O Segundo Aparente Estigma na Vida Política de Fidel Castro.
Giuliane de Alencar & Ubiracy de Souza
Braga
“A
história da Revolução Cubana é a história de Fidel”. Claudia Furiatti
O
primeiro estigma de Fidel Castro é descrito pelo diário espanhol ElPaís quando narra que sua
biografia começa no dia 13 de agosto de 1926 no pequeno povoado de Birán, perto
de Holguín, na antiga província cubana do Oriente. Foi o terceiro dos sete
filhos nascidos “fora do casamento por Angel Castro, um rude fazendeiro galego
que chegou a Cuba como soldado de reposição no final da guerra de Independência,
e a cubana Lina Ruz, que trabalhava como empregada na propriedade familiar”.
Até se divorciar da sua primeira esposa e se casar com Lina, no início dos anos
1940, Angel “não deu aos filhos o sobrenome Castro, razão pela qual até o final
da adolescência Fidel carregou o estigma de ser filho bastardo”. Mas este nexo
ideológico não o impediu de se destacar como um aluno arrojado e brilhante nos
internatos jesuítas os quais passou. Primeiro em Santiago de Cuba, depois em
Havana, mas que se incrustou no núcleo do seu caráter. Vale
lembrar que a sociologia de Erving Goffman fez avanços substanciais no estudo da interação
“face-a-face”, elaborou a “abordagem dramatúrgica”, a interação humana, e
desenvolveu inúmeros conceitos que tiveram uma grande influência,
particularmente no campo da microssociologia da vida cotidiana, representado
pelo “estigma”.
Goffman foi o pioneiro em pensar o conceito de estigma numa perspectiva
social. Estigma é uma relação entre atributo e estereótipo, e tem sua origem
ligada à construção social dos significados através da interação. Muitas de
suas obras tratam da organização do comportamento cotidiano, um conceito que
ele chamou de “ordem da interação”. Ele contribuiu para o conceito sociológico
de “enquadramento” (“frame analysis”). Nesta relação argumentou que a atividade
de falar deve ser vista como um bem social, em vez de uma construção
linguística. A partir da perspectiva metodológica, muitas vezes emprega abordagens
qualitativas. A mais famosa revela-se em seu estudo sobre os aspectos sociais
da doença mental, em particular no funcionamento das “instituições totais”.
Analogamente no filme “O Estranho no Ninho” (1965) que se torna um clássico na
interpretação de Jack Nicholson. Se a psiquiatria não existisse, talvez o
cinema a teria inventado. As duas áreas tratam, fundamentalmente, do
comportamento humano e do período de aceitação e popularidade, se
tornaram importantes influências culturais que interagem num espaço da modernidade em constante modificação.
Oficialmente, seu nome era Fidel Alejandro. Mas quem teve acesso às suas certidões de nascimento que são várias, devido à condição original de filho ilegítimo, posteriormente regularizado assegura que ele teve outros nomes. A historiadora brasileira Cláudia Furiati foi a primeira a documentar o assunto. No livro: “Fidel Castro: A História me Absolverá” (2003), ela diz que, em sua certidão de batismo de 1935, Fidel está registrado como Fidel Hipólito Ruz González. Já a de 1938, consta outro nome: Fidel Casiano Ruz González. E, finalmente, em 1941, quando foi reconhecido, o líder cubano passa a se chamar Fidel Alejandro Castro Ruz, nome pelo qual ficou conhecido até hoje. Sobre o assunto, Fidel Castro disse apenas que “em 13 de agosto, de fato o dia de seu aniversário, coincide com o dia de São Hipólito Casiano”, mas afirma ainda que: “me deram o nome de Fidel por causa do homem que ia ser meu padrinho”.
O jornal ElPaís publicou um longo texto sobre Fidel castro, falecido aos 90 anos na sexta-feira (25/9) em Havana. O editorial afirma que “é considerado um líder autoritário ou simplesmente um tirano para meia humanidade”, lenda revolucionária e flagelo do “imperialismo ianque” para os mais despossuídos e para a esquerda militante. O jornal liberal-conservador FolhadeS. Paulo considera “Fidel Castro, líder da Revolução Cubana e da única ditadura remanescente nas Américas”. Fidel Castro era o último sobrevivente da chamada “Guerra Fria” e certamente o ator político do século XX que mais manchetes de jornal acumularam ao longo de seus 47 anos sob o estigma absoluto de ditador cubano. Um poder caudilhista que começou no dia 1º de janeiro de 1959, após derrotar pelas armas o regime de Fulgêncio Batista que inicialmente subiu ao poder como parte da “Revolta dos Sargentos” que derrubou o regime autoritário de Gerardo Machado (1933), em seguida, nomeou a si mesmo chefe das forças armadas, com a patente de coronel, controlou os membros da Presidência.
