quinta-feira, 17 de maio de 2018

Ecos do Maio de 1968 - As Cidades & História Política no Cinema.

                                                                                        Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza Braga

                 L’agresseur n’est pas celui qui se revolte mais celui qui afirme”. Maio de 68 em Nanterre


Manifestação em 29 de maio de 1968 em Paris.
  
Atingimos na modernidade a compreensão do visível como visível e pari pasu do invisível como invisível, enquanto vínculo orgânico que une o invisível ao visível concreto. Assim, é visível todo objeto ou problema que se situa no terreno, e no horizonte, isto é, no campo estruturado definido da problemática teórica de determinada disciplina teórica. Impõe-se-nos tomar essas palavras ao pé da letra. Alguns autores ajudam-nos a elucidar esses termos. A visão já não é então a representação de uma pessoa individual, dotada da faculdade de “ver” a qual é exercida quer da atenção, quer da distração. A vista é o fato imediato de suas condições estruturais. A vista é a relação de reflexão imanente do campo da problemática sobre seus objetos e seus problemas. A visão perde então seus privilégios religiosos da “leitura sagrada”. Nada mais é que a reflexão da necessidade imanente que liga o objeto ou o problema às suas condições de existência, que têm a ver com as condições de sua produção. A rigor, não é mais o olho do espírito de uma pessoa que vê o que existe no campo definido por uma problemática teórica. E esse próprio campo que se vê nos objetos ou nos problemas que ele define, sendo a visão apenas a reflexão necessária do campo de análise em seus objetos.
O Quartier Latin deve seu nome à época Medieval, quando os habitantes da zona eram estudantes que utilizavam o latim para se comunicar. Desde a Idade Média, os estudantes do “Bairro Latino” tiveram uma grande influência sobre a França, e durante os séculos XIX e XX promoveram movimentos estudantis de grande transcendência política. O Quartier Latin foi um dos centros da Revolução de Maio de 68. Depois de atravessar a Praça de Saint Michel, na qual há uma enorme fonte com a figura de São Miguel lutando com um dragão, há pequenas e encantadoras ruazinhas que formam o Bairro Latino. A partir desse ponto, tudo que você verá são restaurantes e cafeterias que oferecem terraços agradáveis com preços acessíveis. Embora haja muitas ruas com restaurantes agradáveis, uma das principais artérias do bairro é a Rue Huchette. O Quartier Latin é um bairro que fica no quinto e no sexto distritos de Paris, na França. Localiza-se na margem esquerda (sul) do Rio Sena, em torno da Universidade de Sorbonne. O nome do bairro deriva do fato de o latim ter sido amplamente falado próximo à universidade durante a Idade Média. Atualmente, ainda abriga vários estabelecimentos de ensino superior, como a École Normale Supérieure, a École des Mines de Paris e o Campus Universitaires de Jussieu. Durante os anos 1960, especialmente em maio de 1968, foi um grande palco de contestação da sociedade.
Na modernidade os estudantes são um barômetro sensível às tensões que estão se acumulando nas profundezas da sociedade. A onda de manifestações e ocupações estudantis que precederam os acontecimentos de maio foi como um relâmpago que anuncia a tormenta. Nos meses anteriores a maio já havia uma efervescência entre os estudantes que havia se expressado em uma série de manifestações e ocupações. Frente à onda ascendente de protestos estudantis o reitor da prestigiosa universidade Sorbone decidiu fechá-la, era a segunda vez em seus setecentos anos de história. A primeira vez aconteceu em 1940 quando os nazistas ocuparam Paris. A tentativa da polícia de liberar o pátio da Sorbone em 03 de maio foi a centelha que acendeu o fogo. A violência irrompeu no “Bairro Latino”, com o resultado de mais de cem feridos e 596 presos. Os estudantes, os professores, os profissionais, camponeses, cientistas, jogadores de futebol, inclusive as bailarinas do Follies Bergères foram à luta. Em Paris os estudantes ocuparam a Sorbone. O teatro l`Odeon foi ocupado por 2.500 estudantes, inclusive do ensino médio nas escolas. A União Nacional de Estudantes da França (UNEF) e o Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESUP) convocaram greves indefinidas. 


