sábado, 10 de setembro de 2016

O Último Concerto – Diatribes Relacionais entre Emoção & Finitude.


Não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos”. Cora Coralina 


Cora Coralina é o pseudônimo de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (1889-1985), uma poetisa e contista brasileira. Considerada uma das mais importantes escritoras brasileiras, ela teve seu primeiro livro, intitulado: Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais, publicado em junho de 1965, quando tinha quase 76 anos de idade, apesar de escrever seus versos desde a adolescência. Mulher simples, doceira de profissão, tendo vivido longe dos grandes centros urbanos, alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos e conteúdos de sentido do cotidiano do interior brasileiro, em particular dos becos e ruas históricas de Goiás (cf. Anjos, 2013). Ao completar 50 anos, a poetisa relata ter passado por uma profunda transformação interior, a qual definiria mais tarde como “a perda do medo”. Nessa fase, deixou de atender pelo nome de batismo e assumiu o seu belo pseudônimo “que escolhera para si muitos anos antes”. Durante esses anos, Coralina não deixou de escrever poemas relacionados com a sua história pessoal, com a cidade em que nascera e com ambiente político em que fora criada. 

Na metafísica, finitude é uma característica dos entes que se modificam ou têm limites. Cada atributo é infinito no seu gênero, isto é, não é limitado pela Substância nem por outros atributos, pois não tem nada em comum com os mesmos. Cada atributo tem infinitos modos. Os modos são finitos ou limitados, pois estão em comunidade com outras coisas do mesmo gênero que eles mesmos. A limitação dos modos é carência de infinitude, ou simplesmente finitude, uma característica das coisas singulares que pertencem a certo atributo da Substância. E finitude significa ser limitado por outras coisas singulares do mesmo atributo. Todos os seres vivos são seres finitos isto quer dizer que todos morremos porque temos um final. A filosofia de Spinoza tem muito em comum com o estoicismo, mas difere muito dos estoicos na medida em que rejeitou fortemente a afirmação de que a razão pode dominar a emoção. Pelo contrário, analiticamente defendeu que uma emoção pode ser ultrapassada apenas por uma emoção maior. A distinção crucial deriva, entre as emoções ativas e passivas, sendo as primeiras àquelas que são compreendidas racionalmente e as outras as que não o são.
Sabemos que Espinosa pretende afirmar a imanência como princípio e retirar a expressão de toda subordinação no que diz respeito a uma causa emanativa ou exemplar. Expressar não é emanar, parecer, imitar ou assemelhar-se. Deleuze interpreta a substância como singular. O ser é singular, infinito e notável. Ele não é distinto de, ou diferente de qualquer coisa fora de si mesmo, mas distinto em si. A distinção da substância nasce de dentro. Causa sui significa que o ser tanto é infinito quanto definido. Dotado de causalidade eficiente sua diferença é interna a si. A substância é definida por que é diferente em si mesma. Esta autodistinção tem como consequência que o ser não é diferente de qualquer coisa fora do ser, nem é indiferente ou abstrato. A substância única é qualificada, mas não limitada, se tivesse que ser limitada (ou ter número) teria que envolver uma causa externa. A substância é causa de si, o ser é causa material e eficiente de si mesmo. A substância já é real e qualificada (“complicatio”) e não se coloca a questão da determinação por que os atributos preenchem o papel da expressão (“explicatio”). Na definição seis do livro Um da Ética Espinosa diz que: “Por Deus eu entendo um ser absolutamente infinito, quer dizer uma substância que consiste em uma infinitude de atributos onde cada um exprime uma essência eterna e infinita”.

