segunda-feira, 12 de junho de 2017

Maria Luiza Fontenele - Crença, Ideologia & Política no Brasil.

                                                                                          Ubiracy de Souza Braga
 
“Achamos que é totalmente utópico e falso dizer que vai se administrar uma crise”. Maria Luiza Fontenele

                                                                   
O socialismo, como já se disse alhures, não é uma ideia exótica no Brasil (cf. Löwy, 1989; Marchi, 1989; Mainwarring, 2004). A unidade de proximidade e de distância que contêm cada relação entre os seres humanos, segundo Simmel, basicamente no ensaio: The Stranger (1970) pode ser o mais resumidamente possível assim formulada: - “A distância nas relações significa que o próximo está remoto, e o ser estrangeiro ou o estranho, contudo, seria aquele que se encontra mais perto do que distante”. Porque é um elemento natural de relações completamente positivas e, também, porque é uma forma de interação específica. O estrangeiro, contudo, é também um elemento do grupo, não mais diferente que os outros e, ao mesmo tempo, distinto do que consideramos como o “inimigo interno”. É um elemento do qual a posição imanente e de membro compreendem, ao mesmo tempo, um exterior e um contrário. A noção do estranho, agora, como momentos do rechaço e da dissociação, forma aqui, agora, uma relação social de um com outro, e a unidade desta interação pode ser sugerida pelas regulações societárias, não obstante e de maneira nenhuma com um significado único. Na história inteira da economia aparecem estrangeiros, por toda parte, como comerciantes, ou os comerciantes como estrangeiros.
A posição de estrangeiro, no entanto, se intensifica fixamente na consciência, se alguém liga o estranho a sua atividade. A atividade, desta forma, se fixa nele. Em inumeráveis casos, também, isto só será possível, se o estranho viver no comércio como intermediário. O estrangeiro por sua natureza não é proprietário do solo, e o solo não é somente compreendido no sentido territorial, físico, neste caso, mas, também, como uma substância delongada da vida, que não se fixa em um espaço específico, ou em um lugar ideal do perímetro social. Nas relações mais íntimas de pessoa a pessoa, também, todas as atrações e significâncias possíveis no cotidiano das experiências simbolizadas podem revelar o estrangeiro. O estrangeiro é sentido, então, precisamente, como um estranho. Este é um processo que ocorre no interior de um grupo circunscrito, que vivencia a síntese da proximidade e da distância, e que constitui e estabelece a posição formal do estrangeiro no socialmente circunscrito. O estrangeiro é visto e sentido, como alguém absolutamente móvel. Como sujeito surge através de cada contato específico e,  singularmente, não se encontra vinculado organicamente a nada e a ninguém, em tempo e espaço, em relação aos estabelecidos parentais, locais e profissionais.
De outro lado, a expressão para esta constelação de significados encontra-se na objetividade do estrangeiro. Porque este não é determinado a partir de uma origem específica para os componentes singulares de um condicionamento social, ou para as tendências unilaterais de um grupo social determinado pela cultura. Vai além, faz frente a estes com uma atitude particular “objetiva”, simmeliana que significa não uma simples distância e indiferença, mas um fato social especial da distância e da proximidade. Fato especial dado pela relação ambígua entre insensibilidade e envolvimento. Esta objetividade não seria de forma alguma uma “não participação”, que se encontraria, possivelmente, para além ou aquém do comportamento subjetivo e objetivo. Enfatiza um tipo positivo especial de participação, como uma espécie utilitária de observação abstrata ainda não significada, através da qual o espírito parecia equivaler a uma passiva tabula rasa por meio da qual os fatos inscreveriam suas qualidades.


O socialismo cristão é uma tendência dentro do cristianismo que interpreta por  meio das Escrituras, tanto no Antigo Testamento quanto no Novo Testamento, que o modelo de sociedade socialista é o que mais se aproxima do modelo de sociedade que preze pelo amor, caridade e demais ensinamentos de Jesus, ao passo que o modelo de organização capitalista valoriza princípios opostos ao cristianismo como acumulação de capital e meios de produção, de modo que a fé demanda uma opção consciente pelo socialismo. Em termos políticos, os socialistas cristãos formam um grupo extremamente heterogêneo que se insere desde a esquerda à centro-esquerda, com a compreensão de que toda a Cristandade não pode deixar de buscar o sentido social do ensinamento. O socialismo religioso é uma compreensão da representação do socialismo que se coloca como uma opção de organização social que permite aos cristãos viverem em comunhão. 
