anos. Para conter as despesas, o governo propôs endurecer as regras aos benefícios da previdência penalizando o trabalho. Em junho de 2015, por exemplo, o Congresso nacional aprovou o mecanismo 85/95, que prevê mudanças no cálculo da aposentadoria. Com aquela regra, “a soma da idade + o tempo de contribuição deve ser de 85 anos para mulheres e 95 anos para homens”.
A partir de 2017, o mecanismo será gradativamente acrescido em 1 ponto até 2022. Assim, em 2017 as idades passam para 86/96, em 2019 para 87/97, em 2020 para 88/98, até chegar em 90/100 em 2022. A mudança gradativa decorreu de uma decisão da presidente Dilma Rousseff frente à proposta aprovada no Congresso. O argumento decorre do aumento da expectativa de vida. Os gastos com aposentadoria dos idosos seriam acrescidos com as despesas públicas provocando um déficit previdenciário. A previdência consome 22,7% da despesa total do governo brasileiro. Uma pesquisa internacional comparativa demonstrou que os gastos previdenciários equivalem a 11% do PIB no Brasil e a 6% do PIB nos EUA, sendo que a proporção da população norte-americana acima dos 60 anos (16% da população total) é o dobro da brasileira (8% da população total). Para especialistas, a valorização do salário mínimo - que corrige os benefícios -, a aposentadoria precoce e o excesso de pensões são fatores que ajudam a elevar os gastos do governo com a previdência. 
         É neste sentido  que a burocracia admite que equilibrar as contas públicas é um dos pontos centrais da transformação já que o Brasil viverá uma transição demográfica a partir de 2030, quando a previsão do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) prognostica que a população brasileira deverá atingir seu pico e provavelmente terá o maior número de homens e mulheres trabalhando. A população jovem, de faixa etária entre 15 e 29 anos, deve cair consideravelmente a partir desta data. A ideia do novo governo eleito em 2018, ao reformar a Previdência, é aumentar as receitas, mas também cortar despesas - via limitação de benefícios. A equipe econômica também informou que buscará implementar um regime de capitalização - pelo qual cada trabalhador financia a própria aposentadoria por depósitos em uma conta individual. Entretanto, detalhes sobre essa proposta serão apresentados somente no futuro. Com as medidas propostas, o governo quer economizar R$ 1,16 trilhão em dez anos, valor que representa cerca de 1/3 do déficit somente do INSS (sistema público que atende aos trabalhadores do setor privado) previsto para o período, que deve somar R$ 3,1 trilhões no mesmo período. Falta incluir o privilégio dos servidores públicos e militares, não detalhado pelo governo.
         A previsão do Tesouro Nacional é de que, com a aprovação da reforma da previdência, a dívida bruta continue crescendo e atinja 80% do PIB em 2022, mas que comece a recuar no ano seguinte. O nível da dívida bruta é um dos principais indicadores de comparação internacional para medir a capacidade de pagamento de uma nação. É acompanhado atentamente pelas agências de classificação de risco – que conferem notas aos países o que funciona aparentemente como uma recomendação, ou não, para investimentos. Técnicos do Tesouro Nacional observaram recentemente que, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), a dívida bruta de países emergentes, ou seja, no mesmo estágio de desenvolvimento do Brasil, está em cerca de 50% do PIB. Uma tendência crescente da dívida, em um cenário político de ausência de reformas, pode gerar a piora na nota brasileira – com recomendação para que investidores estrangeiros retirem recursos do país.
Bibliografia geral consultada. 
WOOD, Stephen (editor), The Degradation of Work? Skill, Deskilling and the Labor Process. Hutchinson. London: Melbourne, 1982; GIANNOTTI, José Arthur, Trabalho e Reflexão. Ensaios para uma Dialética da Sociabilidade. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984; MAGALHÃES, Dirceu, A Invenção Social da Velhice. Rio de Janeiro: Editora Papagaio, 1989; OLIVEIRA, Jaime A. de Araújo; TEIXEIRA, Sonia M. Fleury, (Im)Previdência Social - 60 anos de História da Previdência no Brasil. 2ª edição. Petrópolis (RJ): Associação de Pós-Graduação em Saúde Pública (ABRASCO), 1989; CARTAXO, Ana Maria Baima, Estratégias de Sobrevivência: A Previdência e o Serviço Social. São Paulo: Cortez Editores, 1995; PAPALEÓ, Neto Matheus, A Velhice e o Envelhecimento em Visão Globalizada. São Paulo: Editora Atheneu, 1997; ARRIGHI, Giovanni, Adam Smith in Beijing: Lineages of the Twenty-first Century. New York/London: Verso Editor, 2007; GRÜN, Anselm, A Sublime Arte de Envelhecer. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2007; HIRANO, Luís Felipe Kojima, Uma Interpretação do Cinema Brasileiro Através de Grande Otelo: Raça, Corpo e Gênero em sua Performance Cinematográfica (1917-1993). Tese de Doutorado em Antropologia Social. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Universidade de São Paulo, 2013; LELOUP, Jean-Yves, Une Danse Immobile. Paris: Éditions Du Relie, 2015; entre outros.                              

terça-feira, 25 de abril de 2017

Hannah Arendt - Cinema, Assimilação & Banalidade do Mal

                                                                                                    Ubiracy de Souza Braga
 
“Nas fotos de sua juventude Arendt transmite uma expressão de inteligência e paixão”. Molina (2016)