 
Melhor dizendo, para Espinoza, a ilusão dos homens de que suas ações resultam de uma livre decisão da mente é consequência de eles serem conscientes apenas de suas ações enquanto ignoram as causas pelas quais são determinadas, o que faz com que suas ações sejam determinadas pelas paixões. Isso é o que ele chama de primeiro gênero de conhecimento, imaginação ou ideias inadequadas (a consciência de nossos afetos, e a inconsciência do que os determina). O segundo gênero de conhecimento são as noções comuns ou ideias adequadas, que se caracterizam pela consciência do que nos determina a agir. As ideias adequadas sempre são efeitos da alegria, acarretam alegria e impulsionam a atividade, enquanto a imaginação (ideias inadequadas) se caracteriza pela passividade e pelo acaso de causar ou ser efeito da alegria ou da tristeza. Metodologicamente a sociologia das emoções se constituiu como uma subárea da disciplina sociologia nos anos 1990, como primícias de um processo iniciado nos Estados Unidos da América quase duas décadas.
Herdeiros de duas escolas sociológicas distintas, a funcionalista de Talcott Parsons e a interacionista simbólica, de George Herbert Mead, Herbert Blumer e  Erving Goffman,  dos sociólogos norte-americanos Randall Collins, Theodore Kemper, Jonathan Turner, Norma Denzin, Arlie Hochschild, Susan Shott, Steven Gordon e Thomas Scheff, desenvolvem à partir das suas respectivas filiações, teorias sociológicas alternativas, e, até certo ponto, conflitantes, para a compreensão das emoções. As tensões entre tais proposições envolvem questões sociológicas fundamentais, cuja origem remota aos debates travados entre os pragmatista William James, John Dewey e George Herbert Mead: O que é emoção? Como estudá-la? Essas questões se desdobram em várias outras: Emoção é um fenômeno sociológico ou biologicamente determinado? Qual a influência do social sobre a forma de sentir e de expressar as emoções? As respostas a essas questões dizem respeito ao conceito sociológico. Seus adeptos propõem uma sociologia das emoções que deve procurar as causas sociais, psicológicas, fisiológicas das emoções para explicá-las. Ou, no sentido formalista, deve utilizar-se do método quantitativo que seja capaz de prever as emoções “empiricamente relevantes” e de formular “leis” gerais, na falta de melhor expressão, aplicáveis ao estudo do homem urbano na contemporaneidade.  

 O pragmatismo que em diferentes variantes apresenta-se como uma forma de filosofia capaz de enfrentar os desafios próprios de nosso tempo, certamente, pode ser compreendido do ponto de vista de suas raízes, como sendo devedor, de um lado, ao pragmatismo clássico dos pensadores norte-americanos Charles Peirce, John Dewey, James, Schiller, por outro lado, às filosofias que emergiram da reviravolta pragmática do Wittgenstein das “Investigações Filosóficas”. O pragmatismo norte-americano, que segundo J-P Cometti, “é a filosofia mais solidamente enraizada na cultura americana”, desenvolveu-se em torno de uma filosofia do conhecimento, mas, desde o princípio, se afastou de concepções que tendem a privilegiar a busca de um fundamento no absoluto ou a de um modelo da razão, que determina a priori as possibilidades de busca e de descoberta. Pode-se dizer que o pensamento central da metafísica, é que o conhecimento humano não se limita ao conhecimento da experiência, mas que é possível chegar a um conhecimento objetivo do mundo através dos conceitos. Fundamento da verdade não é o mundo “material empírico”, mas o “mundo do pensamento”, que apreende a estrutura inteligível do real de análise. O espírito humano é compreendido como coextensivo ao mundo em que as leis da lógica exprimem as leis que estruturam a realidade. Esta postura do pensamento clássico como sendo a pretensão de captar, pela mediação do conceito, a forma e o movimento da natureza e da história o que, em última instância, desembocou na ideia de que o ser humano é capaz de descobrir como reparar a injustiça da história humana.

