Ubiracy de Souza Braga
“O fruto do nosso apostolado depende da
oração”. São Maximiliano Maria Kolbe
Em meados da década de 1990
ministrava na universidade pública em que trabalho, uma disciplina intitulada:
“Correntes Epistemológicas Contemporâneas” que, apresentada por mim ao
colegiado de curso do extinto Departamento de Ciências Sociais, transformado
posteriormente em Coordenação do
curso de Ciências Sociais, (por que, eu não sei!) continha em seu programa
excertos da hermenêutica de Hans-Georg Gadamer, da filosofia de transição de
Georg Simmel, da fenomenologia de Michel de Certeau, e essencialmente a
temática do poder simbólico desenvolvida hic
et nunc por Pierre Bourdieu. Como consequência das tolas e frequentes
reformas universitárias que apenas racionalizam o sistema de créditos, a nova
disciplina criada como primícias do raisonnement sociologique chegou ao fim,
excluída pelos próceres das Ciências Sociais. Isto quer dizer o seguinte: uma disciplina representa um tempo social,
original de pesquisa como fruto do processo de trabalho com começo, meio e fim
que, neste caso, representa um resultado que pode se converter em causa de uma
ação assembleísta. Mas isto não ocorre
com frequência como “lugares praticados” nas universidades. O Ceará é uma
exceção de ultraconservadorismo docente. Há pouco, por exemplo, submeti ao Apostolado da instituição duas novas disciplinas
para integrar a grade curricular do curso de graduação. No primeiro caso a
disciplina: “Sociologia das Emoções”, e no segundo caso a disciplina: “Teoria Política Contemporânea”, acrescido do projeto de pesquisa: “A
Conciliação como Princípio de Autoridade”. Esta em função do golpe de Estado de
2016 no Brasil. As propostas foram rejeitadas, inicialmente, talvez pelo “excesso” de disciplinas
ofertadas por professores do curso de Ciências Sociais, inclusive em função de
atividades programadas destinadas aos candidatos recém aprovados no exame de seleção
do doutorado tardio em Sociologia.
Autores
notaram a extrema confusão que reina na demasiado rica terminologia do imaginário social: signos, imagens, símbolos,
alegorias, emblemas, arquétipos, esquemas (schémas), esquemas (schèmes),
ilustrações, representações, diagramas e sinepsias são termos empregados pelos
analistas do imaginário social. O esquema é uma generalização dinâmica e
afetiva da imagem, constitui a factividade e a não-substantividade geral do parcours
imaginário. O esquema aparenta-se ao que Jean Piaget, na esteira de Herbert
Silberer, chama “símbolo funcional” e ao que Gaston Bachelard na filosofia
chama de “símbolo motor”. Faz a junção ente dos gestos inconscientes da
sensório-motricidade, entre as dominantes reflexas e as representações. São
esses esquemas que na antropologia do imaginário formam o “esqueleto dinâmico”,
o esboço funcional da imaginação. A diferença entre os gestos reflexológicos
que Gilbert Durand descreve analogamente e os esquemas é que estes últimos já
não são apenas abstratos engramas teóricos, mas trajetos encarnados em
representações concretas bem mais precisas. Os gestos diferenciados em esquemas
vão determinar, em contato com o ambiente natural e social, os grandes
arquétipos que Jung os definiu. Os arquétipos constituem as substantificações
dos esquemas. Carl Jung vai buscar esta noção em Jakob Burckhardt e faz dela
sinônimo de origem primordial, de enagrama, de margem original, de protótipo
social.