Ele
manteve esse controle através de uma série de presidentes fantoches até 1940,
quando ele próprio era eleito Presidente de Cuba em uma plataforma populista.
Ele então instalou a Constituição de Cuba de 1940, considerado progressista e
serviu até 1944. Depois de terminar seu mandato ele viveu nos Estados Unidos,
retornando à Cuba para concorrer à presidência em 1952. Enfrentando a derrota
eleitoral, ele liderou um golpe militar que antecipou a eleição. No primeiro
período de seu governo entre 1933 e 1944, exerceu um governo forte. Consolidou
o seu poder concentrando em si todas as nomeações para os cargos públicos.
Durante seu primeiro mandato, Cuba cooperou na 2ª guerra mundial com os aliados
e declarou guerra ao Japão, Alemanha e Itália. De volta ao poder, suspendeu a
Constituição de 1940 e revogou a maioria das liberdades políticas, incluindo o
direito à greve. Alinhado com os latifundiários ricos que possuíam as maiores
plantações de açúcar, presidiu uma economia estagnada que aumentou o fosso entre
os cubanos ricos e pobres. Com o governo cada vez mais corrupto e repressivo de
Batista, começou a lucrar de forma sistemática a partir da exploração de
comercial de interesses em Cuba, através da negociação de relações lucrativas
com a máfia americana, com drogas, jogos de azar.
Empresas de prostituição em
Havana e multinacionais com sede nos Estados Unidos da América que foram adjudicados contratos
lucrativos. Com
o descontentamento com a via institucional e o fracasso de seus passos, a
década de 1950 foi marcada pelo surgimento e desenvolvimento de novos grupos
dispostos à luta armada contra Batista, tais como o Movimento26deJulho,
liderado por Fidel Castro, o DirectorioRevolucionario, cuja maior liderança
era José Antonio Echevarria, algumas facções do Partido Autêntico, o MNR (“Movimento
Nacional Revolucionário”), fundada por García Bárcena, a AL (“Ação
Libertária”), organizada pelo político Justo Carrillo, etc. A oposição radical
contra o governo possuía em comum o desprezo pela via institucional como
solução para o fim da ditadura de Fulgêncio Batista. Acreditavam que eleições organizadas
pelo próprio governo seriam meras formas de reprodução da elite política vinculada
a Batista no poder. Pleiteavam a via insurrecional que eliminasse a ditadura e instaurar a libertação cubana, com transformações
econômicas, políticas e sociais em conjunto.
Para
acalmar o descontentamento crescente da sociedade civil, a qual foi
posteriormente exibida através de frequentes revoltas estudantis e
manifestações - Batista, que estabeleceu a mais apertada censura dos meios sociais
de comunicação, ao mesmo tempo, utilizando o seu “Bureau de Repressão de
Atividades Comunistas” para levar a cabo em larga escala a violência, tortura e
execuções públicas; em uma última análise, matando aproximadamente entre 1.000
a 20.000 pessoas. Durante vários anos até 1959, seu governo recebeu apoio
financeiro, militar e logístico dos Estados Unidos. Instaurou um regime autoritário,
mandando prender os seus opositores e restringindo as liberdades através do
controle da imprensa, da universidade e do congresso, utilizando-se para isso
métodos terroristas e fazendo fortuna para si e para seus aliados. O regime de
Batista foi derrubado em 1959 pelas forças rebeldes comandadas por Fidel
Castro, Che Guevara e Raul Castro. Abandonou Cuba em 31 de dezembro de 1958, exilando-se
primeiro na República Dominicana, posteriormente na Ilha da Madeira, em
Portugal, e depois na Espanha, onde faleceu em Marbella, em decorrência de um
infarto. O apoio do governo dos Estados Unidos ao governo
ditatorial de Fulgêncio Batista (1952-59) foi um episódio emblemático da
Guerra Fria, graças às suas posições favoráveis aos negócios norte-americanos
na ilha. Earl E. T. Smith era o embaixador norte-americano em Cuba nos dois
anos que precederam a queda do ditador Batista.