 
Hannah Arendt, nascida como Johanna Arendt, Linden-Limmer, atualmente bairro de Hanôver, Alemanha, em 14 de outubro de 1906 e falecida em Nova Iorque, em 4 de dezembro de 1975, foi uma filósofa política alemã de origem judaica, uma das mais influentes do século XX. A privação de direitos e a perseguição na Alemanha de pessoas de origem judaica a partir de 1933, assim como o seu breve encarceramento nesse mesmo ano, obrigou-a decidir emigrar. O regime nacional-socialista retirou a nacionalidade sua nacionalidade em 1937, “o que lhe tornou apátrida até conseguir a nacionalidade estadunidense em 1951”. Trabalhou, entre outras atividades, como jornalista e professora universitária e publicou obras importantes sobre filosofia política. Foi a primeira intelectual contemporânea a entender que o imperialismo não se limitava ao expansionismo dos grandes grupos econômicos, tal como antes entenderam John A. Hobson, Rosa Luxemburgo e Vladimir Lenin, ou simplesmente Lenine, por exemplo. Compreendera o nível de análise através do afeto, iniciando uma sociologia das emoções primordialmente como resultado do amor ao mundo. Estava certa de que os males humanos não deixarão de nos fazer companhia e que a alternativa é o fortalecimento das instituições públicas, o envolvimento dos cidadãos na vida política e o desenvolvimento de virtudes associadas à cidadania. Como a probidade moral e a participação estavam fundadas na constatação de que o privatismo típico do homem moderno, a sua ocupação exclusivamente com seus próprios assuntos privados – com infeliz repercussão ainda em nossos tempos sombrios – apenas reforça o temor de que não haja resistência aos ataques que são desferidos contra o domínio público, seja por movimentos totalitários, seja tout court por interesses privados ou corporativos. Tal pragmatismo promove uma apolitia que se associa à incapacidade de conceber sentido de público que não equivalha à soma total dos interesses privados.


                         
Melhor dizendo, o indivíduo privatista é o mesmo que pensa ser justificada a existência do espaço público apenas na medida em que satisfaz os interesses dos indivíduos privados. O mesmo indivíduo que tolera, admite e recomenda a privatização da vida pública em que seus representantes aparentemente se constituam em modelos de probidade. Na esfera pública da cidadania comparativamente, não obstante, quase sempre confunde princípios políticos com metas econômicas e está disposto a abrir mão da aparente moralidade e pudor quando um representante qualquer demonstra ser um bom administrador. O mesmo que exige probidade moral e pública e desrespeita as regras mínimas da convivenciabilidade em nome da satisfação de interesses privados. A distorção entre o campo social e o político decorre da moderna concepção da sociedade, a qual encara a política como um simples espaço de regulação da esfera privada. O Estado nacional tende a regular a vida doméstica mediante o controle social sobre a família e a administração da vida privada. Trata-se de um processo contraditório, pois originariamente a economia pertencia ao domínio do chefe da família e a política à cidadania na polis. A esfera privada da família, fenômeno pré-político na Grécia Antiga, transformou-se num interesse coletivo controlado pelo monopólio de um Estado soberano, consequentemente a esfera privada e a esfera pública correlacionam-se reciprocamente. A passagem das preocupações da esfera privada da família e da casa para o domínio da política anulou a oposição clássica entre a polis e o oikos. A esfera privada atual teve a sua origem nos últimos períodos do Império Romano. Numa época em que devido à desagregação do Império, os cidadãos procuravam afirmar os seus direitos privados nomeadamente o direito de propriedade no espaço público como resposta aos ataques dos bárbaros. 
Na modernidade, o privado opunha-se à esfera da sociabilidade e da esfera política situando-se no domínio do chamado individualismo possessivo. Do ponto de vista da formação intelectual leu Marx e Trotsky e estabeleceu contatos na Hochschule für Politik. A Escola de Políticas Públicas da Baviera é uma instituição independente de Ciências Políticas da Escola de Governança da Universidade Técnica de Munique (TUM). Analisou a exclusão social dos judeus, na falta de melhor expressão, apesar da assimilação, com base no conceito de “pária”, empregado pela primeira vez por Max Weber para falar dos judeus. A este termo, ela opôs outro – “arrivista” -, inspirada pelos escritos de Bernard Lazare. Em 1932, publicou na revista Geschichte der Juden in Deutschland o artigo “Aufklärung und Judenfrage”, no qual expõe suas ideias sobre a independência do judaísmo, contrapondo-as com as dos iluministas Gotthold Ephraim Lessing e Moses Mendelssohn e o precursor do Romantismo, Johann Gottfried Herder. Também em 1932 escreve uma crítica do livro: Das Frauenproblem in der Gegenwart,  de Alice Rühle-Gerstel, no qual comenta a emancipação da mulher na vida pública, mas também discute suas limitações, sobretudo no casamento e na vida profissional. Constata o “menosprezo fático” que sofre a mulher na sociedade e critica os deveres que não são compatíveis com sua relativa independência. Em troca, Arendt contempla o tema do feminismo, por assim dizer à distância. Por um lado, insiste que as frentes políticas são “frentes de homens” e, por outro, considera “questionáveis os movimentos feministas”, assim como os também chamados movimentos juvenis, ambos com estruturas que transcendem as classes sociais,  tendem a fracassar em seu intento de criar partidos políticos influentes.



