sábado, 20 de junho de 2015

A Jaula de Ferro: Uma Metáfora de Secularização da Cultura.

Giuliane  de Alencar & Ubiracy de Souza Braga
 
                                                           O contextualismo é apenas o outro lado do logocentrismo”. Jürgen Habermas
              

A exoneração de um sociólogo pós-marxista levou-me a refletir sobre Max Weber. Os primeiros textos acadêmicos de Maximilian Karl Emil Weber estão ligados a trabalhos desenvolvidos em sua formação (Gadamer) na singular estrutura universitária alemã. Ainda que sejam escritos aparentemente técnicos, como na vida de qualquer acadêmico, ou de um político medíocre, ele procura contextualizar sua pesquisa no âmbito histórico, de um modo particular, o que já demonstra a preocupação social de suas investigações. Durante seu período como professor universitário, Weber dedicou-se ao ensino da economia política e de questões agrárias, uma de suas especialidades, como ocorre com a Innerdeutsche Grenze, Deutsch-Deutsche Grenze, ou informalmente, Zonengrenze, um extenso sistema de fortificações que percorria os 1382 km de comprimento da fronteira entre a Alemanha Oriental (República Democrática Alemã, ou RDA) e a Alemanha Ocidental (República Federal da Alemanha, ou RFA), com a extensão do Mar Báltico até a então Checoslováquia.  Como professor de economia, ele debateu sobre os valores e limite das principais correntes de pensamento social e política de seu tempo. Neste período Max Weber também publicou um texto introdutório chamado “A bolsa” (“Stocks”), para divulgar e promover o entendimento da função econômica do “capital financeiro”, tal como fizera Marx, embora de forma inconclusa. 
Neste período Weber notabilizou-se como um dos grandes especialistas de questões e problemas agrários, refletindo sobre os impactos do capitalismo na esfera da vida rural. Profundamente envolvido com a vida acadêmica sua produção sofre uma interrupção a partir de 1897. É somente depois desta fase transitória que a produção sociológica Weber começa a delinear-se. A aproximação está ligada à pesquisa empírica na região do Leste do rio Elba. Analisando o processo migratório de poloneses na fronteira da Alemanha, Max Weber destacou as tendências da introdução do capitalismo no campo e deu especial atenção às consequências políticas e sociais daquele processo. 
Aplicando diversos questionários, levantando os inúmeros dados ele concluiu que o acelerado processo de modernização econômica da Alemanha estava minando a estrutura de poder da “classe dirigente”, a aristocracia agrária: Junker. Tal visão foi especialmente apresentada em uma Aula Inaugural, questão tópica desprezada entre nós, que serve mais como “palanque” ou uma maneira de satisfação aos novos “burocratas da cultura”, para lembramos do filósofo José Arthur Giannotti, mas pronunciada em 1895, e, denominada: Der Nationalstaat und Wirtschaftspolitik.  O fim do idealismo alemão, o aparecimento do materialismo, o pensamento de Friedrich Nietzsche e as teorias de Freud pareciam unir-se na luta contra a filosofia positivista que ganhava força com a industrialização: ordem e progresso unidos sob a batuta da ciência. Recorde-se que o anarquismo tinha ganhado raízes em Ascona, desde que em 1869, o célebre anarquista russo Mikhail Bakunin tinha vindo residir como refugiado político. 
          Também pouco tempo depois começaram a chegar outros refugiados com projetos distintos, como o de fundar um convento laico com o nome de Fraternitas, por iniciativa de teósofos como: Alfredo Pioda e Franz Hartmann, justamente nas montanhas de Ascona, que receberiam então, mais tarde, o nome de Monte Verità: - “Si erge sulle colline che sovrastano Ascona ed il Lago Maggiore, e rappresenta da sempre un polo magnetico di convergenza di idee, tendenze, sperimentazioni e personaggi storici presentati oggi nell`offerta di un progetto moderno di rilanci”. Em 1900, sob o ambiente histórico e filosófico da Europa do período da pré-guerra, aparece a singular história da realização de uma utopia que tomou o nome de Monte Verità. Singular não só pelo seu alcance, mas também pela radicalidade das suas propostas iniciais, e pela atração que exerceu sobre inumeráveis artistas e pensadores, inclusivamente pelo fato de ter preparado o terreno para a criação do Círculo de Eranos, designação dada a um encontro de pensadores dedicados aos estudos da espiritualidade que ocorreu regularmente próximo a Ascona, na Suíça, a partir de 1933. O grupo de Eranos foi fundado por Olga Froebe-Kapteyn em 1933, e as conferências ocorreram anualmente em sua propriedade desde então - às margens do Lago Maggiore, próximo a Ascona, na Suíça. O nome, sugerido por Rudolf Otto, é derivação da palavra grega que significa um banquete onde não existe um anfitrião a prover os convidados, mas onde todos contribuem com sua comida. o qual teve como expoentes figuras como: Carl G. Jung, Rudolf Otto, Karl Kerenyi, Joseph Campbell, Mircea Eliade, Gilbert Durand, Gershim Scholem, Henry Corbin e Gerardus van der Leeuw.