Em 6 de maio houve novos enfrentamentos no Quartier Latin (“Bairro Latino”): 422 presos, 345 policiais e em torno de 600 estudantes feridos. A repressão utilizada através dos aparelhos de Estado provocara uma indignação generalizada nas cidades. Os estudantes enfurecidos arrancaram paralelepípedos do chão, utilizados como arma, para arremessar contra os policiais e levantaram barricadas seguindo a boa tradição francesa. Os estudantes das universidades na França saíram em seu apoio. Na noite de 10 de maio houve uma ampla revolta no Bairro Latino. Os manifestantes levantaram barricadas e a polícia os atacou com grande violência. Homens armados da polícia anti-distúrbios tomaram de assalto apartamentos privados e golpeou gente simples e corrente, até mesmo o inclusivo caso de uma mulher grávida. Depararam-se com uma resistência que não esperavam. Os parisienses de suas janelas rechaçavam a polícia atirando vasos de plantas e objetos pesados. Dos 367 hospitalizados, 251 eram policiais, 720 pessoas feridas e 468 foram presas. Carros foram destruídos ou queimados. O Ministro da Educação insultou os manifestantes: “Ni doctrine, ni foi, ni loi”.  
Começou assim como uma série de greves estudantis que irromperam em algumas universidades e escolas de ensino secundário em Paris, após confrontos com a administração e a polícia. A tentativa do governo gaullista de esmagar essas greves com mais ações policiais no Quartier Latin levou a uma escalada do conflito, que culminou numa greve geral de estudantes e em greves com ocupações de fábricas em toda a França. O símbolo unificador dos protestos foi O Livro Vermelho de Mao Tsé-Tung e sua inspiração imediata a Revolução Cultural Chinesa, iniciada em 1966 em que o governo de Pequim usava massas de jovens enraivecidos como “tropa de choque” para perseguir, humilhar, torturar e matar milhares de adversários do regime. Alguns filósofos e historiadores afirmaram que esse evento foi um dos mais importantes e significativos do século XX, porque não se deveu a uma camada restrita da população, como trabalhadores e camponeses - que eram maioria -, mas a uma insurreição popular que superou barreiras étnicas, culturais, de idade e de classe. Além disso, teve intrínsecas ligações com os acontecimentos do pós-guerra e com os da chaamda Guerra Fria.
Vale lembrar que as noções sociológicas e política de “esquerda” e “direita” são rótulos antigos, que remontam à clássica Revolução Francesa. Em 1789, a Assembleia Nacional Constitutiva reuniu-se para decidir se, sob o novo regime político da França, o rei deveria ter poder de veto. Em caso afirmativo, perguntava-se se esse direito deveria ser absoluto ou simplesmente suspensivo, por um período de tempo. Ao votar, os partidários do veto absoluto se sentaram ao lado direito do presidente, o lado nobre. De acordo com a tradição cristã, é uma honra sentar-se ao lado direito de Deus, ou à direita do chefe da família na hora do jantar. Aqueles que queriam um veto altamente restrito estavam sentados à esquerda. A organização da sala assumiu o significado político: à direita, aqueles apoiantes de uma monarquia que procurou preservar os poderes do rei; à esquerda, aqueles que desejavam reduzi-los. No século XIX, este vocabulário cada vez mais usado para descrever as tendências políticas dos membros do parlamento francês.
Colocariam monarquistas versus republicanos e depois republicanos conservadores versus modernistas que programaram as principais reformas sociais da Terceira República, mas que incluíam a liberdade de imprensa, a liberdade de associação, o direito de pertencer a um sindicato e o divórcio, entre outras coisas. Na virada do século 20, o debate político-ideológico entre esquerda-direita abrangeu essencialmente a divisão entre os defensores do Catolicismo e os defensores da separação da Igreja e do Estado. Esta mudança, que ocorreu em 1905, é muitas vezes referida como “o choque das duas Franças” – católica e anticlerical. A partir da década de 1930, a divisão surgiu, com a esquerda defendendo o socialismo e a direita a liberalização econômica. Na década de 1970, a liberalização dos costumes tornou-se  questão fundamental, com debates contínuos sobre aborto, divórcio, homoerotismo, igualdade matrimonial, eutanásia, entre outros aspectos. O mesmo se aplica à imigração e abertura à globalização que se opõe ao protecionismo cultural, social e econômico.
