Ubiracy
de Souza Braga*
“Aprendi com o
povo e com a vida, sou um escritor e não um literato, em verdade sou um obá”. Jorge
Amado
Jorge Leal Amado de Faria foi um dos mais famosos e
traduzidos escritores brasileiros de todos os tempos. Ele é o autor mais adaptado da televisão
brasileira, dentre verdadeiros sucessos como: “Tieta do Agreste”, “Gabriela,
Cravo e Canela” e “Teresa Batista Cansada de Guerra” são criações suas, além de
“Dona Flor e Seus Dois Maridos” e “Tenda dos Milagres”. A obra literária de
Jorge Amado conheceu inúmeras adaptações para cinema, teatro e televisão, além
de ter sido tema de escolas de samba por todo o Brasil. Seus livros foram
traduzidos em 55 países, em 49 idiomas, existindo também exemplares em braile e gravações para “deficientes
visuais”. Em 1994 viu sua obra ser reconhecida com o Prêmio Camões. Mas na terá onde nasceu havendo
dúvidas burocráticas sobre seu local de nascimento, foi registrado no povoado de Ferradas,
pertencente a Itabuna, Bahia.
Como escritor engajado recebeu os seguintes prêmios como pensador político e escritor: “Lênin da Paz” (Moscou, 1951); “Prêmio de Latinidade” (Paris, 1971); “Prêmio do Instituto Ítalo-Latino-Americano” (Roma, 1976); “Prêmio Risit d`Aur” (Udine, Itália, 1984); “Prêmio Moinho”, (Itália, 1984); “Prêmio Dimitrof de Literatura” (Sofia, Bulgária, 1986); “Prêmio Pablo Neruda”, da Associação de Escritores Soviéticos (Moscou, 1989); “Prêmio Mundial Cino Del Duca” da Fundação Simone e Cino Del Duca (1990); e “Prêmio Camões” (1995). No Brasil: “Prêmio Nacional de Romance”, do Instituto Nacional do Livro (1959); “Prêmio Graça Aranha” (1959); “Prêmio Paula Brito” (1959); “Prêmio Jabuti” (1959 e 1995); “Prêmio Luísa Cláudio de Sousa”, do Pen Club do Brasil (1959); “Prêmio Carmen Dolores Barbosa” (1959); “Troféu Intelectual do Ano” (1970); “Prêmio Fernando Chinaglia” (1982); “Prêmio Nestlé de Literatura”, (1982); “Prêmio Brasília de Literatura - Conjunto de obras” (1982); “Prêmio Moinho Santista de Literatura” (1984); “Prêmio BNB de Literatura (1985)”.
Escritor profissional, no sentido da “literatura como
missão” (cf. Sevcenko, 1983) viveu exclusivamente dos direitos autorais dos
seus livros. A relevância abordada, por Sevcenko, em sua obra está ligada às
estratégias do esquecimento no Brasil que têm seus marcos simbólicos no começo
do regime republicano, com a histórica “queima dos arquivos” sobre a escravidão a mando do
ministro plenipotenciário das Finanças, Rui Barbosa, teórico do Direito racista, defensor da modernização
do país ao estilo anglo-saxônico. No plano das ideias e mentalidade e prócer da criação literária Jorge
Amado fora simpatizante do candomblé, aliás, mais do que isso, religião na qual exercia o posto de honra
de “Obá de Xangô” no Ilê Opó Afonjá,
do qual muito se orgulhava como homem de fé. Amigos que Jorge Amado prezava no
candomblé eram as mães-de-santo: Mãe Aninha, Mãe Senhora, Mãe Menininha do
Gantois, Mãe Stella de Oxóssi, Olga de Alaketu, Mãe Mirinha do Portão, Mãe
Cleusa Millet, Mãe Carmem e o pai-de-santo Luís da Muriçoca. Analogamente, como
Érico Veríssimo e Rachel de Queiroz, é representante do modernismo
regionalista.
