Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza Braga
“Lutar pelas diferenças sempre que a igualdade nos descaracteriza”. José de Souza Martins
No ano de 1997 a tribo Pataxó obteve uma trágica notoriedade internacional após o assassinato do índio Galdino Jesus dos Santos (1952-1997). Ele dormia em uma parada de ônibus em Brasília - DF quando delinquentes de classe média alta: um menor de idade, G.N.A.J. e quatro maiores de idade: Tomás Oliveira de Almeida, Max Rogério Alves, Eron Chaves Oliveira e Antônio Novely Cardoso Vilanova, barbaramente atearam fogo ao seu corpo, provocando a morte horas após ter em torno de 95% de seu corpo queimado. Os assassinos confessaram o crime hipocritamente, “alegando que o confundiu com um mendigo”, tal como ocorre nos extermínios de limpeza étnica historicamente datada. Galdino Jesus dos Santos, foi um líder e representante indígena brasileiro da etnia pataxó-hã-hã-hães queimado vivo, sadicamente, enquanto dormia em um abrigo de um ponto de ônibus em Brasília, após participar de manifestações políticas do Dia do Índio, em um crime que transformou negativamente o ideário e as relações indígenas no Brasil e no mundo. No início da década de 2000, ocorreu a consolidação de espaços de representação social do movimento indígena – através das suas organizações - nas esferas públicas, com a internalização e a gestão de recursos governamentais e de várias lideranças de organizações indígenas, que passaram a ocupar funções públicas e políticas na esfera da Administração Pública.
O dia 19 de Abril é o Dia do Índio. Esta data foi criada em 1943 pelo presidente da República Federativa do Brasil Getúlio Vargas através do decreto lei número 5.540. Mas porque foi escolhido o 19 de abril? Para entendermos a data, devemos rememorar a década de 1940 quando neste ano foi realizado no México, o I Congresso Indigenista Interamericano e no Congresso os princípios e metas a serem transformados em práticas - ou políticas indigenistas - foram formulados pelos países do continente americano. Além de contar com a participação de diversas autoridades governamentais dos países das Américas, vários líderes indígenas destes continentes foram convidados para participarem das reuniões e decisões. Porém, os índios brasileiros não compareceram nos primeiros dias do evento, pois estavam preocupados e temerosos. Este comportamento era compreensível, pois os índios há 5 ou 6 séculos estavam sendo perseguidos, agredidos e dizimados pelos “homens brancos”. No entanto, após algumas reuniões e reflexões, diversos líderes indígenas resolveram participar, após entenderem a importância daquele momento histórico-político. Esta participação ocorreu no dia 19 de abril, que depois foi escolhido, no continente americano, como o Dia do Índio. Com uma área de 42 189 120 km² e uma população de mais de 902 milhões de habitantes, corresponde a 8,3% da superfície total do planeta, ou 28,4% das terras emersas, e a 14% da população humana. Localizada entre o oceano Pacífico e o Atlântico, a América inclui o mar do Caribe e a Groenlândia, mas não a Islândia, por razões significativas históricas e culturais.
O
que dizem os críticos na América Latina e na Europa é que consideram o
movimento como instrumento a serviço dos estados nacionais para destruir a
identidade dos povos indígenas e integrá-los à uma cultura nacional homogênea,
o território histórico ou a pátria, os mitos, a memória histórica, a cultura de massa pública, os direitos legais, e a economia com mobilidade territorial para seus membros como as bases da identidade nacional. Henri Favre, define o indigenismo como “uma corrente de
pensamento e idéias que se organizam y se desenvolvem em torno da imagem do
índio. Se apresenta como uma interrogação da indianidade por parte dos “não
índios” em função de preocupações e finalidades próprias deles próprios”. Para Aubry (1982: 15), “o indigenismo não é senão uma resposta do
sistema a uma pergunta dos brancos: por que os países pluriétnicos estão
atrasados? Encobre então, uma hipótese: o indígena é um freio ao
desenvolvimento. Em vez de questionar a sociedade global e seu modelo de
desenvolvimento, deprecia a cultura indígena”. Do latim tribu, é o nome que se dá a
cada uma das divisões dos povos antigos, possuindo um território e com algum
tipo de comando, possuindo em comum a mesma ancestralidade. O termo era originalmente empregado para
designar cada uma das trinta divisões da Roma Antiga (mais tarde trinta e
cinco) formadas por cidadãos plebeus; também designam as doze divisões
originais do povo hebreu. Por extensão, aplicou-se, na antropologia, para
designar certos tipos de agrupamentos humanos, mas, por sua imprecisão, deixou
de ser usado tecnicamente.