Como presidente, Charles de Gaulle (1890-1970) pôs fim ao caos político que precedeu o seu regresso ao poder. Durante seu governo, promoveu o controle político da inflação e instituiu uma nova moeda em janeiro de 1960. Também fomentou o crescimento industrial. Apesar de ter apoiado inicialmente o domínio imperialista francês sobre a Argélia, decidiu mais tarde “conceder” a independência àquele país, encerrando uma guerra cara, violenta e impopular. A decisão dividiu a opinião pública francesa, e De Gaulle teve que enfrentar a oposição dos colonos chamados pieds-noirs e dos militares franceses que tinham inicialmente apoiado seu retorno fabuloso ao poder. Em 13 de maio de 1958, os argelinos de origem europeia apelam ao general Charles De Gaulle, fora do poder desde 1950, para manter a soberania da França sobre a Argélia. 
No começo de 1958, o deputado democrata-cristão de Estrasburgo, Pierre Pflimlin, estava sendo sondado para o cargo de primeiro-ministro da Quarta República. Porém, havia a suspeita de que queria negociar um cessar-fogo com os rebeldes da Frente Nacional de Libertação (FNL) que lutavam pela independência da Argélia. Os gaullistas que militavam de corpo e alma pelo retorno ideológico de De Gaulle ao poder encorajam os “Pieds-noirs” - população francesa das antigas colônias no norte da África - à sedição contra Pflimlin. Deixam entender que o general é a personalidade em melhores condições estratégicas de manter os três departamentos argelinos da república francesa. De Gaulle empreendeu o desenvolvimento de armas nucleares francesas e promoveu uma política externa pan-europeia, buscando livrar-se das influências norte-americana e britânica. Retirou da França, o comando militar da OTAN - Organisation du Traité de l'Atlantique Nord apesar de continuar a ser membro da aliança ocidental - e por duas vezes vetou a entrada do Reino Unido na Comunidade Europeia.
Viajou frequentemente pela Europa Oriental e por outras partes do mundo quando reconheceu a virada da China ao comunismo. Em 1967, durante uma visita oficial ao Canadá, incentivou publicamente o Movimento pela Independência de Quebec, o que causou a mais grave crise diplomática entre a França e o Canadá. Seu discurso pronunciado em Montreal, no dia 24 de julho, foi concluído exatamente com o slogan dos separatistas: “Viva o Quebec livre!”, o que foi interpretado pelas autoridades canadenses como apoio do presidente francês ao movimento autonomista. Foi alvo de três atentados confirmados, todos eles falhados. O primeiro ocorreu em Paris, no ano de 1945, por atiradores furtivos alemães. Outro em 8 de Setembro de 1961, organizado por Raoul Salan, uma bomba fabricada com explosivo plástico explodiu perto de seu carro. O último aconteceu em 22 de Agosto de 1962, quando seu carro foi crivado de balas, ficando o vidro traseiro estilhaçado e os pneus estourados, num atentado que mais tarde foi narrado no best-seller “O Dia do Chacal”, de Frederick Forsyth. Ainda em 1963, seria desbaratado um complô na Escola Militar para enfim matá-lo. De Gaulle também enfrentou a oposição dos comunistas e socialistas. Apesar de ter sido reeleito presidente em 1965, desta vez por voto popular direto, em maio de 1968 parecia provável que perdesse o poder, em meio a protestos generalizados de estudantes e trabalhadores. No entanto, sobreviveu à crise com uma ampliação da maioria na Assembleia. Em 1969, depois de perder um referendo sobre a reforma do Senado e a regionalização, renunciou.