Além do reconhecimento que o fardão de imortal da
Academia Brasileira de Letras proporcionou, o escritor recebeu o título de doutor honoris causa em universidades
europeias e centenas de homenagens ao longo da vida. Mas orgulhava-se,
sobretudo das distinções concedidas no universo do candomblé. Não à toa, o romancista escolheu o orixá Exu, entidade da comunicação, da paciência, da ordem e da disciplina, desenhado
pelo amigo Carybé, como marca pessoal. Trata-se de uma figura da mitologia
ioruba que simboliza o movimento e a passagem. Exu está associado à
transgressão de limites e fronteiras. A escolha indica tanto a filiação à
cultura popular como a
valorização da arte de transitar entre universos culturais diferentes. Apesar de sua amizade com Pablo Neruda,
Mario Vargas Llosa, Oscar Niemeyer, Darcy Ribeiro e Gabriel Garcia Márquez - e
do amplo reconhecimento de sua obra, Jorge Amado recusava pompa ou grandeza à
sua trajetória de vida.
Quando Jorge Amado publicou seu primeiro romance, “O
país do carnaval”, em 1931, era só um rapazote de dezenove anos de idade. O
livro narra a história de um jovem, Paulo Rigger, perplexo diante das
dificuldades do mundo e ainda indeciso quanto ao caminho a tomar. Reflete, com
nitidez, a alma agitada e inquieta do jovem Jorge, que, desejando entregar-se à
literatura, se sentia desorientado e escrevia para dar ordem a essa confusão.
Romance de formação, “O país do Carnaval” é um livro que guarda alguns dos
melhores atributos da juventude: a busca frenética do novo, uma forte
efervescência interior e o desejo obstinado de acertar. Mas Jorge Amado ainda
era um autor universal. O Brasil que o jovem Rigger reencontra quando retorna
de Paris é um país que lhe parece estranho e mesmo incompreensível. Um país que
lhe inspira mais dúvidas do que certezas, como se representasse ideologicamente um país do futuro. É uma imagem trêmula, inconclusa, indefinida,
de um país que ainda está por construir seu projeto de nação. E caberá a ele,
Jorge Amado, fazer isso.
No ano de 1932, muda-se para um apartamento na bela
praia de Ipanema, Rio de Janeiro, com o poeta Raul Bopp. Conhece José Américo de Almeida,
Amando Fontes, Rachel de Queiroz, através de quem se aproxima dos comunistas e
Gilberto Freyre. Sai a segunda edição de “O país do carnaval” (1931; 1937),
desta vez com tiragem de dois mil exemplares. Aconselhado por Otávio de Faria e
Gastão Cruls, desiste de publicar o romance “Rui Barbosa nº. 2”, pois, para
eles, o livro não passava de uma repetição ou cópia de “O país do carnaval”.
Viaja para Pirangi, na Bahia; impressionado com a vida dos trabalhadores da
região, publica “Cacau” com capa e ilustrações de Santa Rosa. O livro esgota-se
em um mês. Entre a 1ª e 2ª edição de Cacau, Jorge tem acesso, através de José
Américo de Almeida, aos originais de “Caetés”, romance de Graciliano Ramos.
Empolgado com o talento do escritor alagoano, viaja para Maceió para
conhecê-lo, iniciando uma amizade que duraria até a morte de Graciliano.
Conhece também José Lins do Rego, Aurélio Buarque de Holanda e Jorge de Lima.
Torna-se Redator-chefe da revista “Rio Magazine”. Casa-se em dezembro com
Matilde Garcia Rosa. Juntos publicam pela Editora Schmidt, o livro infantil:
“Descoberta do mundo”.
Este Brasil mais pobre e mais infeliz continuará a desfilar
pelas obras seguintes. Em 1934, lança “Suor” quando desloca o foco da vida no
campo para as ruas das cidades - no caso, a cidade de Salvador. O romance
revela a vida miserável de moradores de um sobrado do bairro histórico do
Pelourinho. De certa forma, muito torta, evoca “O Cortiço”, já famoso romance
que o escritor maranhense Aluísio Azevedo publicou em 1890. Tanto no campo como na
cidade, as adversidades - e a luta dos homens simples para superá-las -
desenham uma imagem áspera, mas calorosa, da vida brasileira. Mais uma vez
Jorge Amado se inspirou em uma experiência pessoal:
na adolescência viveu algum tempo em um dos casarões do Pelourinho há quase 470 anos, ainda em meio à vegetação nativa, Salvador começava a ser construída na região que até hoje abriga o coração da cidade: o Centro Histórico. De sua vida
e de sua memória mais uma vez, dialeticamente literatura e vida se misturam com a questão política e se alimentam
afetivamente como o fogo da paixão.