Hannah Arendt defendia, portanto, um conceito de pluralismo no âmbito político. Graças ao pluralismo, o potencial de uma liberdade e igualdade política seria gerado entre as pessoas (cf. Arendt, 2009). Importante é a perspectiva da inclusão do Outro. Em acordos políticos, convênios e leis, devem trabalhar em níveis práticos pessoas adequadas e dispostas. Como frutos desses pensamentos, Arendt se situava de forma crítica ante a democracia representativa e preferia um “sistema de conselhos” ou formas de “democracia direta”. Entretanto, ela continua sendo estudada como filósofa, em grande parte devido a suas discussões críticas de filósofos como Sócrates, Platão, Aristóteles, Immanuel Kant, Martin Heidegger e Karl Jaspers, além de representantes importantes da filosofia moderna como Maquiavel e Montesquieu.  Justamente graças ao seu pensamento independente, a Theorie der totalen Herrschaft, seus trabalhos sobre filosofia existencial e sua reivindicação da discussão política livre, Arendt tem um papel central nos debates contemporâneos. Como fontes das investigações a politóloga utiliza, além de documentos filosóficos, políticos e históricos, biografias e obras literárias. Esses textos são interpretados de forma literal e confrontados com o pensamento de Arendt. Seu sistema de análise - parcialmente influenciado por Martin Heidegger (2001) - a converte em “uma pensadora original situada entre diferentes campos de conhecimento e especialidades universitárias”. O seu devenir pessoal e o de seu pensamento etnográfico na política demonstram um importante grau de coincidência.
E se a interpretação da história, como Hegel sustenta, representa o “autodesenvolvimento do Espírito, a realização da ideia divina”, de um plano cósmico, o homem histórico deve ser um em que se encontrem as potencialidades de seu tempo, a sua situação histórica e como  Friedrich Nietzsche é um nome universal e o nazismo é e representa, incondicionalmente a decadência humana, essa forma de totalitarismo muito bem descrita e explicada por Arendt (1963), necessitava de justificações filosóficas: “não trepidaram em falsificar as obras de Nietzsche, ao expurgar muitas passagens importantes que acusavam o povo alemão e ao deturpar outras”. O preconceito se antecipa ao juízo recorrendo ao passado. Sua justificação temporal se limita aos períodos da história - em termos quantitativos a maior parte dela - em que o novo é relativamente raro e o velho não morreu na reprodução vida social e material. Em nossa utilização geral, afirma Arendt, “a palavra juízo tem dois significados que se devem distinguir com clareza, mas que se confundem sempre que falamos”.
Juízo significa, primeiramente, organização e subsunção do individual e particular ao geral e universal, procedendo-se então a uma avaliação ordenada com a aplicação de parâmetros pelos quais se identifica o concreto e de acordo com decisões. Por trás de todos esses juízos há um prejulgamento, um preconceito. Somente o caso individual é julgado, não o próprio parâmetro ou a questão de ele ser ou não uma medida adequada do objeto que está sendo medido. Num dado momento, emitiu-se um juízo sobre o parâmetro, mas esse juízo foi adotado, tornando-se, por assim dizer, um meio para se emitirem futuros juízos. Mas juízo pode significar algo totalmente diferente e sempre significa de fato quando nos confrontamos com algo que nunca vimos e para o que não temos nenhum parâmetro à disposição. Esse juízo que não conhece parâmetro só pode recorrer à evidência do que está sendo julgado, e seu único pré-requisito é a faculdade de julgar, o que tem muito mais a ver com a capacidade de discernir do que com a capacidade de organizar e subordinar. Tais juízos sem parâmetros nos são bastante familiares quando se trata de questões de estética e gosto, que, como observou Kant, não se podem discutir, mas de que se pode, seguramente, discordar e concordar. Na vida cotidiana isso se verifica “em face de uma situação desconhecida, que fulano ou beltrano fez um juízo correto ou equivocado”.
Melhor dizendo, em toda crise histórica, são os preconceitos os primeiros a se esboroar e deixar de ser confiáveis, ipso facto, é essa pretensão de universalidade que distingue muito claramente ideologia de preconceito (sempre parcial por natureza). A ideologia afirma peremptoriamente que não devemos mais nos fiar em preconceitos - declarados como literalmente inapropriados. A falta de padrões no mundo moderno - a impossibilidade de formar novos juízos sobre o que aconteceu e o que acontece todos os dias com base em padrões sólidos, reconhecidos por todos, e de subsumir esses eventos a princípios gerais bem conhecidos, assim como a dificuldade, estreitamente associada, de se proverem princípios de ação para o que deve acontecer agora - tem sido frequentemente descrita como niilismo inerente à nossa época, como desvalorização de valores, uma espécie de crepúsculo dos deuses, uma catástrofe na ordem moral do mundo. Todas essas interpretações pressupõem tacitamente que só se pode esperar que os seres humanos tivessem juízos se tiverem parâmetros, que a faculdade de julgar não é,  mais do que a habilidade de consignar casos individuais aos seus lugares corretos e adequados dentro de princípios gerais aplicáveis e sobre os quais estão todos de acordo. 
O primeiro livro “As Origens do Totalitarismo”, originalmente intitulado L`Impérialisme. Les Origines du Totalitarisme (1951) consolida o prestígio intelectual como uma das figuras mais profícuas do pensamento político ocidental. Arendt assemelha de forma polêmica as categorias sociais distintas nazismo e o socialismo, como ideologias totalitárias, isto é, com uma explicação compreensiva da sociedade, distante da possível formulação ideal-típica, mas também inclusiva da vida individual, e demonstra como a via totalitária depende da “banalização do terror” (“banality of the devil”), da manipulação das massas, do “acriticismo massificado” à mensagem absoluta ideal do poder. Adolf Hitler e Josef Stalin seriam em sua interpretação duas faces da mesma moeda tendo alcançado o poder por terem explorado a solidão organizada das massas. Sete anos depois publica o ensaio A Condição Humana (The Human Condition) enfatiza a importância da política como ação e processo, dirigida à conquista da liberdade. Contudo, sabemos que esses preconceitos, observa Torres (2007) não são novos na vida social, havendo toda uma tradição secularizada de identificação da política com domínio, com violência, cuja origem remonta à desvinculação entre política e liberdade realizada pelos filósofos que primeiro trataram do tema, em clara oposição à experiência da polis grega. Nesse sentido, Arendt ressalta que não havia sequer o interesse pelo problema da liberdade na Antiguidade, tendo o mesmo surgido tardiamente na filosofia, com Epicteto, como uma forma do Eu se relacionar com uma realidade externa que lhe seria adversa, resultando então de um estranhamento do mundo. 
O que está em jogo na relação política, inicialmente quando os nazistas apresentaram como sua principal descoberta, segundo Arendt (2012), tinha como escopo o papel significativo dos judeus na política mundial, e o que propagavam como principal alvo - a perseguição dos judeus do mundo inteiro - foi considerado pela opinião pública mero pretexto, interessante truque demagógico para conquistar as massas. Pois bem: não existe aspecto da história contemporânea mais irritante e mais mistificador do que o fato social dentre tantas questões políticas vitais, ter cabido  ao problema judaico, aparentemente insignificante e sem importância, a duvidosa honra de por em movimento toda uma máquina infernal. Tais discrepâncias entre a causa e o efeito social constituem ultraje ao bom senso a tal ponto que as tentativas de explanar o antissemitismo parecem forjadas com o fito de salvar o equilíbrio mental  dos que mantêm o senso de proporção e a esperança de conservar o juízo. Uma dessas apressadas explicações identifica o antissemitismo com desenfreado nacionalismo e suas explosões de xenofobia. Mas,  na verdade, o antissemitismo moderno crescia enquanto declinava o nacionalismo tradicional, tendo atingido seu clímax no momento em que o sistema europeu de Estados-nações, com seu precário equilíbrio de poder, entrara em colapso. Os nazistas, como sabemos, não eram meros nacionalistas. Sua propaganda distinguia-se das características do partidos políticos nascentes. Ela era dirigida aos simpatizantes e não aos membros convictos do partido. Os primeiros partidos antissemitas das últimas décadas do século XX foram os primeiros a coligar-se em nível internacional. Desde o início, convocavam congressos internacionais, e preocupavam-se com a coordenação de atividades em escala internacional, ou, pelo menos, intereuropeia. Noutras palavras, nem a opressão nem a exploração em si chegam a constituir a causa de ressentimento: mas a riqueza sem função palpável é muito mais intolerável, porque ninguém pode compreender, e em seu ersatz aceitar, porque ela deve ser tolerada.  