- “Morreu o general De Gaulle. A França ficou viúva”. Com essas palavras, o  presidente Georges Pompidou anunciou em 10 de novembro de 1970 a morte, aos 80 anos, do homem que libertou a França do nazismo, presidiu o país durante longos 11 anos e devolveu sua aparente grandeza. A notícia da morte, ocorrida na noite anterior em consequência de aneurisma cerebral, levou 14 horas para ser divulgada. A primeira reação na sociedade foi de surpresa e incredulidade. Estudantes esquerdistas ergueram vivas ao ser anunciada a morte do estadista. Eles enxergavam em De Gaulle a “velha ordem” que precisava ser destruída. Georges Marchais, líder do Partido Comunista Francês (PCF), declarou ao Estado: - “De Gaulle representava a política contra a qual lutamos”. O general associou seu nome à resistência francesa que lutou contra os invasores nazistas. – “É disso apenas que desejo me lembrar neste momento”, acrescentou. Foi sepultado no túmulo da família em Colombey-les-deux-Eglises.
O Maio de 68 representou uma grande onda de protestos que teve início com  manifestações estudantis para pedir reformas no setor educacional. A maioria dos insurretos era adepta a ideias esquerdistas, comunistas ou anarquistas. Muitos viam os eventos como uma oportunidade para sacudir os valores conservadores, contrapondo ideias avançadas sobre a educação, a sexualidade e o prazer. Entre eles, uma barulhenta minoria, como o Occident, professava ideias de direita. O começo de tudo ocorreu com uma série de conflitos entre estudantes e autoridades da Universidade de Paris, em Nanterre, cidade próxima à capital francesa. No dia 2 de maio de 1968, a administração decidiu fechar a escola e ameaçou expulsar vários estudantes acusados de liderar o movimento contra a instituição. As medidas provocaram a reação imediata dos alunos de uma das mais renomadas universidades do mundo ocidental, a vetusta Sorbonne, em Paris. Eles se reuniram no dia seguinte para protestar, saindo em passeata sob o comando do líder estudantil Daniel Cohn-Bendit. A polícia reprimiu estudantes com violência e durante  dias as ruas de Paris viraram cenário de brutais batalhas.
A partir de 68 o “modelo profético do engajamento” passa a sofrer um acentuado declínio, atingindo em cheio os privilégios do intelectual que, autônomo em relação aos partidos ou a quaisquer organismos políticos, se punha a representar os interesses gerais, uma universalidade personificada e estilizada pelo seu carisma. A especialização resultante do fortalecimento das ciências humanas, somada à crescente divisão do trabalho e a prevalência do paradigma científico, condicionou o cenário em que o engajamento profético dos intelectuais veio a ser substituído pelo modelo que conciliava o saber localizado e a luta política concreta, estabelecidos mutualmente por limites estratégicos particulares, o “intelectual crítico especializado” ou, segundo seu nome foucaultiano de batismo, o “intelectual específico”. Daí a filosofia da diferença, embora avessa à teleologia dialética da história, ganhar repercussão no círculo acadêmico e, sem ajuste ou adaptação, encontrar afinidade de princípios junto a determinadas franjas da esquerda extraparlamentar. Porque essa filosofia, inicialmente deleuzeana e depois esquizoanalítica, era portadora de categorias que remetiam ao sentido dos engajamentos em curso, ela mostrava-se capaz de indexar, na sua própria linguagem conceitual, a disposição subjetiva de boa parte da militância “gauchista”, o “fundo rebelde irredutível” que permaneceria ativo sob as diferenças de toda representação política.  

 
O Maio de 1968 tem sido reconhecido como a maior greve geral da história. Este poderoso movimento aconteceu no auge da economia na esfera capitalista do pós-guerra. A reação violenta do governo só ampliou a importância das manifestações: o Partido Comunista Francês (PCF) anunciou seu apoio aos universitários e uma influente federação de sindicatos convocou uma greve geral para o dia 13 de maio. No auge do movimento, quase dois terços da força de trabalho do país cruzaram os braços. Pressionado, no dia 30 de maio o presidente Charles De Gaulle convocou eleições para junho. O movimento cresceu tanto que proporcionalmente evoluiu para uma greve de trabalhadores que balançou as estruturas e técnicas persuasivas do governo do presidente Charles De Gaulle. Os universitários se uniram politicamente aos operários e promoveram a maior greve geral da Europa, com a participação de cerca de 9 milhões de pessoas. Isso enfraqueceu politicamente o general De Gaulle, que renunciou um ano depois. Os acontecimentos de maio, com sua força bruta, não foram previstos pelos analistas e estrategistas do capital, nem na França nem em nenhum lugar do mundo.