O
pensador evidencia claramente o caráter de trajeto antropológico dos arquétipos
quando escreve que a imagem primordial deve incontestavelmente estar em relação
com certos processos perceptíveis da natureza que se reproduzem sem cessar e
são sempre ativos, mas por outro lado é igualmente indubitável que ela diz
respeito também a certas condições inferiores da vida do espírito e da dinâmica
da vida em geral. Bem longe de ter a primazia sobre a imagem, a ideia seria
tão-somente o comprometimento pragmático do arquétipo imaginário num contexto
histórico e epistemológico dado. Neste sentido, o mito representa um sistema
dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico que, sob o
impulso de um esquema tende a compor uma narrativa. O mito é já um esboço de
racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se
resolvem em palavras e os arquétipos em ideias culturais. O mito explicita um
esquema ou um grupo de esquemas. Do modo que o arquétipo promovia a ideia, o
símbolo o nome, concordamos com Gilbert Durand que o mito promove a doutrina
religiosa, o sistema filosófico ou, como bem anteviu Émile Bréhier, a
“narrativa histórica e lendária”. Foi
este princípio, que o psicólogo Carl Jung sentiu abrangido por seus conceitos
de “Arquétipo” e “Inconsciente coletivo”, justamente o que uniu o médico
psiquiatra Jung ao físico Wolfgang Pauli, dando início às pesquisas
interdisciplinares em física e psicologia. A sincronicidade, vale lembrar, se manifesta muitas vezes atemporalmente e/ou em eventos energéticos acausais, e em ambos são
violados princípios associados ao paradigma científico vigente.
No primeiro caso, a sociologia das emoções se constituiu como uma subárea da disciplina sociologia nos anos 1990, como primícias de um processo iniciado nos Estados Unidos da América quase duas décadas antes. Herdeiros de duas escolas sociológicas distintas, a funcionalista de Talcott Parsons e a interacionista simbólica, de George Herbert Mead, Herbert Blumer e Erving Goffman, dos sociólogos norte-americanos Randall Collins, Theodore Kemper, Jonathan Turner, Norma Denzin, Arlie Hochschild, Susan Shott, Steven Gordon e Thomas Scheff, desenvolvem a partir das suas respectivas filiações, teorias sociológicas alternativas, e, até certo ponto, conflitantes, para a compreensão das emoções. As tensões conceituais e metodológicas entre tais proposições envolvem questões sociológicas fundamentais, cuja origem remota aos debates travados entre os pragmatistas William James, John Dewey e George Herbert Mead. As respostas a essas questões dizem respeito à definição do conceito sociológico. Seus adeptos propõem uma representação disciplinar da sociologia das emoções que deve procurar as causas sociais, psicológicas, fisiológicas para explicá-las.
No segundo caso,
apresentamos notas de pesquisa que propus como objetivo a análise comparativa
do processo eleitoral anterior ao Golpe de Estado de 17 de abril de 2016 no
Brasil, pretendendo descrever as nuances no nível de análise política em torno
da questão fulcral do princípio de autoridade no Brasil. A
nossa política é a política da conciliação inclusiva à universidade. Fomos nós
os primeiros que a iniciamos por fatos políticos e não por palavras. É a
representação da política da conciliação, mas não dessa conciliação dos
princípios, da conciliação que se firma por atos legislativos e
administrativos. A conjuntura política
em que vivemos sugere que não fomos tomados de surpresa com a abrupta mudança
presidencial ocorrida em 17 de abril de 2016.
A destituição da presidente eleita Dilma Rousseff, do Partido dos
Trabalhadores (PT) representou um golpe de Estado com deputados e senadores -
profundamente envolvidos em casos de corrupção, pois fala-se em 60% da
representação parlamentar que instituiu um processo de destituição pretextando
irregularidades contábeis, as chamadas “pedaladas fiscais”, para cobrir déficits causados no âmbito político nas contas públicas – uma
prática corriqueira em todos os governos anteriores, inclusive de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) após o período da chamada
redemocratização no âmbito do movimento social Diretas Já!
A departamentalização acadêmica surge à medida que as instituições
públicas tornam-se “maiores” e envolvem a tout
court atividades mais diversificadas, forçando-as a dividir as principais
atividades em função da carga horária e tarefas administrativas e transformá-las
em responsabilidades departamentais ou divisionais. Os diferentes tipos usuais
de departamentalização definem os critérios organizacionais para agrupar as pessoas em unidades, para que
possam ser aparentemente melhor administradas. As universidades públicas podem
recorrer quanto à escolha de determinados tipos de departamentalização. Para
isso, devem reconhecer, analisar e escolher o melhor tipo de
departamentalização que assegure os projetos individuais e coletivos em termos
de Pesquisa & Desenvolvimento. Existem tipos de abordagens que definem os
critérios de subordinação da hierarquia.
