“Papel
do juiz é resolver conflitos, e não criá-los”. Teori Zavascki
O
magistrado origina-se do latim magistratus, derivado de magister “chefe,
superintendente” que designa, em tempos passados, lato sensu, “um
funcionário do poder público investido de autoridade”. Desta forma um
Presidente da República, por exemplo, receberia o título de primeiro
magistrado. A palavra latina magistratus tanto significa a função de
governar (magistratura) como a pessoa que governa (magistrado). Na terminologia
do Império Romano, “magistrado” compreendia todos os detentores de cargos
políticos de consulado para baixo. De tal modo, os magistrados teriam poderes
derivados do imperium, interpretado como um poder de soberania de
caráter absoluto, derivado de fatores reais de poder, como a confiança de
exércitos e/ou de soberanos vizinhos. O magistrado exercia sua autoridade nos
limites de uma determinada atribuição, com poderes decorrentes de sua função,
como os juízes, os prefeitos, os governadores e presidentes. Na Antiguidade
havia diversos tipos de magistrados, como os cônsules, os pretores, os meirinhos-mor
(maiorinus-mor), os censores, considerados magistrados maiores, e os
edis e questores, os magistrados menores. No mundo contemporâneo a palavra
magistrado normalmente remete ao exercício do poder judiciário.
A
noção de magistratura, que em alguns países inclui juízes e procuradores, é
desconhecida nos países que adotam a common law como ocorre com o Reino
Unido, os Estados Unidos da América (EUA) ou o Canadá, que estendem as
garantias sociais constitucionais somente aos seus juízes, em senso estrito.
Também no Brasil, os magistrados são tão somente os juízes, membros do Poder
Judiciário, apesar de ambas as categorias (magistrados e membros do Ministério
Público) gozarem das garantias constitucionais de vitaliciedade,
inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos (subsídios). Por sua vez,
alguns países cuja estrutura legal está baseada no Direito Romano (países como
Itália, França, Alemanha, Espanha, Portugal) têm no seu corpo de magistrados
juízes e procuradores (ou promotores públicos). Magistrado ordinário
(Magistratus ordinarii e magistrado extraordinário (magistratus extraordinarii)
eram duas categorias de políticos, militares e em alguns casos, de poder
religioso. Os magistrados ordinários eram eleitos anualmente (exceto os
censores) para servir um ano. Os Magistrados Extraordinários eram eleitos só em
circunstâncias especiais.
A
administração se define através de um âmbito institucional-legal, baseada na
Constituição, leis e regulamentos. Originou-se na França, no fim do século
XVIII, mas só se consagrou como ramo autônomo do direito com o desenvolvimento
do Estado de Direito. Teve como base os conceitos de serviço público,
autoridade, poder público e especialidade de jurisdição. O gestor tem como função gerir,
administrar de forma ética, técnica e transparente a administração pública, quer
sejam órgãos, departamentos ou políticas públicas visando o bem da
comunidade a que se destina e em consonância com as normas legais e
administrativas vigentes. Na Europa, existem basicamente quatro modelos constitucionais
de gestão da administração pública, o modelo nórdico (Dinamarca, Finlândia,
Suécia e Países Baixos), o modelo anglo-saxão (Reino Unido e Irlanda), o modelo
renano ou continental (Áustria, Bélgica, França, Alemanha e Luxemburgo) e o
modelo mediterrâneo (Grécia, Itália, Portugal e Espanha). Na América Latina a
preferência é o modelo mediterrâneo, a exemplo do Brasil.