O general foi incapaz até mesmo de imprimir as cédulas do referendo devido à greve dos trabalhadores das gráficas franceses e a negativa de seus colegas belgas de atuar como fura greves. Este não foi o único exemplo de solidariedade internacional. Os condutores de trens alemães e belgas detinham seus trens na fronteira francesa para não romper a greve. As forças da reação, até esse momento em estado de choque e obrigadas a estar na defensiva, começaram de fato a se organizar. Foram criados Comitês de Defesa da República (CDR), como tentativa de mobilizar a classe média contra os trabalhadores e estudantes. A correlação de forças de classe não é uma questão puramente numérica do tamanho da classe trabalhadora em relação ao campesinato e da classe média em geral. Uma vez que o proletariado entre na luta decisiva e demonstra ser uma força poderosa na sociedade, atrai rapidamente a massa explorada de camponeses e de pequenos comerciantes de classe média que são vítimas da usura dos bancos e dos monopólios. Este fato era evidente como sodalidade em 1968, quando os camponeses levantaram bloqueios nas estradas ao redor de Nantes e distribuíram comida grátis aos grevistas. Uma importante característica da sodalidade é sua autonomia. Entendemos que há de se diferenciar aqui autonomia de independência.
Uma vez na luta, os trabalhadores começaram a ter iniciativas que ultrapassavam os limites de uma greve normal. Um elemento fundamental na equação foram os meios de comunicação de massas. Formalmente, são armas poderosas nas mãos do Estado, mas também dependem dos trabalhadores, que fazem funcionar as emissoras de rádio e televisão. No dia 25 de maio a rádio televisão estatal, a Office de Radiodiffusion-Télévision Française (ORTF) entrou em greve. Suprimiram as notícias das oito da noite. Os gráficos e jornalistas impuseram uma espécie de controle operário sobre a imprensa. Os jornais burgueses tinham que submeter seus editoriais ao escrutínio e deviam publicar as declarações dos comitês de trabalhadores. A Assembleia Nacional discutiu a crise universitária e as batalhas do “Bairro Latino”. Porém, os debates nos salões da assembleia já eram irrelevantes. O poder havia escapado das mãos dos legisladores e agora estava nas ruas. No dia 24 de maio, o presidente De Gaulle anunciou o referendo no rádio e na televisão. O plano de De Gaulle de celebrar um referendo foi frustrado pela ação organizada setorialmente pelos trabalhadores.
As greves e ocupações de empresas multiplicam-se a partir de 13 de maio e aumentam, diariamente durante semanas. A 20 de maio, uma semana depois, o número de grevistas será entre 7 e 9 milhões de trabalhadores, o número de dias de greve durante este período é de 150 milhões, segundo as estatísticas. Mais de 4 milhões de pessoas estarão em greve durante três semanas, mais de dois milhões durante um mês. A Sorbonne estará ocupada durante um mês. Nesta conjuntura de crise de hegemonia  efetuam-se negociações variadas e serão assinados os acordos de Grenelle em 27 de maio, entre o governo de Pompidou, o patronato e as centrais sindicais. São aprovados  um aumento de 35% do salário mínimo e de 10%, em média, para os restantes níveis salariais. É também aprovada a possibilidade de criação de secção sindical em cada empresa. Os acordos não tiveram, no entanto, significativo impacto nas greves e ocupações, que se irão manter até à dissolução da Assembleia Nacional, a 29 de maio, e à realização da manifestação de apoio ao governo a 30 de maio. O Parti Communiste Français (PCF), curiosamente, opôs-se desde início das barricadas ao movimento estudantil e a sua principal preocupação foi acabar com a agitação política e a crise.
