Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza Braga
“Compreender
uma linguagem é dominar uma técnica”. Ludwig Wittgenstein
O
Maracatu historicamente está relacionado ao mercado dos escravos africanos em Portugal no fim da Idade Média.
Ao entrarem em contato com a religião católica, os africanos fizeram
associações entre os santos católicos e as divindades africanas. Uma delas foi
a de Nossa Senhora do Rosário. A imagem da Santa tem, ao redor do pescoço, um
colar de rosas (rosário), similar ao colar de Ifá, orixá que previa o futuro. Assim, os escravos que chegaram à
Europa no século XV passaram a ser devotos de Nossa Senhora do Rosário. Com
isso foi criada a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. Oriundo
das coroações de Reis do Congo, ocorridas a partir do século XVIII nas igrejas
de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos espalhadas por Fortaleza e
cidades interioranas como Sobral, Icó, Aracati e Crato. Em primeiro lugar
devemos considerar que a sociologia nascida da colonização européia é cultus e culturus. Esta ilusão secularizada que cria a dependência em relação ao outro
ensinou-nos a descentrar nosso olhar. Portanto, pouco importa que sejamos de certo
beneficiários, dentro ou fora da Academia, pois estamos longe, cada qual a seu modo, de dominar todos os
aspectos dessas novas civilizações e culturas.
Pois
os registros dos Autos dos Reis de Congos na cidade datam do final do século
XIX e já em 1730 os negros fundaram a Igreja do Rosário em Fortaleza, com a presença
da irmandade do rosário, e consequentemente a coroação dos reis. Esse ritual de coroação teria dado origem a
vários autos e danças, incorporados ao folclore brasileiro originalmente desde
o século XVII. Entre eles, o “Auto dos Reis de Congo”, o Congado e o Maracatu.
De fato, o maracatu assemelha-se com o ritual, pois desenvolve um cortejo etnográfico
com música para a coroação da rainha negra. O ritmo do maracatu cearense é
apresentado por um grupo de percussão no qual se incluem caixas, utilizadas sem
esteira para acentuar a batida grave, surdos, bumbos, ganzás, chocalhos e
triângulos, também chamados de ferros, artesanalmente confeccionados com molas
de transporte pesado, o que lhes confere um timbre característico e sonoridade acentuada,
destacando-se dos demais instrumentos. O “macumbeiro” ou tirador de loas é quem
canta as toadas, nas quais são geralmente enfocados temas ligados à cultura, à
religião e à história comparativa da África e do Brasil. O Maracatu é a mais
tradicional dança dramática de origem afrodescendente presente na cultura do
povo cearense, etnograficamente configurando-se essencialmente através de um
cortejo formado por baliza, porta-estandarte, índios brasileiros e nativos
africanos, negras e baianas, negra da calunga, negra do incenso, balaieiro,
casal de pretos velhos, pajens, tiradores de loas e batuqueiros, em reverência
à rainha negra e sua corte real.
O
Maracatu Rural, folguedo também conhecido por maracatu de baque solto, maracatu
de orquestra, maracatu de trombone ou maracatu de baque singelo, ocorre durante
as comemorações do Carnaval e da Páscoa. É composto por dança, música, poesia e
está associado ao ciclo canavieiro, especialmente da Zona da Mata Norte de
Pernambuco. A manifestação é revelada em gestos, performances, nos pantins de
caboclos e dos arreiamás, na dança das baianas, nas loas dos mestres, nas
indumentárias vestidas pelos folgazões. Diferente da Nação, o Maracatu Rural representa
um resultado da fusão de expressões populares, como cambindas, bumba-meu-boi e
cavalo marinho e coroação dos reis negros. O Cavalo-Marinho é uma brincadeira
popular que envolve performances dramáticas, musicais e coreográficas
apresentadas durante o ciclo natalino. Seus “brincadores” são, em geral,
trabalhadores da zona rural, mas também ecoa no Grande Recife e em João Pessoa
(PB), além de vários outros territórios do País. Durante a encenação ocorrem
danças com personagens mascarados e bichos, como o boi e o cavalo, que dá nome
à brincadeira. Contém ainda louvação ao Divino santo Rei do Oriente e possui
momentos em que há culto à Jurema Sagrada. O Cavalo-Marinho se realiza num
terreiro de chão plano e, geralmente, no ar livre e reúne ainda um grande número
de elementos artísticos e culturais historicamente constitutivos na memória
individual e coletiva, como mestres e os elementos da vivência do trabalho
rural.