Por sua origem europeia e uso na filosofia
colonialista da palavra para designar agrupamentos humanos nos diversos povos
primitivos conquistados ao longo do Globo, o termo ganhou oposição no meio
científico, não apenas por sua imprecisão como também por não atender às
divisões peculiares dos povos que pretendia reunir. O termo nos anos 1970
passou a ser usado por correntes científicas não evolucionistas. Alguns dos
autores que a aboliram argumentam que se trata de “ficção etnográfica e
acadêmica”. Estes conceitos
de tribo, bem como o de tribalismo, etnicidade, clã e linhagem trazem forte
vício colonialista e neocolonialista, com apoio da antropologia que então lhe
servia, devem ser evitados, por também trazerem inerentes divisões no âmbito da
cultura global que visam, antes, ao domínio do que propriamente à compreensão
das realidades que procuram retratar. Como exemplo deste mau uso cita-se os
meios de comunicação de massa que mascaram os problemas africanos como
decorrentes de conflitos tribais, ocultando assim as reais causas étnicas, rituais,
políticas e de organização sociais. O antropólogo Cardoso de Oliveira ressalta
que conceitos de tribo e etnia surgem da ótica europeia para definir as
sociedades asiáticas, ameríndias e africanas, dotando-os de um rótulo comum que
lhes abstrai sua historicidade, em definições determinadas pelo processo político de segregação e colonização.
Contudo,
do ponto de vista da globalidade/totalidade o antropólogo Darcy Ribeiro foi
aquele que num projeto ambicioso em seus estudos de antropologia da civilização
mais contribuiu, nos dias de hoje, para precisar o conceito de “processo
civilizatório”. Em sua démarche intelectual transita à vontade tanto pelos
caminhos ocidentais como pelas veredas do mundo tribal amazônico, ou pelos
corredores de mais de dois “palácios de governo”. Seu compromisso é vital, não
setorial; produz-se na cátedra, na prolongada e boa convivência com os índios,
na criação de universidades, dentro e fora do Brasil, como ministro da Educação
ou como chefe da Casa Civil, como preso político, nas peregrinações do exílio,
e finalmente, como romancista com Maíra (1975) e O Mulo (1987) onde prepara o
terreno para sua etnobiografia antevista em Ensaios Insólitos (1979), Utopia
Selvagem (1982), Testemunho (1991) ou, como consta no Prólogo de seu
derradeiro livro Confissões (1997). Em verdade, um
fragmento da vida latino-americana da década de 1950 até
nossos dias, pode se documentar seguindo-se o rastro aberto por Darcy
Ribeiro.
Traçou o plano de uma obra que
incluiu, entre outros aspectos, a chamada “revolução humana”; as experiências
junto às “formações pré-agrícolas”; um estudo sobre a “revolução agrícola” e
sobre as “aldeias agrícolas indiferenciadas”; as “sociedades pastoris”; a
“revolução urbana” e os “Estados rurais artesanais” e principalmente, - para o
que nos interessa o lugar da “revolução do regadio” e os “Impérios teocráticos
de regadio”, assim como a “revolução metalúrgica” e os “Impérios
mercantil-escravistas” que têm como consequência, grosso modo, a “revolução
mercantil”. O Autor examina os efeitos diferenciais das diversas fronteiras de
expansão econômica perante os grupos que classifica segundo a intensidade de
sua relação com a sociedade nacional. Este modelo de análise será desenvolvido
anos depois pelos projetos de investigação mais avançados da antropologia
brasileira. Por volta de 1957 - assinala Darcy - “haviam sido extintos só no
Brasil, 87 grupos [indígenas], dos 230 registrados em 1900”. Impávido, admite,
“o processo civilizatório é minha voz nesse debate. Ouvida, quero crer, porque foi traduzida para as línguas de nosso circuito ocidental, editada e reeditada muitas vezes e é objeto de debates internacionais nos Estados Unidos e na Alemanha. A ousadia de escrever um livro tão ambicioso me custou algum despeito dos enfermos de sentimentos de inferioridade, que não admitem a um intelectual brasileiro o direito de entrar nesses debates, tratando de matérias tão complexas. Sofreu restrições, também, dos comunistas, porque não era um livro marxista, e dos acadêmicos da direita, porque era um livro marxista. Isso não fez dano porque ele acabou sendo mais editado e mais lido do que qualquer outro livro recente sobre o mesmo tema” (cf. Ribeiro, 1995:14).
