terça-feira, 2 de junho de 2015

Práticas de Espaço, Clandestinidade & Trabalho dos Flanelinhas.

Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza Braga

Uma ausência de significado abre uma lacuna no tempo”. Michel de Certeau

O ponto de partida para a constituição do sujeito é o desejo, mas não um desejo dirigido a uma coisa qualquer no mundo. O homem se torna humano quando “deseja outro desejo”. Abre-se assim, ao homem, um novo espaço de liberdade, que se manifesta antes de tudo como um desejo de reconhecimento e produz uma luta de morte por puro prestígio – o ato fundante da história, o ato antropogênico por excelência. Mas para que haja história, é preciso que haja relação social entre homens vivos. A luta não pode terminar com a aniquilação de um dos lados. Um deles, provavelmente, deve abdicar do combate, colocar a liberdade acima de sua vida, fora da relação entre “senhor-escravo”. Nela se concentrando outra atividade essencial ao projeto do homem: o trabalho intelectual como princípio de liberdade. A dialeticidade que assim se estabelece é um dos pontos culminantes do pensamento humano em todas as épocas, e sua conclusão é surpreendente e magistral: o homem integral, livre, satisfeito com o que é; o homem que se aperfeiçoa, não é o senhor nem o escravo, mas o que consegue suprimir sua sujeição.

Na linguagem teórica, academicamente entendemos que as palavras e expressões funcionam como representação de conceitos teóricos, mas em sua periodização histórica as palavras e expressões funcionam sempre de forma distinta, porque se referem a concepção pontual de uma teoria da história. A dificuldade própria da terminologia teórica consiste, pois, neste sentido em que, por detrás do significado usual da palavra, é preciso sempre discernir o seu significado conceptual, que é sempre diferente do significado usual empírico e casual contido na representação das fontes, nas atas, nos documentos oficiais etc. Na sua significação mais geral deve nos permitir a compreensão histórica e sociológica que tem por efeito social o conhecimento de um objeto: a narrativa da história. É assim que a história abstrata ou a história em geral não existem, no sentido exato do termo, mas apenas a história real, ou “como efetivamente ocorreu, desses objetos que enformam a experiência acumulada da humanidade.

A determinação mais simples e primeira que o espírito pode estabelecer é o Eu, a faculdade de poder abstrair todas as coisas, até sua própria vida. Chama-se idealidade, idealização, precisamente esta supressão da exterioridade. Entretanto, o espírito não se detém na apropriação, transformação e dissolução da matéria em sua universalidade, mas, enquanto consciência religiosa, por sua faculdade representativa, penetra e se eleva através da aparência dos seres até esse poder divino, uno, infinito, que conjunta e anima interiormente todas as coisas, enquanto pensamento filosófico, isto é, como seu princípio universal, a ideia eterna que as engendra e nelas se manifesta. Portanto, que o espírito finito dialeticamente segue um passo a passo e se encontra inicialmente numa união imediata com a natureza, a seguir em oposição com esta e finalmente em identidade com esta, porque suprimiu/subsumiu a oposição e voltou a si mesmo e, per se, o espírito finito é a ideia, que girou sobre si mesma e que existe por si em sua realidade.

Todo conhecer, todo aprender, toda visão, toda ciência, inclusive toda atividade prática, não possui nenhum outro interesse além do aquilo que “é em si”, no interior, manifestar-se desde si mesmo, produzir-se, transformar-se objetivamente. Nesta diferença se descobre toda a diferença na história do mundo. Os homens são todos racionais. O formal desta racionalidade é que o homem seja livre. Esta é a sua natureza. Isto pertence à essência do homem. O europeu sabe de si, é objeto de si mesmo. A determinação que ele conhece é a liberdade. Ele se conhece a si mesmo como livre. O homem considera a liberdade como sua substância. Se os homens “falam mal de conhecer é porque não sabem o que fazem”. Conhecer-se, converter-se a si mesmo no objeto (do conhecer próprio) e o fazem relativamente poucos. Mas o homem é livre somente se sabe que o é. Pode-se também em geral falar mal do saber, como se quiser. Mas somente este saber libera o homem. O conhecer-se é no espírito a existência. Esta é a única diferença da existência (Existenz), a diferença do separável. O Eu é livre em si, mas também por si mesmo é livre e eu sou livre somente enquanto existo como livre.

