Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza Braga
“L’agresseur n’est pas celui qui se revolte mais celui qui afirme”.
Maio de 68 em Nanterre
Manifestação em 29 de maio de 1968 em Paris. |
Atingimos
na modernidade a compreensão do visível como visível e pari pasu do invisível como invisível, enquanto vínculo orgânico
que une o invisível ao visível concreto. Assim, é visível todo objeto ou
problema que se situa no terreno, e no horizonte, isto é, no campo estruturado
definido da problemática teórica de determinada disciplina teórica.
Impõe-se-nos tomar essas palavras ao pé da letra. Alguns autores ajudam-nos a
elucidar esses termos. A visão já não é então a representação de uma pessoa
individual, dotada da faculdade de “ver” a qual é exercida quer da atenção,
quer da distração. A vista é o fato imediato de suas condições estruturais. A
vista é a relação de reflexão imanente do campo da problemática sobre seus
objetos e seus problemas. A visão perde então seus privilégios religiosos da
“leitura sagrada”. Nada mais é que a reflexão da necessidade imanente que liga
o objeto ou o problema às suas condições de existência, que têm a ver com as
condições de sua produção. A rigor, não é mais o olho do espírito de uma pessoa
que vê o que existe no campo definido por uma problemática teórica. E esse
próprio campo que se vê nos objetos ou nos problemas que ele define, sendo a visão apenas a reflexão necessária do
campo de análise em seus objetos.
O
Quartier Latin deve seu nome à época
Medieval, quando os habitantes da zona eram estudantes que utilizavam o latim
para se comunicar. Desde a Idade Média, os estudantes do “Bairro Latino”
tiveram uma grande influência sobre a França, e durante os séculos XIX e XX
promoveram movimentos estudantis de grande transcendência política. O Quartier Latin foi um dos centros da
Revolução de Maio de 68. Depois de atravessar a Praça de Saint Michel, na qual
há uma enorme fonte com a figura de São Miguel lutando com um dragão, há
pequenas e encantadoras ruazinhas que formam o Bairro Latino. A partir desse
ponto, tudo que você verá são restaurantes e cafeterias que oferecem terraços
agradáveis com preços acessíveis. Embora haja muitas ruas com restaurantes
agradáveis, uma das principais artérias do bairro é a Rue Huchette. O Quartier
Latin é um bairro que fica no quinto e no sexto distritos de Paris, na França.
Localiza-se na margem esquerda (sul) do Rio Sena, em torno da Universidade de
Sorbonne. O nome do bairro deriva do fato de o latim ter sido amplamente falado
próximo à universidade durante a Idade Média. Atualmente, ainda abriga vários
estabelecimentos de ensino superior, como a École Normale Supérieure, a École
des Mines de Paris e o Campus Universitaires de Jussieu. Durante os anos 1960,
especialmente em maio de 1968, foi um grande palco de contestação da sociedade.
Em
6 de maio houve novos enfrentamentos no Quartier
Latin (“Bairro Latino”): 422 presos, 345 policiais e em torno de 600
estudantes feridos. A repressão utilizada através dos aparelhos de Estado
provocara uma indignação generalizada nas cidades. Os estudantes enfurecidos
arrancaram paralelepípedos do chão, utilizados como arma, para arremessar
contra os policiais e levantaram barricadas seguindo a boa tradição francesa.
Os estudantes das universidades na França saíram em seu apoio. Na noite de 10
de maio houve uma ampla revolta no Bairro Latino. Os manifestantes levantaram
barricadas e a polícia os atacou com grande violência. Homens armados da polícia
anti-distúrbios tomaram de assalto apartamentos privados e golpeou gente
simples e corrente, até mesmo o inclusivo caso de uma mulher grávida. Depararam-se
com uma resistência que não esperavam. Os parisienses de suas janelas
rechaçavam a polícia atirando vasos de plantas e objetos pesados. Dos 367
hospitalizados, 251 eram policiais, 720 pessoas feridas e 468 foram
presas. Carros foram destruídos ou queimados. O Ministro da Educação insultou
os manifestantes: “Ni doctrine, ni foi, ni loi”.