Historicamente o movimento religioso-socialista dentro da igreja representa um movimento minoritário de grande importância, principalmente para o desenvolvimento da social democracia, no combate aos grupos fascistas e na redemocratização em países como Portugal e Brasil, além de trazer à tona a discussão da relação entre a Igreja e os trabalhadores e da igreja e o socialismo. A base do que representa hoje o “socialismo cristão”, foi iniciado no século XIX, fundamentado pela reflexão das ideias comunistas de Marx como uma tentativa de resposta às desigualdades que surgiram a partir de uma exploração desumana provocada pela quebra da livre concorrência a partir do desaparecimento de leis institucionais conservadoras, que permitiram o crescimento do truste e o surgimento dos grandes monopólios; além de um Estado despreparado para respostas sociais em prol dos mais desfavorecidos. Seus adeptos consideram que o cristianismo é naturalmente uma forma de socialismo. A cristã o vê como um sistema injusto e de consequências funestas. O que se entende por socialismo marxista, influenciado pelas ideias de Marx, representava a vontade de se criar um Estado laico.
            Outro aspecto importante se relaciona com a questão entre família e Estado. No modelo socialista, a educação familiar perderia espaço para um sistema educacional igualitário a todos; a propriedade privada e o direito a herança deixariam de existir, estes bens, no entanto, passariam a ser de controle estatal. O cristianismo considera estes princípios como uma violação do direito da família e uma tentativa de abolir a autoridade paterna; afirma, ainda, que indivíduo, as famílias, as associações têm direito de possuir bens de raiz, bens móveis e bens produtivos; e o Estado em tese, não pode açambarcar estes bens para si. Segundo as tradições judaico-cristãs, os homens têm o direito e o dever de proverem às suas necessidades, e o Estado não pode arvorar-se em providência e suprimir este direito ou substituir se a este dever. O socialismo de representação ideológica cristã é comumente denominado pelos católicos de “Movimento Social Cristão”, quando teve a sua progênie em meados do século XIX, nas obras de vários doutrinários cristãos tais como: Ozanan, Montalembert, Henri de Saint Simon, Lamennais, Albert de Mun, Frederick Denison Maurice, Charles Kingsley, Thomas Hughes, Frederick James Furnivall, Adin Ballou e Francis Bellamy. Escritores que propunham um socialismo novo, baseado nos ideais do cristianismo, oposto à luta de classes e ao ateísmo, mas preocupado com as reivindicações das classes  trabalhadoras, propondo um governo justo e uma sociedade equilibrada. Este novo socialismo, afastado das ideias de Marx, defende as organizações sindicais, as lutas dos trabalhadores em prol de melhores condições de trabalho e de vida e a justiça social.

Escritores estes que propunham um socialismo novo, baseado nos ideais do cristianismo, oposto à luta de classes e ao ateísmo, mas preocupado com as reivindicações das classes pobres e trabalhadoras, propondo um governo mais justo e uma sociedade mais equilibrada. Este novo socialismo, afastado do materialismo marxista, defende as organizações sindicais, as lutas dos trabalhadores em prol de melhores condições de trabalho e de vida e a justiça social. O Magistério da Igreja Católica condenou qualquer forma de socialismo por meio da encíclica “Rerum Novarum” do Papa Leão XIII (1891), em que se opôs ao socialismo de Pierre-Joseph Proudhon, ao marxismo ou o chamado “socialismo científico”, opondo-se também a exploração efetiva do trabalho. Era uma Carta Aberta a todos os bispos, sobre as condições sociais das classes trabalhadoras em que as ideias distributivistas de Wilhelm Emmanuel von Ketteler e Edward Manning tiveram grande influência na sua composição. Os limites conservadores do catolicismo recusam a luta de classes, e a não intervenção do Estado para permitir o desenvolvimento econômico criado pela industrialização e promover a colaboração entre patrões e empregados de forma livre, criando justiça social e distribuição equitativa da riqueza produzida. Pretendia uma resposta cristã para a questão social, alternativa à corrente dominante da Associação Internacional dos Trabalhadores, reconhecida como “Internacional Socialista”.