Cada abordagem departamental tem uma finalidade política distinta para a
instituição, sendo o que a diferença entre cada tipo de abordagem é a maneira
como as atividades são agrupadas e a que grupo de poder se subordinam.
Temos um caso-limite quando o
Cardeal de São Paulo, Dom Odilo Scherer, e os bispos de sua Arquidiocese,
anunciaram recentemente que não autorizariam a criação, prevista em meados de
2011, da Cátedra “Michel Foucault e a Filosofia do Presente” na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Por ocasião do 7° Colóquio Internacional Michel Foucault,
que reuniu na PUC-SP dezenas de especialistas na obra do filósofo e pesquisador,
centenas de interessados, foi assinada uma Carta
de apoio a essa iniciativa. A lista dos signatários incluía de forma
extraordinária desde membros do Collège
International de Philosophie aos membros da Universidad San Martin na
Argentina, da Universidad de los Andes na Venezuela e da Universidad de Valparaiso
no Chile, obtendo a solidariedade do Consulado Geral da França em São Paulo. Do latim cathedra que tem origem num vocábulo grego que
significa “assento” ou “cadeira”, a cátedra é a disciplina/cadeira,
metaforicamente, que ensina um catedrático - professor que tenha preenchido
determinados requisitos para partilhar conhecimentos e que tenha alcançado o
posto mais alto na docência.
O termo também é usado para fazer referência à
função e ao exercício do catedrático. Essa Cátedra, que leva o nome de Michel
Foucault, não é dedicada à leitura de seus escritos – que hoje já é parte da
cultura clássica. Ela está voltada, sob o impulso não exclusivo de seus
trabalhos, como o diz seu título, para uma livre análise, informação e debate
sobre questões de filosofia e de vida civil contemporânea. A recusa de tal
Cátedra, aberta à complexidade e diversidade de estudos e pesquisas na
atualidade, contradiz a deontologia universitária assim como seu fundamento
filosófico. A Universidade seria sua primeira vítima, ironicamente, no caso da
PUC-SP, da 2ª morte de Michel Foucault. Tem-se aí metodologicamente um dos princípios mais
importantes dessa atividade consagrada a si mesmo. Ela não constitui um
exercício da solidão; mas sim uma verdadeira prática social. E isso, em vários
sentidos. Mas toda essa aplicação a si não possuía como único suporte social a
existência das escolas, do ensino e dos profissionais da direção da alma; ela
encontrava, facilmente, seu apoio em todo o feixe de relações habituais de parentesco,
de amizade ou de obrigação.
Quando, no exercício do cuidado de si, faz-se apelo
a outro, o qual se advinha que possui aptidão para dirigir e para aconselhar,
faz-se uso de um direito; e é um dever que se realiza quando se proporciona
ajuda a outro ou quando se recebe com gratidão as lições que ele pode dar na
duração da vida. Acontece também do jogo entre os cuidados de si e a ajuda do
outro inserir-se em relações sociais preexistentes às quais ele dá uma nova
coloração e um calor maior. O cuidado de si – ou os cuidados que se tem com o
cuidado que os outros devem ter consigo mesmos – aparece então como uma
intensificação das relações sociais. Sêneca dedica um consolo à sua mãe, no
momento em que ele próprio está no exílio, para ajudá-la a suportar essa
infelicidade atual e, talvez, mais tarde, infortúnios maiores. O “cuidado de
si” aparece, portanto, intrinsecamente ligado a uma espécie de “serviço da
alma” que comporta a possibilidade de um jogo de trocas com o outro e de um
sistema de obrigações recíprocas. Neste aspecto singular da vida Michel
Foucault abriu uma porta ao eterno.