                         
A analogia das palavras não deve levar a confusões. Ontem como hoje chamam-se partidos as facções que dividiam as Repúblicas antigas, os clãs que se agrupavam em tono de um condottiere na Itália da Renascença, os clubes onde se reuniam os deputados das assembleias revolucionárias, os comites que preparavam as eleições censitárias das assembleias revolucionárias, bem como as vastas organizações populares que enquadram a opinião pública nas democracias modernas. Essa identidade nominal justifica-se por um lado, segundo Duverger (1980), pois traduz certo parentesco profundo: todas essas instituições não desempenham o mesmo papel, que é o de conquistar o poder político e exercê-lo? Os verdadeiros datam apenas de pouco mais de um século. Mesmo o oportuno e brilhante Manifesto do Partido Comunista, de 1848, de Marx & Engels, ainda é parte de um projeto utopico de base operária para a universalização das relações de poder. Em 1850, nenhum país do mundo conhecia partidos políticos no sentido contemporâneo do termo. Mesmo entre norte-americanos, encontravam-se aenas tendências de opiniões, clubes populares, associações de pensamento, grupos parlamentares, mas nenhum partido político propriamente dito. Em 1950, estes funcionavam na maior parte das nações civilizadas, os outros se esforçavam por imitá-las. O mesmo ocorre para compreender a diferença de estrutura que separa o Partido Trabalhista britânico do Partido Socialista francês, se não forem conhecidas as diferentes circunstâncias históricas de seu nascimento. Enfim, é impossível analisar seriamente o pluripartidarismo francês, ou neerlandês, ou o bipartidarismo norte-americano, sem se reportar às origens dos partidos em cada um desses países, que explica sua proliferação em alguns e sua restrição no outro. Em seu conjunto, o desenvolvimento dos partidos parece associado ao da democracia, isto é, à extensão do sufrágio popular e das prerrogativas parlamentares. O nascimento dos partidos encontra-se, portanto, ligado ao dos grupos parlamentares e comitês eleitorais.   
Economicamente quando A. Hitler subiu ao poder, os bancos alemães, onde por mais de cem anos os judeus ocupavam posições-chave, já estavam quase judenrein - desjudaizados - e, os judeus na Alemanha, após longo e contínuo crescimento em posição social e em número, declinavam tão rapidamente que os estatísticos prediziam o seu desaparecimento em poucas décadas. É verdade que as estatísticas não indicam necessariamente processos históricos reais: mas é digno de nota que, para um estatístico, a perseguição e o extermínio dos judeus pelo nazistas pudessem parecer uma insensata aceleração de um processo que provavelmente ocorreria de qualquer modo, em termos da extinção do judaísmo alemão. O mesmo é verdadeiro em quase todos os países da Europa ocidental. O Caso Dreyfus não ocorreu no Segundo Império, quando os judeus da França estavam no auge de sua prosperidade e influência, mas na Terceira República, quando eles já quase desaparecido das posições importantes (embora não do cenário político). O antissemitismo  austríaco tornou-se violento não sob o reinado de Metternich e Francisco José, mas na República Austríaca após 1918, quando era perfeitamente óbvio que quase nenhum outro grupo havia sofrido tanta perda da influência e prestígio em consequência do desmembramento da monarquia dos Habsburgos quanto aos judeus. A perseguição de grupos impotentes, ou em processos de perder o poder, pode não constituir um espetáculo agradável, mas decorre da mesquinhez  humana. O que faz com que os homens obedeçam ou tolerem o poder e, por outro lado, odeiem aqueles que dispõem da riqueza sem o poder é a ideia de que o poder tem uma determinada função e certa utilidade geral. Até mesmo a exploração e a opressão podem levar  a sociedade ao trabalho e ao estabelecimento de ordem, Só a riqueza sem o poder ou o distanciamento altivo do grupo que, embora poderoso, não exerce atividade política são considerados parasitas e revoltantes, porque nessas condições desaparecem os últimos laços que mantêm ligações entre os homens.  A riqueza que não explora deixa de gerar até mesmo a relação existente entre o explorador e o explorado; o alheamento sem política indica a falta do menor interesse do opressor pelo oprimido. 
A diferença fundamental entre as ditaduras modernas e as tiranias do passado está no uso do terror não como meio de extermínio e amedrontamento dos oponentes, mas como instrumento corriqueiro para governar as massas perfeitamente obedientes. O terror, como o conhecemos hoje, ataca sem provocação preliminar, e suas vítimas são inocentes até mesmo do ponto de vista do perseguidor. Esse foi o caso da Alemanha nazista, quando a campanha de terror foi dirigida contra os judeus, isto é, contra pessoas cujas características comuns eram aleatórias e independentes da conduta individual específica. Na Rússia soviética a situação é mais confusa, já que o sistema bochevista, ao contrário do nazista, nunca admitiu em teoria o uso de terror contra pessoas inocentes: tal afirmação, embora possa parecer hipócrita em vista de certas práticas, faz muita diferença. Por outro lado, a prática russa é mais avançada” do que a nazista em um particular: a arbitrariedade do terror segundo a procedência socioeconômica (de classe) do indivíduo foi abandonada há tempos, de sorte qualquer pessoa na Rússia pode subitamente tornar-se vítima do terror policial. O terror, contudo, assume a simples forma do governo só no último estágio de seu desenvolvimento. O que interessa ao historiador é que os judeus, antes de se tornarem as principais vítimas do terror moderno, constituíam o centro de interesse da ideologia nazista. Ora, uma ideologia que tem de persuadir e mobilizar as massas não pode escolher sua vítima arbitrariamente. Em outras palavras, se o número de pessoas  que acreditam na veracidade de uma fraude tão evidente como os “Protocólos dos Sábios do Sião é bastante elevado para dar a essa fraude o foro de dogma de todo um movimento político, a tarefa do historiador já não consiste em descobrir a fraude, pois o fato de tantos acreditarem nela é mais importante do que a circunstância (historicamente secundária) de se tratar de uma fraude.  Enfim, a explicação tipo bode expiatório escamoteia, portanto, a seriedade do antissemitismo e da importância das razões pelas quais os judeus foram atirados ao centro dos acontecimentos. Igualmente disseminada para Arendt, é a doutrina do eterno antissemitismo, na qual o ódio aos judeus é apresentado como reação normal e natural, e que se manifesta com maior ou menor virulência segundo o desenrolar da história. 
O aparecimento e o crescimento do antissemitismo moderno foram concomitantes e interligados à assimilação judaica, e ao processo de secularização e fenecimento dos antigos valores religiosos e espirituais do judaísmo. Vastas parcelas do povo judeu foram, ao mesmo tempo, ameaçadas externamente de extinção física e, internamente, de dissolução. Nessas condições, os judeus ques e preocupavam com a sobrevivência do seu povo descobriram, num curioso e desesperado erro de interpretação, a ideia consoladora de que o antissemitismo “eterno” estaria a eterna garantia da existência judaica. Essa atitude decerto superticiosa, relacionada com a fé em sua eleição” por Deus e com a esperança messiânica, era fortalecida pelo real fato de ter sido a hostilidade cristã, para os judeus, autêntico fator que, durante muitos séculos, desempenhava o papel do poderoso agente preservador, espiritual e político. Os judeus confundem o moderno antissemitismo com o antigo ódio religioso antijudaico. Esse erro é compreensível na sua assimilação, processada à margem do cristianismo, os judeus desconheciam-lhes o aspecto religioso e cultural. Enfrentando o cristianismo em declínio, os judeus podiam imaginar, em toda a inocência, que o antissemitismo correspondia a uma espécie de retrocesso, à medieval e anacrônica Idade das Trevas A ignorância simbólica, ou ideológica, no sentido marxista, ou a incompreensão histórica do seu próprio passado foi, em parte, responsável pela fatal subestimação dos perigos reais e sem precedentes que estavam por vir. Mas é preciso lembrar também que a inabilidade de análise política resultava da própria natureza da história judaica, história de um povo sem governo, sem país e sem idioma. A história judaica oferece extraordinário espetáculo de um povo, único nesse particular, que começou a existência histórica a partir de um conceito bem definido da história e com a resolução quase consciente de realizar na terra um plano bem delimitado, e que depois, sem desistir dessa ideia, evitou qualquer ação política durante 2 mil anos. 
Em consequência, a história política do povo judeu tornou-se mais dependente de fatores imprevisíveis e acidentais do que a história de outras nações, de sorte que os judeus assumiam diversos papéis na sua atuação histórica, tropeçando em todos e não aceitando responsabilidade precípua por nenhum deles. A história judaica oferece extraordinário espetáculo de um povo, único nesse particular, que começou sua existência histórica a partir de um conceito bem definido da história e coma a resolução quase consciente de realizar na terra, segundo Arendt, um plano bem delimitado, e que depois, sem desistir dessa ideia, evitou qualquer ação política durante 2 mil anos. Em consequência, a história política do povo tornou-se mais independente de fatores imprevistos e acidentais do que a história de outras nações , de sorte que os judeus assumiam diversos papéis na sua atuação histórica, tropeçando em todos e não aceitando a responsabilidade precípua por nenhum deles. Isto é, após a catástrofe final, após a aniquilação quase completa dos judeus na Europa, a tese do antissemitismo eterno tornou-se mais perigosa do que nunca, pois ela poderia levar até à absolvição os mais tenebrosos criminosos entre os antissemitas. Longe de garantir a sobrevivência do povo judeu, o antissemitismo ameaçou-o claramente de extermínio. Contudo, essa explicação do antissemitismo, tal como a teoria do bode expiatório - e por motivos semelhantes -, sobreviveu ao confronto com a realidade, pois ela acentua a absoluta inocência das vítimas do teror moderno, o que aparentemente é confirmado pelos fatos históricos e sociológicos, tanto quando na pesquisa cinematográfica constituída pala Sétima Arte