O filme Baisers volés (1968), de François Truffaut, se passa em Paris durante os protestos. Embora não seja um filme abertamente político, ele contém referências e imagens das manifestações. O filme capta o sentimento revolucionário do período e descreve por que Truffaut e Jean-Luc Godard pediram o cancelamento do festival de Cannes de 1968. O filme Mourir d`aimer (1971), de André Cayatte, é baseado na história social de Gabrielle Roussier, uma professora de estudos clássicos interpretada no filme por Annie Girardot que cometeu suicídio após ter sido sentenciada culpada por ter tido um romance com um de seus alunos durante maio de 1968. O filme Tout Va Bien (1972), de Jean-Luc Godard, examina a luta de classes que continuou na sociedade francesa após maio de 1968. O filme A Mãe e a Puta (1973), de Jean Eustache, vencedor do Grand Prix (Festival de Cannes), cita os eventos de maio de 1968 e explora as suas consequências. O filme Cocktail Molotov (1980), de Diane Kurys, uma diretoras, produtora, cineasta e atriz francesa, narra a história social de um grupo de amigos que estavam em viagem a Israel, mas decidem voltar a Paris após ouvir notícias sobre as manifestações políticas urbanas de Maio de 1968. O filme Milou en mai (1990), de Louis Malle (1932-1995), é um retrato satírico sobre o impacto social do fervor revolucionário de maio de 1968 sobre a burguesia de uma pequena cidade. 
Um filme de Bernardo Bertolucci de 2003, Os Sonhadores, baseado na novela The Holy Innocents, de Gilbert Adair, descreve a história de três jovens que, durante o Maio de 1968, veem a revolução “ocorrer pela janela do quarto”. O filme Les Amants Réguliers (2005), de Philippe Garrel, conta a história de um grupo de amigos que participa dos protestos, e suas vidas um ano após. No filme OSS 117: Rio ne répond plus (2009), o protagonista Hubert ironiza os estudantes hippies ao dizerː - “É 1968. Não haverá revolução. Cortem os cabelos”. É uma comédia francesa de 2009, dirigido por Michel Hazanavicius. É a sequência de OSS 117: Cairo, Nest of Spies, de 2006, do mesmo diretor. Parodia filmes com o personagem realizado por André Hunebelle e outros sobre espiões, principalmente os primeiros da série de James Bond. O Espião OSS 117, interpretado por Jean Dujardin, emerge como um desajeitado, racista, machista, chauvinista e politicamente incorreto. O filme Après Mai (2012), de Olivier Assayas, descreve a história de um pintor e seus amigos que levam a revolução para suas escolas e têm que lidar com as consequências existenciais e legais do ato. Enfim, os protestos consumados no extraordinário Maio de 1968 centraram sua luta contra o que era percebido como os três pilares do capitalismo: a fábrica, a escola e a família. Como resultado, cada um destes domínios foi submetido à transformação pós-industrial. 
O trabalho de fábrica torna-se cada vez mais terceirizado ou, no mundo desenvolvido, reorganizado na forma de trabalho de equipe interativo não-hierárquico pós-fordista. Enquanto isso, uma educação privatizada flexível e permanente substitui crescentemente a educação pública universal, e múltiplas formas de arranjos sexuais flexíveis substituem a família tradicional. Ao mesmo tempo, apesar de sua vitória, a esquerda perdeu: o inimigo direto foi derrotado, mas substituído por uma nova, e ainda mais direta, forma de dominação capitalista. No capitalismo pós-moderno, o mercado invade novas esferas, até agora consideradas domínio privilegiado do estado, da educação às prisões e à segurança. Quando o “trabalho imaterial”, como a educação, é celebrado como o trabalho que produz as relações sociais de forma direta, não se deve esquecer o que isso significa numa economia de commodities. Significa que novos domínios, até então excluídos do mercado, passam a ser “comoditizados”. Então, quando estamos com dificuldades, já não conversamos com um amigo, mas pagamos um psiquiatra ou um conselheiro para cuidar do problema. E, em vez dos pais, babás e educadores remunerados irão cuidar das crianças. Ninguém deve esquecer as conquistas reais de 1968. O movimento inaugurou uma mudança radical na forma como lidamos com os direitos sociais das mulheres, o homoerotismo e o racismo. Após a década simplesmente não se pode praticar atos ou proferir discursos racistas e homofóbicos como ainda se podia na década de 1950. Desse modo, 1968 não foi um evento único, mas utópico combinando tendências políticas: por isso, também foi uma pedra no sapato de muitos conservadores. Seu verdadeiro legado reside na rejeição ao liberalismo, em um não quase absoluto, melhor traduzido na fórmula: Soyons réalistes, demandons l'impossible!