A
característica marcante do “coquetismo”, em termos platônicos, para Georg
Simmel representa o estado intermediário entre o ter e o não ter. Assim,
podemos entender como sendo próprio da mulher coquete despertar o interesse e o
desejo do Outro por meio da alusão ao
ato da entrega e não pela entrega em si. A mediação entre o ter e o não ter, que é a essência do coquetismo, se constitui também no
fundamento último do erotismo. O “querer agradar” da coquete ainda não é, em si
e por si, o que dá a seu comportamento o cunho decisivo. Assim, traduzir
coquetismo por “necessidade de agradar” é confundir o meio em um fim e a pulsão
orientada para esse fim. Uma mulher pode lançar mão de tudo para agradar, dos
encantos espirituais à exposição mais insistente de seus encantos físicos, que
ainda assim distinguir-se-á bastante da coquete. Através da dicionarização do
vocábulo, seu sentido refere-se “à procura com o objetivo de despertar
admiração, tendo cuidados excessivos com a aparência física ou outros dotes”.
Na filosofia o sentido do coquetismo não pode ser limitado ao “querer agradar”, pois é um equívoco que tem uma profunda ligação com a autoestima.
Antropologicamente
a humanidade sempre atravessa estágios em que: a) opressão da individualidade é
o ponto de passagem obrigatório de seu livre desabrochar superior, em que a
pura exterioridade das condições de vida se torna a escola da interioridade, b)
em que a violência da modelagem produz uma acumulação de energia, destinada, em
seguida, a gerar toda a especificidade pessoal. Do alto desse ideal é que, c) a
individualidade plenamente desenvolvida, tais períodos parecerão, é claro,
grosseiros e indignos. Mas, para dizer a verdade, além de semear os germes
positivos do progresso vindouro, já é em si uma manifestação do espírito
exercendo uma dominação organizadora sobre a matéria-prima das impressões
flutuantes, uma aplicação das personalidades especificamente humanas, procurando
elas próprias fixar suas normas de vida - do modo mais brutal, exterior ou,
mesmo, estúpido que seja -, em vez de recebê-las das simples forças da
natureza. A horda, uma estrutura social e militar histórica encontrada na estepe eurasiática “não protege mais a
moça e rompe suas relações com ela, porque nenhuma contrapartida foi obtida por
sua pessoa”.
Para
Simmel diante do “conflito” (“Kampf”) os indivíduos vivem em relações sociais de
cooperação, mas também de oposição, portanto, os conflitos são parte mesma da constituição
da sociedade. É neste sentido que formam momentos de crise, um intervalo entre
dois momentos de harmonia, vistos numa função positiva de superação das
divergências. Fundamenta uma episteme em torno da ideia de movimento, da
relação, da pluralidade, da inexorabilidade do conhecimento, de seu caráter
construtivista, cuja dimensão central realça o fugidio, o fragmento e o
imprevisto. Por isso, seu panteísmo estético, ancorado sob forma paradoxais de interpretação real, como episteme, no qual se entende que cada ponto, cada fragmento
superficial e, portanto fugaz é passível de significado estético absoluto, de
compreender o sentido total, os traços significativos, do fragmento à
totalidade.
O
significado sociológico do “conflito”, em princípio, nunca foi contestado.
Conflito é admitido por causar ou modificar grupos de interesse, unificações,
organizações. Por outro lado, pode parecer paradoxal na visão do senso comum se
alguém pergunta se independentemente de quaisquer fenômenos que resultam de
condenar ou que a acompanha, o conflito é uma forma de “sociação”. À primeira
vista, isso soa como uma pergunta retórica. Se todas as interações entre os
homens é uma sociação, o conflito, - afinal uma das interações mais vivas, que,
além disso, não pode ser exercida por um indivíduo sozinho, - deve certamente
ser considerado como “sociação”. E, de fato, os fatores de dissociação, tais
como ódio, inveja, necessidade, desejo, são as causas da condenação, que
irrompe em função deles. Conflito é, portanto, destinado a resolver dualismos
divergentes, é a maneira de conseguir algum tipo de unidade, que seja
através da aniquilação de uma das partes em litígio.