Além
disso, este plano é muito importante na medida em que o autor teve acesso a
obras que em sua maioria estavam sendo publicadas quase que imediatamente
“sobre o estudo das revoluções tecnológicas e na fixação dos modelos teóricos
das formações socioculturais”. Contou também com suas próprias experiências
concretas, com o “trabalho de campo”, como antropólogo junto a grupos indígenas
como os Guajá e os Xokléng, os índios Kadiuéu (1950) e particularmente a Arte Plumária dos Índios Kaapor (1957a) e, igualmente, sobre os
índios Urubus-Kaapor (1957b) e as
tribos do Xingu, entre outras pesquisas originalmente realizadas sobre os
índios no Brasil. Mesmo o livro de Stanley J. Stein e Barbara H. Stein, The Colonial Heritage of Latin America,
(Oxford University Press, 1970) publicado dois anos depois que o Processo Civilizatório (Ed. Civilização
Brasileira, 1968) onde inclui fontes bibliográficas importantes sobre a
Península Ibérica (1580-1800), sobre as colônias ibero-americanas com a
projeção da América Latina em sua fase neocolonial no século XIX, desconhece o “Diagrama
do Processo Civilizatório. Principais Focos de Irradiação, suas
Interpenetrações e Projeções sobre os Povos contemporâneos”, considerando a
importância do estudo de Darcy Ribeiro sobre antropologia das civilizações.
Repetem algumas de suas fontes etnográficas de pesquisa e referências
bibliográficas.
No
caso do assassinato do índio Pataxó, os meliantes são pertencentes a famílias de
classe média alta de grande poder aquisitivo e influência política. A lei é
clara: assassino é o indivíduo que mata
outra pessoa; quem comete homicídio, tirando a vida de outro ser humano:
polícia militar prende o assassino confesso. Desde a prisão os criminosos
contaram com regalias jurídicas a que nenhum outro preso comum tinha direito.
Apesar das críticas efetuadas pela promotora Maria José Miranda, que acompanhou
o processo nos primeiros cinco anos, os (04) quatro criminosos detidos tinham “direito
a tomar banho quente e manter cortinas em suas celas, além de ficarem de posse
da chave da própria cela”. Por motivos aparentemente desconhecidos, a promotora
pediu afastamento do caso antes do julgamento. G.N.A.J., foi encaminhado para o
centro de reabilitação juvenil do Distrito Federal, “onde ficou preso apenas
por três meses, apesar de ter sido condenado a 1 ano de reclusão”. Os outros 4 foram condenados (2001), a 14 anos de prisão “em regime integralmente
fechado por homicídio doloso”. Pelo crime não teriam direito a
benefícios, “mas, já no ano seguinte, receberam autorização para exercer
funções administrativas em órgãos públicos”.
Índios protestaram na Praça Pataxó, em Brasília, onde Galdino morreu.
Além
disso, três dos cinco rapazes chegaram a ser flagrados pela imprensa dominante
e hegemônica “se dirigindo em carro próprio até o presídio sem passar por
qualquer tipo de revista, após namorar e ingerir bebida alcoólica em um bar”. Em
agosto de 2004, foi concedido o livramento condicional aos quatro condenados.
Esse benefício foi recepcionado pela opinião pública como um atestado do “caráter
volúvel do Poder Judiciário frente à força político-econômica” e, evidentemente
revoltou os familiares do índio assassinado. A mídia também noticiou a
concessão do benefício, apesar de previsto em lei, como “certeza da impunidade”
(cf. Braga, 2012) para um crime considerado hediondo pela legislação
brasileira. O local do crime foi rebatizado como Praça do Compromisso. Foram colocadas duas esculturas relativas ao
assassinato de Galdino: uma delas retrata uma pessoa em chamas e a outra
representa uma pomba, o símbolo da paz.
Historicamente
como é sabido, mas, sobretudo no plano ideológico (totalidade) e cultural
(especificidade), no campo imaginário e simbólico, entre nós temos a
interiorização na naturalidade das desigualdades e a impossibilidade de lidar
com as diferenças étnicas, sexuais, religiosas, sociais e culturais.