Os filmes O Diário de Anne Frank (The Diary of Anne Frank, 1959), reconstitui a história social de uma garota de 13 anos durante a 2ª guerra mundial foi uma das provas mais concretas do temor pelo qual passaram os judeus naquela conjuntura geopolítica de terror. Anne Frank e sua família se esconderam durante dois anos pelo temor de serem levados a um campo de concentração. Sua última frase foi escrita em 1º de agosto de 1944. Três dias depois, os alemães prenderam toda a família. Anne morreu de tifo em março de 1945, num campo de extermínio humano. A Lista de Schindler é daqueles projetos mais pessoais do cineasta judeu-americano Steven Spielberg. O filme narra a história real de Oskar Schindler, um industrial alemão que negociava com os nazistas a utilização de trabalhadores judeus em sua fábrica, poupando-os de serem levados para os campos de concentração. A representação das imagens em preto e branco imprime ao filme o terror do qual aqueles judeus foram poupados e a tensão social e política pela qual passou Oskar Schindler. É um filme clássico sobre o Holocausto, ganhou sete estatuetas do Óscar em 1994, entre elas a do binômio produção/consumo de Melhor filme e Diretor destacando o papel de interpretação e de dramaticidade da obra calcada na memória social. O Menino do Pijama Listrado (2008) é sobre relação de amizade entre dois meninos de oito anos que vivem separados por uma cerca eletrificada. Bruno é filho de um oficial nazista e Shmuel é o garoto com o pijama listrado, expressando a representação do estigma de assimilação, preso em um campo de concentração. Ingênuo, Bruno supõe que aquela gente que vive do outro lado da cerca é camponesa, mas não entende o motivo político de tanta infelicidade, muito menos a representação da roupa listrada que seu amigo veste. As conversas com Schmuel demonstram a ele o que realmente acontece dos que estão encerrados do lado de lá do arame farpado e põe fim à sua ilusão humana da existência. 