No
caso de Fidel Castro o periódico ElPaís descreve que nem mesmo no ocaso de
sua existência, depois que uma doença o afastou do governo (2006), “sua
influência desapareceu da ilha que sempre foi pequena demais para ele”. Como
marxista a concebia o âmbito da revolução universal, seu objetivo na vida. Somente
uma imprensa demagógica e acanalhada como a brasileira seria capaz de publicar
manchetes tão estarrecedoras sobre a morte de Fidel Castro como fez a FolhadeS. Paulo. Os grandes jornais do mundo
publicaram manchetes reforçando a liderança de Fidel. Ainda que o jornal
quisesse por seu ultraconservadorismo levar a palavra ditador para a manchete, podia ao menos fazer eticamente como inúmeros
jornais que deram uma dualidade estrutural, em oposição assimétrica de quem o
considerava ditador e de quem o considerava uma liderança legítima. A palavra ditador
vem de um jornal que apoiou a ditadura militar no Brasil. Que fornecia seus
carros para servir aos torturadores do golpe de Estado de 1° de abril de 1964.
Que jamais chamou os generais brasileiros de ditadores, ainda que eles tenham
torturado/assassinado, jornalistas como Vlado Herzog.
Vlado
Herzog nasceu na cidade de Osijek, na então Iugoslávia, em 1937, filho de um
casal de origem judaica. Durante a 2ª guerra mundial, para escaparem do
antissemitismo praticado pelo Estado fantoche da então Croácia, controlada pela
contrarrevolucionária Alemanha nazista, a família Herzog imigrou primeiramente
para a Itália, onde viveram clandestinamente até imigrarem para o Brasil.
Naturalizado brasileiro, Vladimir Herzog tinha paixão pela fotografia,
atividade que exercia por conta de seus projetos coletivos com o cinema. Passou
a assinar “Vladimir” por considerar que seu nome soasse exótico para os
brasileiros. Herzog se formou em Filosofia pela Universidade de São Paulo, em
1959. Na década de 1970, assumiu a direção do departamento de telejornalismo da
TV Cultura (SP) e também de professor de jornalismo na Escola de Comunicações e
Artes (ECA) da Universidade de São Paulo. É uma instituição pública de ensino
superior localizada na cidade de São Paulo. Como parte da Universidade de São
Paulo, é considerada uma unidade de ensino, pesquisa e extensão. A ECA foi
fundada em 15 de junho de 1966, e hoje é formada por oito departamentos e pela Escola
de Arte Dramática (EAD). Oferece 21 cursos em nível de graduação, 13 desses cursos de formação na área
de Artes e 8 cursos voltados às comunicações. Seus alunos e ex-alunos são reconhecidos
como Ecanos.
O
Centro Acadêmico Lupe Cotrim (CALC) é responsável pela representação dos alunos
perante os professores e a Universidade. Foi fundado em 1968, em homenagem a
uma professora e poeta da ECA, Maria José Lupe Cotrim Garaude Gianotti. O
Centro Acadêmico organiza discussões e debates sobre as questões relativas aos
cursos, às formações em Comunicações e Artes e á universidade e organiza os
estudantes em torno dessas questões. O CALC também organiza as eleições para
representação discente (RDs), além de eventos culturais, como a QuintaiBreja, e
festivais de arte e música. A gestão é eleita anualmente. A atlética da Escola
de Comunicações e Artes surgiu em 1971, mas somente em 1990 ela se separou do
Centro Acadêmico e se tornou independente, constituindo a Associação Atlética
Acadêmica Lupe Cotrim, ou simplesmente Ecatlética, como é reconhecida. As
cores da Ecatlética representam o amarelo e o roxo, e a principal competição de que a
faculdade participa são os Jogos Universitários de Comunicação e Artes (JUCA),
reunindo as principais instituições de ensino de comunicações e artes de São
Paulo. Em 2007, a Escola de Comunicações e Artes conquistou o primeiro título geral do campeonato e em
2010 veio o bicampeonato. E também participa do BIFE, jogos universitários
que atualmente contam com 12 faculdades da Universidade de São Paulo.