Os
cortejos de maracatu são uma tentativa de refletir e preservar no âmbito da
memória as antigas cortes africanas, que ao serem conquistados e vendidos como
escravos trouxeram suas raízes e mantiveram seus títulos de nobreza, para o Brasil.
O cortejo é composto por uma bandeira ou estandarte abrindo as alas. Logo
atrás, segue a dama do paço, que carrega a mística calunga, representando todas
as entidades espirituais do grupo. Atrás dela, seguem as Yabás, popularmente chamadas de baianas e, pouco depois, a corte e
o rei e a rainha dos maracatus. Os títulos de rei e rainha são passados de
forma hereditária. Essa ala representa a nobreza da Nação. De cada lado seguem
as escravas ou “catirinas”, normalmente jovens, que usam vestimentas de chitão.
Mantendo o ritmo do desfile, seguem os batuqueiros. Os instrumentos são: alfaias, que são tambores, caixas ou taróis, ganzás e abês, esses conduzidos por mulheres que
vão à frente desse grupo e que fazem do seu toque, um show a parte.
A têmpera é a mistura usada em pintura,
constituída de gema e clara de ovo, água e pigmentos em pó. Também é obtida
misturando-se ingredientes oleosos com uma solução de água e cola como ocorre
no carnaval. O artista pinta sobre um painel revestido de cola e gesso. Quando
a têmpera é corretamente aplicada (fortuna), distribuída em finas camadas, não
fica transparente, nem completamente opaca (virtù).
A têmpera foi aperfeiçoada na Idade Média e utilizada nos quadros de
cavalete, do séc. XIII até o séc. XV. O que tem a dizer sobre ele é verdadeiro,
ainda que descreva dialeticamente apenas um aspecto do fenômeno da
personalidade histórica mundial. Na política em sua representação demoníaca
aparece analiticamente como sinônimo de têmpera tem-se: a austeridade, o
caráter, a consistência, o feitio, a índole, a rijeza e o temperamento, o que
reitera na Itália a figuração de Maquiavel. Há pouca documentação sobre a história do maracatu antes da década de 1950.
Os
primeiros registros de maracatu em Fortaleza datam do início do século XX,
quando Gustavo Barroso descreve, em “Coração de menino”, os desfiles que
ocorriam na Praça do Carmo, então Praça do Livramento. Segundo Calé Alencar,
fundador do Maracatu Nação Fortaleza e pesquisador do Maracatu no Ceará, a
origem do Maracatu em Fortaleza provavelmente seja mais antiga. O legado do
maracatu para a música cearense se estabelece com o surgimento do Ceará como
unidade administrativa com 14 municípios, após separação de Pernambuco, quando
ocorre a aparente visibilidade da existência de inúmeras comunidades negras e
quilombolas urbanos e rurais espalhados por boa parte do território cearense.
Bernardo Manuel de Vasconcelos foi nomeado o primeiro governador pelo início da
urbanização de Fortaleza quando existiam os quilombolas de Goiabeiras, Lagoa do
Ramo, Catolé dos Pereira, Pereiral e Cinzenta. Em Tauá, Tururu, Crateús,
Itapipoca, Tamboril, Umari, Parambu, Iracema entre outros, é notado a grande
presença negra nessas vilas. Segundo alguns historiadores e antropólogos, cerca
de 10 milhões de escravos entraram na América no período de 1502 a 1870. Ao
longo desses séculos se formou uma grande miscigenação entre europeus,
principalmente portugueses, negros e índios. Poucos países do mundo contemporâneo passaram por uma miscigenação tão intensa e violenta quanto o
Brasil.