A palavra flanelinha já foi incorporada no cotidiano das pessoas, principalmente nos centros metropolitanos. Segundo o quase sempre citado dicionário Aurélio, “flanelinha” é a expressão usada para designar o “guardador informal”. O mesmo léxico, define a palavra guardador da seguinte forma: “Indivíduo que vigia para os respectivos donos os automóveis estacionados nas ruas, recebendo, em troca, gorjetas do público ou remuneração do Departamento de Trânsito”.  Dessa forma, dicionarizado pelo Aurélio, “o flanelinha é aquele que exerce a atividade de guardador em desacordo com as formalidades legais”. E, claro, no dicionário de língua portuguesa do lexicógrafo brasileiro Antônio Houaiss que também já incorporou o vocábulo dentre seus conceitos literários, como “guardador de automóveis clandestino das ruas das grandes cidades”.

Flanelinha é o apelido dado “a um indivíduo geralmente não regulamentado”. É uma figura de linguagem que consiste no emprego de um termo por outro. Sem norma que se utiliza da apropriação do outro para conseguir remuneração pelos serviços prestados no estacionamento. Na limpeza ou na proteção da mercadoria automóvel estacionado irregularmente em local público. O nome “flanelinha” vem do uso de uma flanela para limpar os vidros dos automóveis. A profissão é aceita legalmente apenas nas cidades de Belo Horizonte, São Luís e Brasília, “onde o trabalho somente será remunerado mediante consentimento do motorista”. Atuar como “flanelinha”, de acordo com a lei brasileira, pode constituir uma “contravenção” - exercício ilegal de profissão, dificilmente por ser regulamentada. – “Atuação de flanelinhas não é fiscalizada pelo poder público” (cf.  Jornal O Povo, 11.08.2014).

No Brasil, a lei que a Constituição Federal de 1988 determinou que fosse criada para regulamentar determinada matéria denomina-se “complementar”, e exige quórum qualificado, em oposição à lei ordinária, que de tal prescinde. Sabemos que nem todas as leis complementares no Brasil, como se pensa talvez erroneamente, destinam-se a complementar diretamente o texto constitucional. Pois o constituinte, originário ou reformador, reserva a leis complementares matérias de especial importância ou matérias polêmicas, para cuja disciplina seja desejável e recomendável a obtenção de um maior consenso entre os parlamentares. Segundo o STF - Supremo Tribunal Federal, quando uma lei ordinária for aprovada com quórum suficiente de lei complementar, não haverá inconstitucionalidade. Neste caso esta lei ordinária regula matéria própria de lei complementar. Em sendo assim, entende-se politicamente o quórum qualificado de maioria absoluta, dado este que supre a constitucionalidade da matéria em pauta.