A encíclica critica fortemente a falta de princípios éticos e valores morais na sociedade progressivamente laicizada de seu tempo, uma das grandes causas dos problemas sociais. O documento papal refere alguns princípios que deveriam ser usados na procura de justiça na vida social, económica e industrial, como por exemplo, a melhor distribuição de riqueza, a intervenção do Estado na economia a favor dos mais pobres e desprotegidos e a caridade do patronato à classe operária. A encíclica veio completar outros trabalhos de Leão XIII durante o seu papado - Diuturnum, sobre a soberania política; Immortale Dei, sobre a constituição cristã dos Estados e Libertas, sobre a liberdade humana - para modernizar o pensamento social católico e da sua hierarquia. Pelos sucessores no papado foi denominada de “Carta Magna” do “Magistério Social da Igreja” e com ela deu-se início à sistematização do pensamento católico, passado ser o pilar da doutrina social da Igreja a que assistimos.
O que transforma estas analogias puramente virtuais em relação dinâmica de afinidade eletiva é uma conjuntura histórica determinada, uma constelação peculiar de eventos que se dá a partir do final dos anos 50. Por um lado trata-se de uma conjuntura mundial: a crise e renovação teológica do catolicismo europeu no pós-guerra, a eleição de João XXIII em 1958 e sua convocação de um novo Concílio, visando o aggiornamento da doutrina e das práticas da Igreja. Paralelamente, se desenvolve uma crise do marxismo (burocraticamente) institucional, com o XX Congresso do PCUS e a denúncia do stalinismo. Estes eventos sociais vão criar condições favoráveis para um relacionamento mais aberto entre cristianismo e marxismo, mas suas consequências na Europa não irão (com algumas exceções, sobretudo na França) mais além de um diálogo entre dois blocos políticos e culturalmente opostos. A esquerda cristã brasileira, tal como aparece nos anos 1960 na JUC, na JEC e na AP é a primeira forma que toma, na América Latina, a articulação entre fé cristã e política marxista - não como fenômeno individual, excepcional, mas como corrente com uma base social ampla. É interessante observar que este processo não é o resultado nem do Concílio Vaticano II, nem das comunidades de base, nem da teologia da libertação e tampouco do golpe militar de 1° de abril de 1964: ele é bem anterior a todos estes eventos que usualmente são considerados como causas da evolução da Igreja no Brasil e na América Latina e que sem dúvida jogarão um papel importante numa etapa posterior (cf. Löwy, 1989).
Maria Luíza Menezes Fontenele nasceu em Quixadá em 27 de novembro de 1942. Inscreve sua história política nesta conjuntura política coronelista.  Foi a primeira mulher a ser eleita prefeita de capital no estado brasileiro, além de ser a primeira prefeita de capital eleita pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Filha de Diva Menezes Fontenele e Antonino Fontenele, Maria Luiza Menezes iniciou sua militância no movimento estudantil secundarista, tendo integrado a Juventude Estudantil Católica (JEC) do Centro Liceal dos Estudantes cearenses. Posteriormente, como aluna do curso de Serviço Social da Universidade Federal do Ceará (UFC), atuou na comunidade do Pirambu (Fortaleza) e foi vice-presidente do Diretório Acadêmico da Escola de Serviço Social. Graduou-se em 1965 no curso de Serviço Social e foi Chefe do departamento de Ação Comunitária da Fundação de Serviço Social de Fortaleza.  Em 1967, tornou-se professora da UFC. Concluiu o curso de mestrado em Sociologia, na Universidade Vanderbilt, nos Estados Unidos da América, em 1973. Como deputada estadual eleita pelo MDB (1979-1982), reeleita posteriormente pelo PMDB (1983-1986), foi Relatora do Estatuto do Magistério. Participou da oposição à ditadura militar e do Movimento Feminino pela Anistia aos presos políticos e perseguidos por crimes ditos políticos.
Em 1986, concorrendo por um partido de oposição de esquerda que dava os seus primeiros passos (o PT), foi a primeira mulher a ser eleita prefeita de uma capital. Na campanha, as pesquisas apontavam Paes de Andrade em primeiro lugar, com 50% das intenções de voto, e Lúcio Alcântara, em segundo lugar, com 21%. A então jovem professora do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC) aparecia na terceira posição, com 10%. O resultado da eleição surpreendeu a todos, inclusive o PT, que sequer possuía um projeto consistente para a cidade, dada a descrença na vitória. Maria Luiza assumiu uma prefeitura endividada, com uma folha de pagamento do tamanho da receita do município e uma política fiscal que concentrava ainda mais que hoje os recursos nas mãos da União e dos Estados. Sem dinheiro, sem apoio do então governador, Tasso Jereissati, e com um discurso socialista, ela enfrentou uma greve geral dos servidores municipais e grande insatisfação popular. Terminou sua péssima administração em meio a desentendimentos com o PT e com as ruas de Fortaleza tomadas pelo lixo. Em 1987, foi expulsa do partido e filiou-se ao PSB.
