Ubiracy de Souza Braga*
Mulheres yawalapitis que em 2012 homenagearam
Darcy Ribeiro - O Globo. Foto: André Coelho.
Escrevi estas “Confissões”, (1997), dizia Darcy
Ribeiro urgido por duas lanças. Meu “medo-pânico” de morrer antes de dizer a
que vim. Meu medo ainda maior de que sobreviessem as dores terminais e as
drogas heroicas trazendo com elas as bobeiras do barato. Bobo não sabe de nada.
Não se lembra de nada. Tinha que escrever ligeiro, ao correr da pena. Hoje, o
medo é menor, e a aflição também. Melhorei. Vou durar mais do que pensava. Se
nada de irremediável suceder, terei tempo para revisões. Não ouso pensar que me
reste vida para escrever mais um livro. Nem preciso, já escrevi livros demais.
Mas admito que tirar mais suco de mim nesta porta terminal é o que quisera.
Impossível? Este livro meu, ao contrário dos outros todos, cheios de datas e
precisões, é um mero reconto espontâneo, “como me vem à cabeça, o que me
sucedeu pela vida afora, desde o começo, sob o olhar de Fininha, até agora,
sozinho neste mundo”.
- “Muito relato será, talvez, equivocado em alguma
coisa”. Acho melhor que seja assim, para que meu retrato do que fui e sou saia
tal como me lembro. Neguei-me, por isso, a castigar o texto com revisões
críticas e pesquisas. Isso é tarefa de biógrafo. Se eu tiver algum, ele que se
vire, sem me querer mal por isso. Quero muito que estas minhas Confissões comovam. Para isso as
escrevi, dia a dia, recordando meus dias. Sem minhas “Confissões” comovam. Para isso as escrevi, dia
a dia, recordando meus dias. Sem nada tirar por vexame ou mesquinhez nem nada
acrescentar por tolo orgulho. Termino esta minha vida exausto de viver, mas
querendo mais vida, mais amor, mais saber, mais travessuras. A você que fica
aí, inútil, vivendo vida insossa, só digo: ‘Coragem! Mais vale errar, se
arrebentando, do que poupar-se para nada. O único clamor da vida é por mais
vida bem vivida. Essa é, aqui e agora, a nossa parte. Depois, seremos matéria
cósmica, sem memórias de virtudes ou de gozos. Apagados, minerais. Para sempre
mortos’” (cf. Ribeiro, 1997).
Na
Introdução à Fenomenologia Hegel repete
suas críticas a uma filosofia que não fosse mais que “teoria do conhecimento”.
E não obstante, a Fenomenologia, como
têm assinalado todos os seus comentaristas (cf. Wahl, 1951; Kojève, 1972;
Hypollite, 1974; Labarrière, 1975), demarca em certos aspectos um retorno ao
ponto de vista de Kant e de Fichte. Em que novo sentido deve-se subentendê-lo?
Ora, se o saber é um instrumento, modifica
o objeto de sua apreensão e não nos apresenta em sua pureza. Se for um meio tampouco,
nos transmite a verdade sem alterá-la de acordo com a própria natureza do meio
interposto. Se o saber é um instrumento, isto supõe que o sujeito do saber e
seu objeto de conhecimento se encontram separados. O Absoluto seria distinto do
conhecimento. Nem o Absoluto poderia ser saber de si mesmo, nem o saber poderia
ser saber do Absoluto. Contra tais pressupostos a existência mesma da ciência
filosófica e no âmbito da dialética que conhece efetivamente, é já uma
afirmação analogamente como realiza Darcy Ribeiro o saber e a consciência entre
os povos indígenas.
Enfim, se a Fenomenologia
é “o itinerário da alma que se eleva ao espírito por meio da consciência”, fora
de dúvida, a idéia de semelhante itinerário foi sugerida a Hegel pari passu com a convergência entre as
obras literárias. Como também aquelas que nos parecem referidas como “novelas
de cultura” tendo em vista a leitura feita sobre o Emílio, de Jean-Jacques
Rousseau. Ipso facto, na dita obra
encontrava uma primeira história da “consciência natural”, elevando-se por si
mesma à liberdade, através das experiências que lhe são próprias e que são
particularmente formadoras. Ou seja, ao “formar a coisa, forma-se a si mesmo”.
É neste sentido que apresentamos outro
Darcy Ribeiro, sem querer dizer mais do que já foi dito. Embora com a intenção
de religar sua démarche à questão
etnográfica e de formação da consciência dos povos Ameríndios.