                Se o espaço “é um lugar praticado”, para concordarmos com Michel de Certeau, que desenvolve de forma conspícua a percepção fenomenológica do cotidiano, através do que ele denominou “invenção do cotidiano”, livro que já alcançou em 2013 a 20ª edição pelas Editoras Vozes, a rua geometricamente definida por um urbanismo “é transformada em espaço pelos pedestres”. Analogamente, a leitura é o espaço produzido pela prática do lugar constituído por um sistema de signos – um manuscrito. Merleau-Ponty já distinguia de um espaço geométrico outra espacialidade que denominava “espaço antropológico”, que visava separar da univocidade geométrica a experiência de um “fora” dado sob a forma de espaço e para o qual dialeticamente o “espaço é existencial” e “a existência é espacial”. Essa experiência dialética é relação com o mundo, no sonho e na percepção, de Freud aos nossos dias, e por assim dizer anterior à sua diferenciação. Ela exprime o nosso ser situado por um desejo, indissociável da existência e plantado no espaço de uma paisagem em experiências espaciais distintas.      
                O diminutivo “flanelinha” é usado no Brasil em referência àqueles sujeitos, na falta de melhor expressão, que se oferecem para ajudar os motoristas a estacionar seus carros. Propõem-se a cuidar dos veículos até a volta dos proprietários, em troca de uma determinada quantia de dinheiro. Esse dinheiro pode ser conseguido mediante consentimento do motorista ou por coerção. Os relatos efetuam, portanto um trabalho que, seguindo a etnografia de Michel de Certeau, incessantemente, transforma lugares em espaços ou espaços em lugares. Organizam também os jogos das relações mutáveis que uns mantêm com os outros. São inúmeros esses jogos. Num leque se estende desde a implantação de uma ordem imóvel e quase “mineralógica” até a sucessividade acelerada das ações multiplicadoras de espaços populares. Mas esse frenesi espacializante nem por isso deixa de ser menos circunscrito pelo lugar textual. Seria possível uma tipologia de todos esses relatos? Jamais em termos de identificação de lugares e de efetuações de espaços. Mas, para aí encontrar os modos segundo os quais se combinam essas distintas operações, precisa se ter critérios e categorias de análise, e a necessidade que reduz aos relatos o cotidiano. O relato tem uma função social e autorização inscrita no sujeito. Mais exatamente de fundação. Gilson Gomes é cadastrado no Centro de Referência de Assistência Social (DF). 
Nos relatos de “apartamento” ou de “rua” as manipulações de espaço ou “percursos” levam a melhor. Na maioria das vezes, essa forma de descritores determina o estilo inteiro da narração. Quando intervém a outra forma, ela tem como valor ou ser condicionada ou suposta pela primeira. Nos dois casos um fazer permite um ver. Mas há também casos em que um percurso supõe uma indicação de lugar. A cadeia das operações espacializante parece toda pontilhada de referências ao que produz uma representação de lugares ou ao que implica uma ordem local. Tem-se assim a estrutura do relato de viagem, histórias de caminhadas e gestas que são marcadas pela “citação” dos lugares que daí resulta ou que as autoridades simbólicas preconizam preconceitos.  
Dois pesos e duas medidas bem equilibradas. Os relatos antropológicos efetuam um trabalho que, seguindo a etnografia extraordinária de Michel de Certeau, incessantemente, transforma “lugares em espaços” ou “espaços em lugares”. Organizam também os “jogos” das relações sociais mutáveis que uns mantêm com os outros. São inúmeros esses jogos, num leque se estende desde a implantação de uma ordem imóvel e quase mineralógica até a sucessividade acelerada das ações multiplicadoras de espaços populares, no âmbito das representações da vida. Mas esse “frenesi espacializante” nem por isso deixa de ser menos circunscrito pelo lugar textual. Seria possível uma tipologia de todos esses relatos, em termos de identificação de lugares e de efetuações de espaços. Mas, para aí encontrar os modos segundo os quais se combinam essas distintas operações, onde precisa se ter critérios e categorias de análise, e, além disso, a necessidade que reduz aos relatos etnográficos a leitura real do cotidiano não existe.
Ora, seguindo a crítica analítica aberta pela filosofia de Richard Rorty entendemos que depreende a vida cotidiana as relações entre “contingência, ironia e solidariedade” quando afirma:
   Ao considerarmos exemplos de jogos de linguagem alternativos – o vocabulário da antiga política ateniense versus o de Jefferson, o vocabulário moral de São Paulo versus o de Freud, o jargão de Newton versus o de Aristóteles, o idioma de Blake versus o de Dryden -, é difícil pensar que o mundo toma um deles melhor do que o outro decide entre eles. Quando a ideia de descrição do mundo se desloca do nível de frases regidas por critérios em jogos de linguagem para os jogos de linguagem completos, jogos entre os quais não escolhemos com referência a critérios, a ideia de que o mundo decide quais são as descrições verdadeiras já não pode ter sentido claro. Torna-se difícil pensar que, de algum modo, esse vocabulário já existia no mundo, à espera que os descubramos”.                  
Eis aí precisamente a formalização do primeiro papel do relato: sua autorização. Autoriza práticas sociais arriscadas e contingentes (cf. Rorty, 2007). Disseminada, não só por causa da diversidade dos meios sociais, mas, sobretudo por causa de uma crescente heterogeneidade, ou, pensando bem, de uma heterogeneidade sempre mais desvelada entre as “referências autorizantes”. Referimo-nos à excomunhão das divindades territoriais. O desapreço pelos lugares habitados pelo espírito dos relatos e a extensão das áreas neutras, privadas de legitimidade que marcam a fuga. A fragmentação das narrações organizadoras de fronteiras e de apropriação nos conflitos de classes, nos conflitos étnicos e raciais. Esses fragmentos escondidos articulam a história biográfica cujo espaço fundamenta as práticas de espaço. A organização reconhecível nos relatos de espaço da cultura cotidiana se acha, invertida pelo trabalho abstrato que isolou um sistema de lugares geográficos.

