segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Denzel Washington – Arte, Cinema & Sociologia das Emoções

Ubiracy de Souza Braga*

 
                                                                    O que você vê quando olha prá mim?”. Denzel Washington
           
                       
Denzel Washington entrou na Universidade de Fordham para seguir o curso de Jornalismo, que deixou inacabado, mas formou-se em Teatro pela mesma Universidade, para seguir a carreira de ator, estreando em telefilmes com sucesso na telenovela “St. Elsewhere”, de 1982. É uma universidade privada, sem fins lucrativos e católica dos Estados Unidos, com três campi ao redor da cidade de Nova Iorque. Fundada pela Diocese Católica Romana de Nova Iorque em 1841, com o nome de St. John's College, foi administrada por muitos anos pela Sociedade de Jesus até se tornar uma instituição independente, controlada por um conselho de administração de leigos, que mantiveram a tradição jesuíta. A sua primeira grande oportunidade cinematográfica ocorreu quando Richard Attenborough o convidou para desempenhar o papel do ativista sul-africano Steve Biko em “Um Grito de Liberdade”, em 1987, e dois anos depois conquistou o Óscar de Melhor Ator pelo seu desempenho de soldado num batalhão inteiramente negro durante a guerra civil americana em “Tempo de Glória”, de 1989. O filme centra-se nos acontecimentos da vida real envolvendo ativista negro Steve Biko e seu amigo Donald Woods, que o encontra destrutivo, e as tentativas de entender sua vida. Washington estrela como Biko e o ator Kevin Kline retrata Woods.
       Cry Freedom investiga as formas de pensamentos sociais de discriminação, corrupção política, e os efeitos perversos sobre as repercussões da violência no âmbito dos conflitos urbanos. Voltaria a repetir a nomeação desta vez para Melhor Ator (principal) pelo seu retrato do líder revolucionário “Malcolm X” de 1992. No dia 19 de maio de 1925 nascia em Omaha, em Nebrasca, nos Estados Unidos da América, Al Hajj Malik Al-Habazz, reconhecido politicamente como Malcolm Little ou Malcolm X, líder revolucionário que defendia a igualdade dos negros, filho de um pastor protestante e casado com uma mulher mulata. Durante a infância, ele sofreu com as constantes mudanças de cidade, fugindo das agressões de grupos racistas, que culminaram no assassinato do seu pai em 1931. No dia 14 de fevereiro de 1965, sua casa foi atacada, Malcolm e sua família sobreviveram, mas ninguém foi incriminado pelo atentado. Uma semana depois, no dia 21, Malcolm havia terminado um discurso na sala Audubon, em Manhattan, quando deu início um tumulto.
             Um homem gritou: - “Tire as mãos do meu bolso”. Os guarda-costas de Malcolm foram ver o que estava acontecendo e, enquanto isso, um outro homem disparou contra o peito de Malcolm. Neste momento, morria o líder revolucionário de apenas 39 anos. Norman Butler, Thomas Johnson e Talmage Hayer foram condenados à prisão perpétua pelo assassinato. Em 1992, o diretor Spike Lee produziu um documentário sobre o líder revolucionário chamado Malcolm X. A sua carreira solidificou-se em êxitos de bilheteira como “Pelican Brief”, ao lado de Julia Roberts, “Filadélfia”, co-estrelado por Tom Hanks - quando ganhou seu primeiro Óscar neste filme - o thriller “Crimson Tide”, de 1995, com Gene Hackman e o filme de guerra “Coragem Sob Fogo”, de 1996. Depois de protagonizar mais um thriller, “The Bone Collector”, em 1999, obteve mais uma nomeação para Melhor Ator pelo filme “The Hurricane”, baseado na história verídica do pugilista Rubin Hurricane Carter, acusado injustamente de ter participado num duplo assassinato e encarcerado durante vinte anos até que um jovem fã, ao ler a sua autobiografia, tenta limpar o seu nome como cidadão.