Em 1974, o general Ernesto Geisel
tomou posse da presidência da República com um discurso de abertura política
chamado de “distensão”, o que na prática significaria a diminuição da censura,
investigar as denúncias de torturas e dar maior participação aos civis no
governo. Todavia, o governo enfrentava dois infortúnios: na política a derrota
nas eleições parlamentares e na economia crise mundial do petróleo. Além disso,
o general Ednardo D`Ávila Mello, comandante do II Exército, afirmava que os comunistas estariam infiltrados no
governo de São Paulo, na época chefiado por Paulo Egydio Martins, o que criou
uma certa contradição entre estes. Nesta conjuntura, a linha dura sentiu-se
ameaçada, e em 1975 a repressão continuava forte. O Centro de Informações do
Exército (CIE) se voltou essencialmente contra o Partido Comunista Brasileiro
(PCB), do qual Herzog era militante, mas não desenvolvia atividades
clandestinas. Através do jornalista Paulo Markun, Herzog chegou a ser informado
que seria preso, mas não fugiu. Agentes
do II Exército convocaram Vladimir para prestar depoimento sobre as ligações
que ele mantinha com o Partido Comunista Brasileiro (PCB), partido político na ilegalidade durante o regime civil-militar que
teve início com o golpe de Estado de 1° de abril de 1964. No dia seguinte, Herzog compareceu espontaneamente ao DOI-CODI, um órgão subordinado ao
Exército, de inteligência e repressão do governo durante a ditadura
que se seguiu ao golpe militar de 1964.
A estabilidade política alcançada
no governo Médici de 1969 a 1974, possibilitou ao presidente indicar o
nome do seu sucessor. As eleições indiretas para presidente da República, realizadas
no Congresso Nacional, não passavam de fachada com objetivo de encobrir o
processo eleitoral de natureza antidemocrática. O governo dispunha de folgada
maioria no Congresso Nacional. O partido governista, a Aliança Renovadora
Nacional, controlava o Senado e Câmara Federal. O Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que fazia o papel da oposição “consentida” no período da ditadura, lançou uma candidatura de
protesto com Ulysses Guimarães, candidato à presidência; e Barbosa Lima
Sobrinho, como vice-presidente. Conforme o esperado, o Congresso Nacional
referendou o nome de Ernesto Geisel como presidente da República. O
tecnoburocrata E. Geisel assumiu o governo prometendo retorno à democracia por
meio de um processo gradual e seguro. Em 25 de outubro de 1975, Rua Tutóia,
cidade de São Paulo. Nas dependências do Destacamento de Operações de
Informações – Centro de Operações de Defesa Interna – um homem é
torturado com pancadas e choques elétricos. Seus companheiros, na sala ao lado
ouvem seus gritos. O homem recusa-se a assinar um suposto depoimento por não
admitir que as informações constantes naquele pedaço de papel sejam
verdadeiras. Ele não escrevera nenhuma palavra daquilo. Em um ato de
indignação, rasga o papel. E num ato de maior indignação ainda, mesclado a ira,
seu torturador o esbofeteia. Os amigos, na outra sala, não ouvem mais seus
gritos. Algumas horas mais tarde, dentro de uma cela no mesmo departamento, uma
foto do homem morto, amarrado por uma tira de pano em um pequeno pedaço de
ferro no alto da cela.
O Inquérito Policial Militar, IPM apresenta como causa
da morte “suicídio por enforcamento”. Esta era a versão oficial sustentada
pelos militares no poder e ignorada pela família. Vladimir Herzog havia sido
assassinado e seus torturadores haviam montado uma farsa grotesca para encobrir
a barbaridade que haviam cometido. Chegou à sede DOI-CODI, às 8
horas, levado àquele endereço pelo jornalista Paulo Nunes, que cobria a área
militar na redação da Cultura e dormira na casa do diretor da TV naquela noite
para assegurar que ele se apresentaria na instalação militar logo cedo. Nunes
foi dispensado na recepção e Vlado encaminhado para interrogatório. Foi então
encapuzado, amarrado a uma cadeira, sufocado com amoníaco, submetido a
espancamento e choques elétricos, conforme o manual ali praticado e seguindo a
rotina a que foram submetidos centenas de outros presos políticos nos centros
de tortura criados pela ditadura e financiados em boa parte por empresários que
patrocinavam ações repressivas e de violação dos Direitos Humanos, como a
Operação Bandeirante. - “Naquela cela solitária, com o ouvido na janelinha, eu
podia ouvir os gritos: ‘Quem são os jornalistas? Quem são os jornalistas?’ Pelo
tipo de grito, pelo tipo de porrada, sabia que estava sendo feito com alguém
exatamente aquilo pelo que eu tinha passado, recordou, em 1992, em depoimento
ao jornal Unidade, do sindicato da categoria, o jornalista Sérgio Gomes, que
estava preso no mesmo DOI-CODI em que Vlado se encontrava naquele dia. - “Lá
pela hora do almoço há uma azáfama, uma correria”.