Vale
lembrar que a nação é um produto cultural, político e social que surge na
Europa a partir do fim do século XVIII e que se constitui efetivamente em uma “comunidade
política imaginada”. Nesse processo de construção histórica, a relação entre o
velho e o novo, o passado e o presente, a tradição e a modernidade é uma
constante e se reveste de importância fundamental, pois, a nação é uma
comunidade de sentimento que normalmente tende a produzir um Estado próprio, é
preciso invocar antigas tradições (reais ou inventadas) como fundamento natural
da identidade nacional que está sendo criada. Isso tende a obscurecer o caráter
histórico e relativamente recente dos Estados nacionais. Assim, como
Estado-nação procura delimitar e zelar por suas fronteiras geopolíticas, ele
também se empenha em demarcar suas fronteiras culturais, estabelecendo o que
faz e o que não faz parte da nação. Através desse processo se constrói uma
identidade nacional que procura dar uma imagem à comunidade abrangida por ela.
Nesse sentido o processo de consolidação dos Estados-nações é extremamente
recente. Mesmo em sociedades que atualmente parecem ser bem integradas.
Esta
exploração humana dos trópicos não se processou, em verdade, por um
empreendimento metódico e racional, não emanou de uma vontade construtora e
enérgica: fez antes com desleixo e certo abandono. Dir-se-ia mesmo que se fez
apesar de seus autores. E o reconhecimento desse fato não constitui, para
Sérgio Buarque, menoscabo à grandeza do esforço português. Isto porque existe
uma ética do trabalho, como existe uma ética da aventura. Assim, o indivíduo do
tipo trabalhador só atribuirá valor moral positivo às ações que sente ânimo de
praticar e, inversamente, terá por imorais e detestáveis as qualidades próprias
do aventureiro – audácia, imprevidência, irresponsabilidade, instabilidade,
vagabundagem – tudo, enfim, quanto se relacione com a concepção espaçosa do
mundo, característica desse tipo. Por outro lado, as energias e esforços que se
dirigem a uma recompensa imediata são enaltecidos pelos aventureiros; as
energias que visam à estabilidade, à paz, à segurança pessoal e os esforços sem
perspectiva de rápido proveito material passam, ao contrário, por viciosos e
desprezíveis para eles. Nada lhes parece mais estúpido e mesquinho do que o
ideal do trabalhador.
Na
obra da conquista e colonização dos novos mundos coube ao “trabalhador”, papel
muito limitado, quase nulo. Historicamente predispunha aos gestos e façanhas
audaciosos, galardoando bem os melhores homens de grandes voos. E não foi
fortuita a circunstância de se terem encontrado neste continente, empenhados
nessa obra, principalmente as nações onde o tipo ideal do trabalhador, encontrou ambiente menos propício. Essa pouca
disposição para o trabalho, ao menos para o trabalho sem compensação próxima,
essa indolência, como diz o deão Inge, não sendo evidentemente um estímulo às
ações aventurosas, não deixa de constituir, com notável frequência, o aspecto
negativo do ânimo quer gera as grandes empresas. Como explicar, sem isso, que
os povos ibéricos mostrassem tanta aptidão para a caça aos bens materiais em
fins do século XVIII? “Um português” comentava certo viajante em fins do século
XVIII, “pode fretar um navio para o Brasil com menos dificuldade do que lhe é
preciso para ir de cavalo de Lisboa ao Porto”. E essa ânsia de prosperidade sem
custo, de títulos honoríficos, de posições e riquezas fáceis, tão notoriamente
característica da gente de nossa terra, não é bem uma das manifestações mais
cruas do espírito de aventura?
Nesse
ponto, precisamente, os portugueses e seus descendentes imediatos foram
inexcedíveis. Procurando recriar aqui o meio de sua origem, fizeram-no com uma
facilidade que ainda não encontrou, talvez, segundo exemplo na história. Aos
portugueses e, em menor grau, aos castelhanos, coube, sem dúvida, a primazia no
emprego do regime que iria servir de modelo à exploração latifundiária e
monocultora adotada depois por outros povos. E a boa qualidade das terras do
Nordeste brasileiro para a lavoura altamente lucrativa de cana-de-açúcar fez
com que essas terras se tornassem o cenário onde, por muito tempo, se elaboraria
em seus traços mais nítidos o tipo de organização agrária mais tarde
característico das colônias europeias situadas na zona tórrida. E verificou-se,
frustradas as tentativas de emprego do braço indígena, que o recurso
mais fácil estaria na introdução de escravos africanos.