Metodologicamente quando temos em mente realmente o outro como individualidade, como ocorre na conversação terapêutica ou no interrogatório de um acusado, realmente não se pode falar de uma situação de possível acordo. Tudo isso, que caracteriza a situação do pôr-se de acordo na conversação toma sua versão propriamente hermenêutica, onde se trata de compreender a forma e o conteúdo de textos. Caso contrário, nos encontramos diante de um tribunal. O instrumental conceitual sustentado nos conceitos de “jogos de linguagem”, “significação”, “seguir regras”, “dar ordens”, “forma de vida” e tantos outros, sugerem possíveis aplicações no contexto da linguagem relativa à descrição das atividades sociais ou culturais, constituindo-se primícias em relacionar a filosofia de Ludwig Wittgenstein com as ciências sociais, desde Peter Winch, Hanna Fenichel-Pitkin, Anthony Giddens, Derek Phillipe, ou Hannah Arendt, para ficarmos nesses exemplos. Não estamos longe de admitir que o conceitos significando “seguir regras”, ou, “dar ordens” é uma expressão verbal indicativa de uma realização onde há uma diferença entre crer que se está seguindo uma regra e estar de fato seguindo-a. Este conceito foi magistralmente utilizado por Hannah Arendt em sua etnografia “Eichmann em Jerusalem. Um relato sobre a banalidade do mal” (São Paulo: Companhia das Letras, 1999, edição original: Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil, (1963), posto que, o segredo, que envolve o preconceito, estudado magistralmente por Georg Simmel, tinha uma finalidade evidentemente prática. Segundo Arendt, aqueles que eram informados explicitamente da ordem do Füher Adolf Hitler não eram mais “portadores de ordens”, mas progrediam ao grau de “portadores de segredos” e tinham de fazer um juramento especial. Além disso, toda correspondência referente ao assunto, o extermínio físico em massa de judeus ficava sujeita a rígidas “regras de linguagem”, e, exceto nos relatórios dos Einsatzgruppen, é raro encontrar documentos em que ocorram palavras ousadas e discriminatórias como “extermínio”, “eliminação”, ou “assassinato”. Os codinomes prescritos para o assassinato eram “solução final”, “evacuação” (“Aussiedlung”), e “tratamento especial” (“Sonderbehandlung”); a deportação, ficando óbvio a menos que envolvesse judeus enviados para Theresienstadt, o “gueto dos velhos” para judeus privilegiados, caso em que se usava “mudança de residência”, habilmente forjada na medida em que recebia nomes de “reassentamento” (“Umsiedlung”) e “trabalho no Leste” (“Arbeitseinsatz im Osten”), sendo que “o uso destes últimos nomes prendia-se ao fato de os judeus serem realmente muitas vezes reassentados temporariamente em guetos, onde certa porcentagem deles era temporariamente usada para trabalhos forçados” (cf. Arendt, 1999:100).
O instrumental sustentado nos conceitos de “jogos de linguagem”, “regras”, “significação”, “seguir regras”, “dar ordens”, “forma de vida” e tantos outros, sugerem possíveis aplicações no contexto da linguagem relativa à descrição das atividades sociais ou culturais constituindo-se primícias em relacionar a filosofia de Wittgenstein com as ciências sociais desde Peter Winch, Hanna Fenichel-Pitkin, Anthony Giddens, Derek Phillipe, para ficarmos nesses exemplos. Não estamos longe de admitir que o conceito “seguir regras” (ou, “dar ordens”) que é uma expressão verbal indicativa de uma realização onde há uma diferença entre crer que se está seguindo uma regra e estar de fato seguindo-a. Foi magistralmente utilizado por Arendt em seu destacado ensaio Eichmann em Jerusalem. Um Relato sobre a Banalidade do Mal (Editora Companhia das Letras, 1999, edição original: “Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil”, 1963), posto que, o segredo, estudado por Georg Simmel, tinha uma finalidade prática. Conforme a etnografia de Arendt, aqueles que eram informados explicitamente da ordem do Füher não eram mais “portadores de ordens”, mas progrediam ao grau missiona´rio de “portadores de segredos” e tinham de fazer um juramento especial. Além disso, toda correspondência referente ao assunto, notadamente um conjunto de práticas sociais sobre o extermínio físico de judeus ficava sujeita a rígidas “regras de linguagem”, e, exceto nos relatórios dos Einsatzgruppen, é raro encontrar documentos em que ocorram palavras marcadas e ousadas como “extermínio”, “eliminação”, ou “assassinato”. Os codinomes prescritos para assassinato eram “solução final” (“Endlösung”), “evacuação” (“Aussiedlung”), e “tratamento especial” (“Sonderbehandlung”). A deportação - a menos que envolvesse judeus enviados para Theresienstadt, o “gueto dos velhos” para judeus privilegiados, caso em que se usava “mudança de residência” - recebia os nomes de “reassentamento” (“Umsiedlung”) e “trabalho no Leste” (“Arbeitseinsatz im Osten”), sendo que o uso destes últimos nomes prendia-se ao fato de os judeus serem muitas vezes reassentados temporariamente em guetos, e porcentagem deles era temporariamente usada para trabalhos forçados.
É neste sentido que, no ano de 1963, Hannah Arendt escreveria “Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil”, a partir da cobertura jornalística que faria do julgamento do exterminador dos judeus e arquiteto da “Solução Final” para a The New Yorker. Nesta etnografia impressionante revela-se que o grande exterminador dos judeus não era um demônio e um poço de maldade, segundo Hannah Arendt, como o criam os ativistas judeus, mas alguém “terrível e horrivelmente normal”, como um “típico burocrata que se limitara a cumprir ordens, com zelo, sem capacidade de separar o bem do mal, ou de ter mesmo contrição” (cf. Boeno, 2010). Esta perspectiva valer-lhe-ia a crítica ideológica virulenta das organizações judaicas que a considerariam falsa e abjurariam a insinuação da cumplicidade dos próprios judeus na prática dos crimes de extermínio. Arendt apontara, apenas, para a complexidade da natureza humana, para certa “Report on the Banality of Evil” que surge quando se compadece com o sofrimento, a tortura e a própria prática do mal conclui: “é fundamental manter uma permanente vigilância para garantir a defesa e preservação da liberdade”. 
   As origens do fascismo alemão remontam a 1919, quando um grupelho de sete homens se reuniu numa cervejaria de Munique e fundou o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores alemães. O nome do partido é sugestivo e não tardou a ser abreviado na fala popular para “nazi”. Em pouco tempo, o mais obscuro dos sete surgia como chefe. Chamava-se ele Adolf Hitler e tinha nascido em 1889, sendo filho de um pequeno funcionário aduaneiro da Áustria (cf. Nicholls, 2000). O começo de sua vida foi infeliz e desajustado. Rebelde e indisciplinado desde a infância parece ter sido sempre oprimido por um sentimento solitário de frustração. Na escola, perdia tempo desenhando retratos e por fim resolveu ser pintor. Com esse objetivo em vista dirigiu-se em 1909 para Viena, esperando ingressar na Academia. Reprovado no exame durante quatro anos arrastou sua existência obscura como vendedor ocasional e pintor de pequenos esboços e aquarelas que mal conseguia vender a lojas de arte. Enquanto “isso ia alimentando alguns preconceitos políticos de índole violenta” (cf. Burns, 1967: 883).
 A ideologia fascista pode ancorar-se em três características humanas: o medo, o fanatismo e a intolerância. É um fenômeno político e discursivo (propaganda) deste século e cuja formulação definitiva talvez não possa se dar como concluída. Ela tem-se estabelecido pela fórmula autoritária: “Crer e não pensar”; “trabalhar e não refletir”; “obedecer e não discutir”. Surgiu em torno de 1890 na Europa ocidental como “eclipse da razão”. Temos aí o conceito de “autoridade irracional”, que poderia ser caracterizado como o poder sobre o povo, logrado sobre a base do terror, onde a crítica está proibida, e onde existe uma absoluta desigualdade entre os membros da comunidade. No inicio da 2ª guerra mundial (1940-1945) a Alemanha encontrava-se em conflito político-ideológico com os judeus radicados na Alemanha. No filme: “O menino de pijama listrado” uma família alemã que morava em Berlim teve que se mudar para uma casa perto do “campo de concentração” (“Arbeitseinsatz im Osten”), onde o Ralf pai de Bruno trabalhava desenvolvendo atividades secretas como militar de caserna. Seu filho Bruno fez amizade com um judeu chamado Shmel (Samuel) onde aprendeu o significado e sentido cultural da amizade. Bruno apesar de ter prejudicado Samuel ele o perdoou. Sem preconceito social, Bruno prometeu a Samuel que o ajudaria na procura seu pai, sumido, aparentemente depois de ter ido fazer um trabalho e não havia voltado. Em verdade havia sido confinado num “campo de concentração” nazista.
No filme em questão, no dia em que Bruno iria se mudar para morar com sua tia resolveu fugir para ajudar Samuel a procurar seu pai, vestindo-se como as outras crianças, cavou um buraco passando para dentro do campo de concentração. Lá dentro junto com Samuel foi à sua cabana a procura do pai, porém antes que conseguissem sair do campo de concentração foi levado junto com os judeus para a câmera de gás. Quando sua família sentiu sua ausência, fora a sua procura e encontrara suas roupas jogadas em frente ao campo de concentração, quando seu pai entrou em busca de Bruno. Viram que havia uma cabana vazia e lembrou-se que aquele seria o dia em que os judeus seriam colocados na câmera de gás. Logo descobriram que seu filho estava junto com os judeus com seus pijamas jogados ao chão e havia sido morto envenenado pelo gás letal. Quando o terror e a inocência dão as mãos, salta aos olhos a narrativa do filme: The Boy in the Striped Pyjamas (2008) que usa e abusa da inocência infantil para chocar o público, que absorve os absurdos do nazismo, equidistantes da interpretação de Albert Camus como analisaram noutro lugar. Dirigido por Mark Herman, o filme é surpreendente e baseado no livro homônimo de John Boyne, onde o terror e a inocência dão-se as mãos e compõem uma ciranda cujo efeito social específico para o espectador representa um misto de encanto e nojo. Isso fica explícito logo nos primeiros minutos de exibição quando as crianças, absortas em suas brincadeiras, correm pelas ruas. Estrategicamente espalhados pelo cineasta nas cenas estão elementos como soldados, cães, bandeiras com suásticas. Já nos primeiros minutos nos deparamos com a contextualização do período histórico e político-ideológico. A inocência é reforçada pela sonoplastia que evoca relaxamento. O que virá, no entanto, é o significado do terror; implícito, e ipso facto intenso representando a expressão da dor física e mental.