Ele foi torturado durante toda a
manhã e se dá o tal silêncio. A pessoa para de ser torturada e em seguida há
uma azáfama, uma correria…A gente percebe que tem alguma coisa estranha
acontecendo. Tinham acabado de matar o Vlado”. Mas o assassinato brutal, por
espancamento, não era o limite a que podiam chegar os feitores do regime
ditatorial. Esquivar-se da responsabilidade pelo crime forjando uma
inverossímil cena de suicídio seria o próximo passo dos torturadores. Com uma
tira de pano, amarraram o corpo pelo pescoço à grade de uma janela e convocaram
um perito do Instituto Médico Legal para fotografar a “prova” de que o preso
dera fim à própria vida, em um surto de enlouquecido arrependimento por ter
escrito uma confissão que aparecia rasgada, no chão, na imagem divulgada pelos
órgãos de repressão. A cena da morte de Vlado, fotografada pelo perito do IML,
foi representada pelo artista Elifas Andreato no quadro “25 de Outubro”.
Etnograficamente
na pressa para montar esse “circo macabro”, os torturadores ignoraram detalhes
como o fato de Vlado Herzog ser mais alto do que a janela com grade onde
supostamente enforcou-se e a rotina de encarceramento que tira dos presos
qualquer instrumento com o qual se possam enforcar, cintos e cadarços entre
eles. Criaram, assim, uma mentira tão flagrante que a Sociedade Cemitério
Israelita nem considerou a hipótese de enterrar o corpo na área reservada aos
suicidas, como determina a prática e ética religiosa. Mas, no Inquérito
Policial Militar que viria a ser instaurado em razão da morte ocorrida em
instalação oficial, o promotor Durval de Araújo – um defensor e protegido do regime
– ainda sustentaria que o sepultamento aconteceu no setor de suicidas,
recorrendo a depoimentos contraditórios e, mais que isso, se esforçaria para
distorcer o que diziam vários depoentes. A mãe de Vlado disse que sentiu que
queria morrer ao receber a notícia da perda do filho. O promotor tentou
registrar que ela “sentiu vontade de suicidar-se também”.
O
segundo estigma de Fidel Castro advém
da origem da palavra ditador, que no
âmbito da linguagem refere-se ao Latim dictare,
“dizer repetidamente”, de dicere, “dizer, falar, contar”.
Mesmo longe dos holofotes, ele ainda é lembrado pela força da sua oratória. O
líder cubano fez história pelos longos discursos que costumava proferir. A
duração dos seus discursos representou um aspecto marcante em sua comunicação. Dificilmente
as pessoas analisam as técnicas metodológicas que utilizou para falar em
público, mas, sim, “como conseguia falar por tanto tempo”. Ou melhor, como o
público conseguia enredar-se em sua produção discursiva. Fidel podia ser
prolixo, é verdade, entretanto, ninguém pode negar que foi muito habilidoso nos
palanques. Ao contrário do que alguns imaginam o público não ouvia seus
discursos por obrigação. A plateia não se cansava e tinha prazer em permanecer
horas apreciando suas apresentações. Com certeza, ele sempre será lembrado como
um dos maiores oradores de todos os tempos.