O
que o português vinha buscar era, sem dúvida, a riqueza, mas riqueza que custa
ousadia, não riqueza que custa trabalho. Não foi, por conseguinte, uma
civilização tipicamente agrícola o que instauraram os portugueses no Brasil com
a lavoura açucareira. Não o foi, em primeiro lugar, porque a tanto não conduzia
o o gênio aventureiro que os trouxe á América; em seguida, por causa da
escassez da população do reino, que permitisse emigração em larga escala de
trabalhadores rurais, e finalmente pela circunstância de a atividade agrícola
não ocupar então, em Portugal, posição de primeira grandeza. Poucos indivíduos
sabiam dedicar-se a vida inteira a um só mister sem se deixaram atrair por
outro negócio aparentemente lucrativo. E ainda mais raros seriam os casos em
que um mesmo ofício perdurava na mesma família por mais de uma geração, como
acontecia normalmente em terras onde a estratificação social alcançara maior
grau de estabilidade. Da tradição portuguesa, pouca coisa se conservou entre
nós que não tivesse sido modificada ou relaxada pelas condições adversas do
meio.
Accountability é
um termo da língua inglesa que pode ser traduzido para o português como “responsabilidade
com ética” e remete à obrigação, à transparência, de membros de um órgão
administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras
ou a seus representados. Também traduzida como prestação de contas, significa
que quem desempenha funções de importância na sociedade deve regularmente
explicar o que anda a fazer, como faz, por qual motivo faz, quanto gasta e o
que vai fazer a seguir. Não se trata, portanto, apenas de prestar contas em
termos quantitativos mas de auto-avaliar a obra feita, de dar a conhecer o que
se conseguiu e de justificar aquilo em que se falhou. A obrigação de prestar
contas, neste sentido amplo, é tanto maior quanto a função do cargo é pública,
ou seja, quando se trata do desempenho de cargos pagos pelo dinheiro dos
contribuintes. Melhor dizendo, accountability
é um conceito da esfera de ação social ética com significados variados dependendo
de quem delega poder numa situação de sujeito. Frequentemente é usado em
circunstâncias que denotam responsabilidade civil, imputabilidade, obrigações e
prestação de contas.
As teorias sociais que envolvem as
especulações em torno da morte do ministro Teori Zavascki ganham força na
história com fatos recentes vividos por ele e sua família. Em março de 2016,
antes da farsa do “impeachment” da presidente Dilma Rousseff (PT), Zavascki foi
hostilizado por manifestantes “anti-PT” depois de contestar uma decisão do juiz
federal Sergio Moro. Naquela conjuntura política o ministro decidiu que a
investigação política de escutas telefônicas que envolviam Dilma e o
ex-presidente Lula deveria ser enviada ao Supremo. Na noite de 22 de março, um
grupo foi à casa de Zavascki em Porto Alegre e pendurou na fachada do prédio
uma faixa de “Teori traidor”. Em maio, Francisco Prehn Zavascki, filho do
ministro, “escreveu no Facebook que sua família estava sofrendo ameaças”. No
mês seguinte ao post do filho na rede social Facebook, o ministro confirmou a
ameaça durante um evento no Rio de Janeiro, mas minimizou seu conteúdo
afirmando: - “Não tenho recebido nada sério”. Zavascki ocupava a função de
ministro do STF desde 29 de novembro de 2012 e, desde 19 de março de 2016,
também atuava como ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ele era o relator da Operação Lava Jato no STF e seria o responsável por
decidir se a corte vai homologar ou não o acordo de delação premiada de 77
executivos da Odebrecht, esperada para fevereiro. A ex-presidente Dilma
Rousseff afirmou em nota que “perdemos um grande brasileiro”. Ela citou que
teve “o privilégio de indicá-lo para ministro do STF, com ampla aprovação do
Senado”, e disse que Zavascki: - “desempenhou esta função com destemor como um
homem sério e íntegro”.