Em verdade, um fragmento etnográfico importante nas
páginas da vida latino-americana da década de 1950 até os dias de hoje, pode se
documentar seguindo-se o rastro
aberto por Darcy Ribeiro. Traçou o plano de uma obra que incluiu, entre outros
aspectos, a chamada “revolução humana”; as experiências junto às “formações
pré-agrícolas”; um estudo sobre a “revolução agrícola” e sobre as “aldeias
agrícolas indiferenciadas”; as “sociedades pastoris”; a “revolução urbana” e os
“Estados rurais artesanais” e principalmente, – para o que nos interessa o
lugar da “revolução do regadio” e os “Impérios teocráticos de regadio”, assim
como a “revolução metalúrgica” e os “Impérios mercantil-escravistas” que têm
como consequência, grosso modo, a “revolução mercantil”. O Autor examina os
efeitos diferenciais das diversas fronteiras
comparativamente de expansão econômica perante os grupos que classifica segundo
a intensidade de sua relação com o espaço antrópico e social com a sociedade
nacional.
O antropólogo quando viveu entre indígenas
na Amazônia e no Pantanal brasileiro.
Este modelo de análise
será desenvolvido anos depois pelos projetos de investigação mais avançados da
antropologia brasileira. Por volta de 1957 – assinala Darcy – “haviam sido
extintos só no Brasil, 87 grupos [indígenas], dos 230 registrados em 1900”.
Impávido, admite, “o processo civilizatório é minha voz nesse debate. Ouvida,
quero crer, porque foi traduzida para as línguas de nosso circuito ocidental,
editada e reeditada muitas vezes e é objeto de debates internacionais nos
Estados Unidos e na Alemanha. A ousadia de escrever um livro tão ambicioso me
custou algum despeito dos enfermos de sentimentos de inferioridade, que não
admitem a um intelectual brasileiro o direito de entrar nesses debates,
tratando de matérias tão complexas. Sofreu restrições, também, dos comunistas,
porque não era um livro marxista, e dos acadêmicos da direita, porque era um
livro marxista. Isso não fez dano porque ele acabou sendo mais editado e mais
lido do que qualquer outro livro recente sobre o mesmo tema” (cf. Ribeiro,
1995:14).
Além disso, este plano é muito importante na medida em
que o Autor teve acesso a obras que em sua maioria estavam sendo publicadas
quase que imediatamente “sobre o estudo das revoluções tecnológicas e na
fixação dos modelos teóricos das formações socioculturais”. Contou também com
suas próprias experiências concretas como antropólogo junto a grupos indígenas
como os Guajá e os Xokléng, os índios Kadiuéu (1950) e particularmente a “Arte
Plumária dos Índios Kaapor” (1957a) e, igualmente, sobre os índios Urubus-Kaapor
(1957b) e as tribos do Xingu, entre outras pesquisas originalmente realizadas
sobre os índios no Brasil. Mesmo o livro de Stanley J. Stein e Barbara H.
Stein, “The Colonial Heritage of Latin América”, (Oxford University Press,
1970) publicado dois anos depois que o “Processo Civilizatório” (Ed.
Civilização Brasileira, 1968) onde inclui fontes bibliográficas importantes
sobre a Península Ibérica (1580-1800), sobre as colônias ibero-americanas com a
projeção da América Latina em sua fase neocolonial no século XIX, desconhece a
redução antropológica contida no “Diagrama do Processo Civilizatório.
Principais Focos de Irradiação, suas Interpenetrações e Projeções sobre os
Povos contemporâneos”, considerando a importância do estudo de Darcy Ribeiro
sobre antropologia das civilizações. Repetem algumas de suas fontes e
referências bibliográficas.
Isto é importante, repetimos, na medida em que com a
“revolução do regadio” Ribeiro compreendeu que alguns processos civilizatórios
brotaram de gestação autóctone, cumpridas passo a passo, como parece ter
ocorrido analogamente na Mesopotâmia e nas Américas. Outros podem ter surgido
da fecundação de um velho contexto cultural originalmente desenvolvida em
diferentes lugares. Mas o fundamental é que se configuram como formações socioculturais
“tão radicalmente diferenciadas das anteriores e das posteriores” que só podem
ser compreendidas “como uma nova etapa da evolução humana ou como fruto
amadurecido de uma nova revolução tecnológica, a do regadio” (cf. Ribeiro,
1968:94) que o levou mais adiante em “busca de explicações terra-a-terra” (sic)
para reconstituir o processo de formação dos povos americanos, com uma profunda
reflexão para explicar as causas do seu desenvolvimento.