 

A história social da escravidão (ou escravatura) nos Estados Unidos inicia-se no século XVII, quando práticas escravistas similares aos utilizados pelos espanhóis e portugueses em colônias na América Latina, e termina em 1863, com a Proclamação de Emancipação de Abraham Lincoln, realizada durante a Guerra Civil Americana. Na origem da guerra tem-se, grosso modo, a escravidão e dois modelos econômicos opostos. A Guerra Civil Americana, também reconhecida como Guerra de Secessão ou Guerra Civil dos Estados Unidos, foi uma guerra civil travada nos Estados Unidos de 1861 a 1865, entre o Norte e o Sul. A guerra civil teve início principalmente como resultado da longa controvérsia política e ideológica sobre a escravização dos negros. O norte em expansão econômica devido à industrialização, à proteção ao mercado interno e à mão-de-obra livre e assalariada, e o sul de economia baseada na plantação e no escravismo. As diferenças entre os estados do norte e do sul, ao contrário da dicotomização entre estudiosos, não são tão acentuadas, como diz Lewis C. Gray.
O caráter capitalista da plantation escravista do sul, análogo aos estados do norte, era em certa medida uma contradição no sentido marxista interna ao sistema econômico. Mas uma economia escravista tende a inibir, do ponto de vista do valor-trabalho o desenvolvimento econômico de uma sociedade capitalista, tal como fora analisado por Max Weber em seu livro: “The Theory of Social and Economic Organization”. Ele analisa o comportamento que é dirigido principalmente por interesses materiais e também orientado para o comportamento de outros. Esse segundo aspecto distingue sua noção de ação econômica daquela da teoria econômica. A ação econômica de Weber é uma ação econômica social. É a partir dessa noção que o sociólogo vai relacionar economia e outras ordens e poderes sociais, como religião e política. Além disso, o retorno dos lucros de volta à produção, presente no norte industrializado, não ocorria da mesma forma nos estados do sul, que tinha uma acentuada tendência a um consumo intenso. Assim, norte e sul diferem-se na medida em que o primeiro possui um progresso econômico qualitativo com o retorno dos lucros à produção, e o sul, por sua vez, ao dirigir seus lucros em escravos e terras, possui um progresso econômico quantitativo, levando em consideração a aparente baixa produtividade da mão-de-obra escrava.
No período da Declaração de Independência dos Estados Unidos, em 1776, a escravidão era legal e presente em todas as Treze Colônias. Em 1865, quando foi abolida pela Décima Terceira Emenda da Constituição, ela estava presente em metade dos estados da União. Como um sistema laboral, foi vital para o sucesso econômico dos Estados Unidos no começo de sua história e quanto foi feito ilegal, foi substituída nas fazendas por sharecropping (uma forma de parceria rural) e trabalhos forçados de presos do sistema carcerário, mirando principalmente afro-americanos, que continuaram em um sistema análogo a escravidão por quase um século após a guerra civil de 1861-65. Esse fato histórico, teórico e ideológico (cf. Bailyn, 2003) se deve à mentalidade escravista do proprietário sulista, que investia na compra de escravos como mercadoria, pois “dava prestígio e segurança econômica e social numa sociedade dominada pelos plantadores”. Os consequentes saltos qualitativos na produção nortista levaram os proprietários sulistas a uma aguda disputa com os proprietários do norte. Se for aceita a condição capitalista para os estados do sul, assim como para os estados do norte, tem-se então uma sociedade capitalista que impediu o desenvolvimento do próprio capitalismo, que historicamente tende a revoltas, guerras e revoluções, considerando que o sul apresentava problemas em torno do binômio de produção de produtos para o consumo interno.  

 
 