O
perfil reservado do ministro, avesso a holofotes, foi tema de conversa entre o
senador Romero Jucá (PMDB-RR) e o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado.
Nessa conversa, frequentemente lembrada em discussões “conspiratórias” nas
redes sociais, gravada em março e divulgada em maio de 2016, Jucá sugere que
apenas uma “mudança” no governo federal – que, segundo ele, seria resultado de
“pacto” nacional, “com o Supremo, com tudo” - poderia “estancar essa sangria”
provocada pela Operação Lava Jato. Em
outro momento da conversa, Sérgio Machado afirma que o ideal seria buscar um
elo com Zavascki. - “Um caminho é buscar alguém que tem ligação com o Teori,
mas parece que não tem ninguém”, ao que Jucá responde: - “Não tem. É um cara
fechado, foi ela (Dilma) que botou. Um cara... burocrata. Da... ex-ministro do
STJ”. Com a morte inusitada de Zavascki, a relatoria da Lava-Jato pode ser designada ao ministro que o substituirá na
Corte, ser escolhido pelo golpista Michel Temer, citado nas investigações. A
presidenta do STF ministra Cármen Lúcia pode abrir uma exceção.
Neste
sentido, aproxima-se do conceito analítico descrito por Benedict Anderson,
“imagined communities” inicialmente publicado em 1983 e reeditado em 1991, com
diversas correções e adição de capítulos, embora tenha sido cunhado
especificamente para tratar do âmbito conceitual do nacionalismo, ele passou a
ser generalizado, no nível de análise teórica quase como um sinônimo político
de “comunidade de interesse”. Ele pode ser utilizado, por exemplo, para se
referir a uma comunidade baseada em orientação sexual, ou consciência de
fatores de risco global. Mas metodologicamente, uma “comunidade imaginada”
difere de uma comunidade real, pois não se baseia em interação social de seus
membros, e por razões práticas não pode fazê-lo: Anderson chega a mencionar que
nada maior que um vilarejo pode ser uma “comunidade real”, já que é impossível
que todos seus membros se conheçam. Nação é um exemplo de comunidade
socialmente construída, imaginada por pessoas com interesses políticos que
percebem a si próprias como parte de um grupo.
Como
Anderson afirma, essa comunidade tem como representação a ideia de que é “imaginada”,
pois os membros de uma nação, mesmo da menor delas, nunca conhecerão a maioria
de seus conterrâneos, nunca os encontrarão ou, até mesmo, ouvirão a seu
respeito. Ainda assim, eles terão em suas mentes a imagem de sua comunhão.
Membros de uma comunidade, apesar da potencial impossibilidade de interação
real uns com os outros, não deixam de compartilhar interesses ou aspectos
identitários comuns. A mídia, por exemplo, cria e mantém comunidades
imaginadas, embora geralmente o faça voltando à sua interação através dos meios
que proporcionam a imaginação, como se estivesse referindo à totalidade de
cidadãos de um país. A origem significativa do conceito de nação para Anderson e
historiadores opostos como Eric Hobsbawm e Ernest Gellner, ambos analisados em
“Imagined Communities”, é uma representação da Modernidade. De acordo com
Anderson, para que a concepção de nação
e nacionalismo surgisse, foram necessárias três mudanças históricas centrais.