Interiorização da naturalidade de que haja os “sem direito” e os “sem poder”,
reforçando a visão autoritária inclusivamente para a formação das relações
sociais e políticas no campo jurídico. Manutenção de um padrão imaginário
autoritário sobre o país, derivado da alternativa messiânica e milenarista que
presidiu o imaginário nos navegantes, dos viajantes e principalmente dos
evangelizadores, para os quais a América seria a concretização das profecias de
Isaías e de Daniel, da restauração do chamado “paraíso terrestre”.
Em
suma, a violência simbólica e política, com a penetração da religião católica,
como é bem documentadas de forma exemplar no filme de Roland Joffé, A Missão (The Mission, Londres, 1986, Flashback Home Vídeo, 125 min), alude as
representações sociais da “conquista”, “colonização”, “invasão”, “descobrimento”,
“achamento”, extermínio humano etc. com que a Europa implantou seu poder
técnico, político e militar nas Américas, quer se tratasse de espanhóis,
portugueses, ingleses, franceses etc. é apenas o índice estatístico de uma
morte irreparável: “a morte das grandes civilizações que”, como demonstra eloquentemente
Miguel León Portilla, “possuíam um sistema educativo, um mundo moral e
artístico e formas de relação humana em contínua evolução criativa”. Neste
sentido não só a América perdeu com isso: a Europa perdeu, pois ao caírem às
civilizações americanas desapareceram auspícios alternativos de relação e
imaginação que as sociedades indígenas americanas, mas também as europeias,
talvez tivessem precisado e de que certamente precisarão - in ixtli, in yolotl - aos problemas sociais para os quais a modernidade ocidental não dispõe de
respostas adequadas: relação com a natureza, ou, com a morte, como afirma Alejo
Carpentier em Los Pasos Perdidos.
Desta
forma é aceito que o etnocídio “é a supressão das diferenças culturais julgadas
inferiores e más”; é a aplicação de um princípio de identificação, de um
projeto de redução do outro ao mesmo, como ocorre, por exemplo, com o índio
amazônico suprimido como outro e reduzido ao tempo como cidadão brasileiro. Em
outras palavras, o etnocídio resulta na dissolução do múltiplo no Um. O que
significa agora o Estado? Ele é, por
essência, o emprego de uma força centrípeta que tende, quando as circunstâncias
o exigem, a esmagar as forças centrífugas inversas. O Estado se quer e se
proclama o centro da sociedade, o todo do corpo social, o mestre absoluto dos
diversos órgãos desse corpo. Descobre-se assim, no núcleo mesmo dessa
substância do Estado, a força atuante do Um, a vocação de recusa do múltiplo, o
temor e o horror da diferença.
Nesse nível formal em que nos situamos atualmente, afirma Pierre Clastres, “constata-se que a prática etnocida e a máquina estatal funcionam da mesma maneira e produzem os mesmos efeitos: sob as espécies da civilização ocidental ou do Estado, revelam-se sempre a vontade de redução da diferença e da alteridade, o sentido e o gosto do idêntico e do Um”. Isto porque, como compreendemos historicamente, as consequências imediatas da conquista e ocupação das áreas mais densamente povoadas da civilização indígena nas Américas foram etnocidas. O somatório de doenças epidêmicas como varíola, sarampo, febre tifoide, sífilis, a superexploração do trabalho e debilitação física resultante, de acordo com Martins, com a chegada do estranho (1993; 1997) para a aculturação de uma sociedade comunal orientada para o lucro, acabou por produzir nos séculos XVI e XVII um dos declínios demográficos mais desastrosos jamais registrados pela história mundial. Ou seja, “entre 1492 e 1550, a conquista literalmente aniquilara a população indígena caribenha, a primeira a ser submetida e dizimada. No México central, uma população de aproximadamente 25 milhões, em 1519 (...) achava-se reduzida a pouco mais de 1 milhão em 1605. Nos Andes centrais - para os quais dispomos de poucos estudos de história demográfica - parecem ter-se repetido os mesmos padrões gerais de destruição geográfica decorrente da ocupação espanhola. Um contingente populacional calculado entre 3,5 e 6 milhões (em 1525) foi reduzido para 1,5 milhão (por volta de 1561), somente retornando ao índice de 6 milhões cerca de 1754” (cf. Stein e Stein, 1976: 37).