Há cerca de duzentos anos, a ideia de que a verdade era produzida, e não descoberta começou a tomar conta do imaginário individual (o sonho) e coletivo (os mitos, os ritos, os símbolos) europeu. O precedente estabelecido pelos românticos conferiu a seu pleito uma plausibilidade inicial. O papel efetivo de romances, poemas, peças teatrais, quadros, estátuas e prédios no movimento social dos últimos 150 anos deu-lhe uma plausibilidade ainda maior, obtendo legitimidade, já que “as ideias adquirem força na história”. Alguns filósofos inclinaram-se ao Iluminismo e continuaram a se identificar com a ciência. Eles veem a antiga luta entre a ciência e a religião, a razão e a irracionalidade, como um processo em andamento que assumiu a forma de luta entre a razão e todas as mediações intraculturais que pensam na verdade constituída e não encontrada. Eles  consideram que a ciência é a atividade paradigmática e insistem que a ciência natural descobre a verdade, ao invés de cria-la.

Encaram a expressão “criar a verdade” como meramente metafórica e totalmente enganosa. Pensam na política e na arte como esferas em que a ideia de “verdade” fica deslocada. Outros filósofos, percebendo que o mundo descrito pelas ciências físicas não ensina nenhuma lição moral e não oferece conforto espiritual, concluíram que a ciência não passa de uma serva da tecnologia. Esses filósofos alinham-se com o utopista político e com o artista inovador. Os primeiros contrastam a “realidade científica concreta” com o “subjetivo” ou o “metafórico”, os segundos veem a ciência como mais uma das atividades humanas, e não como o lugar em que os seres humanos deparam com uma realidade não humana “concreta”. De acordo com essa visão, os grandes cientistas inventam descrições do mundo que são úteis para o objetivo de prever e controlar o que acontece, assim como os poetas e os pensadores políticos inventam outras descrições do mundo para outros fins. Não há sentido algum, porém, em que qualquer dessas descrições seja uma representação exata de como é o mundo em si. Esses filósofos consideram inútil a própria ideia dessa representação, consignando uma verdade de categoria fenomênica, como uma descrição do espírito ainda não plenamente cônscio de sua natureza espiritual (dialética) e, elevar ao tipo de verdade oferecida pelo poeta e pelo revolucionário político.  

O idealismo alemão representou uma solução de compromisso pouco duradoura e insatisfatória. É que Immanuel Kant e Georg Hegel fizeram apenas concessões parciais em seu repúdio à ideia de que a verdade está “dada”. Dispusera-se a ver o mundo da ciência empírica como um mundo “fabricado” – a ver a matéria como algo construído pela mente, ou como feita de uma mente insuficientemente cônscia de seu próprio caráter mental -, mas persistiram em ver a mente, o espírito, as profundezas do eu como dotados de uma natureza intrínseca – uma natureza que se poderia conhecer por uma espécie de “superciência” não empírica, chamada de filosofia. Isso significava que apenas metade da verdade – a metade científica inferior – era produzida. A verdade superior, a verdade sobre a mente, seara da filosofia, ainda era uma questão de descoberta, não de criação. Richard Rorty precisa sua tese de distinção entre a afirmação de que o mundo está dado e a de que a verdade dada, equivale a dizer, com bom senso, que a maioria das coisas no espaço e no tempo, é efeito de causas que não incluem os estados mentais humanos. Dizer que a verdade não está dada é dizer que, onde não há frases, não há verdade. E que as frases são componentes das línguas humanas, e que as línguas humanas são criações humanas. Só as descrições podem ser “verdadeiras” ou “falsas” - sem o auxílio das atividades dos seres humanos - não pode sê-lo. Em filosofia e lógica, a contingência enquanto representação da realidade é o modo de ser daquilo que não é necessário nem impossível.   