Em
junho de 2016, Teori Zavascki anulou a validade jurídica da escuta telefônica
que interceptou conversa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a presidente Dilma Rousseff. Na decisão em que anulou a validade da
interceptação da conversa entre Lula e Dilma, Teori considerou que “Sérgio Moro
não tinha competência para analisar o material, por envolver a presidente da
República, que só pode ser investigada pelo Supremo”. Além disso, o ministro
considerou irregular a divulgação das conversas. O ministro da Suprema Corte,
no mesmo despacho, enviou para S. Moro, em sigilo, as investigações relativas
ao sítio em Atibaia (SP) e ao triplex em Guarujá (SP) os quais Lula é acusado
de ser o verdadeiro proprietário. Ainda sobre o ex-presidente Lula, Teori Zavascki,
em outubro de 2015, incluiu o petista no inquérito principal da Lava Jato. Em
outubro de 2016, o magistrado suspendeu a “Operação Métis”, que apurou a
suposta tentativa de policiais do Senado de obstruir investigações de
parlamentares na Lava Jato. Na decisão, ele afirmou que a intenção da Métis era
investigar parlamentares, que só pode ser feito com aval do Supremo Tribunal
Federal.
No
julgamento em que a Segunda Turma do Supremo negou pedido da defesa de Lula
para tirar de Moro às investigações sobre suposto recebimento de propina pelo
petista, Teori criticou em seu voto a atuação dos integrantes do Ministério
Público Federal do Paraná na entrevista em que havia sido anunciado que o
petista seria denunciado. Na ocasião, os procuradores da República acusaram o
ex-presidente da República de ser o “comandante máximo da propinocracia
brasileira”, em referência comparativamente aos fatos investigados na operação
Lava Jato. O relator da Lava Jato no Supremo chamou de “espetáculo midiático” a
entrevista do MPF paranaense. Um despacho em ação de sigilo na Corte,
determinando uma diligência investigativa, por exemplo, foi assinado no último
dia 10/10/2017. Atualmente, há no gabinete do ministro um acervo de 7.566
processos, sendo 12 ações penais. Responsável pelos processos da Operação Lava
Jato em andamento na Corte, Zavascki estava prestes a homologar a delação
premiada dos 77 ex-executivos da Odebrecht enviados pela PGR no dia 19 de
dezembro de 2016. Embora o poder Judiciário estivesse em recesso, o ministro do
Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki vinha despachando normalmente desde o
início deste mês e estava prestes a homologar
as delações premiadas de ex-executivos da Odebrecht no âmbito da Operação
Lava Jato. Ainda que à distância, o magistrado se comunicava com a equipe de
gabinete dele, concentrada no 3° andar do anexo 2 da Corte, para emitir ordens
judiciais em processos sob sua responsabilidade.
O
primeiro deles decorreu da ideia de que uma particular linguagem de escrita
oferecia acesso privilegiado à verdade “ontologicamente situada”, precisamente
por que tal linguagem era uma parcela inseparável desta verdade. O segundo
desses conceitos decorreu da crença que a sociedade seria “naturalmente
organizada” ao redor e sob potestades, isto é, sob monarcas que eram pessoas à
parte de outros seres humanos e que governavam por alguma forma de deliberação
cosmológica (divina). O terceiro decorreu de uma concepção de temporalidade em
que a cosmologia e a história eram indistinguíveis, e a origem tanto do mundo
quanto dos homens era essencialmente idêntica. Combinadas, essas ideias
enraizaram firmemente as vidas dos homens na natureza das coisas, dando
significado para as fatalidades cotidianas da existência, sobretudo, a morte, a
perda e a servidão, oferecendo de diversas formas redenção delas. A tópica da
descritibilidade pode ser vista no filme dirigido por Kore-Eda Hirokazu, “Nossa
Irmã Mais Nova” (2015), de título original: “Umimachi Diary”, em que Sachi
(Haruka Ayase), Yoshino (Masami Nagasawa) e Chika (Kaho) são irmãs e vivem
juntas em uma casa que pertence à família há tempos. Apesar de não verem o pai
há 15 anos, elas resolvem ir “ao rito de passagem de seu enterro” (cf. Koury,
2009).