Enfim, Integrante do Conselho Indigenista Missionário na Bahia, Haroldo Heleno garante ser mentira que os índios Pataxós Hã Hã Hãe, do sul da Bahia, realizam ocupações desde fevereiro deste ano e que tenham provocado violência na região, como divulgou recentemente a Rede Globo de Televisão. Nailton Muniz Pataxó, da Aldeia Milagrosa, no município baiano de Pau Brasil, acrescenta que a emissora e a imprensa local mentem ao divulgar que os índios lutam pela demarcação de terras e esclarecem que o objetivo é a anulação dos títulos de posse dos fazendeiros. “Na verdade a tribo indígena pede há 30 anos que os títulos sobre a área, uma reserva já demarcada em 1937, sejam anulados. Geralmente nas outras áreas existe uma disputa pela demarcação do território, essas já estão demarcadas”, afirma Heleno. Enfim, depois de décadas de disputa política, os índios pataxós obtiveram o reconhecimento do direito às terras na reserva Caramuru-Catarina Paraguassu, no sul da Bahia.
Nesse nível formal em que nos situamos atualmente, afirma Pierre Clastres, “constata-se que a prática etnocida e a máquina estatal funcionam da mesma maneira e produzem os mesmos efeitos: sob as espécies da civilização ocidental ou do Estado, revelam-se sempre a vontade de redução da diferença e da alteridade, o sentido e o gosto do idêntico e do Um”. Isto porque, como compreendemos historicamente, as consequências imediatas da conquista e ocupação das áreas mais densamente povoadas da civilização indígena nas Américas foram etnocidas. O somatório de doenças epidêmicas como varíola, sarampo, febre tifoide, sífilis, a superexploração do trabalho e debilitação física resultante, de acordo com Martins, com a chegada do estranho (1993; 1997) para a aculturação de uma sociedade comunal orientada para o lucro, acabou por produzir nos séculos XVI e XVII um dos declínios demográficos mais desastrosos jamais registrados pela história mundial. Ou seja, “entre 1492 e 1550, a conquista literalmente aniquilara a população indígena caribenha, a primeira a ser submetida e dizimada. No México central, uma população de aproximadamente 25 milhões, em 1519 (...) achava-se reduzida a pouco mais de 1 milhão em 1605. Nos Andes centrais - para os quais dispomos de poucos estudos de história demográfica - parecem ter-se repetido os mesmos padrões gerais de destruição geográfica decorrente da ocupação espanhola. Um contingente populacional calculado entre 3,5 e 6 milhões (em 1525) foi reduzido para 1,5 milhão (por volta de 1561), somente retornando ao índice de 6 milhões cerca de 1754” (cf. Stein e Stein, 1976: 37).
Enfim, Integrante do Conselho Indigenista Missionário na Bahia, Haroldo Heleno garante ser mentira que os índios Pataxós Hã Hã Hãe, do sul da Bahia, realizam ocupações desde fevereiro deste ano e que tenham provocado violência na região, como divulgou recentemente a Rede Globo de Televisão. Nailton Muniz Pataxó, da Aldeia Milagrosa, no município baiano de Pau Brasil, acrescenta que a emissora e a imprensa local mentem ao divulgar que os índios lutam pela demarcação de terras e esclarecem que o objetivo é a anulação dos títulos de posse dos fazendeiros. “Na verdade a tribo indígena pede há 30 anos que os títulos sobre a área, uma reserva já demarcada em 1937, sejam anulados. Geralmente nas outras áreas existe uma disputa pela demarcação do território, essas já estão demarcadas”, afirma Heleno. Enfim, depois de décadas de disputa política, os índios pataxós obtiveram o reconhecimento do direito às terras na reserva Caramuru-Catarina Paraguassu, no sul da Bahia.
O
Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o seguinte: “que são nulos todos os
títulos de propriedades concedidos a fazendeiros e agricultores sobre glebas
localizadas dentro da reserva, que tem 54 mil hectares”. A região tem registrado frequentes conflitos
sociais pela posse das terras. No final de abril, “um índio levou um tiro na
perna”. Apesar de o processo sobre a área pataxó não constar da pauta de
julgamentos do STF prevista para ontem, a ministra Cármen Lúcia pediu que a
ação fosse julgada diante da urgência e gravidade: - “Trata-se de um caso
insólito, excepcional. A situação é de extrema conflituosidade”, afirmou o
presidente do tribunal, Carlos Ayres Britto. Ele afirmou que a terra para o
índio “é uma alma” e não simplesmente um bem material. Nesse julgamento, o STF
atendeu a um pedido da Fundação Nacional
do Índio (FUNAI). O último a
votar, Ayres Britto seguiu o voto do Relator, Eros Grau (aposentado), proferido
no início do julgamento, em 2008. Ao final, foram 7 votos a 1 pela nulidade dos
títulos de propriedade de terras concedidas a fazendeiros e agricultores,
ficando vencido o ministro Marco Aurélio.