Começou
assim como uma série de greves estudantis que irromperam em algumas
universidades e escolas de ensino secundário em Paris, após confrontos com a
administração e a polícia. A tentativa do governo gaullista de esmagar essas
greves com mais ações policiais no Quartier
Latin levou a uma escalada do conflito, que culminou numa greve geral de
estudantes e em greves com ocupações de fábricas em toda a França. O símbolo
unificador dos protestos foi O Livro
Vermelho de Mao Tsé-Tung e sua inspiração imediata a Revolução Cultural Chinesa,
iniciada em 1966 em que o governo de Pequim usava massas de jovens enraivecidos
como “tropa de choque” para perseguir, humilhar, torturar e matar milhares de
adversários do regime. Alguns filósofos e historiadores afirmaram que esse
evento foi um dos mais importantes e significativos do século XX, porque não se
deveu a uma camada restrita da população, como trabalhadores e camponeses - que
eram maioria -, mas a uma insurreição popular que superou barreiras étnicas,
culturais, de idade e de classe. Além disso, teve intrínsecas ligações com os
acontecimentos do pós-guerra e com os da chaamda Guerra Fria.
Vale
lembrar que as noções sociológicas e política de “esquerda” e “direita” são
rótulos antigos, que remontam à clássica Revolução Francesa. Em 1789, a Assembleia
Nacional Constitutiva reuniu-se para decidir se, sob o novo regime político da
França, o rei deveria ter poder de veto. Em caso afirmativo, perguntava-se se
esse direito deveria ser absoluto ou simplesmente suspensivo, por um período de
tempo. Ao votar, os partidários do veto absoluto se sentaram ao lado direito do
presidente, o lado nobre. De acordo com a tradição cristã, é uma honra
sentar-se ao lado direito de Deus, ou à direita do chefe da família na hora do jantar.
Aqueles que queriam um veto altamente restrito estavam sentados à esquerda. A
organização da sala assumiu o significado político: à direita, aqueles apoiantes de uma
monarquia que procurou preservar os poderes do rei; à esquerda, aqueles que
desejavam reduzi-los. No século XIX, este vocabulário cada vez mais usado
para descrever as tendências políticas dos membros do parlamento francês.
Colocariam monarquistas versus republicanos e depois republicanos conservadores versus modernistas que programaram as principais reformas sociais da
Terceira República, mas que incluíam a liberdade de imprensa, a liberdade de
associação, o direito de pertencer a um sindicato e o divórcio, entre outras
coisas. Na virada do século 20, o debate político-ideológico entre esquerda-direita abrangeu essencialmente
a divisão entre os defensores do Catolicismo e os defensores da separação da
Igreja e do Estado. Esta mudança, que ocorreu em 1905, é muitas vezes referida
como “o choque das duas Franças” – católica e anticlerical. A partir da década
de 1930, a divisão surgiu, com a esquerda defendendo o socialismo e a
direita a liberalização econômica. Na década de 1970, a liberalização
dos costumes tornou-se questão
fundamental, com debates contínuos sobre aborto, divórcio, homoerotismo,
igualdade matrimonial, eutanásia, entre outros aspectos. O mesmo se aplica à
imigração e abertura à globalização que se opõe ao protecionismo cultural,
social e econômico.
Como
presidente, Charles de Gaulle (1890-1970) pôs fim ao caos político que precedeu
o seu regresso ao poder. Durante seu governo, promoveu o controle político da
inflação e instituiu uma nova moeda em janeiro de 1960. Também fomentou o
crescimento industrial. Apesar de ter apoiado inicialmente o domínio imperialista
francês sobre a Argélia, decidiu mais tarde “conceder” a independência àquele
país, encerrando uma guerra cara, violenta e impopular. A decisão dividiu a
opinião pública francesa, e De Gaulle teve que enfrentar a oposição dos colonos
chamados pieds-noirs e dos militares
franceses que tinham inicialmente apoiado seu retorno fabuloso ao poder. Em 13
de maio de 1958, os argelinos de origem europeia apelam ao general Charles De
Gaulle, fora do poder desde 1950, para manter a soberania da França sobre a
Argélia.