- “Salto, assim, afirma ele, da escala de 10 mil anos
de história geral para os quinhentos anos da história americana com um novo
livro: As Américas e a Civilização, em que proponho uma tipologia dos povos
americanos, na forma de uma ampla explanação explicativa”. Ou seja, como vimos
com a referência ao Diagrama do Processo Civilizatório (cf. Ribeiro, 1968:53;
1995:15). A abordagem básica consistiu no desenvolvimento de uma metodologia
própria e inovadora que permitiu reunir os povos americanos em três categorias
gerais explicativas do seu modo de ser e elucidativas de suas perspectivas de
desenvolvimento humano. Essa tipologia etnográfica “possibilitou superar o
nível de análise meramente histórico, incapaz de generalizações, e focalizar
cada povo de forma mais ampla e compreensível do que seria praticável com as
categorias antropológicas e sociológicas habituais” (cf. Ribeiro, 1983a: 12).
A tipologia utilizada por Darcy Ribeiro foi elaborada,
como ele dizia, “com esse espírito”. O que nos faz compreender o seguinte: - “Em
lugar de transpor à América Latina esquemas desenvolvidos pela análise de
distintas situações históricas, procuramos elaborar uma tipologia fundada na
observação da realidade presente e na análise da formação das classes da
América Latina, a partir da estratificação social registrada nas metrópoles
ibéricas e do estudo de suas transformações posteriores. Nossa tipologia aqui
apresentada de forma sumária nada mais é, na verdade, do que um esquema de
posições correntes, e também mais fiel ao verdadeiro significado da teoria
marxista de classes sociais” (1983b: 66). Tais são os Povos-Testemunho (os mesoamericanos
que integram o México Asteca-Náhuatl); os Povos-Novos (os brasileiros, os
grã-colombianos, os antilhanos, os chilenos); os Povos-Transplantados (os
anglo-americanos, os rio-platenses) e os Povos-Emergentes (africanos e
asiáticos).
Os primeiros são constituídos pelos representantes
modernos das velhas civilizações autônomas sob as quais se abateu a expansão europeia.
O segundo bloco é representado pelos povos americanos plasmados nos últimos
séculos como um subproduto da expansão europeia pela fusão e aculturação de
matrizes indígenas, negras e europeias. O terceiro é integrado pelas nações
constituídas pela implantação de populações europeias no ultramar com a
preservação do perfil étnico, da língua e da cultura originais. Finalmente, os
últimos, representam as nações novas da África e da Ásia cujas populações
ascendem de um “nível tribal” (cf. Maffesoli, 1987: 95), onde a constatação
poética ou, mais tarde, psicológica da pluralidade da pessoa (“eu é um outro”),
pode ser interpretada, de um ponto de vista sócio-antropológico como expressão
de um continuun intangível, ou da condição de meras “feitorias coloniais” para
a de “etnias nacionais”. Só temos valor pelo fato de pertencermos a um grupo.
A primeira destas configurações designada como
Povos-Testemunho é integrada pelos sobreviventes de altas civilizações
autônomas que sofreram o impacto da expansão europeia. São resultantes modernos
da ação traumatizadora daquela expansão e dos seus esforços de reconstituição
étnica como sociedades nacionais modernas. Reintegradas em sua independência,
não voltam a ser o que eram antes, porque se haviam transfigurado
profundamente. Mais do que povos considerados atrasados na história, eles são
os povos espoliados da história. Séculos de subjugação ou de dominação direta
ou indireta impuseram-lhes profundas deformações que não só depauperaram seus
povos como também traumatizaram toda a sua vida cultural. Como problema básico,
enfrenta a integração dentro de si mesmo das duas tradições culturais de que se
fizeram herdeiros, não apenas diversas, mas, em muitos aspectos, contrapostas.
Atraídos ainda simultaneamente pelas duas tradições, mas incapazes de fundi-las
numa síntese significativa para toda a população, conduzem dentro de si o
conflito étnico entre a cultura original e a civilização colonizadora europeia.