A
imagem está associada a conhecimentos
pretéritos adquiridos e concernentes ao objeto que ela de fato representa. Ela
não apreende nada além daquilo que nós podemos extrair da realidade durante o
trabalho de percepção. A imagem não se relaciona com o mundo em si, ela só
depende do processo de como podemos descobrir algo sobre ela. Portanto, se
existe uma possibilidade de se observar o objeto através da imaginação, mesmo
assim essa possibilidade ainda não nos permite apreender nada de novo em
relação ao objeto. A imagem, ato da consciência imaginante, é um elemento,
identificado como o primeiro e incomunicável, como produto de uma atividade
consciente atravessada de um extremo ao outro por uma corrente de “vontade
criadora”. Trata-se, de dar-lhe à sua própria consciência um conteúdo de
sentido imaginante, próximo da analogia weberiana da interpretação da ciência que recria para si os objetos afetivos espontaneamente ao
seu redor: ela é criativa.
Daí
a importância de se compreender no campo da imagem, de sua produção, recepção,
influência, de sua relação com o sonho, o devaneio, a criação e a ficção, a
substituição das mediações pelos meios de comunicação, posto que contenha em si
uma possibilidade de violência, a partir da constituição do novo regime de
ficção que hoje afeta, contamina e penetra a vida social. Ipso facto temos a sensação de sermos colonizados, mas sem saber
precisamente por quem. Não é facilmente identificável e, a partir daí é normal
questionar-se sobre o papel da cultura ou da ideia que fazemos dela. O etnólogo
Marc Augé reitera que as “etnociências” se atribuem sempre dois objetivos,
proposto por ele ao final em seu opúsculo “La guerre des rèves” (1997). Usado
como prefixo, “etno” relativiza o termo que o segue e o faz depender da “etnia”
ou da “cultura” que supõe ter práticas análogas às que chamamos “ciências”:
medicina, botânica, zoologia etc. Desse ponto de vista, a etnociência tenta reconstituir o que serve de ciência aos outros,
suas práticas sanitárias e do corpo, seus conhecimentos botânicos, mas também
suas modalidades de classificação, de relacionamento etc. É claro que, a partir
do momento em que se generaliza a etnociência muda de ponto de vista.
Ela
tenta emitir uma apreciação sobre os modelos locais, indígenas, e compará-los a
outros e, além disso, propor uma análise dos procedimentos cognitivos em ação
num certo número de experiências. Ela leva então às vezes o nome de
antropologia: fala-se assim em antropologia médica ou cognitiva. Em verdade,
quando Augé recoloca a questão: “que é nosso imaginário, hoje?”, por outro
lado, ele se indaga se nestes dias não estamos assistindo a uma generalização
do fenômeno de fascínio da consciência que nos pareceu característico da
situação colonial e de seus diferentes avatares? Trata-se de “exercícios de Etnoficção”,
em analisar o estatuto da ficção ou as condições etnológicas de seu surgimento numa
sociedade, e ipso facto num momento histórico particular, em analisar os diferentes gêneros
que se irradiam sob formas ficcionais, sua relação com o imaginário individual e coletivo, as
representações da morte etc., em diferentes sociedades ou conjunturas.
Temos
o que fica reservado como lugar de representação do conhecimento, posto que bem
entendido o nível ao qual se aplica a pesquisa antropológica, ela tem por
objeto interpretar a interpretação que os outros fazem da categoria do outro,
nos diferentes níveis que situam o lugar dele e impõem sua necessidade. Melhor
dizendo, tendo como representação social etnia, tribo, aldeia, linhagem ou
outro modo de agrupamento até o átomo elementar de parentesco, do qual se sabe
que submete a identidade da filiação à necessidade da aliança, o
individualismo, enfim; que todos os sistemas rituais definem como compósito e
pleno de alteridade, figura literalmente impensável, como o são, em modalidades
opostas, a do rei e a do feiticeiro. O fato social é que deste ângulo de
análise há um princípio abrangente e primordial, porque norteador, pois “toda
antropologia é antropologia da antropologia dos outros, além disso, que neste
âmbito, o lugar antropológico, é simultaneamente princípio de sentido para aqueles que o habitam e
princípio de inteligibilidade para
quem o observa”. Essa inteligibilidade, ao que nos parece, fornece e propõe no âmbito de apropriação dos saberes que as
condições de uma antropologia da contemporaneidade devem ser deslocadas do
método para o objeto. E além disso, que deve-se estar atento às mudanças que afetaram as
grandes categorias por meio das quais os homens pensam sua identidade e suas
relações recíprocas em termos espaciais.