No
começo de 1958, o deputado democrata-cristão de Estrasburgo, Pierre Pflimlin,
estava sendo sondado para o cargo de primeiro-ministro da Quarta República.
Porém, havia a suspeita de que queria negociar um cessar-fogo com os rebeldes
da Frente Nacional de Libertação (FNL)
que lutavam pela independência da Argélia. Os gaullistas que militavam de corpo
e alma pelo retorno ideológico de De Gaulle ao poder encorajam os “Pieds-noirs”
- população francesa das antigas colônias no norte da África - à sedição contra
Pflimlin. Deixam entender que o general é a personalidade em melhores condições
estratégicas de manter os três departamentos argelinos da república francesa. De
Gaulle empreendeu o desenvolvimento de armas nucleares francesas e promoveu uma
política externa pan-europeia, buscando livrar-se das influências
norte-americana e britânica. Retirou da França, o comando militar da OTAN - Organisation du Traité de l'Atlantique Nord
apesar de continuar a ser membro da aliança ocidental - e por duas vezes vetou
a entrada do Reino Unido na Comunidade Europeia.
Viajou
frequentemente pela Europa Oriental e por outras partes do mundo quando
reconheceu a virada da China ao comunismo. Em 1967, durante uma visita oficial
ao Canadá, incentivou publicamente o Movimento pela Independência de Quebec, o
que causou a mais grave crise diplomática entre a França e o Canadá. Seu
discurso pronunciado em Montreal, no dia 24 de julho, foi concluído exatamente
com o slogan dos separatistas: “Viva o Quebec livre!”, o que foi interpretado
pelas autoridades canadenses como apoio do presidente francês ao movimento
autonomista. Foi alvo de três atentados confirmados, todos eles falhados. O
primeiro ocorreu em Paris, no ano de 1945, por atiradores furtivos alemães.
Outro em 8 de Setembro de 1961, organizado por Raoul Salan, uma bomba fabricada
com explosivo plástico explodiu perto de seu carro. O último aconteceu em 22 de
Agosto de 1962, quando seu carro foi crivado de balas, ficando o vidro traseiro
estilhaçado e os pneus estourados, num atentado que mais tarde foi narrado no best-seller “O Dia do Chacal”, de
Frederick Forsyth. Ainda em 1963, seria desbaratado um complô na Escola Militar
para enfim matá-lo. De Gaulle também enfrentou a oposição dos comunistas e
socialistas. Apesar de ter sido reeleito presidente em 1965, desta vez por voto
popular direto, em maio de 1968 parecia provável que perdesse o poder, em meio
a protestos generalizados de estudantes e trabalhadores. No entanto, sobreviveu
à crise com uma ampliação da maioria na Assembleia. Em 1969, depois de perder
um referendo sobre a reforma do Senado e a regionalização, renunciou.
-
“Morreu o general De Gaulle. A França ficou viúva”. Com essas palavras, o presidente Georges Pompidou anunciou em 10 de
novembro de 1970 a morte, aos 80 anos, do homem que libertou a França do
nazismo, presidiu o país durante longos 11 anos e devolveu sua aparente
grandeza. A notícia da morte, ocorrida na noite anterior em consequência de
aneurisma cerebral, levou 14 horas para ser divulgada. A primeira reação na
sociedade foi de surpresa e incredulidade. Estudantes esquerdistas ergueram
vivas ao ser anunciada a morte do estadista. Eles enxergavam em De Gaulle a “velha ordem” que precisava ser destruída. Georges Marchais, líder
do Partido Comunista Francês (PCF), declarou ao Estado: - “De Gaulle
representava a política contra a qual lutamos”. O general associou seu nome à
resistência francesa que lutou contra os invasores nazistas. – “É disso apenas
que desejo me lembrar neste momento”, acrescentou. Foi sepultado no túmulo da
família em Colombey-les-deux-Eglises.