Na região sul dos Alpes suíços, o Ticino, localiza-se vários lagos da Suíça italiana, entre eles o Lago Maggiore, imponente pela sua extensão e por se achar encravado no coração dos Alpes. Chegar às aldeias ribeirinhas do lago é como aterrar numa espécie de oásis, no meio de uma paisagem tropical, cujos grandes picos se refletem na superfície brilhante dos lagos. No século XIX, várias povoações estabeleceram-se ao seu redor, entre elas a comunidade de Ascona. A região está dotada de um clima subtropical muito diferente das temperaturas extremas do resto da Suíça. A riqueza mineral é enorme e dá ao lugar um magnetismo especial que propicia o aparecimento de inumeráveis lendas. A região adquiriu um prestígio de paraíso terrestre, quase mágico. E rapidamente começou a receber refugiados políticos e pensadores que fugiam da vida das grandes cidades europeias, ao que contribuía a tradicional neutralidade Suíça face aos conflitos do resto da Europa.
Além disso, discordavam profundamente do rumo que as sociedades ocidentais estavam a tomar. Decidiram então adoptar a chamada “terceira via” re conhecida na Alemanha como Lebensreform, ou, “Reforma da vida”, que tinha como antecedente o pensamento de Bernstein. Muitos jovens da burguesia europeia que não desejavam transformações profundas na economia sentiram-se atraídos por este projeto. Tal foi o caso do casal Ida Hofmann e Henry Oedenkoven, ela professora e, ele, jovem herdeiro. Ida Hoffmann, foi autora de obras tais como: “A Contribution to the Female Questio”; “The Importance of True Theosophy”, sendo esta última em italiano. Compilou algumas notas conhecidas como: “Notes Towards the Promotion of the Vegetarian Lifestyle”, e também escreveu junto com Henri Oedenkoven um livro em alemão sobre o Monte Verità.
            Também as ideias de Karl Graser influenciaram o grupo. Graser preconizava que as reformas de vida se devia inspirar no Émile, de Jean-Jacques Rousseau, quando disse “Emílio foi o melhor e mais importante de todas minhas obras,” abordam temas políticos e filosóficos referentes à relação do indivíduo com a sociedade, explica como o indivíduo pode conservar sua bondade natural bem como na ideia de Leon Tolstoi, para quem “o homem deve seguir aquilo que a sua consciência determina”. Em novembro de 1900, Henri Oedenkoven e Ida Hoffmann, com o auxílio dos amigos Arthur e Karl Gräser (irmãos), Lotte Hattemer e Jenny Hoffmann (irmã de Ida, nascida em 1863), fundaram a Colônia Vegetariana e Naturista no famoso Monte Verità. O irmão de Karl, o poeta e pintor Gustav Graser, com 21 anos, e a irmã de Ida, Jenny, foram os dois elementos mais ativos e radicais de todo o grupo. Gustav tinha acumulado a experiência de ter pertencido a vários círculos boêmios da Alemanha, tal qual František Kafka é não pode ser esquecido, em Praga em 1883, faleceu em Klosterneuburg, município da Áustria localizado no distrito de Wien-Umgebung, no estado de Baixa Áustria. Mais tarde  Hermann Hesse converter-se-ia num dos principais discípulos.  