Em 1990 foi eleita deputada federal pelo PSB. Durante seu mandato (1991-1995) participou, no Congresso Nacional, da elaboração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Também integrou a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou a prostituição infantil no Brasil. Defendeu a educação pública de qualidade, a reforma agrária e a reforma urbana. Em 1993, deixou o PSB e filiou-se ao PSTU, partido que integrou até 1998 etc. Professora aposentada da UFC continua a participar do movimento social do Ceará. É uma das fundadoras da União das Mulheres Cearenses (UMC) e do Grupo Crítica Radical, que criou, juntamente com Rosa Maria Ferreira da Fonseca, Jorge Paiva e Célia Zanetti. O grupo atua em várias frentes, em campanhas contra a violência, contra a criminalização dos movimentos sociais e pelo direito à memória e à verdade sobre torturas, mortes e desaparecimentos do período da ditadura militar. O grupo prega o boicote às eleições, como protesto contra o establishment político brasileiro. Em 2011, Maria Luíza viajou para a Nova York para seguir o Occupy Wall Street, o movimento populista norte-americano do século (cf. Hicks, 1961).
Em 27 de outubro de 1935, o Papa Pio XI nascido, Ambrogio Damiano Achille Ratti, em 31 de maio de 1857, foi o 259º bispo de Roma e Papa da Igreja católica de 1922 até sua morte em 10 de fevereiro de 1939. Enviou uma carta ao Cardeal Dom Sebastião Leme (1882-1942) e aos Bispos do Brasil, na qual afirmava que devido à escassez do clero, a Ação Católica (AC) seria necessária, pois sua primeira tarefa seria a formação para que existisse uma “unidade orgânica”, com coordenações em todas as associações; e que o objetivo da AC seja fazer de cada indivíduo um apóstolo de Cristo no ambiente social onde estivesse. Portanto deveriam ser organizadas semanas de estudo e oração necessárias para a formação de militantes entre os jovens estudantes e operários; para que a AC pudesse ser o “exercício pacífico de Cristo, exército de justiça, amor e paz”. Ipso facto, sua intenção era que os leigos se tornassem o “braço estendido” da Igreja Católica na sociedade como apostolado subordinado ao poder do clero.
O núcleo inicial da ACB era o Centro Dom Vital (CDV), fundado em 1922, que reunia parte da intelectualidade católica conservadora e defendia um nacionalismo de direita. Durante a década de 1920, o CDV era dirigido por Jackson de Figueiredo. O Centro Dom Vital (CDV) é uma associação brasileira de católicos leigos de caráter nacional, sediada na cidade do Rio de Janeiro. No âmbito intelectual, constitui-se numa das mais influentes agremiações culturais brasileiras do século XX. Entre seus mais famosos e atuantes membros históricos estiveram Jackson de Figueiredo, Alceu Amoroso Lima, Gustavo Corção e Heráclito Sobral Pinto. Criado em 1922 sob a liderança de Jackson de Figueiredo, liderou a intelectualidade leiga católica brasileira até o início da década de 1960. Quando de sua fundação, foi instituição pioneira na adoção de um modelo de organização católica leiga não estritamente ligada a uma ordem ou congregação particular da Igreja, e diverso das tradicionais confrarias (ordens terceiras e irmandades). Seus propósitos principais são o fortalecimento do apostolado e a formação entre leigos, bem como a intervenção na esfera de ação cultural secular, e não mais, como para as confrarias, algum culto ou devoção particular.
Entre seus princípios estatutários encontra-se a “comunhão e estrita observância da orientação doutrinária do magistério da Igreja”. A eleição de seu presidente e diretoria realiza-se periodicamente entre os associados, sendo a seguir submetida à chancela do Arcebispo do Rio de Janeiro. O CDV dedica-se ainda hoje, depois de muitas renovações, à difusão da fé e à evangelização da cultura no Brasil, assim como à promoção de debates culturais e religiosos. Edita a prestigiada revista A Ordem, onde escreveram grandes nomes das letras e da alta intelectualidade brasileiras. Promovem periodicamente palestras, ciclos de conferências, cursos de variados gêneros e organiza um cineclube próprio. Possui acervo e biblioteca, com publicações, documentos, fotos e materiais diversos, relacionados à história e às atividades do Centro Dom Vidal.