O Maio de 68 representou uma grande onda
de protestos que teve início com manifestações
estudantis para pedir reformas no setor educacional. A maioria dos insurretos
era adepta a ideias esquerdistas, comunistas ou anarquistas. Muitos viam os
eventos como uma oportunidade para sacudir os valores conservadores,
contrapondo ideias avançadas sobre a educação, a sexualidade e o prazer. Entre
eles, uma barulhenta minoria, como o Occident,
professava ideias de direita. O começo de tudo ocorreu com uma série de
conflitos entre estudantes e autoridades da Universidade de Paris, em Nanterre,
cidade próxima à capital francesa. No dia 2 de maio de 1968, a administração
decidiu fechar a escola e ameaçou expulsar vários estudantes acusados de
liderar o movimento contra a instituição. As medidas provocaram a reação
imediata dos alunos de uma das mais renomadas universidades do mundo ocidental,
a vetusta Sorbonne, em Paris. Eles se reuniram no dia seguinte para protestar,
saindo em passeata sob o comando do líder estudantil Daniel Cohn-Bendit. A
polícia reprimiu estudantes com violência e durante dias as ruas de
Paris viraram cenário de brutais batalhas.
A partir de 68 o “modelo profético do
engajamento” passa a sofrer um acentuado declínio, atingindo em cheio os
privilégios do intelectual que, autônomo em relação aos partidos ou a quaisquer
organismos políticos, se punha a representar os interesses gerais, uma
universalidade personificada e estilizada pelo seu carisma. A especialização
resultante do fortalecimento das ciências humanas, somada à crescente divisão
do trabalho e a prevalência do paradigma científico, condicionou o cenário em
que o engajamento profético dos intelectuais veio a ser substituído pelo modelo
que conciliava o saber localizado e a luta política concreta, estabelecidos
mutualmente por limites estratégicos particulares, o “intelectual crítico
especializado” ou, segundo seu nome foucaultiano de batismo, o “intelectual específico”.
Daí a filosofia da diferença, embora avessa à teleologia dialética da história,
ganhar repercussão no círculo acadêmico e, sem ajuste ou adaptação, encontrar
afinidade de princípios junto a determinadas franjas da esquerda extraparlamentar.
Porque essa filosofia, inicialmente deleuzeana e depois esquizoanalítica, era
portadora de categorias que remetiam ao sentido dos engajamentos em curso, ela
mostrava-se capaz de indexar, na sua própria linguagem conceitual, a disposição
subjetiva de boa parte da militância “gauchista”, o “fundo rebelde irredutível”
que permaneceria ativo sob as diferenças de toda representação política.
O
Maio de 1968 tem sido reconhecido como a maior greve geral da história. Este
poderoso movimento aconteceu no auge da economia na esfera capitalista do
pós-guerra. A reação violenta do governo só ampliou a importância das
manifestações: o Partido Comunista Francês (PCF) anunciou seu apoio aos
universitários e uma influente federação de sindicatos convocou uma greve geral
para o dia 13 de maio. No auge do movimento, quase dois terços da força de
trabalho do país cruzaram os braços. Pressionado, no dia 30 de maio o
presidente Charles De Gaulle convocou eleições para junho. O movimento cresceu
tanto que proporcionalmente evoluiu para uma greve de trabalhadores que
balançou as estruturas e técnicas persuasivas do governo do presidente Charles
De Gaulle. Os universitários se uniram politicamente aos operários e promoveram
a maior greve geral da Europa, com a participação de cerca de 9 milhões de
pessoas. Isso enfraqueceu politicamente o general De Gaulle, que renunciou um
ano depois. Os acontecimentos de maio, com sua força bruta, não foram previstos
pelos analistas e estrategistas do capital, nem na França nem em nenhum lugar
do mundo.