O romance “Mar morto” (1936) é outro exemplo da
simbiose entre Jorge Amado e o Brasil. A dialética se estabelece da seguinte
forma: Cada vez que escreve sobre si, ele escreve sobre o Brasil. Cada vez que
retorna às lembranças íntimas em busca das conexões perdidas no passado, são
fios da vida brasileira que puxa para perto de si. Depois de tratar da vida no
campo e nos bairros populares da cidade, Jorge se debruça, em “Mar morto”, sobre
a vida no mar. O livro narra a história e os amores de heroicos pescadores que,
em precários saveiros, sobrevivem enfrentando o oceano. A cada madrugada a
morte os espera no mar imenso. Nesse livro, a imagem destemida do homem
brasileiro se engrandece ainda mais. Ele agora não é só um lutador, mas um
homem que - como o herói Guma, que se afoga no mar - se aproxima do mito. Um
herói que, reencenando os relatos antropológicos da Odisseia, de Homero,
assim como a Ilíada, um poema elaborado ao longo de séculos de tradição oral, tendo tido sua forma fixada por escrito, enfrenta as forças da natureza e as armadilhas do destino nelas guardadas, e
sai cada vez mais fortalecido. É a história do herói de mil estratagemas que tanto vagueou, depois de ter destruído a cidadela sagrada de Troia, viu cidades e conheceu costumes de homens e que compreendendo o mar padeceu mil tormentos. Mãe Senhora, Zélia Gattai, Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Jorge Amado.
Além dessas, mais uma característica da literatura de
Jorge Amado (qualidade, também, de sua vida pessoal) amadurece: a consciência
social (Hegel) e o engajamento político (Marx). Publicado em 1935, “Jubiabá”
reafirma, ainda com mais determinação, que o espírito lutador do brasileiro
desemboca, necessariamente, nessa combinação de elementos que levam Jorge Amado
a escrever, mais à frente, livros de forte espírito didático e baseados em sua dialeticidade - isto é, a divisão do
mundo entre os adeptos do bem e os do mal. Escrito em 1943, “Terras do sem-fim”
faz uma dura descrição da vida miserável nos grandes latifúndios da Bahia, como
em “São Jorge dos Ilhéus”, de 1944, também trata das disputas políticas, em um
cenário dominado pelo regime de semiescravidão. Escreve ainda livros de grande
importância histórica como “O cavaleiro da esperança”, biografia do líder
comunista Luís Carlos Prestes, em que trabalhou no ano de 1945, durante um
breve exílio na Argentina e, depois, no Uruguai. Neste ano Jorge Amado se
tornou vice-presidente do I Congresso dos
Escritores, quando fez duras críticas ao regime fascista do Estado Novo
(1937-46). Com o fim do Estado Novo, tornou-se deputado federal pelo Partido Comunista do Brasil (PCB) e se
casou com a escritora, fotógrafa e memorialista anarquista Zélia Gattai.
Baiana por merecimento, Zélia Gattai recebeu em 1984 o
título de “Cidadã da Cidade do Salvador”. Na França, recebeu o título de
“Cidadã de Honra da Comuna de Mirabeau” (1985) e a “Comenda des Arts et des
Lettres”, do governo francês (1998). Recebeu ainda, no grau de comendadora, as
ordens do Mérito da Bahia (1994) e do Infante Dom Henrique (Portugal,1986). A
prefeitura de Taperoá, no estado da Bahia, homenageou Zélia Gattai dando o nome
da escritora à sua Fundação de Cultura e Turismo, em 2001. Neste ano foi eleita
para a Academia Brasileira de Letras, para a cadeira 23, anteriormente ocupada
por Jorge Amado, que teve Machado de Assis como primeiro ocupante e José de
Alencar como patrono. No mesmo ano, foi eleita para a Academia de Letras da
Bahia e para a Academia Ilheense de Letras. Em 2002, tomou posse nas três. No lançamento do livro: “Jorge Amado: um
baiano romântico e sensual” (2002), em Salvador, estavam pessoas como Antônio
Carlos Magalhães, Sossó, Calasans Neto, Auta Rosa, Bruna Lima, Antônio
Imbassahy e James Amado, entre outros. Ao lançar seu primeiro livro, “Anarquistas
graças a Deus”, Zélia Gattai recebeu o “Prêmio Paulista de Revelação Literária”,
de 1979. No ano seguinte, recebeu o “Prêmio da Associação de Imprensa”, o “Prêmio
McKeen” e o “Troféu Dante Alighieri”.