Neste bloco, encontram-se a Índia, a China, o Japão, a
então Coréia unificada, a Indochina, os países islâmicos e alguns outros. Nas
Américas, são representados pelo México, pela Guatemala, bem como pelos povos
do Altiplano Andino; sobreviventes das populações Astecas e Maia, os primeiros,
e da civilização Incaica, os últimos. Dentre estes povos apenas o Japão e, mais
recentemente a China conseguiram incorporar às respectivas economias a
tecnologia industrial moderna e reestruturar suas próprias sociedades em novas
bases. Os dois núcleos de povos das Américas, como povos conquistados e
subjugados, sofreram um processo de compulsão europeizadora muito mais violento
do que resultou sua complexa transfiguração étnica. Seus perfis étnicos
nacionais conformam perfis neo-hispânicos metidos nos descendentes da antiga
sociedade, mestiçados com europeus e negros. Os demais povos apenas coloriram
sua figura étnico-cultural nas Américas, “a etnia neo-européia é que se tinge
com as cores das antigas tradições culturais, tirando delas características que
as singularizam”.
A segunda configuração, os “Povos-Novos”
constituíram-se pela confluência de contingentes díspares em suas
características raciais, culturais e linguísticas. Reunindo negros, brancos e
índios para abrir grandes plantações de produtos tropicais ou para a exploração
mineira, visando tão-somente atender aos mercados europeus e gerar lucros, as
nações colonizadoras acabaram por plasmar povos profundamente diferenciados de
si mesmas e de todas as outras matrizes formadoras. Estes contingentes básicos,
embora exercendo papéis distintos, entraram a mesclar-se e a fundir-se
culturalmente com maior intensidade do que em qualquer outro tipo de conjunção.
Assim, ao lado do branco, “chamado a exercer os papéis de chefia na empresa”
(por força das condições de dominação impostas aos demais); do negro, nela
“engajado como escravo”; do índio, “também escravizado ou tratado como mero
obstáculo a erradicar”, foi surgindo uma população mestiça que fundia aquelas
matrizes nas mais variadas proporções.
Etnograficamente os Povos-Novos surgem hierarquizados,
como os Povos-Testemunho, pela distância social que separa a sua camada
senhorial de fazendeiros, mineradores, comerciantes, funcionários coloniais e
clérigos da massa escrava engajada na produção. Constituíam-se de rudes
empresários, senhores de suas terras e de seus escravos, forçados a viver junto
a seu negócio e a dirigi-lo pessoalmente com a ajuda de uma pequena camada
intermédia, de técnicos, capatazes e sacerdotes. Onde a empresa prosperou
muito, como nas zonas açucareiras e mineradoras do Brasil e das Antilhas,
puderam dar-se ao luxo de residências senhoriais e tiveram de alargar a camada
intermédia, dos engenhos como das vilas costeiras, incumbidas do comércio
exterior.
Vale lembrar que nenhum dos povos deste bloco
constitui uma nacionalidade multiétnica. Em todos os casos, seu processo de
formação foi suficientemente violento para compelir a fusão das matrizes
originais em novas unidades homogêneas. Somente o Chile, por sua formação
peculiar, guarda no contingente Araucano, uma micro-etnia diferenciada da
nacional, historicamente reivindicante do direito de ser ela própria, ao menos
como modo diferenciado de participação na sociedade nacional. Os chilenos e os
paraguaios contrastam também com os outros Povos-Novos pela ascendência
principalmente indígena de sua população e pela ausência do contingente negro
escravo, bem como do sistema de plantation, que tiveram papel tão saliente na
formação dos brasileiros, dos antilhanos, dos colombianos e dos venezuelanos.
Ambos conformam, juntamente com a matriz étnica original dos rio-platenses, a
variante dos Povos-Novos.
A composição predominantemente “índio-espanhola” dos
Povos-Testemunho se diferencia dessa variante porque suas populações indígenas
originais não haviam alcançado um nível de desenvolvimento cultural equiparável
ao dos mexicanos ou dos Incas. É o resultado da seleção de qualidades raciais e
culturais das matrizes formadoras, que melhor se ajustaram às condições que
lhes foram impostas. O papel decisivo em sua formação foi representado pela
escravidão que, operando como força distribalizadora, desgarrava as novas
criaturas das tradições ancestrais. São produto tanto da deculturação redutora
de seus patrimônios tribais indígenas e africanos, quanto da aculturação
seletiva desses patrimônios e da própria criatividade face ao novo meio.
A terceira configuração analítica histórico-cultural é
representada pelos
Povos-Transplantados, correspondentes às nações modernas criadas pela migração
de populações europeias para novos espaços mundiais, onde procuram reconstituir
formas de vida essencialmente idênticas às de origem. Cada um deles
estruturou-se segundo modelos de vida econômica e social da nação de que
provinha, levando adiante, nas terras adotivas, processos de renovação que já
operavam nos velhos contextos europeus. Suas características referem-se à
homogeneidade cultural que mantiveram pela origem comum de sua população, ou
que plasmaram pela assimilação dos novos contingentes. A maioria destes
contingentes veio ter à América como trabalhadores rurais aliciados mediante
contr@tos que os submetiam a anos de trabalho servil “para ingressar na
categoria de granjeiros livres e de artesãos também independentes”.