O
general foi incapaz até mesmo de imprimir as cédulas do referendo devido à
greve dos trabalhadores das gráficas franceses e a negativa de seus colegas
belgas de atuar como fura greves. Este não foi o único exemplo de solidariedade
internacional. Os condutores de trens alemães e belgas detinham seus trens na
fronteira francesa para não romper a greve. As forças da reação, até esse
momento em estado de choque e obrigadas a estar na defensiva, começaram de fato
a se organizar. Foram criados Comitês de
Defesa da República (CDR), como tentativa de mobilizar a classe média
contra os trabalhadores e estudantes. A correlação de forças de classe não é
uma questão puramente numérica do tamanho da classe trabalhadora em relação ao
campesinato e da classe média em geral. Uma vez que o proletariado entre na
luta decisiva e demonstra ser uma força poderosa na sociedade, atrai
rapidamente a massa explorada de camponeses e de pequenos comerciantes de
classe média que são vítimas da usura dos bancos e dos monopólios. Este fato
era evidente como sodalidade em 1968, quando os camponeses levantaram bloqueios
nas estradas ao redor de Nantes e distribuíram comida grátis aos grevistas. Uma
importante característica da sodalidade é sua autonomia. Entendemos que há de
se diferenciar aqui autonomia de independência.
Uma
vez na luta, os trabalhadores começaram a ter iniciativas que ultrapassavam os
limites de uma greve normal. Um elemento fundamental na equação foram os meios
de comunicação de massas. Formalmente, são armas poderosas nas mãos do Estado,
mas também dependem dos trabalhadores, que fazem funcionar as emissoras de
rádio e televisão. No dia 25 de maio a rádio televisão estatal, a Office de Radiodiffusion-Télévision
Française (ORTF) entrou em greve. Suprimiram as notícias das oito da noite.
Os gráficos e jornalistas impuseram uma espécie de controle operário sobre a
imprensa. Os jornais burgueses tinham que submeter seus editoriais ao
escrutínio e deviam publicar as declarações dos comitês de trabalhadores. A Assembleia
Nacional discutiu a crise universitária e as batalhas do “Bairro Latino”.
Porém, os debates nos salões da assembleia já eram irrelevantes. O poder havia
escapado das mãos dos legisladores e agora estava nas ruas. No dia 24 de maio,
o presidente De Gaulle anunciou o referendo no rádio e na televisão. O plano de
De Gaulle de celebrar um referendo foi frustrado pela ação organizada
setorialmente pelos trabalhadores.
As
greves e ocupações de empresas multiplicam-se a partir de 13 de maio e
aumentam, diariamente durante semanas. A 20 de maio, uma semana depois, o
número de grevistas será entre 7 e 9 milhões de trabalhadores, o número de dias
de greve durante este período é de 150 milhões, segundo as estatísticas. Mais
de 4 milhões de pessoas estarão em greve durante três semanas, mais de dois
milhões durante um mês. A Sorbonne estará ocupada durante um mês. Nesta
conjuntura de crise de hegemonia efetuam-se negociações variadas e serão
assinados os acordos de Grenelle em 27 de maio, entre o governo de Pompidou, o
patronato e as centrais sindicais. São aprovados um aumento de 35% do salário mínimo e de 10%,
em média, para os restantes níveis salariais. É também aprovada a possibilidade
de criação de secção sindical em cada empresa. Os acordos não tiveram, no
entanto, significativo impacto nas greves e ocupações, que se irão manter até à
dissolução da Assembleia Nacional, a 29 de maio, e à realização da manifestação
de apoio ao governo a 30 de maio. O Parti
Communiste Français (PCF), curiosamente, opôs-se desde início das
barricadas ao movimento estudantil e a sua principal preocupação foi acabar com
a agitação política e a crise.
O
filme Baisers volés (1968), de François Truffaut, se passa em Paris durante
os protestos. Embora não seja um filme abertamente político, ele contém
referências e imagens das manifestações. O filme capta o sentimento revolucionário
do período e descreve por que Truffaut e Jean-Luc Godard pediram o cancelamento
do festival de Cannes de 1968. O filme Mourir d`aimer (1971), de André
Cayatte, é baseado na história social de Gabrielle Roussier, uma professora de
estudos clássicos interpretada no filme por Annie Girardot que cometeu suicídio
após ter sido sentenciada culpada por ter tido um romance com um de seus alunos
durante maio de 1968. O filme Tout Va Bien (1972), de Jean-Luc Godard,
examina a luta de classes que continuou na sociedade francesa após maio de
1968. O filme A Mãe e a Puta (1973), de Jean Eustache, vencedor do Grand Prix (Festival de Cannes), cita os
eventos de maio de 1968 e explora as suas consequências. O filme Cocktail
Molotov (1980), de Diane Kurys, uma diretoras, produtora, cineasta e atriz francesa, narra a história social de um grupo de amigos que estavam em viagem a Israel, mas decidem voltar a Paris após ouvir
notícias sobre as manifestações políticas urbanas de Maio de 1968. O filme Milou en mai (1990), de Louis Malle (1932-1995), é um retrato satírico sobre o impacto social do fervor revolucionário de maio de 1968 sobre a burguesia de uma pequena cidade.