Os ministros Gilmar Mendes e Dias
Toffoli estavam impedidos, e Ricardo Lewandowski não participou em razão de
viagem para cumprir agenda oficial. Luiz Fux também não participou por suceder
o ministro Eros Grau. Para ontem estava marcado originalmente o julgamento de
uma ação que discute a adoção de sistemas de cotas no âmbito do Programa Universidade para Todos
(Prouni). Segundo eles, a “mídia tradicional” também não revela a precariedade
nos acampamentos. O líder Pataxó afirma que quase dois (02) mil índios
acampados passam fome. Eles se alimentam apenas de jaca e banana. As crianças
também não tomam leite. E a falta de atendimento médico levou à morte o irmão
do líder Pataxó. - “Talvez esse clima tenha sido criado propositalmente para
colocar a opinião pública contra os indígenas”, ressalta o conselheiro. Para
eles, “tem sido muito prejudicial para todo mundo. Tem se criado um clima de
muito terror e muita apreensão. A Rede Globo, em vários momentos, tem usado dado
que conduz a sociedade a uma opinião contrária aos índios” e completa: - “Agora
com a proximidade da ação a favor dos índios, a imprensa tem tentado conduzir a
sociedade contra eles, colocando-os como grandes vilões da história”. Um documento foi elaborado por cinco
caciques, 21 lideranças indígenas e presidentes de quatro associações, para
as denúncias.
Bibliografia geral consultada.
Bibliografia geral consultada.
RIBEIRO, Darcy, Os Índios e a Civilização. Rio de
Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1970; Idem, Uirá Sai à Procura de Deus. Ensaios de Etnologia e Indigenismo. Rio
de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1974; AUBRY, André, Indigenismo, Indianismo y
Movimientos de Liberación Nacional. San Cristóbal de las Casas: Instituto
de Assesoria Antropológica para la Región Maya, 1982; CARNEIRO DA CUNHA,
Manuela. Os Direitos dos Índios. São
Paulo: Editora Brasiliense, 1987; MARTINS, José de Souza, A Chegada do Estranho.
São Paulo: Editora Hucitec, 1993; PARAISO, Maria Hilda Baqueiro, Amixokori, “Pataxó, Monoxó, Kumanoxó, Kutatol, Maxakali, Malali e Makoni: Povos Indígenas Diferenciados ou Subgrupos de uma Mesma Nação? Uma Proposta de Reflexão”. In: Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia. São Paulo, nº 4, pp. 173-187, 1994; TODOROV, Tzvetan, Los Abusos
de la Memoria. Buenos Aires: Ediciones Paidós, 2000; ALMEIDA, Maria Regina
Celestino de, Os Índios na História do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fundação
Getúlio Vargas, 2010; PISTORI, Maria Helena Cruz, “Do Jornalístico ao Jurídico e do Jurídico ao Jornalístico: A Construção do Argumento”. In: Estudos Linguísticos. São Paulo, 40 (3), pp. 1458-1470, set-dez, 2011; COSTA, João Paulo
Peixoto, Disciplina e Invenção: Civilização e Cotidiano Indígena no Ceará
(1812-1820). Dissertação de Mestrado em História. Teresina: Universidade
Federal do Piauí, 2012; PIUBELLI, Rodrigo, Memórias e Imagens em Torno do Índio Pataxó Hãhãhãe Galdino Jesus dos Santos (1997 a 2012). Dissertação de Mestrado em História. Brasília: Universidade de Brasília, 2012; SILVA, Ayalla Oliveira, Camacãs,
Guerens, Pataxós e o Aldeamento São Pedro de Alcântara: Trabalho, Relações Interétnicas
e Ocupação do Território de Cachoeira de Itabuna, Sul da Bahia (1814-1877).
Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História. Instituto de
Ciências Humanas e Sociais. Seropédica: Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro, 2015; XAVIER, Maico Oliveira, Extintos no Discurso Oficial, Vivos
no Cenário Social: Os Índios do Ceará no Período do Império do Brasil –
Trabalho, Terras e Identidades Indígenas em Questão. Tese de Doutorado. Programa
de Pós-graduação em História Social. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará,
2015; entre outros.
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