É bem verdade que a liberdade no pensamento tem somente o puro pensamento por sua verdade; e verdade sem a implementação da vida. Por isso, para lembrarmos de Hegel, é ainda só o conceito da liberdade, não a própria liberdade viva. Com efeito, para ela a essência é só o pensar em geral, a forma coo tal, que afastando-se da independência das coisas retornou a si mesma. Mas porque a individualidade, como individualidade atuante, deveria representar-se como viva; ou, como individualidade pensante, captar o mundo vivo como um “sistema de pensamento”; teria de encontrar-se no pensamento mesmo, para aquela expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do pensamento, um conteúdo do que é verdadeiro. Com isso não haveria, absolutamente nenhum outro ingrediente, naquilo que é para a consciência, a não ser o conceito que é a essência. O conceito enquanto abstração, separando-se da multiplicidade variada das coisas, não tem conteúdo nenhum em si mesmo, exceto um conteúdo que lhe é dado. A consciência, quando pensa o conteúdo, o destrói como um ser alheio; mas o conceito é conceito determinado e justamente essa determinidade é o alheio que o conceito possui nele. 

Esta unidade do existente, o que existe, e do que é em si é o essencial da evolução. É um conceito especulativo, esta unidade do diferente, do gérmen e do desenvolvido. Ambas estas coisas são duas e, no entanto, uma. É um conceito da razão. Por isso só todas as outras determinações são inteligíveis, mas o entendimento abstrato não pode conceber isto. O entendimento fica nas diferenças, só pode compreender abstrações, não o concreto, nem o conceito. Resumindo, teremos uma única vida a qual provavelmente está oculta. Mas depois entra na existência e separadamente, na multiplicidade das determinações, e que com graus distintos, são necessárias. E juntas de novo, constituem um sistema. Essa representação é uma imagem da história da filosofia. O primeiro momento era o em si da realização, e em si do gérmen etc. O segundo é a existência, aquilo que resulta. Assim, o terceiro é a identidade de ambos, mais precisamente agora o fruto da evolução, o resultado de todo este movimento. E a isto Hegel chama “o ser por si” do homem, do espírito mesmo. Somente o espírito chega a ser verdadeiro por si, idêntico consigo. O que o espírito produz, é ele mesmo. Ele é um desembocar em seu outro. É um desprendimento, um desdobrar-se, e por isso, ao mesmo tempo, um desafogo.  