Há cerca de duzentos anos, a ideia de que a verdade era produzida, e não descoberta começou a tomar conta do imaginário individual (o sonho) e coletivo (os mitos, os ritos, os símbolos) europeu. O precedente estabelecido pelos românticos conferiu a seu pleito uma plausibilidade inicial. O papel efetivo de romances, poemas, peças teatrais, quadros, estátuas e prédios no movimento social dos últimos 150 anos deu-lhe uma plausibilidade ainda maior, obtendo legitimidade, já que as “ideias adquirem  força na história”. Alguns filósofos inclinaram-se ao iluminismo e continuaram a se identificar com a ciência. Eles veem a antiga luta entre a ciência e a religião, a razão e a irracionalidade, como um processo em andamento que assumiu a forma de luta entre a razão e todas as mediações intraculturais que pensam na verdade constituída e não encontrada. Esses filósofos consideram que a ciência é a atividade paradigmática e insistem que a ciência natural descobre a verdade, ao invés de cria-la.

Encaram a expressão “criar a verdade” como meramente metafórica e totalmente enganosa. Pensam na política e na arte como esferas em que a ideia de “verdade” fica deslocada. Outros filósofos, percebendo que o mundo descrito pelas ciências físicas não ensina nenhuma lição moral e não oferece conforto espiritual, concluíram que a ciência não passa de uma serva da tecnologia. Esses filósofos alinham-se com o utopista político e com o artista inovador. Os primeiros contrastam a “realidade científica concreta” com o “subjetivo” ou o “metafórico”, os segundos veem a ciência como mais uma das atividades humanas, e não como o lugar em que os seres humanos  deparam com uma realidade não humana “concreta”. De acordo com essa visão, os grandes cientistas inventam descrições do mundo que são úteis para o objetivo de prever e controlar o que acontece, assim como os poetas e os pensadores políticos inventam outras descrições do mundo para outros fins. Não há sentido algum, porém, em que qualquer dessas descrições seja uma representação exata de como é o mundo em si. Esses filósofos consideram inútil a própria ideia dessa representação, consignando uma verdade de categoria fenomênica, como uma descrição do espírito ainda não plenamente cônscio de sua natureza espiritual (dialética) e, elevar ao tipo de verdade oferecida pelo poeta e pelo revolucionário político.                      

O idealismo alemão, porém, representou uma solução de compromisso pouco duradoura e insatisfatória. É que Kant e Hegel fizeram apenas concessões parciais em seu repúdio à ideia de que a verdade está “dada”. Dispusera-se a ver o mundo da ciência empírica como um mundo “fabricado” – a ver a matéria como algo construído pela mente, ou como feita de uma mente insuficientemente cônscia de seu próprio caráter mental -, mas persistiram em ver a mente, o espírito, as profundezas do eu como dotados de uma natureza intrínseca – uma natureza que se poderia conhecer por uma espécie de superciência não empírica, chamada de filosofia. Isso significava que apenas metade da verdade – a metade científica inferior – era produzida. A verdade superior, a verdade sobre a mente, seara da filosofia, ainda era uma questão de descoberta, não de criação. Richard Rorty precisa sua tese de distinção entre a afirmação de que o mundo está dado e a de que a verdade dada, equivale a dizer, com bom senso, que a maioria das coisas no espaço e no tempo, é efeito de causas que não incluem os estados mentais humanos. Dizer que a verdade não está dada é dizer que, onde não há frases, não há verdade. E que as frases são componentes das línguas humanas, e que as línguas humanas são criações humanas. Só as descrições podem ser “verdadeiras” ou “falsas” - sem o auxílio das atividades descritivas dos seres humanos - não pode sê-lo. Em filosofia e lógica, a contingência enquanto representação da realidade é o modo de ser daquilo que não é necessário nem impossível. 