No filme The Boy in the Striped Pyjamas (2008) o menino aparentava ter medo e ao mesmo tempo admiração pelo pai, por ser autoritário na vida familiar e político-militar. A corrupção da consciência, fenomenologicamente falando, no sentido que emprega Merleau-Ponty (2006: 53 e ss.) funciona como a “essência da consciência para o mal”, ou, “essência da percepção para o mal”, posto que: a consciência só começa a serem determinando um objeto, e mesmo os fantasmas de uma “experiência interna” só é possível por empréstimo à experiência externa. Portanto, não há vida privada da consciência. A consciência só tem como obstáculo o caos, que não é nada. Mas em uma consciência que constitui tudo, ou, antes, que possui eternamente a estrutura inteligível de todos os seus objetos, assim como na consciência empirista que não constitui nada, a atenção permanece um poder abstrato, ineficaz, porque ali ela não tem nada para fazer. Contudo, a amizade pura, livre e desinteressada dos meninos Bruno e Shmuel mostrou o mundo onde os preconceitos de diversidades, sejam eles de qualquer categoria, credo, classe social, esmagam a esperança e a vontade de se conviver em paz. Historicamente os campos de concentração conjugado com o processo de trabalho forçado não foram uma exclusividade um mal dos nazistas e, tampouco, foram inventados por eles. Basta citar um único exemplo de modelo precedente dos gulags da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), que existiram desde a hegemonia histórica dos czares, quando eram chamados de katorgas. Os nazistas destacaram-se em virtude do processo de “mecanização da morte”, isto é, da aplicação de um método perverso praticamente com planejamento industrial de morte por gás venenoso.