Assim sendo, cada um regula tudo de acordo com o seu próprio afeto e, além disso, aqueles que são afligidos por afetos opostos não sabem o que querem, enquanto aqueles que não têm nenhum afeto são, pelo menor impulso, arrastados de um lado para outro. Sem dúvida, tudo isso mostra claramente que tanto a decisão da mente, quanto o apetite e a determinação do corpo são, por natureza, coisas simultâneas, ou melhor, são uma só e mesma coisa, que chamamos decisão quando considerada sob o atributo do pensamento. Existe uma distinção sociológica entre a emoção e os resultados da emoção, principalmente os comportamentos gerados e as expressões emocionais. Mas a emoção não é apenas uma experiência subjetiva, associada a temperamento, personalidade e motivação. As emoções quase sempre se constituem instantaneamente sob condições culturais ou associações combinadas com as emoções básicas, que nos nível individual ocorre como a raiva e desgosto e podem ser combinados em desprezo, no âmbito da relação política, o que pode levar à banalização do processo punitivo.
Orquestrado a partir de uma narrativa que se divide entre as histórias sociais de vida de  seus protagonistas, O Quarteto tem a música clássica de Beethoven “Opus 131 String Quartet in C# Minor” como fio condutor. O roteiro, quando acaba sendo escrito a “quatro mãos”  como ocorreu por afinidades eletivas entre Zilberman e Seth Grossman, beneficia não apenas o ambiente do filme, como seus protagonistas, interpretados dialeticamente por um quarteto de grandes atores: Christopher Walken, Catherine Keener e Mark Ivanir, e principalmente Philip Seymour Hoffman, que nos lembra de que “estrelas mudam de lugar”. No filme “O Último Concerto”, a “dramatis personae” é revista e compreendida pelas cordas do violinista vivido pelo ator que se vê diante do risco do fim do quarteto em que toca há duas décadas, da aposentadoria do amigo que descobre ter Parkinson e da crise de um casamento, “last but not least”, como escopo refere-se à dignidade do sujeito diante da finitude do conhecimento perpassado pela imaginação como representação do resultado.
No filme rememoramos a figura ímpar de Philip Seymour Hoffman, um premiado ator e diretor teatral norte-americano. Iniciou sua carreira na televisão, em 1991, e no ano seguinte começou a aparecer no cinema. Gradualmente conquistou o duro reconhecimento por seu trabalho como ator coadjuvante em diversos filmes célebres, como: “Scent of a Woman”, de 1992, “Twister”, de 1996, “Boogie Nights”, de 1997, “Happiness” e “The Big Lebowski”, de 1998, “Magnolia” e “The Talented Mr. Ripley”, de 1999, “Almost Famous”, de 2000, “25th Hour” e “Punch-Drunk Love”, de 2002, e “Cold Mountain”, de 2003. Em 2005 Hoffman interpretou o papel-título no filme biográfico “Capote”, de 2005, conquistando diversos prêmios, incluindo um Oscar de melhor ator. Foi indicado outras três vezes ao Oscar de melhor ator coadjuvante em “Charlie Wilson`s War”, de 2007, “Doubt”, de 2008 e “The Master”, de 2012. Noutros filmes elogiados pela crítica nos quais atuou estão “Before the Devil Knows You're Dead” e “The Savages”, de 2007. Em 2010 o ator fez sua estreia como diretor de cinema com “Jack Goes Boating”. Philip Seymour Hoffman conseguiu o papel de Plutarch Heavensbee é o principal idealizador nas adaptações cinematográficas de “Em Chamas” (2013), “A Esperança”, parte 1 (2014) e “A Esperança”, parte 2 (2015), da saga “Jogos Vorazes”, de Suzanne Collins.
A sequência natural de conflitos culturais, que anima e conduz o longa-metragem, em meio às angústias existenciais da história, é temperada em toda a sua extensão por uma peça de Beethoven, Opus 131, que o quarteto ensaia para a sua nova temporada – aquela que será a última do doce Peter, vivido com maestria por Christopher Walken desafinações nas cordas. Como consequência, o som produzido fica pouco harmônico, se considerarmos que tal condição é a que persiste até o final. A partir desse dilema, ele questiona sobre as alternativas: O que é melhor? Continuar tocando, tentando atingir uma afinação em grupo, ou desistir? Tal discurso serve de analogia ao conflito principal de O Último Concerto. Quando Peter descobre ter Parkinson em estágio inicial, decide retirar-se do quarteto com as seguintes condições: tocar no primeiro concerto comemorativo dos 25 anos do grupo e, posteriormente, ser substituído por violoncelista, conservando assim a identidade artística do Fugue.
No entanto, tal “desafinação” causa desdobramentos dramáticos muito maiores que os desejados, já que questões internas dos outros músicos, Juliette Gelbart (Catherine Keener), Robert Gelbart (Phillip Seymour Hoffman) e Mark Ivanir (Daniel Lerner), surgem para pôr em risco, profissionalmente a sobrevivência artística do quarteto de cordas. Entrelaçando de maneira interessante e criativa tais questionamentos, o filme de Yaron Zilberman articula-se em si e para si gradualmente desenvolvendo um quadro de infeliz ressentimentos, angústia, escape e enfrentamento, levando seus personagens ao que se pode depreender como limite das emoções. Neste sentido é perceptível a relação que existe entre o conceito do artista e as principais necessidades humanas, como as de manutenção da identidade e de pertencimento ao grupo. É nessa relação social, que o músico conquista a simpatia do seu público-alvo, através da imagem que pretende passar e de quem deseja atingir, para definir qual é a sua linguagem, o seu estilo e personalidade como substrato da criação no âmbito da divisão do trabalho.
 É basicamente uma clássica história padrão como ocorre comparativamente à banda de rock, mas no universo da música clássica. A interação social entre o quarteto, contudo, não é a mesma coisa. Do sujeito talentoso que quer fazer tudo do jeito dele ao segundo violinista, que apresenta o cansaço de ficar relegado ao posto de acompanhamento e quer passar a solar, são  problemas singulares retratados na tela. E também há as questões mais pessoais. Como o personagem do Christopher Walken, que se descobre nos estágios iniciais do mal de Parkinson e precisa arranjar alguém para substituí-lo no grupo quando ele não der mais conta no manejo do “cello”. Ou a crise no casamento entre os personagens de Philip Seymour Hoffman e Catherine Keener. E para completar, a filha deles ainda desenvolve uma relação amorosa/afetiva conturbada com seu professor de violino, que não por acaso do destino é o astro do quarteto e o sujeito (des) conhecido do elenco. No filme há ainda a tópica da solidão que contrasta com a tradição, na ciência, na arte vista como um ofício que transcende a essência do espírito. 
Em homens que através de seu talento se ocupam de problemas de substância, está entre os que facilmente se impacientam pelas cansativas e complicadas discussões de método-e-teoria-em-geral, que lhe interrompe em grande parte os estudos disciplinares adequados. Portanto, somente pela conversação na qual os pensadores experimentados trocam informações sobre as suas formas práticas de trabalho, será possível transmitir ao iniciante um senso útil de método e teoria. A consciência popular do problema, como uma questão e uma preocupação deve ser cuidadosamente levada em conta. A imaginação sociológica permita-nos lembrar, consiste em grande parte na capacidade de passar de uma perspectiva a outra. Estabelecer uma visão adequada da sociedade que ocorre com um grande volume de trabalho, que com frequência é de rotina. Mas há, no caso artístico, certo espírito alegre atrás dessa combinação, bem como um interesse realmente muito grande em ver o sentido disciplinar do mundo e seu treinamento com demasiada precisão. O que leva-nos ao paradoxo de consequências não intencionais, contra o que deveria ser a princípio, espontâneo e mesmo desorganizado, pois quase sempre as ideias originais se apresentam assim, inicialmente, no nível mais concreto de sua execução. 
Bibliografia geral consultada.