O
continente africano tornou-se durante mais de três séculos, o grande celeiro de
mão de obra escrava para a acumulação capitalista europeia e para os
proprietários rurais e de minas na América do Norte. Milhões de negros
africanos foram trazidos para a América ao longo de séculos de migrações
forçadas, eram embarcados geralmente em Angola, Moçambique e Guiné e
desembarcados no Recife, Salvador e Rio de Janeiro. As pessoas de ascendência
africana são reconhecidas na Declaração e no Programa de Ação de Durban como “um grupo de vítimas específicas
que continuam sofrendo discriminação, como legado histórico do comércio
transatlântico de escravos”. Mesmo afrodescendentes que não são descendentes
diretos dos escravos enfrentam o racismo e a discriminação que ainda hoje
persistem. Em dezembro de 2013 a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) adotou, por consenso, uma
resolução que cria a chamada década internacional de afrodescendentes,
denominada politicamente: “Pessoas Afrodescendentes: Reconhecimento, Justiça e
Desenvolvimento”. A década está sendo celebrada de 1º de janeiro de 2015 a 31
de dezembro de 2024, com o objetivo de reforçar o combate ideológico ao
preconceito, intolerância, a xenofobia e ao racismo.
O
antropólogo Darcy Ribeiro considerava o contingente negro e mulato “o mais
brasileiro dos componentes do nosso povo” uma vez que, desafricanizado pela escravidão e não sendo indígena nem branco
reinol, só restava a ele assumir uma identidade plenamente brasileira. Isto não
quer dizer que negros e mulatos tenham se integrado à sociedade brasileira sem
serem estigmatizados. Muito pelo contrário, muitos brasileiros desenvolveram
vergonha das suas origens negras, seja pelo fato de que descender de escravos
remete a um passado de humilhações e sofrimentos que deveria ser esquecido ou
pelos estereótipos negativos que foram construídos em torno da negritude,
associando-a a mazelas sociais como a pobreza e a criminalidade. Portanto,
assumir-se negro no Brasil sempre foi muito difícil, por todo o conteúdo
ideológico anti-negro que historicamente se desenvolveu no país, onde ainda
hoje impera a “ideologia do branqueamento” e um padrão branco-europeu estético
e cultural. Portanto, no Brasil, apenas as pessoas de pele preta retinta são
consideradas negras, sendo que o mulato já é pardo e, portanto “meio-branco”, uma
vez que, diante da massa de negros afundados na miséria, mediante o preconceito
urbano, com eles não queria se confundir.
Antropologicamente escrevi estas
“Confissões” (1997), urgido por duas lanças. Meu “medo-pânico” de
morrer antes de dizer a que vim. Meu medo ainda maior de que sobreviessem as
dores terminais e as drogas heroicas trazendo com elas as bobeiras do barato.
Bobo não sabe de nada. Não se lembra de nada. Tinha que escrever ligeiro, ao
correr da pena. Hoje, o medo é menor, e a aflição também. Melhorei. Vou durar
mais do que pensava. Se nada de irremediável suceder, terei tempo para
revisões. Não ouso pensar que me reste vida para escrever mais um livro. Nem
preciso, já escrevi livros demais. Mas admito que tirar mais suco de mim nesta
porta terminal é o que quisera. Impossível? Este livro meu, ao contrário dos
outros todos, cheios de datas e precisões, é um mero reconto espontâneo, “como
me vem à cabeça, o que me sucedeu pela vida afora, desde o começo, sob o olhar
de Fininha, até agora, sozinho neste mundo”. - “Muito relato será, talvez,
equivocado em alguma coisa”. Acho melhor que seja assim, para que meu retrato
do que fui e sou saia tal como me lembro. Neguei-me, por isso, a castigar o
texto com revisões críticas e pesquisas. Isso é tarefa de biógrafo. Se eu tiver
algum, ele que se vire, sem me querer mal por isso. Quero muito que estas
minhas Confissões comovam. Para isso as escrevi, dia a dia, recordando meus
dias. Sem que minhas “Confissões” comovam (...). Sem nada tirar por vexame ou
mesquinhez nem nada acrescentar por tolo orgulho. Termino esta minha vida
exausta de viver, mas querendo mais vida, mais amor, mais saber, mais
travessuras. A você que fica aí, inútil, vivendo vida insossa, só digo:
Coragem! Mais vale errar, se arrebentando, do que poupar-se para nada (...).