Além disso, os corpos dos mortos nas câmaras de gás eram incinerados em fornos construídos com essa finalidade. Quando a 2a guerra mundial estava chegando ao fim, e os nazistas progressivamente perdiam terreno, os cadáveres dos campos de concentração começaram a ser despejados em valas comuns e incinerados nas covas. Geograficamente a maior parte dos judeus mortos no holocausto era do Leste Europeu. Sabemos também que os principais campos de concentração e extermínio nazista não se encontravam em território alemão, mas, sim, no Leste europeu, sobretudo na Polônia. Em terreno alemão, os campos construídos tinham tamanho pequeno (se comparados com os poloneses), sendo a maior parte destinada a trabalhos forçados para opositores políticos, homossexuais, criminosos, e não propriamente para extermínio.  O primeiro campo a ser construído foi o de Dachau, em 1933 no ano em que Adolf Hitler assumiu o poder; outros foram erguidos nas cidades de Breitenau e Flossenbürg. A partir de 1941, quando houve o ataque à Rússia com a Operação Barbarossa (Unternehmen Barbarossa), representando o nome de código para a invasão da União Soviética pelas Potências do Eixo, iniciada em 22 de junho de 1941, durante a guerra mundial finda em 1945. Foi projetado para alcançar os objetivos político-ideológicos da Alemanha nazista de conquistar a União Soviética ocidental para que ela pudesse ser repovoada pelos alemães, de usar os povos eslavos como força de trabalho escravo para o chamado esforço de guerra do Eixo e de aproveitar as reservas de petróleo do Cáucaso e os recursos agrícolas dos territórios soviéticos, os nazistas ocuparam vastas regiões, incluindo praticamente todo o território polonês e partes dos Países Baixos, Ucrânia, Croácia, Bielorrússia e outros países.

Nesses locais estava concentrada a maior parte da população judaica da Europa. Ao contrário do que normalmente se imagina, a população judaica alemã representava cerca de menos de 1% da população da Alemanha quando Hitler assumiu o poder. A maior parte dos judeus mortos no holocausto foi capturada nos países do Leste. A consciência não está menos intimamente ligada aos objetos em relação aos quais ela se distrai do que aqueles aos quais ela se volta. O filme foi baseado no best-seller homônimo de John Boyne. Diferente do seu processo de criação normal, Boyne declarou que escreveu a primeira versão do livro em apenas dois dias e meio. O campo de concentração no qual o pai de Bruno trabalha não é nomeado, mas os especialistas dizem ser possível reconhecê-lo como o campo de Auschwitz pela presença de quatro crematórios na composição do cenário.  - “Auschwitz I, o principal campo do complexo de Auschwitz, representou a primeira das unidades a serem estabelecidas, nas proximidades da cidade polonesa de Oswiecim. Sua construção teve início em maio de 1940, em um quartel de artilharia usado anteriormente pelo exército polones na região de Zasole, subúrbio de Oswiecim. O campo foi se expandindo continuamente por meio de trabalho escravo. A câmara improvisada estava localizada no porão da prisão (Bloco 11). Mais tarde, uma câmara de gás fixa foi construída dentro do crematório”. A propaganda nazista do campo de concentração que aparece no filme foi baseada em um vídeo originalmente editado em 1941, produzido pelos ideólogos nazistas. Sociologicamente representou uma rede de campos de concentração localizados no sul da Polônia operados pelo Terceiro Reich e colaboracionistas nas áreas polonesas anexadas politicamente pela Alemanha Nazista, tendo se constituído o maior símbolo do Holocausto perpetrado pelo nazismo durante a Segunda Guerra Mundial. A partir de 1940, o governo de Adolf Hitler construiu vários campos de concentração e um campo de extermínio nesta área. A razão direta para sua construção foi o fato de que as prisões em massa de judeus, especialmente poloneses, por toda a Europa que ia sendo conquistada pelas tropas nazistas, excediam em grande número a capacidade das prisões convencionais até então existentes. Ele foi o maior dos campos de concentração nazistas, consistindo de Auschwitz I (Stammlager, campo principal e centro administrativo do complexo); Auschwitz II–Birkenau (campo de extermínio), Auschwitz III–Monowitz, e mais 45 outros campos desgraçadamente como satélites. 

Bibliografia geral consultada. 

BURNS, Edward McNall, História da Civilização Ocidental. 2ª edição. Porto Alegre: Editor Globo, 1967; LACLAU, Ernesto, Política e Ideología en la Teoría Marxista: Capitalismo, Fascismo, Populismo. México: Siglo Veintiuno Editores, 1978; Idem, La Razón Populista. Buenos Aires: Editor Fondo de Cultura Económica, 2005; ARENDT, Hannah, Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil. New York: Viking Press, 1963; Idem, La Crise de la Culture: Huit Exercices de Pensée Politique. Paris: Éditions Gallimard, 1972; Idem, L` Impérialisme. Les Origines du Totalitarisme. Paris: Éditions du Seuil, 1980; Idem, Homens em Tempos Sombrios. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 1987; Idem, Vita activa. La Condizione Umana. Milan: Edizione Bompiani, 1989; Idem, Essays in Understanding: 1930-1954. New York: Schocken Books Editors, 2005; Idem, Journal de Pensee (1950-1973). Paris: Éditions Du Seuil, 2005; Idem, Origens do Totalitarismo. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2012; TORRES, Ana Paula Repolês, “O Sentido da Política em Hannah Arendt”. In: Trans/Form/Ação vol. 30 nº 2. Marília, 2007; BOYNE, John, O Menino do Pijama Listrado. 1ª edição. São Paulo: Editora Seguinte, 2007; BOENO, Maico Russiano de Souza, O Bur(r)ocrata, uma Análise Existencialista do Pensamento de Hannah Arendt no Caso Eichmann até a Formação do Tribunal penal Internacional. São Paulo: Editor Publit, 2010; MOREIRA, Elzanira Rosa Mello, A Banalidade do Mal e a Faculdade de Pensar: Política e Ética nas Reflexões de Hannah Arendt. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Belém: Universidade Federal do Pará, 2017; LAZIER, Tiago Cerqueira, Hannah Arendt: Entre a Contingência e o Absoluto. Tese de Doutorado. Departamento de Ciência Política. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017; MIZAEL, Táhcita Medrado, Redução do Preconceito Racial: Uma Investigação Analítico-Comportamental. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Psicologia. Centro de Educação e Ciências Humanas. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2019; ROCHA, Lara França da, Pensar em Tempos Sombrios: As Implicações Políticas do Pensamento na Perspectiva de Hannah Arendt. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2019; entre outros.