Na década de 1930, o CDV apoiou os integralistas, o movimento fascista brasileiro. Jackson de Figueiredo foi sucedido por Alceu Amoroso Lima, que, no início era um conservador, mas depois seria um intelectual católico de esquerda. Outro importante integrante da ACB foi Dom Hélder Câmara, que, em 1947, foi nomeado como assistente daquela entidade. Quando jovem foi um admirador do populismo fascista, mas renegaria essa ideologia, e, cada vez mais sensibilizado pela problemática social, se tornou um símbolo do clero progressista. Outra vertente inicial foi a Juventude Feminina Católica, reconhecida em 1932. A Ação Católica (cf. Oliveira, 1983; Dale, 1985) tem os significados de apostolado católico geral e apostolado social. Pio XI vai procurar concretizá-la oficialmente, em 1935, de modo especial comparativamente na Itália e no Brasil, como indicam estudos nesta direção, como organização distinta das outras organizações católicas em geral, contando ademais com outras auxiliares, e comportando uma estrutura própria e metodologia correspondente, a qual visava à colaboração ou participação inclusiva do leigo no apostolado da hierarquia da Igreja.

Os estatutos apontavam para a existência de diferentes organizações ideológicas de formação no âmbito da Juventude Católica (JC). Inicialmente a Juventude Estudantil Católica (JEC), para a mobilização da mocidade do curso secundário; Juventude Universitária Católica (JUC), só para universitários; Juventude Operária Católica (JOC), para a mobilização da mocidade operária. Posteriormente, principalmente durante a década de 1960, a JUC e a JOC passariam a funcionar independentemente da Ação Católica Brasileira em determinadas conjunturas. Antes do reconhecimento oficial, em 1935, pode-se dizer que Ação Católica nasceu e se firmou na Itália, desde a década de 1920, com seus quatro ramos fundamentais, segundo a idade e o sexo, insistindo na necessidade da formação como preparação para a ação, com seus círculos e semanas de estudos. Outra vertente foi a JOC, criada na Bélgica, também da década de 1920, que tinha como objeto a influência do apostolado no meio operário e que tinha como característica, também a formação “na ação e pela ação”, seguindo o método: “ver, julgar e agir”, concebido pelo sacerdote belga Joseph Léon Cardijin (1882-1967).
No Brasil, também antes da instituição oficial do modelo italiano, em 1935, além do Centro Dom Vital, surgiram, em diversas regiões do país, núcleos de leigos cristãos, por exemplo, a Juventude Feminina Católica (JFC), criada sob o estímulo e a animação do Padre João Batista Portocarrero Costa, em Recife. Em São Paulo, além da fundação da JFC, assinalam-se, tanto na Capital, como no interior - São Carlos, Taubaté, Jundiaí, Cruzeiro, Lorena, São José dos Campos, Piquete e Jacareí -, as primeiras experiências da Juventude Operária Católica (JOC e JOCF). Seções jocistas também foram criadas no Rio Grande do Sul, em Santa Maria, Passo Fundo e Bagé. Além de Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo, formaram-se grupos da JFC em Minas Gerais e no Ceará. No Rio de Janeiro, pelo Centro Dom Vital (1930), Ação Universitária Católica (AUC).
Oficializada a Ação Católica Brasileira, os núcleos de militantes cristãos foram se desenvolvendo de forma desigual. A Ação Católica por meio específico (operária, estudantil, universitária, agrária e independente), chamada também de Ação Católica Especializada, foi se firmando cada vez mais no setor de jovens. Tanto assim que, em 1948, a Comissão Episcopal de Ação Católica aprovava oficialmente a JOC como ramo fundamental da ACB e como organismo de âmbito nacional, com um assistente eclesiástico e equipe próprios, e com sede no Rio de Janeiro. Em 1943, começou a se delinear dentro da ACB uma nova maneira de encarar a organização do laicato. Essa nova orientação baseava-se nos princípios já difundidos na Europa do padre Josef Léon Cardjin, para quem “era impossível promover uma reforma espiritual profunda dos indivíduos sem uma reforma concomitante do meio em que viviam e trabalhavam”.        