Seu
primeiro grande discurso ocorreu em 1956 quando falou durante cinco horas, para
dizer que a “História o absolveria”. Superou essa marca em 1959, em que manteve
a atenção do público durante sete horas, após ter derrubado o ditador Fulgêncio
Batista. E bateu seu próprio recorde em 1998, em que falou empé durante 7h15. Isso
mesmo - sete horas e quinze minutos de discurso. Um fato curioso sobre os
longos discursos de Fidel Castro ocorreu em setembro de 2000, na “Cúpula do
Milênio”, em Nova York. Ao se dirigir à Tribuna da Assembleia da Organização
das Nações Unidas, havia na plateia uma enorme expectativa para saber como o
orador, que gostava de falar tanto, poderia restringir seu discurso ao tempo
máximo determinado de 5 minutos. Prevaleceu a genialidade de Fidel que, ao
chegar diante do público e deparar-se com a lâmpada amarela localizada sobre a
tribuna, indicando que o tempo do discurso estava se esgotando, retirou um
lenço branco do bolso e a cobriu ostensivamente, de maneira irônica, posto que
a questão do tempo para ele não seria considerada. Sua competência oratória e
sua habilidade para liderar as plateias jamais deixarão de ser admiradas.
Em
seus últimos meses de vida, o líder da Revolução Cubana, Fidel Castro
(1926-2016), ficou distante de atividades públicas. Pouco antes de completar 90
anos de idade, realizou seu último discurso, em abril deste ano, durante o
encerramento do VII Congresso do Partido Comunista de Cuba (PCC). Na ocasião,
ele falou do futuro do comunismo e da sua própria morte. Com o falecimento de
Fidel Castro na noite desta sexta-feira (25/11/2016), o governo de Cuba
decretou nove dias de luto nacional, contados a partir deste sábado (26).
Havana também anunciou que o funeral de Fidel será no dia 4 de dezembro, no
cemitério Santa Efigência, na cidade de Santiago de Cuba. Mas o corpo do
ex-comandante-em-chefe deve ser cremado, conforme a vontade do Fidel
informou seu irmão e sucessor político, Raúl Castro.
Em
seu último discurso político para o povo cubano afirmou Fidel Castro: - “Devo,
em breve, cumprir 90 anos, eu nunca teria pensado em tal ideia e isso nunca foi
o resultado de um esforço, foi capricho da sorte. Logo serei, já como todos os
demais. A todos nós chegará nossa vez, mas ficaram as ideias dos comunistas
cubanos como prova de que neste planeta, se você trabalha com fervor e
dignidade, é possível produzir os bens materiais e culturais que os seres
humanos necessitam, e nós devemos lutar incansavelmente para obtê-los. Para
nossos irmãos da América Latina e do mundo, devemos transmitir que o povo
cubano vencerá. Talvez seja a última vez fale nesta sala. Eu votei em todos os
candidatos apresentados para consulta pelo Congresso e agradeço ao convite e a
honra de que me escutem. Felicito a todos, e, em primeiro lugar, ao companheiro
Raul Castro por seu magnífico esforço. Empreenderemos a marcha e
aperfeiçoaremos o que devemos melhorar, com a máxima lealdade e força unida,
como Martí, Maceo e Gómez em marcha imparável. Fidel Castro Ruz”.
O
primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, expressou neste sábado sua tristeza
pela morte do líder da Revolução cubana Fidel Castro, de Antananarivo, onde
participa da 16º cúpula de Francofonia. Trudeau lamentou a morte de um velho
amigo de seu país e de sua família, recordando a relação que seu pai, o
falecido primeiro-ministro canadense Pierre-Elliott Trudeau (1919-2000). – “Hoje
me inteirei com profunda tristeza da morte do presidente cubano que mais tempo
exerceu essa função”, declarou Trudeau em um comunicado divulgado da capital de
Madagascar. O dirigente canadense classificou Fidel Castro politicamente como
uma “figura controversa”, mas defendeu parte do legado de suas conquistas enquanto
esteve à frente do país. O presidente do México, Enrique Peña Nieto, lamentou a
morte do “pai da revolução cubana”, destacando que o líder revolucionário “Fidel
Castro foi um amigo do México, promotor de uma relação bilateral baseada no
respeito, no diálogo e na solidariedade”.