A Secretaria de Educação do Estado da
Bahia concedeu-lhe a “Medalha Castro Alves”, em 1987. Em 1988, recebeu o “Troféu
Avon”, como destaque da área cultural e o “Prêmio Destaque do Ano de 1988”,
pelo livro: “Jardim de inverno”. O livro de memórias: “Chão de meninos”,
recebeu o “Prêmio Alejandro José Cabassa”, da União Brasileira de Escritores,
em 1994. O casamento aproximou-a de intelectuais como Oswald de
Andrade, Lasar Segall, Tarsila do Amaral, Mário de Andrade, Rubem Braga e
Vinicius de Moraes. Essa radicalização política de sua literatura se prolonga
durante o exílio de Jorge e Zélia em Praga, na Tchecoslováquia, no início dos
anos 1950, quando escreveu “O mundo da paz”, livro de reportagens sobre o
socialismo. Até que, em 1954, pouco depois de publicar os três volumes de “Os
subterrâneos da liberdade” - romance ambientado na resistência ao Estado Novo -
Jorge Amado viveu um grande golpe pessoal. Naquele ano, durante o XX Congresso do Partido Comunista Soviético,
o secretário-geral do partido, Nikita Khruchióv, denunciou publicamente as
atrocidades cometidas pelo ditador Josef Stálin, que esteve no poder de 1922
até 1953, ano de sua morte. A revelação representou uma grande decepção para
Jorge Amado que em 1951 recebera, em Moscou, o Prêmio Internacional Stálin. Uma
radical metamorfose íntima o afastou da visão internacionalista, pautada
pela doutrina do comunismo, e o aproximou ainda mais do Brasil e da realidade
brasileira, ampliando seu olhar sobre nosso país.
Esta reviravolta se refletiu, cinco anos depois, no
extraordinário romance “Gabriela, cravo e canela”, livro que marca sua ruptura com uma visão
mais ortodoxa do mundo literário e que se consagrou com um de seus maiores sucessos da literatura internacional. O
romance o lança, de vez, em uma nova visão do Brasil e do mundo, agora não mais
esquemática, ou programática, mas viva, cheia de contradições e de
incongruências - como a realidade, de fato, é. Outro sinal dessa mudança
aparece na novela “A Morte e a Morte de Quincas Berro D`água”, que ele publica
em 1959 e que é, nos aspectos literários, seu livro mais sofisticado. Nesta obra,
Jorge Amado finda a visão mais esquemática do real, que caracterizou seus
primeiros romances. Quincas Berro D`água é um personagem que desafia a morte.
Arremeda, os escritores que, com sua imaginação mágica, ultrapassam os limites da realidade e desafiam as leis da
natureza. Ele não é um resignado, mas um insubmisso. Contudo, se é inútil
revoltar-se, para lembrarmo-nos de Michel Foucault, sua crítica analítica
imiscui-se muito além da rebeldia contra as mazelas sociais. E progressivamente se expande para uma revolta
contra os limites da condição humana e as determinações do destino.
Em 1961, mais próximo ainda das coisas brasileiras,
Jorge Amado foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Em 1964, com o
livro “Os pastores da noite”, a presença do candomblé (cf. Prandi, 1995a;
1995b; 2001) e do misticismo afro-brasileiro se tornam ainda mais presentes em
sua literatura. Se com “Gabriela...”, ele reforça as tintas no retrato de um
Brasil sensual e otimista, habitado por gente que tem uma alegria absolutamente
indiferente às contingências sociais, em “Os pastores” ele volta a enfatizar a
figura de um país no qual o espiritualismo e a religiosidade se agigantam. As
forças místicas e irracionais se tornam, em definitivo, mais potentes que as
circunstâncias sociais e políticas. Mas é com a publicação de “Dona Flor e seus
dois maridos”, em 1966, que Jorge Amado se consagra “como o grande retratista
do Brasil”. Neste ínterim, não há escritor brasileiro que tenha imagem pessoal tão ligada ao país quanto ele. E isto começa. talvez, quando ele publicou seu primeiro romance O país do carnaval em 1931, pois era um rapaz de dezenove anos de idade. A primeira adaptação de um romance de Jorge Amado no
exterior ocorreu no ano de 1941, quando “Mar morto” se tornou uma radionovela
na emissora El Mundo, da Argentina - e
que ajudou os argentinos a entender um pouco mais seus vizinhos brasileiros.