           Ida Hofmann e Henry Oedenkoven pensava que a autoconsciência no sentido empregado por Hegel que bastava para criar “uma comunidade livre e capaz de viver em harmonia”. Porém, a coexistência de pensamentos tão heterogéneos como o anarquismo, o teosofia e o naturismo, ainda que tivessem pontos comuns, acabou por gerar alguns confrontos insuperáveis. Inicialmente, parecia que as divergências incidiam sobre coisas meramente práticas, como seja renunciar ao uso de eletricidade ou de aquecedores. Porém, para os irmãos Graser coisas como estas tinham um significado decisivo no que respeita a uma autêntica transformação da vida. Para eles, Ida e Henry violavam os princípios da comunidade quando decidiam aproveitar as riquezas derivadas do capitalismo, ao mesmo tempo em que afirmavam que este sistema era a causa dos males sociais. Apesar de toda a sua aparente ingenuidade, o projeto social era assombroso por todo o seu arrojo e convicção. É fácil imaginar que para os anarquistas a prática vegetariana era insossa e absurda.
Nas suas memórias, o anarquista Erich Musham, ensaísta, poeta e dramaturgo judaico-alemão ascendeu dentro da esquerda europeia após a Grande Guerra, sendo um dos principais líderes dentro das estruturas conselhistas da República Soviética da Baviera.  Recorda Musham: “Depois de ter trabalhado toda a manhã na construção e só ter comido pão e uma maçã, sentia-me a desfalecer, pelo que fui descansar”. Henry Oedenkoven e Ida Hoffmann  dois famosos personagens do avant-garde anarquista, naturista, e vegetarianista perguntava-se porque é que não continuava a trabalhar tal como os outros. -  Acabamos por ter uma altercação e ele gritou: “podes ir-te embora; não se perde nada”. E afirma: - Logo que cheguei ao centro de Ascona pedi um bife e um copo de vinho, que me souberam servir como nunca. O fato social de que nós temos sido usados através da apropriação do trabalho por anos e anos a fio para no fundo poder satisfazer aqueles  mais ricos. La ciudad suiza de Ascona (Foto, 2009).
Os primeiros anos do Monte Verità, até 1905, foram os mais radicais. Com o tempo agravaram-se os problemas financeiros e acentuou-se a divisão entre os vários elementos. Por essa altura, o local era habitado de maneira regular por cerca de 40 pessoas. Ida e Henry optaram por comercializar a “Casa de Cura”, que até ali havia servido só para os residentes, transformando-o num sanatório privado com serviço aberto ao público. Tal decisão originou enormes divergências e constituiu o ponto de ruptura. Para os anarquistas, Monte Verità tinha-se transformado numa experiência social isolada protagonizada por burgueses excêntricos à procura da “terceira via”, aqui fora do sentido sociológico inglês. Prevaleceu então o grupo de teósofos e naturistas, mas, apesar de vários anarquistas terem abandonado o projeto, a verdade é que não deixaram de influenciá-lo.
Em 1905 construíram-se as casas maiores e o sanatório vegetariano, que foi batizado como: Sociedade Vegetariana do Monte Verità. A Casa Central tornou-se centro de reunião de toda a comunidade e do sanatório; tinha cantina, sala de música, sala de jogos, assim como espaços com sol e ar para terapias naturais. A Casa Annatta foi construída a partir do conceito teosófico de “casa-alma”; conservada ainda hoje, o seu exterior parece-se com um paralelepípedo rematado com ângulos retos de madeira, e por dentro é constituído por formas orgânicas e ondulantes que harmonizam com ângulos arredondados dos tetos, das portas e das janelas. Um lendário personagem do Monte Verità foi o médico anarquista Dr. Raphael Friedeberg, que atraiu, a partir de 1905, uma colônia de outros anarquistas. Tinha sido militante do Deutsch Sozialdemokratischen Partei, e pensou em Ascona como o local ideal para criar uma comunidade anarco-reformista baseada no conceito criado por ele mesmo: “o psiquismo histórico”. Esta ideia postulava que a libertação do indivíduo podia dar-se a partir de uma educação não coerciva, livre do dogmatismo sócio religioso nos padrões notadamente da burguesia. Friedeberg desenvolveu a medicina natural ao longo de 35 anos de estudos e pesuisas, e nunca deixou de polemizar com a medicina científica, apesar da fama e do prestígio desta.