Depois, seremos matéria cósmica, sem memórias de virtudes ou de gozos.
Apagados, minerais. Para sempre mortos”.
Nos
registros mais antigos, os desfiles de maracatu em Fortaleza ocorriam nas
festas do ciclo natalino, nas festas da Nossa Senhora do Rosário e de Corpus
Christi, onde não eram bem aceitos. Á partir de 1937, com o desfile de estreia
do maracatu “Az de Ouro”, criado por Raimundo Alves Feitosa, conhecido como
Raimundo Boca-aberta, em 1936, o maracatu cearense passou a assumir a formação
de um bloco carnavalesco e a desfilar
durante os carnavais, como ocorre até hoje. Além de ter criado o maracatu “Az
de Ouro”, e ter adaptado o maracatu para os desfiles carnavalescos, Raimundo
Boca-aberta foi um dos maiores compositores de loas de que se tem notícia e um
compositor dos mais notáveis. O ritmo do maracatu cearense nas primeiras
décadas do século XX, como se pode escutar nos registros de Luiz Heitor Corrêa
de Azevedo (incluindo gravações de Raimundo boca-aberta), é semelhante ao coco,
com influência da umbanda (cf. Pordeus Jr., 1997). Os instrumentos utilizados
eram: caixa (sem esteira), ganzá, gonguê, tambor-onça e ferro. Na década de 1950,
por influência do Maracatu Az de Espada, o maracatu cearense toma um novo
estilo, inspirado no Auto dos Congos. O novo ritmo, cadenciado e dolente, com
um gingado majestoso e solene.
O
maracatu Vozes da África surgiu em 20
de novembro de 1980, por ocasião das comemorações do dia da Consciência Negra. Entraram na cena do
Carnaval de rua, em 1981. O nome é uma alusão ao poema de Castro Alves, poeta
baiano de meados do século XIX (1847-1871), que se celebrizou pelos poemas: O
Navio Negreiro e Vozes da África, em defesa do povo africano, afetado pelo
tráfico escravo. A sua primeira diretoria teve uma composição heterogênea, na
perspectiva de expressar o compromisso com as questões do movimento negro
organizado no Ceará, quanto em “inovar” na estética visual e rítmica, através
da junção de vários artistas. Compunha a diretoria, além do jornalista e
professor Paulo Tadeu, José Maria de Paula Almeida, que se tornou a rainha, o
figurinista Isidoro dos Santos, Afrânio Rangel e Haroldo Rangel, compositores
de loas, Luiz Alencar Rangel filho, José Nilton, músico; o aderecista Valmir
Balaio, o artista plástico e ator Ivany Gomes, além de vários outros artistas e
educadores. Desde a sua fundação/criação, o grupo teve as seguintes
denominações: Maracatu Vozes D´África,
Grupo Afro- Brasileiro Maracatu Vozes D´África, assumindo hoje, por razões
jurídicas Associação Cultural Maracatu Vozes da África. A caminho de vivência
de seus 30 anos de atividades, o maracatu Vozes
da África realizou em torno de (01) mil apresentações públicas,
procurando demonstrar, prática e notadamente, os aspectos pluralistas e
didáticos da cultura Afro-Brasileira.