Lá,
elas conhecem a adolescente Suzu Asano (Suzu Hirose), a meia irmã mais nova que
aos poucos entende como é a vida. Mesmo tão nova, possui vasta experiência em
superar dificuldades. É ótima jogadora de futebol, comunicativa e sincera. Logo
as três irmãs convidam Suzu para que more com elas. O convite é aceito e, a
partir de então, elas passam a conviver juntas e aprendem os pontos sensíveis
numa “comunidade imaginada” relacionada à memória ao pai em comum. Hirokazu
Kore-Eda analisa a valorização da vida como uma experiência baseada na relação
dialética entre alegria e sofrimento, representados por momentos de felicidade
e dor não só inevitáveis como parte fundamental de nossa existência sobre o
“cotidiano” (cf. Heller, 1975), na medida em que o dia-a-dia desconstrua o
estereótipo, retratando-o com uma visão poética, plena da beleza dos detalhes,
como o flanelódromo surge diante de nós e que marca o nascimento das irmãs e
vinda da “irmã mais nova”, pois é ao mesmo tempo sutil, fascinante e
melancólico, mas por vezes turbulento e trágico no sentido nietzschiano.
O
modelo mediterrâneo é mais direcionado ao sistema de carreira, se caracteriza pelo baixo status do funcionalismo, forte intervenção da política na
administração e níveis elevados de proteção ao emprego. Entre o pessoal da
administração pública há diferenças importantes relativamente ao direito
pertinaz ao exercício da função, diferenças estas que variam em razão do regime
jurídico no qual se insere o agente público. Denomina-se regime estatutário o
do exercente de cargo público, e as bases deste regime são as mesmas do regime
jurídico-administrativo comum. O servidor público é a denominação concedida ao
ocupante de cargo público, logo submetido a regime estatutário, mas que se
distingue do empregado público, que, apesar de também ser espécie do gênero
agente público, é regido pela legislação contratual trabalhista, por exemplo, onde
o empregado público concursado mantém suas relações jurídicas com base na
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) - daí o neologismo celetista.
Do
ponto de vista histórico e pontual o conceito de “carreira” deriva da palavra
latina “carraria” e passou por diversas transformações no decorrer de sua
aplicabilidade teórica e historicamente determinada. Por volta de 1530, no
período renascentista, simplificadamente, “carreira” identificava um caminho,
ou o “curso do sol através dos céus”. Nas disputas de Justa, em 1590, a palavra
“carreira” estava inserida no seguinte contexto: o cavalo que, durante o
combate, passava uma “carreira” em seu oponente. A partir de 1803, o
significado contemporâneo da palavra “carreira” passou a se relacionar ao mundo
perigoso dos negócios, quando o termo foi associado à ideia de “caminho na vida
profissional”. Presentemente entende-se “carreira” como a soma de todos os
cargos ou posições ocupadas por uma pessoa durante o decorrer de sua vida
profissional. Este entendimento, curiosamente, é conditio sine qua non a raiz etimológica do termo e impede que o
conceito real da palavra seja plenamente assimilado no mercado, inclusive por
alguns profissionais de renome em nível globalizado. Ipso facto não está associado a restrições temporais, mas de espaço
e lugar. Não revela um histórico profissional, propriamente dito, mas um
caminho particular rumo a um objetivo institucional.