A Ação Católica Brasileira era então dirigida por Alceu Amoroso Lima, com a participação de outros intelectuais católicos, muitos dos quais ligados ao integralismo e à Ação Integralista Brasileira, que fora extinta em 1937 - assim como todos os partidos políticos -, após a instauração do Estado Novo. Opondo-se à nova orientação da ACB, o grupo liderado por Plínio Correia de Oliveira desligou-se em 1943 da organização. No pós-guerra, com a derrota do fascismo, a liberação da Europa e a crescente influência de pensadores católicos humanistas - como Emmanuel Mounier, Teilhard de Chardin e Jacques Maritain - além das visitas ao Brasil, na década de 1950, do Padre Louis Joseph Lebret (1897-1966), dominicano francês ligado ao movimento Economia e Humanismo, o pensamento social católico brasileiro sofreu inúmeras transformações. Em 1947, o padre Hélder Câmara assumiu o cargo de assistente eclesiástico da Ação Católica Brasileira. Em 1950, logo em seguida à IV Semana Nacional de Ação Católica, celebrada em julho daquele ano, a Comissão Episcopal de Ação Católica, estabelecia novos estatutos para a ACB, dispondo da seguinte maneira o quadro geral: Juventude Masculina Católica, constituindo-se nos movimentos JAC (Juventude Agrária Católica), JEC, JIC (Juventude Independente Católica), JOC, JUC; Juventude Feminina Católica, formando a JACF, JECF, JICF, JOCF, JUCF; Homens de Ação Católica, formado pelas quatro ligas masculinas LAC, LIC, LOC, LUC; Senhoras de Ação Católica, formada pela LACF, LICF, LOCF, LUCF. Aos poucos, movimentos sociais de influência masculinas e movimentos sociais de influência femininas fundem-se num conjunto de práticas e saberes sociais intitulados: JUC, JAC, JEC, JIC e JOC para moços e moças.
Em 1952, um fato político novo veio influir na atuação da ACB. Foi criada a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, da qual dom Hélder Câmara era o secretário-geral. De certo modo, portanto, a CNBB brotou da ACB, e vários integrantes da CNBB haviam trabalhado na ACB como assistentes, e ainda permaneciam em contato com a entidade. Essa ligação estreita com a CNBB alterou a relação institucional da ACB com a hierarquia católica, deixando de depender das diretrizes ditadas individualmente por cada bispo para tratar com um órgão de representação nacional, aumentando assim sua autonomia de ação. No início dos anos 1960, já sob o pontificado de João XXIII, o Concílio Vaticano II, convocado no dia 25 de dezembro de 1961, através da bula papal “Humanae salutis”, pelo Papa João XXIII. Este mesmo Papa inaugurou-o, a ritmo extraordinário, no dia 11 de outubro de 1962, realizado em 4 sessões, só terminou no dia 8 de dezembro de 1965, já sob o papado de Paulo VI, o que suscitou uma cisão ideológica da Igreja do Brasil, em uma corrente interpretada politica e espacialmente mais à esquerda, liderada por Dom Hélder Câmara, e outra mais à direita, ligada a Dom Jaime de Barros Câmara e Dom Vicente Scherer.
Como aparelho ideológico de Estado a Ação Católica contava então com cinco organizações destinadas aos mais jovens: a Juventude Agrária Católica (JAC), formada por jovens do campo, a Juventude Estudantil Católica (JEC), formada por jovens estudantes do ensino médio (secundaristas), a Juventude Operária Católica (JOC), que atuava no meio operário, a Juventude Universitária Católica (JUC), constituída por estudantes de nível superior e a Juventude Independente Católica (JIC), formada por jovens que não fossem abrangidos pelas organizações anteriores. As mais conhecidas são a JEC, JOC e JUC. O crescente envolvimento do movimento estudantil na discussão dos problemas nacionais e das chamadas reformas de base, tais como a reforma agrária, acabou por engendrar a criação de uma organização política desvinculada da Igreja - a Ação Popular, constituída por antigos membros da JUC. Em 30 de abril de 1963, a CNBB pedira reformas urgentes, inserindo-se na discussão sobre as reformas de base, lançadas pelo governo. Vale lembrar que do ponto de vista ideológico a Igreja Católica, em seu conjunto, chegou dividida ao golpe político-militar de 1° de abril de 1964.