Sociologicamente,
a partir da década de 1950 surgiram outros grupos étnicos como os reconhecidos grupos
“Estrela Brilhante”, “Az de Espada” e “Leão Coroado”, agremiações de grande
destaque nos desfiles carnavalescos, contribuindo com a riqueza de seus
cortejos para a consolidação etnohistórica do maracatu como uma das mais
importantes expressões artísticas e culturais de representação da memória do
povo cearense contemporâneo. A história social do carnaval em Fortaleza
registra um expressivo número destes grupos étnicos, muitos deles já extintos, talvez
pela falta de patrocínio estatal, como é o caso dos maracatus: “Rancho Alegre”,
“Nação Africana”, “Rei de Espada”, “Rei dos Palmares”, “Nação Uirapuru”, “Nação
Gengibre”, “Nação Verdes Mares” e “Rancho de Iracema”. Atualmente participam do
carnaval de rua os seguintes maracatus: “Az de Ouro”, “Rei de Paus”, fundado originalmente
em 1960, como “Ás de Paus”, “Vozes da África”, fundado em 1980, “Nação Baobab”, fundado em 1995, “Rei Zumbi”,
fundado em 2001, “Nação Solar”, fundado em 2001, “Nação Iracema”, fundado em
2002, “Kizomba”, fundado em 2003, “Nação
Fortaleza”, fundado em 2004, “Axé de Oxóssi”, fundado em 2007 e “Girassol”,
fundado em 2008.
O
maracatu é uma manifestação cultural presente, principalmente, na cultura
pernambucana. No Brasil, há três tipos de maracatu: o maracatu de baque virado,
ou maracatu nação, o maracatu de baque solto, ou maracatu rural, e o maracatu
cearense. Eles se diferem basicamente em relação à estrutura, história, música
e personagens recorrentes. No presente trabalho, trataremos do maracatu de
baque virado, o qual, no Brasil, teve seu início em Recife (PE) e possui maior
significância na cultura brasileira. No Ceará, “o povo caboclo usa uma mistura
de fuligem, talco, óleo infantil e vaselina em pasta para tingir o rosto de
negro”. É um ritmo musical, dança e ritual de sincretismo religioso com origem
no estado brasileiro de Pernambuco. Conforme o “baque” ou batida, existem dois
tipos: “baque virado” (Maracatu Nação) e “baque solto” (Maracatu Rural). O
primeiro, bastante comum na área metropolitana do Recife, é o mais antigo ritmo
afro-brasileiro; e o segundo é característica da cidade de Nazaré da Mata
referida à Zona da Mata do Norte de Pernambuco. É caracterizado pelo uso
predominante de instrumentos de percussão de origem africana. Com ritmo intenso
e frenético, teve origem nas congadas, cerimônias de coroação dos reis e
rainhas da Nação negra. Na percussão chama-se a atenção os grandes tambores,
chamados alfaias que são tocados com talabartes, as baquetas especiais para o
instrumento. Estes dão o ritmo ou o baque da música e são acompanhados pelos caixas ou taróis, ganzás e um gonguê ou agogô.
Há poucos
anos houve um movimento musical de reação sociocultural em Recife que fundiu o
ritmo maracatu com a influência da música eletrônica. Assim surgiu o movimento
Manguebeat, analisado noutro lugar, criado pelo músico Chico Science, representando musicalmente um
“maracatu atômico”. Conforme registrado
no livro “Idéias e Palavras”, existiam os maracatus do Morro do Moinho (Arraial
Moura Brasil, por trás da Estação Central), do Beco da Apertada Hora (atual rua
Governador Sampaio), da rua de São Cosme (atual rua Padre Mororó), do Outeiro
(Aldeota antiga, atual região do Colégio Militar) e o do Manoel Furtado. O
maracatu penetrou no carnaval, desfilando oficialmente com o reconhecimento de
agremiação carnavalesca, em 1937, através de um convite feito pelo então Rei
Momo Ponce de Leon ao Maracatu “Az de Ouro”, fundado em 1936 por Raimundo Alves
Feitosa, compositor e tirador de loas também conhecido como Raimundo Boca
Aberta.