       Denzel Washington voltaria à cerimônia dos Óscares em 2001, mas como vencedor, pelo seu desempenho no policial “Dia de Treinamento”, interpretando “Alonzo Harris”, um agente do Departamento de Narcóticos que, ao acolher um agente noviço (Ethan Hawke), acaba por demonstrar a sua faceta de corrupto no país da Lei & Ordem. Ao aceitar o prêmio, Denzel o dedicou ao ator Sidney Poitier, homenageado pelo conjunto de sua carreira nessa mesma noite única, que entrou para a história social do cinema e da Academia como a noite em que dois atores negros, Denzel Washington e Halle Berry, venceram pari passu as categorias de Melhor Ator e Melhor Atriz. A sociologia das emoções se constituiu como uma subárea da disciplina sociologia nos anos 1990 primícias de um processo iniciado nos Estados Unidos quase duas décadas antes. Herdeiros de duas escolas sociológicas distintas, a funcionalista de Talcott Parsons e a interacionista simbólica, de George Herbert Mead, Herbert Blumer e  Erving Goffman,  dos sociólogos norte-americanos Randall Collins, Theodore Kemper, Jonathan Turner, Norma Denzin, Arlie Hochschild, Susan Shott, Steven Gordon e Thomas Scheff, desenvolvem à partir das suas respectivas filiações, teorias sociológicas alternativas, e, até certo ponto, conflitantes, para a compreensão das emoções.                
     As tensões conceituais e metodológicas entre tais proposições envolvem  questões sociológicas fundamentais, cuja origem remota aos debates travados entre os pragmatistas William James, John Dewey e George Herbert Mead: O que é emoção? Como estudá-la? Essas questões se desdobram em várias outras: Emoção é um fenômeno sociológico? As emoções são sociocultural ou biologicamente determinadas? Ou, as emoções são inatas e universais ou são culturalmente específicas? Qual a influência do social sobre a forma de sentir e de expressar as emoções? Ou, qual e como os sentimentos influenciam os comportamento e atitudes dos indivíduos? Os referencias teóricos da disciplina central se aplicam ao estudo das emoções ou são necessários conceitos específicos? É possível estabelecer relações entre emoções e macro estrutura? As respostas a essas questões dizem respeito à definição do conceito sociológico. Seus adeptos propõem uma sociologia das emoções que deve procurar as causas sociais, psicológicas, fisiológicas das emoções para explicá-las. Deve utilizar-se do método que seja capaz de prever as emoções empiricamente relevantes e de formular leis gerais aplicáveis ao estudo do homem urbano na contemporaneidade.                          
Consagrado como uma das principais estrelas de Hollywood continuou a apostar nos registros dramáticos: em “John Q”, de 2002, foi um pai desesperado que decide manter como refém todo um hospital como protesto social por não procederem a um transplante de coração ao seu filho e estrelou em 2004, ao lado de Meryl Streep, “Sob o Domínio do Mal”, representa uma sinistra e competente refilmagem do sucesso dos anos 1960, com Denzel Washington no papel que pertenceu a Frank Sinatra. Ben Marco é um soldado que, em meio à violência dos soldados norte-americanos da Guerra do Golfo, foi sequestrado pelo inimigo, juntamente com sua tropa. Alguns anos depois, já em sua casa, Ben começa a rememorar do processo de submissão na guerra com a lavagem cerebral pelo qual passou enquanto esteve preso, que fazia com que obedecesse ordens sem consciência de seu papel social para contestá-las. Com um de seus companheiros de tropa, Raymond Shaw, concorrendo a um cargo na vida política do país, Ben tenta entrar em contato com ele, temendo que Shaw esteja sendo controlado durante esse processo. O ator é casado com Pauletta Pearson Washington desde junho de 1983 com quem tem quatro filhos: John David (1984), Katia (1987) e os gêmeos Olivia e Malcolm (1991). Washington é um cristão devoto. Em 1995, doou 2,5 milhões de dólares para ajudar projetos sociais de construção da entidade pentecostal norte-americana Igreja de Deus em Cristo, composta predominantemente de negros, é a maior denominação pentecostal dos Estados Unidos.