          Outros anarquistas também ligados ao Monte Verità foram Erich Musham, Fritz Brupbacher, Kropotkine, Ernst Frick, o boêmio psicanalista Johanes Nohl, o psicanalista austríaco Otto Gross, que procurou fundar no Monte Verità “um matriarcado naturista e comunista”. Erich Müsham tornou-se, no entanto, num crítico ferrenho da comunidade. Para ele havia uma terrível contradição no objetivo de criar uma colônia autárquica inspirada em princípios comunistas. Quando observava a convivência no grupo, alertava: “Todas as colônias comunistas que não se apoiem numa orientação revolucionária socialista terminarão no fracasso, sobretudo quando os laços que unem os participantes são tão insignificantes como os princípios vegetarianos”. Em 1909 Monte Verità contava cerca de 200 residentes e um número aproximado de opiniões. A maioria eram seguidores do teosofismo, enquanto uma parte minoritária estava próxima do antroposofismo de Rudolf Steiner. Ainda que Ida e Henry não fossem teosóficos, partilhavam também o interesse pela mitologia e reencontro das religiões orientais, sobretudo o hinduísmo e budismo estudados por Max Weber, e posteriormente, por Fritjof Capra em seu The Tao of Physics, publicado em 1975 por Shambhala Publications of Berkeley.
Enfim, a criação em 1910 da Escola da Nova Vida, dirigida por Rudolf von Laban e da sua ajudante Mary Wigman, trouxe ao Monte Verità uma fase de grande ebulição artística; a escola estava próxima da ideia da reforma do corpo e do espírito que preconizava Hofmann. Nesses anos o dadaísmo não deixou de marcar presença com a chegada de Hans Arp e da sua mulher Sophie Taeureb. Os habitantes de Ascona deram aos monteveritanos o nome de balabiott, que significa: “dançam nus”. Alguns velhos habitantes recordam: “Aqueles nórdicos (alemães, suíços, holandeses, ingleses) faziam festas durante noites inteiras, e durante as quais dançavam despidos uma espécie de dança árabe”. Entrar no Monte Verità era proibido para as crianças e jovens de Ascona; para os adultos, aquele local era para os loucos, endiabrados, monstros, seres sujos que viviam em pequenas cabanas como carneiros. Apontadas com ainda maior temor eram as mulheres que não eram poupadas a adjetivos derivados de preconceitos sociais tais como: “a endiabrada”, “a puta”, “a cabra negra”, “a impudica”. O Município acabou por proibir as pessoas em circular em Ascona com “minifraldas” porque os “balabiott”, quando desciam ao povoado, “traziam túnicas largas atadas á cintura, e quando não havia ninguém em redor desatavam-nas deixando à vista as pernas e o corpo”.
Primero llegaron los hippies, luego los pensionistas. Ahora la ciudad suiza de Ascona se ha convertido en la meca de quienes buscan la buena vida. A principios del siglo XX, un grupo de vegetarianos, anarquistas y artistas fundaron una colonia en Ascona en lo que fuera un pequeño pueblo pescador a orillas del Lago Maggiore. Allí cambió por primera vez su fisonomía. En los últimos tiempos, y gracias a la visión de un empresario (Stefan Breuer), un chef trendy (Ivo Adam) algunos aliados como el hotelero Philippe Fruttiger, Ascona vuelve a cambiar de perfil. Se reinventa. Para unos la ciudad cobra un nuevo impulso y se adapta a las nuevas tendencias que buscan los viajeros, para otros este grupo de emprendedores está destruyéndola”.

            Se refletirmos sobre Mônaco, na leitura de Paulo Ricardo em “Olhar 43”, temos os seguintes versos:
Seu corpo é fruto proibido /É a chave de todo pecado /E da libido, é prum garoto introvertido/Como eu é pura perdição/É um lago negro o seu olhar/É água turva de beber, se envenenar/Nas tuas curvas derrapar, sair da estrada,/E morrer no mar… no mar/É perigoso o seu sorriso, é um sorriso assim jocoso,/Impreciso, diria misterioso, indecifrável, riso de mulher/Não sei se é caça, ou caçadora, se é Diana ou Afrodite/Ou se é Brigitte,/Stephanie de Mônaco,/Aqui estou inteiro ao seu dispor…/Princesinha/Pobre de mim, invento rimas assim prá você/E um outro vem em cima, e você nem prá me escutar/Pois acabou, não vou rimar porra nenhuma/Agora vais sair como eu já nem quero nem saber/Se vai caber ou vão me censurar…/Será?/E prá você eu deixo apenas meu olhar 43/Aquele assim meio de lado, já saindo/Indo embora, louco por você/Que pena/Que desperdício!”...