Dez anos mais tarde, consequência das fortes ligações com o movimento comunista
internacional, “O cavaleiro da esperança” se tornou uma radionovela na oficial
da Tchecoslováquia. é um tipo de drama radiofônico no formato de uma narrativa folhetinesca sonora, nascida da dramatização do gênero literário novela, produzida e divulgada em rádio, principalmente na América Latina. Na chamada era de ouro do rádio, as radionovelas foram fundamentais para que a história do rádio brasileiro se configurasse. Em 1961, a Metro-Goldwyn-Mayer comprou os direitos de
adaptação literária de “Gabriela”, projeto que, no entanto aparentemente fracassou. Mas foi adaptado
para o cinema em 1983, com direção de Bruno Barreto e com a atriz Sônia Braga no
papel-título. O ator Marcello Mastroianni interpretou Nacib. Entre outras adaptações
no exterior: “Capitães da Areia”, realizada, em 1970, pelo diretor de cinema norte-americano
Hall Bartlett, com Kent Lane e Tisha Sterling. Em 1975 o cineasta francês
Marcel Camus - que já adaptara o “Orfeu da Conceição”, de Vinicius de Moraes,
para o cinema, conquistando a Palma de Ouro do Festival de Cannes - levou “Os
pastores da noite” para a telona. A cada lançamento, não é só a literatura de
Jorge Amado que se dissemina que ela carrega e difunde.
Em 1977, “Tenda dos Milagres” no cinema sob a direção de
Nelson Pereira dos Santos, com Hugo Carvana e Anecy Rocha. Em 1996, foi a vez
de o cineasta Cacá Diegues dirigir “Tieta do Agreste”, com o talento e a beleza
de Sônia Braga no papel-título.
Na sequência temos “Tenda dos Milagres”, adaptada por
Aguinaldo Silva, em 1985, “Capitães da Areia”, por José Louzeiro e Antonio
Carlos Fontoura, em 1989, “Tereza Batista”, por Vicente Sesso, em 1992, “Dona
Flor...”, por Dias Gomes, em 1997, e “Pastores da noite”, por Maurício Farias e
Sérgio Machado, em 2002, que se transformaram em minisséries de consumo fácil pelos telespectadores globais. Atores reconhecidos do porte de
Sônia Braga, Nelson Xavier e Betty Faria tiveram interpretações consagradoras
de personagens de Jorge Amado, quando comparativamente o cantor, compositor e violonista João Gilberto é reconhecido como o pai da Bossa Nova - voz da faixa e do disco símbolos do estilo, Chega de Saudade, e um dos principais representantes da projeção internacional da música brasileira na década de 1960. Enquanto assistia na TV às encenações das
histórias de Jorge, o Brasil via a si mesmo, e aprendia quem estava
predestinado a ser. A identidade entre Jorge Amado e o Brasil também
chegou às escolas de samba. Em 1989 o Império Serrano, do subúrbio de
Madureira, no Rio de Janeiro, levou para a avenida o samba-enredo: “Jorge
Amado, Axé, Brasil” do G. R. E. S - Grêmio Recreativo Escola de Samba Império
Serrano.
A extraordinária Casa do Rio Vermelho com programação Especial no mês de agosto, em Salvador, Bahia. Jorge Amado é um dos autores brasileiros mais
publicados em todo o mundo. Sua obra foi editada em 55 países, e vertida para
49 idiomas e dialetos: albanês, alemão, árabe, armênio, azeri, búlgaro,
catalão, chinês, coreano, croata, dinamarquês, eslovaco, esloveno, espanhol,
esperanto, estoniano, finlandês, francês, galego, georgiano, grego, guarani,
hebraico, holandês, húngaro, iídiche, inglês, islandês, italiano, japonês,
letão, lituano, macedônio, moldávio, mongol, norueguês, persa, polonês, romeno,
russo, também três em braile, sérvio, sueco, tailandês, tcheco, turco,
turcomano, ucraniano e vietnamita. De sua experiência acadêmica e notadamente política, bem como para
retratar os casos dos imortais da Academia Brasileira de Letras (ABL), escreveu: “Farda,
Fardão, Camisola de Dormir”, numa alusão ao formalismo da entidade e à aparente
senilidade de seus membros. O livro tem como cenário os ecos da cidade do Rio de Janeiro e seus personagens transitam pelo mundo da Academia Brasileira de Letras na conjuntura política fascista do Estado Novo (1937-45). Segundo Antônio Carlos Villaça é a representação da novela, longe da sua saga baiana, uma fábula carioca e mundana, com intrigas em torno de uma eleição acadêmica, nos anos 1940.