Um filme de Bernardo Bertolucci de 2003, Os Sonhadores,
baseado na novela The Holy Innocents, de Gilbert Adair, descreve a história
de três jovens que, durante o Maio de 1968, veem a revolução “ocorrer pela
janela do quarto”. O filme Les Amants Réguliers (2005), de Philippe Garrel,
conta a história de um grupo de amigos que participa dos protestos, e suas
vidas um ano após. No filme OSS 117: Rio ne répond plus (2009), o
protagonista Hubert ironiza os estudantes hippies ao dizerː - “É 1968. Não haverá
revolução. Cortem os cabelos”. É uma comédia francesa de 2009, dirigido por
Michel Hazanavicius. É a sequência de OSS 117: Cairo, Nest of Spies, de 2006,
do mesmo diretor. Parodia filmes com o personagem realizado por André Hunebelle
e outros sobre espiões, principalmente os primeiros da série de James Bond. O
Espião OSS 117, interpretado por Jean Dujardin, emerge como um desajeitado,
racista, machista, chauvinista e politicamente incorreto. O filme Après Mai (2012),
de Olivier Assayas, descreve a história de um pintor e seus amigos que levam a
revolução para suas escolas e têm que lidar com as consequências existenciais e
legais do ato. Enfim,
os protestos consumados no extraordinário Maio de 1968 centraram sua luta contra o que era percebido como os
três pilares do capitalismo: a fábrica, a escola e a família. Como resultado,
cada um destes domínios foi submetido à transformação pós-industrial.
O
trabalho de fábrica torna-se cada vez mais terceirizado ou, no mundo
desenvolvido, reorganizado na forma de trabalho de equipe interativo
não-hierárquico pós-fordista. Enquanto isso, uma educação privatizada flexível
e permanente substitui crescentemente a educação pública universal, e múltiplas
formas de arranjos sexuais flexíveis substituem a família tradicional. Ao mesmo
tempo, apesar de sua vitória, a esquerda perdeu: o inimigo direto foi
derrotado, mas substituído por uma nova, e ainda mais direta, forma de
dominação capitalista. No capitalismo pós-moderno, o mercado invade
novas esferas, até agora consideradas domínio privilegiado do estado, da
educação às prisões e à segurança. Quando
o “trabalho imaterial”, como a educação, é celebrado como o trabalho que produz
as relações sociais de forma direta, não se deve esquecer o que isso significa
numa economia de commodities. Significa que novos domínios, até então excluídos
do mercado, passam a ser “comoditizados”. Então, quando estamos com
dificuldades, já não conversamos com um amigo, mas pagamos um psiquiatra ou um
conselheiro para cuidar do problema. E, em vez dos pais, babás e educadores
remunerados irão cuidar das crianças. Ninguém deve esquecer as conquistas reais
de 1968. O movimento inaugurou uma mudança radical na forma como lidamos com os
direitos sociais das mulheres, o homoerotismo e o racismo. Após a década
simplesmente não se pode praticar atos ou proferir discursos racistas e
homofóbicos como ainda se podia na década de 1950. Desse modo, 1968 não foi um
evento único, mas utópico combinando tendências políticas: por isso, também foi uma pedra no sapato
de muitos conservadores. Seu verdadeiro legado reside na rejeição ao
liberalismo, em um não quase absoluto, melhor traduzido na fórmula: Soyons réalistes, demandons l'impossible!
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