                 Contudo, mutatis mutandis, é uma bobagem dizer que Max Weber é considerado um dos fundadores do estudo moderno da sociologia. Mais do que isso. É um giant que soube compreender o socialismo, sem ser socialista. Soube criticar o capitalismo, percebendo o problema da ética no capitalismo. Aproximou-se dos anarquistas, tendo vivido a experiência singular, de Ascona, envolvendo-se afetivamente com as irmãs Richtoffen (cf. Chacon, 1988), antecipando algumas teses de Freud, sem ser anarquista, tal como a autora de Simone de Beauvoir, autora de O Segundo Sexo. Herdou com estes, talvez, a sabedoria de ser acadêmico na universidade, político nos gabinetes e mundano nos salões. Sua influência também pode ser apreendida na economia, na filosofia da história, no direito, na ciência política e na administração, nas questões de método nas ciências empíricas e sociais, para não falarmos nos temas abrangentes das escolas históricas e mesmo do historicismo presente no marxismo, como tão bem fora descrito por Michel Löwy. Começou sua carreira acadêmica na Universidade Humboldt, em Berlim e, posteriormente, trabalhou na Universidade de Freiburg, na Universidade de Viena e na Universidade de Munique. Personagem influente na política alemã da época, sem tropeçar nas questões da “ciência como vocação” (“Wissenschaft als Beruf”) como ocorre hic et nunc, foi consultor dos negociadores alemães no Tratado de Versalhes (1919) e da Comissão encarregada da Constituição de Weimar.
            Para sermos breves, “O Segundo Sexo” é uma obra seminal que estabeleceu de imediato uma plataforma de discussão acesa sobre a condição feminina e a diversidade ou pluralidade sobre a noção de “feminismo”(s). Apesar das várias polêmicas que sempre suscitou, tem servido de referência para a maior parte dos ensaios, debates e discussões posteriores. Camille Paglia afirmou que ao lê-la, aos dezesseis anos, mudou toda a sua vida: “Teve um grande impacto sobre mim; a minha independência intelectual data desse momento. O Segundo Sexo continua a ser a obra suprema do feminismo moderno”. Quanto a Katte Millett baseou “Sexual Politics” na obra de Simone e a australiana Germaine Greer foi nela que se inspirou, principalmente no tratamento do tema do “envelhecimento feminino e suas consequências”, talvez como... É fácil encontrar notas sobre de Beauvoir em quase todos os estudos femininos. Camille visitou quatro vezes o Brasil. Em 1996, promovendo o lançamento de seu livro Vampes e vadias, foi ao Rio de Janeiro e a São Paulo, em companhia de sua  companheira Alison Maddex. Em 2007, conferenciou em Porto Alegre e, em 2008, em Salvador. Retornou a Salvador em fevereiro de 2009 para curtir o carnaval. Declara-se apaixonada pelo Brasil.
Ipso facto quando surgiu, em 1949, “O Segundo Sexo” causou tanto admiração, quanto estranheza. Era uma obra vasta, dividida em dois volumes, bem documentada e alicerçada na lógica e no conhecimento e muito pouca feminina. Às mulheres então estavam reservadas aos gêneros literários como o romance ou a novela. Tendo como crítica filosófica, “pôs a nu a condição feminina”, explorou áreas ligadas à situação da mulher, englobando história, filosofia, economia, biologia, etc., bem como alguns “case studies” e algumas experiências particulares. Simone queria demonstrar que a própria noção de feminilidade era uma ficção inventada pelos homens na qual as mulheres consentiam, fosse por estarem pouco treinadas nos rigores do pensamento lógico ou porque calculavam ganhar algo com a sua passividade, perante as fantasias masculinas.