Assim,
se um lugar de análise pode se definir como identitário, relacional e
histórico, um espaço que não pode se definir nem como identitário, nem como
relacional, nem como histórico definirá um na etnologia da solidão de Marc
Augé, o que ele denominou analiticamente de “não-lugar”. A hipótese adjudicada
na teoria, e, portanto, no pensamento, é o que o autor chama de surmodernité conquanto produtora de não-lugares, de espaços que não são em si lugares
(tradicionais) antropológicos. Isto é importante. Estas características comuns
podem ser aplicadas a dispositivos institucionais diferentes e que constituem,
de certo modo, as formas elementares de compreensão do espaço social. Trata-se de aspectos
gerais e que se identificam enquanto itinerários ou eixos ou caminhos que, do ponto de vista etnológico
conduzem de um lugar a outro. Mas também em cruzamentos e praças, que
satisfazem por assim dizer esferas de ação social, que nos mercados definem
necessidades do intercâmbio econômico e, nesta progressão, centros mais ou menos monumentais. Sejam eles religiosos ou políticos construídos por certos homens e mulheres e
que definem como outros, em relação a outros centros e outros espaços sociais.
Contrariando
esta dimensão analítica para repensar o trabalho nas instituições públicas, a
particularidade da Universidade Estadual do Ceará (UECE) é que a prática
institucional decorre em um confronto do Apostolado (casta) tendo como leitmotiv a luta pelos cargos. O
exercício da autoridade legal está relacionado com o cargo ocupado pelo
funcionário-professor. As normas legais são abstratas enquanto consideradas
como um sistema integrado demonizado no
âmbito discursivo do direito, concretizado na aplicação da lei nos casos
particulares contrário ao apostolado. Desse modo, o processo administrativo
orienta-se para os interesses pessoais
assim definidos pelas ordenações da instituição, dentro dos limites legalmente
estabelecidos e de acordo com os princípios gerais aprovados em conformidade pelas
relações de compadrio pelas ordenações.
O exercício da autoridade legal está relacionado com o cargo ocupado pelo funcionário-professor,
servidor público concursado e habilitado ao cargo, o que implica em sua
subordinação a uma ordem pessoal para a qual orienta suas ações políticas. Isto
significa que a obediência aparentemente não é devida ao indivíduo, mas ao
cargo ocupado, que representa uma
posição efetiva de autoridade com limites legalmente definidos. O membro do
Apostolado obedece aos critérios racionais da administração.
Bibliografia
geral consultada.
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Petite Bibliothèque Rivages, 1988; TAVARES, Ana Maria, Armadilhas para os
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Vivendo na Linha: Marcos e Marcas de uma Cultura de Fronteira à Luz da
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Mota, O Apostolado dos Padrões: Limites e Possibilidades de um Plano Industrial
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Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História. Centro de Filosofia e Ciências
Humanas. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2012; AUGÉ, Marc, Non-Lieux.
Introduction à une Anthropologie de la Surmodernité. Paris: Éditions du
Seuil, 1992; Idem, La Guerre des Rêves. Exercices d’Ethno-Fiction. Paris:
Éditions du Seuil, 1997; Idem, El Antropólogo y el Mundo Global. México: Siglo
Veintiuno Editores, 2014; Idem, O Duplo da Vida: Etnologia, Viagem, Escrita.
Maceió: Editora da Universidade Federal de Alagoas, 2014; “Como Um Escritor
É Lido? Sobre a Apropriação de Elias Canetti pelas Universidades Brasileiras”.
In: Plumilla Educativa 14 (14) :225-238, 2014; RIBEIRO,
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Dissertação de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: Universidade
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