No
sentido pontual é um termo disciplinar que designa um determinado campo do
conhecimento. Como campos específicos de
saber, as disciplinas se referem aos mais diversos âmbitos de produção de
conhecimento técnico e científico. Tem como representação a produção social
através de instâncias ou níveis de análises sobre a realidade social, a
constituição de uma linguagem aparentemente comum entre os seus praticantes, a
definição e constante redefinição de seus objetos de estudo, uma singularidade
que as diferencia de outros saberes, uma complexidade interna que termina por
gerar novas modalidades no interior da disciplina. Enfim, a rede de conexão
humana de conhecimentos que constitui determinado campo de saber, com a formação
progressiva da chamada comunidade científica compartilhada pelos diversos
praticantes do campo disciplinar. Há concretamente um processo de trabalho, com
a fundação e manutenção de revistas científicas especializadas, a ocorrência
constante de congressos frequentados pelos praticantes do campo disciplinar, a
criação de instituições científicas que representam os profissionais do campo
de saber vinculando seu nome, seu cargo no âmbito do processo de trabalho e de
pesquisa nas instituições e assim por diante.
No
caso brasileiro, o país adotou ao longo de sua história três modelos de
administração do Estado: o patrimonialista, em que não havia diferenciação
entre os bens públicos e privados; o burocrático, advindo da desorganização do
Estado na prestação dos serviços públicos, além da corrupção e do nepotismo; e
por fim, o modelo gerencial, fruto das mudanças da segunda metade do século XX.
Esse modelo, apesar de não ser estático, se encontra dessa maneira entre nós,
visto que a influência do Direito Administrativo francês apenas aparentemente acaba
por lhe conferir uma maior rigidez organizacional. Contudo, o país também sofreu interferências
norte-americanas, através do presidencialismo, o que imprimiu uma flexibilidade
e politização na Administração brasileira. Apenas, com a Carta Magna de 1988
que a legislação tornou-se mais rígida em relação à burocracia. Nos termos da
Constituição, a administração pública deve seguir os princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
A
base do conceito de carreira é expressa no curriculum Lattes, elaborado nos padrões da “plataforma” gerida pelo Deus ex machina CNPq, tendo como
resultado a experiência individual cumulativa na integração de bases de dados
de currículos, de grupos de pesquisa e de instituições em um único sistema de
informação, “tornando-se um padrão nacional no registro do percurso acadêmico
de estudantes e pesquisadores do Brasil”. Atualmente é adotado pela maioria das
instituições de fomento, universidades e institutos de pesquisa do país. A
“riqueza” do controle de informações, a abrangência e confiabilidade são
elementos indispensáveis aos pleitos de financiamentos na área de ciência e
tecnologia. O curriculum Lattes é mais abrangente que o curriculum vitae, sendo
esta a principal diferença entre os dois. Além disso, é mais longo, pois deve
mencionar detalhadamente tudo o que está relacionado com a carreira do
profissional.
A
expressão é usada habitualmente para indicar um desenvolvimento de uma história
concreta que não leva em consideração sua lógica interna e é tão inverossímil
que permite ao autor terminá-la com uma situação improvável, porém mais
palatável. Em termos modernos, deus ex
machina também pode descrever uma pessoa ou uma coisa, fora do sentido
fetichista marxista, que de repente aparece e resolve um problema aparentemente
insolúvel, contrariando Hegel para quem a sabedoria poderia resolvê-lo.. A
noção de deus ex machina também pode
ser aplicada a uma revelação dentro de uma história vivida por um personagem, como
tem ocorrido no trabalho disciplinar, que envolva realizações complicadas, às
vezes perigosas ou mundanas e, porventura, sequência de eventos aparentemente
não relacionados que conduzem ao ponto da história em que tudo é conectado por
algum conceito profundo. Essa intervenção inesperada e oportuna visa a dar
sentido à história no lugar de um evento mais consistente com a trama. As
tragédias de Eurípides eram notórias no uso deste recurso.
Pode-se
entender carreira como uma série de estágios que variam conforme forças de
trabalho exercido sobre o indivíduo. Tem-se a relação entre a organização e o
profissional, como fator de conciliação das expectativas entre ambas a partes.