Bibliografia geral consultada.
COHN-BENDIT, Daniel, “et alii”, A Revolta Estudantil. Rio de Janeiro: Editora Laudes, 1968; MAUPÉOU-ABBOUD, Nicole de, Ouverture du Ghetto Étudiant. La Gaúche Étudiante à Ia Recherche d'un Nouveau Mode d`Intervention Politique (1960-1970). Paris: Éditions Anthropos, 1974; FERRY, Luc & RENAUT, Alain, La Pensée 68. Essai sur l`Anti-humanisme Contemporain. Paris: Éditions Gallimard, 1985; HAMON, Hervé; ROTMAN, Patrick, Génération. Les Années de Rêve. Paris: Éditions Du Seuil, 1987; DUTEUIL, Jean-Pierre, Nanterre 1965-68: Vers le Mouvement du 22 mars. Mauléon (Fr.): Éditions Acratie, 1988; 1993; THIOLLENT, Michel, “Maio de 1968 em Paris: Testemunho de um Estudante”. In: Tempo Social; Rev. Sociol. USP. São Paulo, 10 (2): 63-100, 1998; DUNN, Christopher, Brutality Garden: Tropicalia and the Emergence of a Brazilian Counterculture. EUA: University of North Carolina Press, 2001; COUTINHO, Mário Alves, Escrever com a Câmera Cinema e Literatura no Olhar de Jean-Luc Godard. Tese de Doutorado. Faculdade de Letras. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2007; ROSS, Kristin, Mayo del 68 y sus Vidas Posteriores. Ensayo contra la Despolitización de la Memoria. Madrid: Ediciones Acuarela, 2008; GRÉMION, Pierre. “Les Sociologues et Mai 68”. In: Le débat: Mai 68, quarante ans après, n° 149. Paris: Éditions Gallimard, 2008; DAMAMME, Dominique, “et al”. Mai-Juin 68. Paris: Les éditions de l’Atelier, 2008; DIDI-HUBERMAN, Georges, Quand les Images Prennent Position. L´Oiel de l´Histoire, 1. Paris: Les Editions de Minuit, 2009; ASLAN, Odette, O Ator no Século XX: Evolução da Técnica/Problema da Ética. 1ª edição. São Paulo: Editora Perspectiva, 2010; OLIVEIRA JÚNIOR, Luiz Carlos Gonçalves de, O Cinema de Fluxo e a Mise en Scène. Dissertação de Mestrado. Departamento de Cinema, Rádio e Televisão. Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2010; MUNSTERBERG, Hugo, The Film: A Psychological Study. Cap. III - “Profundidade e movimento”. Traduzido por Yves São Paulo. Feira de Santana (BA), nº 1. vol. 1. Ano 2015; OTA, Nilton, “A Quarta Parede do Marxismo Francês: Maio de 68 e a Invenção dos Dispositivos Intelectuais de Engajamento”. In: Doispontos. Curitiba. São Carlos, vol. 13, n° 1, pp. 53-72, abril de 2016; OTA, Nilton, “A Quarta Parede do Marxismo Francês: Maio de 68 e a Invenção dos Dispositivos Intelectuais de Engajamento”. In: doispontos. Curitiba. São Carlos, vol. 13, n° 1, pp. 53-72, abril de 2016; MARQUES, Rosa; UGINO, Camila Kimie; XIMENES, Salomão Barros, “Governos Lula e Dilma em Matéria de Seguridade Social e Acesso à Educação Superior”. In: Brazilian Journal of Political Economy/Revista de Economia Política, vol. 38, nº 3, 2018; entre outros.  

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