Comprada em 1960 com dinheiro da venda dos direitos do livro “Gabriela, Cravo e Canela”, de Jorge Amado, para a MGM, a casa mais tarde se transformou no título do livro de Zélia Gattai publicado em 2002, narrando a história social vivida pelo casal quando residiu no imóvel. No local, os escritores receberam visitas ilustres, como do cineasta Glauber Rocha, Pablo Neruda, Tom Jobim, Dorival Caymmi, Roman Polanski, Jack Nicholson, Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir, só para citar alguns.Toda essa riqueza é ilustrada nos diversos ambientes da casa, com seus mais de dois mil metros quadrados, incluindo o jardim onde as cinzas de Jorge e Zélia estão formalmente depositadas. A Casa do Rio Vermelho conta com mais de 30 horas de cine-vídeos e projeções. Ou seja, é impossível conhecer toda a história do imóvel e do casal de escritores em apenas uma visita. Para tornar mais didática a experiência de mergulhar na intimidade de Jorge Amado e Zélia Gattai, a casa foi dividida em vários espaços temáticos, entre política, cultura e arte literária mantendo sempre as características originais, ma sobretudo a riqueza do acervo, da memória e de documentos importantes, como cartas trocadas com personalidades nacionais e internacionais. Bibliografia geral consultada.
AMADO, Jorge, Capitães de Areia. Rio de Janeiro:
Editor José Olympio, 1937; Idem, Vida de
Luiz Carlos Prestes: El Cabalero de la Esperanza. Prefácio del Mayor Carlos
da Costa Leite. Buenos Aires: Ediciones Claridad, 1942; Idem, Homens e Coisas do Partido Comunista.
Rio de Janeiro; Belo Horizonte, 1946 (Cultura Popular); Idem, O Mundo da Paz: União Soviética e
Democracias Populares. Rio de Janeiro: Vitória, 1952; Idem, Os Subterrâneos da Liberdade. São Paulo:
Editora Martins Fontes, 1954, 3 volumes; WARAT, Luis Alberto, A Ciência Jurídica e Seus Dois Maridos. Santa Cruz do Sul:
Faculdades Integradas de Santa Cruz do Sul, 1985; PRANDI, Reginaldo, “Dei
Africani nell’ Odierno Brasile: Introduzzione Sociologica al Candomblé”. In:
Luisa Faldini Pizzorno (org.), Solto le
acque abissali. Firenze: Ediciones Aracne, 1995; Idem, Mitologia dos Orixás. São Paulo: Editora Companhia das Letras,
2001; SODRÉ, Muniz, Corpo de Mandinga.
Salvador: Editora Manati, 2002; ANTUNES, Ana Luiza
Rodríguez, Homossexualidade: A Mestiçagem que Jorge Amado Não Viu: Um Estudo
sobre as Personagens Homossexuais nos Romances de Jorge Amado. Tese de Doutorado
em Letras. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul,
2009; SILVA, Alba
Valéria Tinoco Alves, O Trágico e o Cômico em “Dona Flor e Seus Dois Maridos”.
In: A Palo Seco. Ano 5, nº 5, vol. 1, pp. 67-77, 2013; DINIZ, Luis de
Melo, Representações da Infância Ultrajada e da Criança-herói: Uma Leitura de
Charles Dickens e Jorge Amado. Tese de Doutorado em Letras. João Pessoa:
Universidade Federal da Paraíba, 2013; MURACA, Márcio Henrique, Jorge Amado e o Judeu. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Estudos Judaicos e Árabes. Departamento de Letras Orientais. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015; FILGUEIRA, Pedro
Henrique da Silva, As Personagens Negras de Capitães de Areia em Cena: Diálogo
entre Literatura, Cinema e Teatro. Dissertação de Mestrado em Artes Cênicas.
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Norte: Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, 2015; BRUGGE, Úrsula Lima, Gabriela, Cravo e Canela: Subjetividade Feminina e
Resistência na Obra de Jorge Amado. Tese de Doutorado. Programa de Pós-graduação em Educação
Brasileira. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2015; entre
outros.
_______________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará.
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