De um lado, os movimentos leigos da Ação Católica, comprometidos com vários movimentos de transformação social - Movimento de Educação de Base (MEB), Movimento Popular de Cultura (MPC) do Recife, Campanha de Educação Popular (CEPLAR) da Paraíba, etc. - destacando-se a experiência alfabetizadora de Paulo Freire, também com forte presença de cristãos. De outro lado, as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, nome comum de uma série de manifestações públicas ocorridas entre 19 de março e 8 de junho de 1964 no Brasil em resposta ao ideário comunista representado pelas ações dos grupos progressistas e pelo discurso político em comício realizado pelo então presidente João Goulart em 13 de março daquele mesmo ano. Na data, o mandatário assinou dois decretos, permitindo a desapropriação de terras numa faixa de 10 km às margens de rodovias, ferrovias e barragens e transferindo para a União o controle de cinco refinarias de petróleo que operavam no país. Além disso, prometeu realizar as reformas de base, uma série de mudanças administrativas, agrárias, financeiras e tributárias, garantindo justiça social. Com discurso insuflando, promoveu a insubordinação, incitando os sargentos da marinha a amotinar-se nos quartéis, Goulart antecipou tanto uma reforma urbana quanto as condições e possibilidades da implementação de um imposto sobre grandes fortunas. Na chamada Guerra Fria e polarização entre os Estados Unidos e a União Soviética, estas ideias foram vistas como um passo direção do processo de concretização da revolução brasileira.

Vários grupos sociais, incluindo precisamente o clero, o empresariado e setores políticos diversos se organizaram em marchas, levando às ruas mais de um (01) milhão de pessoas com o intuito de derrubar o governo Goulart. A primeira das 49 marchas aconteceu no dia 19 de março - dia de São José, padroeiro das famílias - em São Paulo e congregou entre 300 e 500 mil pessoas. Ela foi organizada por grupos como Campanha da Mulher pela Democracia (CAMDE), União Cívica Feminina (UCF), Fraterna Amizade Urbana e Rural, Sociedade Rural Brasileira, dentre outros grupos, recebendo também o apoio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e do controverso Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES). Na ocasião, foi distribuído o “Manifesto ao povo do Brasil” pedindo o afastamento de Goulart da presidência. Após a deposição do presidente pelos militares em 1° de abril, as marchas passaram a se chamar “Marchas da Vitória”. A maior delas, articulada pelo CAMDE no Rio de Janeiro, levou cerca de um (01) milhão de pessoas às ruas em 2 de abril de 1964.
Em São Paulo, no dia 19 de março de 1964, quinhentas mil pessoas, incluindo grande número de cristãos e de cristãs (as “marchadeiras”). Na ocasião, o Padre Calazans, senador por São Paulo, discursou: -“Hoje é o dia de São José, padroeiro da família... Fidel Castro é o padroeiro de Brizola”. Meses antes, o deputado-padre Pedro Maciel Vidigal, endereçando-se aos proprietários de terras de Minas Gerais, recomendava substituir o “amai-vos uns aos outros”, por “armai-vos uns aos outros”. Em 2 de abril, no Rio de Janeiro, realizou-se a Marcha da Vitória, comemorativa do golpe político-militar de 1º de abril de 1964, com o apoio do Cardeal Jaime de Barros Câmara. A marcha ocorreu no dia 2 de abril de 1964, logo após o golpe militar, no Rio de Janeiro com cerca de 1 (um) milhão de pessoas. A manifestação patrocinada e financiada também pelo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais - IPES, pelo banqueiro e governador mineiro Magalhães Pinto e pelo governador Carlos Lacerda saudou o novo regime que estava assumindo o poder. Essa manifestação foi oriunda da “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, que foram passeatas que ocorreram em várias capitais antes do golpe político-militar, contra o presidente eleito João Goulart e suas reformas de cunho político progressista. O IPES, durante seu principal período de ação, era localizado no portentoso edifício Avenida Central, na ágora comercial do Rio de Janeiro, situado vigésimo sétimo andar, possuindo treze salas, com vista ampla para a Baía de Guanabara. Sua estrutura, tal qual à de sua entidade-irmã, o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), equivale ao que hoje se conhece como think tank ou “organização não governamental” (ONG). A função do IPES era integrar os movimentos sociais de direita para criar as bases de uma oposição que pudesse deter “o avanço do comunismo soviético no ocidente”, e em particular, no Brasil.
Bibliografia geral consultada.          
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