É bem verdade que a liberdade no pensamento tem somente o puro pensamento por sua verdade; e verdade sem a implementação da vida. Por isso, para lembrarmos de Hegel, é ainda só o conceito da liberdade, não a própria liberdade viva. Com efeito, para ela a essência é só o pensar em geral, a forma coo tal, que afastando-se da independência das coisas retornou a si mesma. Mas porque a individualidade, como individualidade atuante, deveria representar-se como viva; ou, como individualidade pensante, captar o mundo vivo como um “sistema de pensamento”; teria de encontrar-se no pensamento mesmo, para aquela expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do pensamento, um conteúdo do que é verdadeiro. Com isso não haveria, absolutamente nenhum outro ingrediente, naquilo que é para a consciência, a não ser o conceito que é a essência. O conceito enquanto abstração, separando-se da multiplicidade variada das coisas, não tem conteúdo nenhum em si mesmo, exceto um conteúdo que lhe é dado. A consciência, quando pensa o conteúdo, o destrói como um ser alheio; mas o conceito é conceito determinado e justamente essa determinidade é o alheio que o conceito possui nele.   

Esta unidade do existente, o que existe, e do que é em si é o essencial da evolução. É um conceito especulativo, esta unidade do diferente, do gérmen e do desenvolvido. Ambas estas coisas são duas e, no entanto, uma. É um conceito da razão. Por isso só todas as outras determinações são inteligíveis, mas o entendimento abstrato não pode conceber isto. O entendimento fica nas diferenças, só pode compreender abstrações, não o concreto, nem o conceito. Resumindo, teremos uma única vida a qual está oculta. Mas depois entra na existência e separadamente, na multiplicidade das determinações, e que com graus distintos, são necessárias. E juntas de novo, constituem um sistema. Essa representação é uma imagem da história da filosofia. O primeiro momento era o em si da realização, e em si do gérmen etc. O segundo é a existência, aquilo que resulta. Assim, o terceiro é a identidade de ambos, mais precisamente agora o fruto da evolução, o resultado de todo este movimento. E a isto Hegel chama “o ser por si”. É o “por si” do homem, do espírito mesmo. Somente o espírito chega a ser verdadeiro por si, idêntico consigo. O que o espírito produz, seu objeto de pensamento, é ele mesmo. Ele é um desembocar em seu outro. É um desprendimento, um desdobrar-se, e por isso, ao mesmo tempo, um desafogo.