No entanto, ao fazê-lo cairiam na armadilha de se autolimitarem. Os homens chamaram a si os terrores e triunfos da transcendência, oferecendo às mulheres segurança e tentando-as com as teorias da aceitação e da dependência, mentindo-lhes ao dizer que tais são características inatas do seu caráter. Ao fugir a este determinismo biológico, Simone de Beauvoir abriu as portas a todas as mulheres no sentido de formarem o seu próprio ser e escolherem o seu próprio destino, libertando-se de todas as ideias pré-concebidas e dos mitos pré-estabelecidos que lhe dê pouca ou nenhuma hipótese de escolha. Assim, qualquer mulher deve criar a sua própria via, mesmo que seja a de cumprir um papel tradicional escolhido por ela, admitem muitas mulheres que enveredaram por esses sinos luminosos até alcançarem suas escarpas abruptas que devemos desconstruir.
Nos trabalhos em que analisa a República de Weimar, Peter Gay estuda os modelos de comportamento alemães, vendo neles duas dimensões, dois tipos distintos de preocupação: a do “autoaperfeiçoamento, a bildung (...) livre de toda política, e aquela, inferior e sórdida, dos assuntos humanos, com seus compromissos e questões de ordem prática”. A coexistência entre estes dois tipos de valores vai se desenvolver em uma combinação específica de ingenuidade, estupidez adolescente e pragmatismo maquiavélico e sádico. Os wandervogel, escreve o criterioso historiador Peter Gay: “buscavam na cordialidade e camaradagem um escape às mentiras engendradas pela cultura da pequena burguesia, um modo de vida sadio (...) e, sobretudo, uma existência em comum, capaz de se elevar acima dos interesses particulares e da política mesquinha dos partidos”. Nesses movimentos havia chefes e discípulos que utilizavam uma linguagem e um estilo específico. 
Elemento e imagem de “sua intimidade emocional”, e celebravam certas palavras, como, por exemplo, gemeinshaft: a comunidade era a seus olhos uma invocação mágica. As aspirações e valores dos wandervogel exprimiam “sua busca de alma, sua desconfiança em relação ao espírito”. Para falar do complexo de sentimentos e reações que exprime o espírito deste movimento de juventude, vale-se da expressão “busca de unidade”, que representa, em seu ponto de vista, uma regressão oriunda de um grande medo: “o medo da modernidade”. Segundo Gay, as abstrações que F. Tönnies e outros utilizaram, como: volk, führer, organismus, reich, entscheidung, gemeinshaft, aufheben, termo hegeliano que significa ao mesmo tempo “elevar”, “anular” e “preservar”, como é sabido, “revelam uma necessidade desesperada de raízes e pertença a uma comunidade, constituem uma rejeição radical da razão, a que se acrescenta o apelo à ação direta ou à submissão a um chefe carismático”. Observa que “este conglomerado de sentimentos hostis que se fazia passar por filosofia” incitou Troeltsch, em 1922, a assinalar o perigo desta inclinação, a seus olhos especificamente alemã, que favorecia a “mistura de misticismo e brutalidade” (cf. Haroche, 2006).
           Grande parte de seu trabalho como pensador e estudioso da ética foi reservado para o chamado processo de racionalização e desencantamento, com o qual começou suas reflexões sobre a sociologia da religião. Max Weber argumentou que a religião era uma das razões não exclusivas do porque as culturas do Ocidente e do Oriente se desenvolveram de formas diversas, e salientou a importância de algumas características específicas do protestantismo ascético, que levou ao nascimento do capitalismo, a burocracia e do estado racional e legal nos países ocidentais. Argumentou que a religião era uma das razões não exclusivas do porque as culturas do Ocidente e do Oriente se desenvolveram de formas diversas, originais, situando a relação histórica da origem dos letrados chineses, e salientou algumas características específicas do protestantismo ascético, que levou ao nascimento do capitalismo, a burocracia e do estado racional e legal nos países ocidentais.
            A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo é considerada a grande obra de Max Weber e é o seu texto mais lido e conhecido. A primeira parte desta obra foi publicada em 1904 e a segunda veio a público em 1905, depois da viagem do autor e de sua esposa aos Estados Unidos. Analisando todo o processo em seu conjunto, Weber verifica que dos dogmas e, em especial, dos impulsos morais do protestantismo, derivados após a reforma de Lutero, surge uma forma de vida de caráter metódico, disciplinado e racional. Da base moral do protestantismo surge não só a valorização religiosa do trabalho e da riqueza, mas também uma forma de vida que submete toda a existência do indivíduo a uma lógica férrea e coerente: uma personalidade sistemática e ordenada. Sem estes impulsos morais não seria possível compreender a ideia de vocação profissional, concepção que subjaz as figuras modernas do operário e do empresário. A moral específica dos círculos protestantes possui uma relação sociológica de afinidade eletiva com o comportamento (espírito) que subjaz ao sistema econômico moderno e, ainda que este não derive apenas deste fator unicausal, trata-se de um impulso vital para o entendimento do mundo tanto moderno quanto contemporâneo.