A carreira é um dos termos das ciências sociais que não é ambígua e está
relacionada a uma gama ampla de definições. Pode significar, ao mesmo tempo,
emprego assalariado ou atividade não remunerada, profissão, vocação, ocupação,
estágio, posição em uma organização, trajetória de um indivíduo no trabalho,
uma fonte de informação para as empresas alocarem recursos humanos, e,
sobretudo, um roteiro pessoal para a realização dos próprios desejos. Carreira
inclui os estudos ou a preparação acadêmica e integram as capacidades laborais,
as novas aprendizagens, as mudanças pessoais sobre a própria imagem, as metas e
os valores, assim como a resposta para as novas oportunidades e mudanças tanto
sociais, como ideológicas e políticas. A carreira é um caminho de maturação em
conhecimentos, habilidades e responsabilidades sobre a própria vida.
Os
mais recentes balanços críticos da sociologia das profissões põem em relevo seu
viés ideológico e o erro de perspectiva por ele condicionado, a saber: a) ao
endossar a premissa de que a organização profissional das ocupações significa a
superação de interesses privados individuais ou grupais em nome de nobres
interesses coletivos, os sociólogos estariam reafirmando o discurso ideológico
dos próprios profissionais, que nada mais é do que a ideologia de classe média
que se assume acima das classes sociais e de seus conflitos identitários necessários;
b) ao entender a organização profissional como comunidade de interesses e
âmbito de socialização, esta sociologia, de inspiração funcionalista, não
estaria levando em conta o movimento simultâneo e correlato de “desprofissionalização”,
definido pelo aumento do número de profissionais assalariados (isto é, pela
difusão da relação de assalariamento), pela emergência (entre os quadros médios
e mesmo superiores) da organização sindical e da prática de greve a que apelam
as frações da classe operária e, finalmente, pela redução do diferencial de
salário, de prestígio e de controle do processo de trabalho do trabalhador “não-manual”
qualificado em relação às demais categorias de trabalhadores não-manuais e operárias
em geral.
A
denúncia dos limites interpretativos da sociologia das profissões se põe,
assim, em termos de uma perspectiva que busca reintegrar as frações dos
trabalhadores técnico-científicos na lógica do sistema de relações de classe,
perspectiva que, mais recentemente, ressurge nos debates em torno da
tecnocracia. Aliás, a familiaridade é grande entre as formulações que entendem
os estratos ocupacionais como comunidades potenciais ou efetivas a serviço da
coletividade e as concepções que admitem a transição do poder fundado na propriedade
ao poder elevado na ciência e na técnica. Todavia, são ainda incipientes os
estudos a respeito das práticas monopolistas das profissões estabelecidas e
mesmo as muitas formas de dependência e/ou de pertinência da categoria
ocupacional às formas de dominação burocrática da classe dominante. O caminho
que parece ser seguido é o de explorar a extensão das relações de trabalho no
setor de prestação de serviços, de modo a evidenciar como subjacentemente ao
movimento de profissionalização e de desprofissionalização, operam processos de
divisão social e técnica do trabalho na acumulação de capital através do Estado.
Fica nítido o encobrimento ideológico que
concebe automático o nexo entre a diferenciação do sistema educacional, o
surgimento da ocupação e a existência de necessidades sociais efetivas quando não
atendidas, comprometem no sentido ético de realização profissional, entendendo
a ciência como vocação e o destino da coletividade dos praticantes inseridos
nas instituições e em seus postos de pesquisa. A importância da questão está em
que sua resposta reporta-se à noção de delegação, não da delegação estatal, via
regulamentação jurídica, mas da delegação cultural implícita na partilha de
componentes da estrutura a dominante, vale dizer, legítima. A intenção
de caucionar o desempenho de métier
sociológico na razão científica, por oposição ao senso comum (ou à magia),
significa não a extensão irresistível no sentido de imperativo da razão
absoluta do ethos científico a mais
uma esfera da prática, mas a eficácia simbólica de um modelo cultural
valorizado, capaz de reduzir à indignidade práticas concorrentes, mas distantes
do arbitrário cultural dominante e hegemônico.
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