Integram o bloco de Povos-Transplantados a Austrália e
a Nova Zelândia, em certa medida também os bolsões neoeuropeus de Israel, da
União Sul-Africana e da Rodésia. Nas Américas são representados pelos Estados
Unidos, pelo Canadá e também pelo Uruguai e a Argentina. Nos primeiros casos
tais povos nascem de projetos de colonização implantados sobre territórios,
cujas populações tribais foram dizimadas ou confinadas em reservations para que
uma nova sociedade neles se instalasse. No caso dos países rio-platenses, resultante
de um empreendimento peculiaríssimo da “elite crioula” – inteiramente alienada
e hostil à sua própria etnia de Povo-Novo. Concebidos como gente com mais
peremptória vocação para o progresso. A Argentina e o Uruguai resultam de
sucessão ecológica deliberadamente desencadeada pelas oligarquias nacionais e se
transforma em Povo-Transplantado. A população ladina e a gaúcha, originária da
mestiçagem dos povoadores ibéricos com o indígena, foi esmagada e substituída,
como contingente básico da nação, por um alude de imigrantes europeus.
Finalmente, o quarto bloco de povos extra-europeus do
mundo moderno é constituído pelos Povos-Emergentes. São integrados pelas
populações africanas que ascendem da condição tribal à nacional. Na Ásia
encontram-se também alguns casos de Povos-Emergentes que transitam da condição
tribal à nacional. Esta categoria não surgiu na América, apesar do avultado
número de populações tribais que, ao tempo da conquista, contavam com centenas
de milhares e com mais de um milhão de habitantes. Este fator, mais do que
qualquer outro, exprime a violência da dominação primeiro europeia que se
prolongou por quase quatro séculos, depois nacional, a que estiveram submetidos
os povos tribais americanos. Dizimados prontamente alguns deles, outros mais
lentamente, somente sobreviveram uns poucos que foram anulados como etnias e
como base de novas nacionalidades, enquanto seus equivalentes africanos e
asiáticos, apesar da violência do impacto que sofreram, ascendem hoje para a
vida nacional. A consciência étnica
percorre todo o mundo. Nunca as chamadas “minorias nacionais” foram tão
combativas como agora. Isto se pode constatar pela luta dos Bascos, Catalães,
Galegos, Bretões, Flamengos e de outras nacionalidades fanaticamente apegadas a
tudo que afirme seu caráter de etnias autônomas imersas em entidades multiétnicas.
Bibliografia geral consultada:
RIBEIRO, Darcy, O
Processo Civilizatório. Etapas da Evolução Sociocultural. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1968; Idem, Os
Índios e a Civilização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970; Idem,
Uirá Sai à Procura de Deus. Ensaios de
Etnologia e Indigenismo. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1974; Idem, “Por uma Antropologia melhor e mais nossa”. In: Encontros com a Civilização Brasileira
n˚ 15. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979a; Idem, “Antropologia ou a
Teoria do Bombardeio de Berlim” - Darcy Ribeiro entrevistado por Edilson
Martins. In: Encontros com a Civilização
Brasileira n˚ 12. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979b; Idem, Ensaios Insólitos. Porto Alegre:
L&PM Editores, 1979c; Idem, “Nosotros Latino-Americanos”. In: Encontros com a Civilização Brasileira.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982a; Idem, Utopia Selvagem. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1982b; Idem, As Américas e a Civilização, Processo de
Formação e Causas do Desenvolvimento Desigual dos Povos Americanos.
Petrópolis (RJ): Vozes, 1983a; Idem, O
Dilema da América Latina: Estruturas de Poder e Forças Insurgentes.
Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1983b; Idem, Testemunho. Rio de Janeiro: Editora Siciliano,
1991; Idem, “Tiradentes Estadista”. In: A
sagração da liberdade: heróis e mártires da América Latina. Rio de Janeiro:
Revan, 1994; Idem, O Povo Brasileiro: A
Formação e o Sentido do Brasil. 2ª edição. São Paulo: Editora Companhia das Letras,
1995; Idem, Mestiço é Que é Bom. Rio
de Janeiro: Editora Revan, 1996; Idem, Confissões.
São Paulo: Companhia das Letras, 1997, entre outros.
____________________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
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