No final da Ética Protestante, Max Weber destaca para o que nos interessa - objeto de nossa argumentação que, apesar de secularizada, ou seja, desprovida de fundamentos religiosos, a vida aquisitiva da economia moderna generalizou-se para todo conjunto da vida social: os puritanos queriam tornar-se monges, hoje todos têm que segui-los. Esta avaliação também ganha contornos críticos, pois Weber constata que a lógica da produção, do trabalho e da riqueza envolve o mundo moderno como uma “jaula de ferro”, (Eisernen Käfig) e se pergunta qual o destino dos tempos modernos: o ressurgimento de velhas ideias ou profecias ou uma realidade petrificada, até que a última tonelada de carvão fóssil seja queimada? Em tons que lembram Nietzsche, ele dirá ainda sobre os homens dos tempos atuais: “especialistas sem espírito, nulidades sem coração”. Esta visão crítica do capitalismo encorajou certos pensadores marxistas como Georg Lukács, Karl Löwith, Michael Löwy a ressaltarem algumas afinidades do seu pensamento com a visão marxista, corrente que, sem menosprezar as sensíveis diferenças entre as duas formas de pensamento, foi sendo denominada de “webero-marxismo”. No entanto, diferente da visão marxista, que privilegia os condicionamentos econômicos, Weber, coerente com uma visão multicausal dos fenômenos sociais, destaca seus fatores culturais e, mais tarde, concordando com Marx, enfatizará também a importância dos fatores materiais no surgimento das instituições modernas. Bibliografia geral consultada.
 
MITZMAN, Arthur, La Jaula de Hierro. Una Interpretación Histórica de Max Weber. Madrid: Alianza Universidad, 1976; LAMO DE SPINOSA, Emiliano, “Max Weber y el Desencanto de la Burguesia”. In: El País.  21 de noviembre de 1976; CHACON, Vamireh, Max Weber e a Crise da Ciência Política. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1988; SCAFF, Lawrence, Fleeing the Iron Cage. California: University of California Press, 1999; CIPRIANI, Roberto, “Al di là della secolarizzazione”. In: Studi di Sociologia, 26, 3-4: 1988: 271-288; CRESPI, Franco, “La Fine della Secolarizzazione: Dalla Sociologia del Progresso alla Sociologia dell`Esistenza”. In: Studi di Sociologia, 26, gennaio-marzo: 1988: 33-42; COLLIOT-THÉLÈNE, Catherine, Le Désenchantement de l`État: de Hegel à Max Weber. Paris: Éditions Minuit, 1992; CHAVES, Mark, “Secularization as Declining Religious Authority”. In: Rev. Social Forces, 1994: 72, 3: pp. 749-774; WEBER, Max, La Ética Protestante y el Espiritu del Capitalismo. Madrid: Mestas Ediciones, 2002;  HAROCHE, Claudine, “Subjetividades e Aspirações: Os Movimentos de Juventude na Alemanha (1918-1933)”. In: Ágora. Vol. 9, nº 1. Rio de Janeiro, jan./jun., 2006; ADVERSE, Hilton, Política e Secularizaçao em Carl Schmitt. In: Kriterion 49 (118), dez. 2008; BEAUVOIR, Simone de, O Segundo Sexo. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2009; HABERMAS, Jürgen, Teoria do Agir Comunicativo. 1: Racionalidade da Ação e Racionalização Social. São Paulo: Editora WMF MartinsFontes, 2012; FOUCAULT, Michel, Microfísica do Poder. 1ª edição. São Paulo: Editora Paz e Terra, 2014; LÖWY, Michael. A Jaula de Aço. São Paulo: Boitempo Editorial, 2014; LIMA, Sebastião Hugo Brandão, A Crítica de Nietzsche à Religião Cristã. Dissertação de Mestrado. Programa de Mestrado em Ciências da Religião. Recife: Universidade Católica de Pernambuco, 2015;  entre outros.

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