DELEUZE, Gilles, Spinoza: Philosophie Pratique. Paris: Éditions Minuit, 1981; MANNHEIM, Karl, “El Problema de las Generaciones”. In: Revista Española de Investigaciones Sociológicas, n° 62, pp. 193-242; 1993; ELIAS, Norbert, O Processo Civilizador. Volume 1. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990; Idem, O Processo Civilizador. Volume 2. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1993; Idem, Mozart, Sociologia de um Gênio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1995; MENEZES BASTOS, Rafael José, “Esboço de uma Teoria da Música: Para Além de uma Antropologia sem Música e de uma Musicologia sem Homem”. In: Anuário Antropológico 95, 1994; STRAVINSKY, Igor, Poética Musical. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996; HARRISON, Charles & WOOD, Paul (Org.), Art en Théorie: 1900-1990. Paris: Editeur Hazan, 1997; HOBSBAWM, Eric, História Social do Jazz. 5ª edição. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 2007; MIRANDA, Paulo Henrique Façanha de, Das Palavras à Vida: O Prazer em Max Weber. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2009; OLIVEIRA, Eduardo Carrascosa, O Naturismo e os Paradoxos da Identidade na Sociedade Contemporânea. Tese de Doutorado. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2012; ANJOS, José Humberto Rodrigues dos, “Na Minha Vida, a Vida Mera das Obscuras”: As Representações do Eu e de Outros Espaços em Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais, de Cora Coralina. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2013; GARCÍA, Toni, Phillip “Seymour Hoffman, o maior de sua geração”. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/02; ANDRADE, Ludmila Santos, Poesia e Crônica em Cora Coralina. Dissertação de Mestrado em Letras e Linguística. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2016; entre outros.

__________________

* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).    

Nenhum comentário:

Postar um comentário