A
palavra “maracatu” designou um instrumento de percussão e o aprimoramento da dança em torno da coreografia ao som deste instrumento. Os
cronistas portugueses chamavam aos infiéis de nação, nome que acabou sendo
assumido pelo colonizado no processo civilizatório. Os próprios negros passaram
a autodenominar de nações a seus agrupamentos tribais. As nações sobreviventes
descendem de organizações de negros deste tipo e nos seus estandartes escrevem:
Clube Carnavalesco Misto Maracatu
(CCMM). Mário de Andrade, no capítulo “Maracatu” de seu livro: Danças Dramáticas Brasileiras (II)
apresenta diversas possibilidades de origem e significado da palavra maracatu,
entre elas uma provável origem americana: maracá = instrumento ameríndio de
percussão; catu = bom, bonito em tupi; marã = guerra, confusão; marãcàtú, e depois marãcàtú descrevendo “guerra bonita”, entre nações isto é, reunindo
o sentido etnográfico festivo e o conteúdo guerreiro no mesmo termo. Mario de
Andrade deixa claro que enumerava os vários significados da
palavra “sem a mínima pretensão a ter resolvido o problema. Simples divagação
etimológica pros sabedores... divagarem mais”. Sua origem e
história é incerta, mas autores ressaltam que o maracatu nasceu nos
terreiros de candomblé, quando os escravos reconstituíam a coroação do reis do
Congo. Com a Abolição tardia, ganhou as ruas, tornando-se um
folguedo carnavalesco.
Bibliografia geral
consultada.
PORDEUS JÚNIOR, Ismael de Andrade, Promethé mal encheinée, ou Exu de roi des carrefour. Tese de Doutorado em Sociologia e Ciências Sociais - Etnologia. Lyon: UNiversite Lumière Lyon 2, 1988; ALENCAR, Calé, Origem e Evolução do Maracatu no Ceará.
Fortaleza: Banco do Nordeste, 2007; CARVALHO, Ernesto Ignácio, Diálogo de Negros, Monólogo de Brancos: Transformações e Apropriações Musicais do Maracatu Baque Virado. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2007; CUNHA, Maximiliano Wanderley Carneiro da, O Som dos Tambores Silenciosos: Performance e Diáspora Africana nos Maracatus Nação de Pernambuco. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2009; LIMA, Ivaldo Marciano de França, Entre Pernambuco e a África. História dos Maracatus-nação do Recife e a
Espetacularização da Cultura Popular (1960-2000). Tese de Doutorado em
História. Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal
Fluminense, 2010; KOSLINSKI, Ana Beatriz Zaine, A Minha Nação é Nagô, a Vocês eu Vou Apresentar: Mito, Simbolismo e Identidade Nação do Maracatu Porto Rico. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2011; GARCEZ, Luiz dos Santos, Os Movimentos de Maracatu Estrela Brilhante, de Recife: “Os Trabalhos de uma Nação Diferente”. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Antropologia. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2013; LIMA, Ivaldo Marciano França, “Maracatu Nação e Grupos Percussivos. Diferenças, Conceitos e Histórias”. In: História. Questões de Debates. Curitiba, n 61, pp. 303-328, jul./dez., 2014; Artigo: “Maracatus e Cavalo-Marinho Recebem Título de
Patrimônio Cultural Imaterial”. In: http://g1.globo.com/2014/12/03; SILVA, Gilian
Evaristo França, Poder e Devoção: As
Irmandades Religiosas da Fronteira Oeste da América Portuguesa. Tese de Doutorado
em História. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal
do Paraná, 2015; FERREIRA, Cleison
Leite, A Geografia do Maracatu-Nação de Pernambuco: Representações Espaciais
e Deslocamento de Elementos no Brasil e no Mundo. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Instituto
de Ciências Humanas. Departamento de Geografia. Brasília: Universidade de
Brasília, Brasília, 2016; OLIVEIRA, Edivaldo Alves de, Os Territórios dos Maracatus do Povoado do Brejão Brejo
Grande/SE. Dissertação de Mestrado. Curso de Geografia. São Cristóvão: Universidade Federal
de Sergipe, 2017; entre outros.
Que confusão!!
ResponderExcluirSão 3 tipos de fenômeno musical diferentes, apesar do nome.
Muito diferentes.
O texto confundi os 3, e maracatu NUNCA, nunca e nunca foi um instrumento!
Gloria Cunha,
ResponderExcluirBasta você entender o significado do sincretismo religioso, para admitir que, ao entrarem em contato com a religião católica, os africanos fizeram associações entre os santos católicos e as divindades africanas.