O
presidente do Equador, Rafael Correa, destacou que “se foi um grande. Morreu
Fidel. Viva Cuba! Viva América Latina!”. O presidente salvadorenho, o
ex-comandante guerrilheiro Salvador Sánchez Cerén, declarou-se muito triste com
a morte de Fidel.- “Com profunda dor, recebemos a notícias do falecimento de um
querido amigo e eterno companheiro, comandante Fidel Castro”, escreveu Sánchez
Cerén. O ex-presidente soviético Mikhail Gorbachev prestou sua homenagem neste
sábado ao falecido pai da revolução cubana Fidel Castro, que fortaleceu seu
país e resistiu ao bloqueio norte-americano. – “Fidel resistiu e fortaleceu seu
país durante o bloqueio americano mais duro, quando havia uma pressão colossal
sobre ele e ainda assim tirou seu país desse bloqueio para um caminho para um
desenvolvimento independente”, declarou Gorbachev, citado pela agência de
notícias russa Interfax.
A
imprensa internacional repercute com destaque a morte do líder cubano Fidel
Castro, aos 90 anos. A rede de televisão ABC News disse que Fidel colocou Cuba
no cenário mundial e se tornou um ator de grande destaque mundial. Mas a
emissora lembrou também que o líder cubano tinha inimigos e foi adversário de
11 presidentes norte-americanos durante o período em que eles ocuparam a Casa
Branca. A rede de televisão CBS News transmitiu a reação de uma multidão de
exilados cubanos, que vivem há décadas nos Estados Unidos. Os cubanos reunidos
em frente ao restaurante Versailles, em Little Havana, um bairro de exilados
cubanos que fica em Miami, na Flórida, entoam cânticos de “Viva Cuba” e
acenando com bandeiras cubanas. De acordo com a emissora MSNBC News, Fidel
Castro desafiou os esforços dos Estados Unidos para derrubá-lo por cinco
décadas. Segundo a emissora de televisão, Fidel costumava afirmar que
sobrevivera a 634 tentativas e/ou conspirações para assassiná-lo, principalmente
comandadas pela CIA e
por organizações de exilados que vivem nos Estados Unidos. Segundo a emissora,
os relatos de Fidel Castro afirmavam que “as tentativas para matá-lo incluíam
pílulas de veneno, charuto tóxico, explosões e uma roupa de mergulho
quimicamente contaminada”.
Bibliografia
geral consultada.
FERNANDES,
Florestan, Da Guerrilha ao Socialismo: A
Revolução Cubana. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1979; CASTRO, Fidel, Nada Podra Detener la Marcha de la História.
Entrevista concedida a Jeffrey Elliot y Mervin Dymally. La Habana: Editora
Política, 1985; SZULC, Tad., Fidel: um
retrato crítico. São Paulo: Editora Best Seller, 1986; LAZO PÉREZ, Mario, Recuerdos de Moncada. La Habana: Editora
Politica, 1987; BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz, De Martí a Fidel: A Revolução Cubana e a América Latina. Rio de
Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1998; BORDIEU, Pierre, Otros pasos del Gobierno Revolucionario
Cubano. La Habana: Editorial de Ciencias Sociales, 2002; TEIXEIRA, Rafael
Saddi, A Dominação Carismática de Fidel
Castro (1952-1960). Dissertação de Mestrado em História. Universidade
Federal de Goiás: Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia, 2004; AYERBE, Luís
Fernando, A Revolução Cubana. São
Paulo: Editora UNESP, 2004; SALES, Jean Rodrigues, O Impacto da Revolução Cubana sobre as Organizações Comunistas Brasileiras (1959-1974). Tese de Doutorado. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Departamernto de História. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2005; PRADO, Giliard da Silva, Guerrilhas da Memória: Estrate´gias de Legitimação da Revolução Cubana (1959-2009). Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em História. Instituto de Ciências Humanas. Departamernto de História. Brasília: Universidade de Brasília, 2013; PRATES, Thiago
Henrique Oliveira, “O Mundo não Acaba no Malecón”: Exílio, Intelectuais e Dissidência
Política nas Revistas Encuentro de la Cultura Cubana e Revista
Hispano-Cubana (1996-2002). Dissertação de Mestrado. Faculdade de
Filosofia e Ciências Humanas. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais,
2015; FURIATI, Claudia Maria Thiebaut, Fidel Castro - Uma Biografia Consentida. 5ª
edição. Revista, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2016; PASQUALINO, Beatriz Buschel, A Rádio Rebelde como Arma da Guerrilha na Revolução Cubana. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas: Universidade Estaduald e Campinas, 2016; entre outros.
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