O Brasil é o lugar mais caro do mundo para se contratar “os serviços de um flanelinha”. A informação vem de um estudo realizado pela Universidade Federal de Sucre, na Bolívia. A instituição usou como parâmetro o serviço básico de guarda de carros e comparou flanelinhas mundiais e o poder de compra em 26 países. Dados da pesquisa revelaram um aumento de 17,5% nos preços praticados pelos flanelinhas brasileiros em 2010 em comparação ao período anterior. Esse crescimento coloca o Brasil no 1° lugar do ranking de guardadores de carro mais caros do mundo pela primeira vez em 15 anos. Do ponto de vista teórico e prático no sentido global, temos “O Estudo Geopolítico da Atuação dos Flanelinhas”, também conhecido como EGAF, é realizado anualmente desde 1995 e, até 2010, tinha a Índia na liderança. No Brasil, o custo médio do serviço é de R$ 5,34, que geralmente é arredondado para “cincão”. O quase “profissional” pode receber como pena, de 03 meses a 01(um) ano de detenção.
          A punição por ameaça ou violência praticada por “flanelinhas” poderá ter sua pena aumentada. A vetusta comissão de juristas que elabora o anteprojeto do novo Código Penal aprovou aumento da pena para atos de constrangimento ilegal. Quando associada à violência, a “prática de lugar” para guardar carros em vias públicas poderá ser punida com essa nova regra. Entre os países com flanelinhas mais baratos estão Inglaterra e Alemanha, onde a atividade é gratuita. Oscar Martinez, responsável pelo levantamento, credita o aumento do valor nos serviços às vitórias de candidaturas brasileiras a eventos esportivos importantes. Segundo ele, quando se aumenta a demanda a esses serviços é natural um aumento de preços na mesma proporção. - “Veja bem, logo mais o Brasil vai ser sede da Copa, das Olimpíadas e do Fim do Mundo. Muita gente vai visitar o país. E, mesmo indo de avião, muitas pessoas gostam de alugar carro para não depender de taxistas locais”, explica o cientista político. Outro fator é a elevação do custo do serviço de segurança. Em várias capitais brasileiras, o serviço de flanelinha já é feito por homens armados, o que encarece a operação. Iraque, Bolívia, Irã e a própria China garantem melhoras nos serviços e uma posição melhor no ranking. O trabalho informal é definido pela ausência de registro em trabalho, sem benefícios, sem férias pagas, sem garantias, sem seguro desemprego, etc., isto é, pela ausência de direitos previstos nas legislações. Não se trata aí de atividade “ilícita”, mas “não formalizada”. É relevante relacionar a locução “trabalho informal” com outras que significam igualmente essa tensão corporativa entre o legal e o ilegal. É o caso de comércio ilegal, do trabalho ilegal. A ilegalidade na legislação trabalhista compreende, entre outras coisas: vendas de produtos sem documentação legal, produto ilícito, produto falsificado, marca ilícita. 
Bibliografia geral consultada. 

NEG, Oskar e KLUGE, Alexander Kluge, Sfera Publica ed Esperienza: Per un’Analisis dell’Organizzazzione della Sfera Publica Borghese e della Sfera Publica Proletaria. Milano: Gabrielle Mazzota Editore, 1970; CERTEAU, Michel de, L`Invention du Quotidiene. Volume 1. Arts de Faire. Paris: Union Générale d`Editions 10-18, 1980; CAVALCANTI, Clovis; DUARTE, Renato, À Procura de Espaço na Economia Urbana: O Setor Informal em Fortaleza. Recife: SUDENE/FUNDAJ, 1980; AMADEO, Edward; ESTEVÃO, Marcello, A Teoria Econômica do Desemprego. São Paulo: Editora Hucitec, 1994; CARDOSO, Adalberto Moreira, “Economia, Sociologia, Eficiência e Democracia na análise das Relações de Trabalho”. In: Conselho Latino-americano de Ciências Sociais, 1999; LE GOFF, Jacques, Por Amor às Cidades. Conversações com Jean Lebrun. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 2001; RORTY, Richard, Consequências do Pragmatismo. Lisboa: Editor Rolos e Filhos, 1982; Idem, A Filosofia e o Espelho da Natureza. Rio de Janeiro: Editora Relume-Dumará, 1994; Idem, Objetivismo, Relativismo e Verdade. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1997; Idem, “Duas Profecias”. In: Folha de S. Paulo, 24 de maio de 1998; Idem, Contingência, Ironia e Solidariedade. São Paulo: Editora Martins Editora, 2007; MILLEN, Milene, Flanelinhas no Espaço Urano: Um Estudo sobre a Inserção de Jovens no Mercado de Trabalho em Juiz de Fora. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal de Juiz de Fora, 2007; FAÇANHA, José Marcílio de Sousa, Semáforos – Parada Obrigatória! Um Lugar Praticado por Personagens e Histórias. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação. Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade. Universidade Estadual do Ceará 2005; Idem, Beco da Lama: Formas e Cores de uma Plástica da Vida. Tese de Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e Representações. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2014; POSTONE, Moishe, Tempo, Trabalho e Dominação Social. São Paulo: Boitempo Editorial, 2015; SILVA, Olga Myrla Tabaranã, Salário x Transferência de Renda: Tensões no Processo de Reprodução Social de Usuários do Programa Bolsa Família (PBF) em Belém. Dissertação  de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Serviço Social. Instituto de Ciências Sociais Aplicadas. Belém: Universidade Federal do Pará, 2015; entre outros.

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