 
 Enfim, a sequência de “O Protetor” (“The Equalizer”), adaptação para os cinemas da série de TV oitentista estrelada por Denzel Washington, ganhou data de estreia nos cinemas norte-americanos. A Sony Pictures anunciou que a estreia do filme acontece dia 29 de Setembro de 2017, exatamente três anos após a estreia do primeiro filme. O retorno de Washington é esperado, mas tanto o diretor Antoine Fuqua quanto a protagonista feminina Chloë Moretz não tiveram suas voltas confirmadas. Apesar da indefinição, Fuqua se reunirá mais uma vez com Washington no remake de “Sete Homens e um Destino”. O filme: “O Protetor” arrecadou pouco mais de US$ 192 milhões nas bilheterias no ano passado. No filme, Denzel interpreta o vigilante Robert McCall, um ex-policial das forças especiais que simulou sua morte para viver uma vida tranquila em Boston. Quando ele sai de sua aposentadoria auto-imposta para resgatar uma jovem, Teri (Chloë Grace Moretz), ele se encontra vis-à-vis com mafiosos russos ultraviolentos. Ele pratica atos de vingança contra todos os que agem brutalmente sobre pessoas indefesas. Seu desejo de justiça se reacende no âmbito da categoria sociológica de justiçamento privado. Se alguém tem um problema, está com todas as chances empilhadas contra si, e sem ter para onde correr; McCall vai ajudar. Ele é O Protetor.
Quem assistiu ao excelente “Dia de Treinamento”, que teve o diretor Antoine Fuqua em parceria com o ator Denzel Washington, cujo trabalho lhe rendeu o Oscar em sua categoria, logo imaginaria que um segundo encontro dos dois poderia trazer algo semelhante ao filme de 2001. No entanto, “O Protetor” é completamente diferente do que Fuqua e Washington realizaram concretamente em um de seus primeiros filmes. Em relação aos vilões, eles não são apenas  vagos, como possuem características clichês da máfia em qualquer situação ou país. O simples fato de serem russos já sugere a nacionalidade de vilões como componente conveniente aos norte-americanos no período da chamada Guerra Fria. Embora a máfia russa pudesse servir justamente como uma forma de desconstruir a visão política dos criminosos, esta escolha como “social irradiado” pretende que imaginemos algo que criticasse tal situação. Ressurge a figura mítica de um justiceiro que represente algo interessante, já que promove uma espécie de catarse coletiva – por matar policiais corruptos e bandidos -,  para introjetar  a humanização do personagem em momentos extremamente delicados.
       O ator norte-americano Denzel Washington foi homenageado como a personalidade do ano dos Estados Unidos no setor de entretenimento pela revista Entertainment Weekly. Washington, que ganhou o Oscar em 2002 por sua atuação em Dia de Treinamento, foi saudado pela revista por ter atingido novos patamares em sua carreira. A Entertainment Weekly deu o título a Washington depois de ele se transformar no segundo negro a receber o Oscar de melhor ator. O jornalista Dave Karger, que escreveu o artigo sobre Washington, afirma que ele foi escolhido não apenas pelo Oscar, mas também por sua estréia como diretor no filme Antwone Fisher, sobre um jovem que quer encontrar a família que o abandonou. Fisher é o típico negro americano que encontrou na Marinha uma saída para sua vida de traumas. O pai morreu antes de ele nascer, a mãe não foi buscá-lo no orfanato quando ela saiu da prisão, foi abusado pelos pais adotivos e viu seu melhor e único amigo morrer quando assaltava uma loja. Ele também participa do filme como o psiquiatra Jerome Davenport. O filme é inspirado por uma história verídica, com o verdadeiro Antwone Fisher creditado como o roteirista, baseado em sua autobiografia escrita no livro Finding Fish. O filme foi produzido por Washington, Nancy Paloian e Todd Black, e apresenta a trilha sonora de Mychael Danna.
Bibliografia geral consultada. 

  
GRAY, Lewis Cecil, History of Agriculture in the Southern United States to 1860. Contributions to American Economic History. Washington: Carnegie Institute of Washington, 1933; PARSONS, Talcott, The Structure of Social Action. 2ª edição. Glencoe: The Free Press, 1949; MARCUSE, Herbert, Eros e Civilização. Uma Interpretação Filosófica do Pensamento de Freud. 8ª edição. São Paulo: Guanabara Koogan, 1966; ELIAS, Norbert; DUNNING, Eric, Deporte y Ocio en el Proceso de la Civilizacion. 2ª ediciones. México: Fondo de Cultura Económica, 1995; THOMPSON, John, Ideologia e Cultura Moderna, Teoria Social Crítica na Era dos Meios de Comunicação de Massa. 3ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1999; MAFFESOLI, Michel, El Instante Eterno. El Retorno de lo Trágico en las Sociedades Posmodernas. Buenos Aires: Ediciones Paidós, 2001; BIKO, Steve  I Write What I Like: Selected Writings. Chicago: University of Chicago Press, 2002; BAILYN, Bernard, As Origens Ideológicas da Revolução Americana. Bauru: EDUSC, 2003; KEMPER, Theodore, Power and Status and the Power-status Theory of Emotins. In: Handbook of the Sociology of Emotions, 87-113. Boston: MA: Springer, 2006; THOMPSON, John, Ideologia e Cultura Moderna, Teoria Social Crítica na Era dos Meios de Comunicação de Massa. 3ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2006; VILHENA, Junia de, A Violência da Cor: Sobre Racismo, Alteridade e Intolerância. In: Revista Psicologia Política, vol. 6, 12, 2006; KOURY, Mauro Guilherme Pinheiro, Emoções, Sociedade e Cultura: A Categoria de Análise Emoções como Objeto de Investigação na Sociologia. Curitiba: Editora CRV,  2009; Idem, “Sociologia e Antropologia dos Corpos e das Emoções”. RBSE - Revista Brasileira de Sociologia da Emoção (Online), vol. 11, pp. 645-653, 2012; Idem, “Emoções e Sociedade: Um passeio na Obra de Norbert Elias”. In: História. Questões e Debates, vol. 59, pp. 79-98, 2013; Idem, “Talcott Parsons e a Teoria Geral da Ação”. RBSE - Revista Brasileira de Sociologia da Emoção (Online), vol. 13, pp. 140-151, 2014; entre outros.
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).

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