“A liberdade de consciência traz mais perigos do que a autoridade e o despotismo”. Michel Foucault
O Big Ben é o nome dado etnograficamente de um grande sino instalado na torre Noroeste do Palácio de Westminster, sede do Parlamento Britânico, localizado em Londres, no Reino Unido. O nome oficial da torre em que o Big Ben está localizado era originalmente Clock Tower, mas ela foi renomeada como Elizabeth Tower em 2012 para marcar o Jubileu de Diamante da Rainha Elizabeth II (1952-2022). A torre foi inaugurada durante a gestão de Sir Benjamin Hall, ministro de Estado da Inglaterra, em 1859. A torre foi construída em estilo neogótico e tem 96 metros de altura, tendo sido concluída em 1858 e iniciado suas atividades em 7 de setembro de 1859. A Torre do Big Ben é um ícone cultural britânico, um dos símbolos mais proeminentes na história social do Reino Unido e frequentemente em cenas de filmes, séries de televisão, programas ou documentários ambientados em Londres. Em 15 de fevereiro de 1952 tocou 56 vezes, todos os minutos durante o funeral do rei Jorge VI, falecido com 56 anos de idade. Em 27 de julho de 2012 tocou durante 3 minutos de forma programada das 8 horas e 12 minutos às 8horas e 15 minutos para anunciar a Abertura dos Jogos Olímpicos de Verão de 2012. Foi a primeira vez que o sino tocou fora de sua programação normal desde o funeral do Rei Jorge VI, em 1952. A torre abriga o maior relógio composto de quatro lados do mundo e é considerada a décima quarta torre de relógio mais alta do mundo contemporâneo. O funcionamento do relógio é famoso por sua confiabilidade. Os designers foram o advogado e horologista amador Edmund Beckett Denison e George Airy, o Astrônomo Real. A construção foi confiada ao relojoeiro Edward John Dent (1790-1853); após sua morte em 1853, seu enteado Frederick Dent concluiu o trabalho, em 1854.
Como a torre não estava completa até 1859, Denison teve tempo para experimentar: em vez de usar o especificamente o escapamento deadbeat e remontoire como originalmente projetado, Denison inventou tecnologicamente o escapamento gravitacional duplo de três pernas que fornece a melhor separação entre o pêndulo e o mecanismo do relógio. O pêndulo é instalado dentro da caixa à prova de vento fechada sob a sala do relógio. Tem 13 pés (4,0 m) de comprimento, pesa 660 libras (300 kg), é suspenso em tira de aço para molas de 1⁄64 polegadas (0,40 mm) de espessura e bate a cada 2 segundos. O mecanismo de relógio em sala abaixo pesa cinco toneladas. No topo do pêndulo está uma pequena pilha de moedas antigas; estes são para ajustar a hora do relógio. Adicionar uma moeda tem o efeito de levantar minuciosamente a posição do centro de massa do pêndulo, reduzindo o comprimento efetivo da haste do pêndulo e, portanto, aumentando a taxa de oscilação do pêndulo. Adicionar ou remover um centavo mudará a velocidade do relógio em 0,4 segundos por dia. O relógio tem corda manual, levando cerca de 1,5 horas três vezes por semana. Em 10 de maio de 1941, um bombardeio alemão danificou duas faces do relógio e seções do telhado da torre e destruiu a Câmara dos Comuns. O arquiteto Sir Giles Gilbert Scott (1880-1960) projetou um novo bloco de cinco andares. Dois andares são ocupados pela câmara usada pela primeira vez em 26 de outubro de 1950.
O relógio funcionou com precisão e soou durante toda a Blitz. Antes de 1878 o relógio parou pela primeira vez em sua história, “devido a uma forte queda de neve” nos ponteiros de um relógio. Entre 21 de agosto de 1877 e janeiro de 1878 o relógio foi parado por três semanas para permitir que a torre e o mecanismo fossem limpos e reparados. A velha roda de escape foi substituída. A tarefa de descrever os nexos do agir comunicativo não consiste simplesmente em explanação o mais precisa possível do sentido das exteriorizações simbólicas que compõem a sequência observada? Certamente precisamos distinguir entre as realizações interpretativas de um observador que tenha a intenção de entender o sentido de uma exteriorização simbólica, de um lado, e as realizações interpretativas dos participantes da interação, de outro, os quais coordenam suas ações socialmente por meio do mecanismo de entendimento. Diversamente dos que têm envolvimento direto, o intérprete não está empenhado em chegar a uma interpretação passível de consenso, para que possa conciliar seus planos de ação com os dos outros atores. Mas talvez as realizações interpretativas de observador e participante se distingam somente em sua função e não em sua estrutura. Jürgen Habermas, um filósofo e sociólogo alemão que participa da tradição da teoria crítica e do pragmatismo, sendo membro da Escola de Frankfurt (cf. Jay, 2008), sustenta a seguinte tese acadêmica: ações comunicativas não podem ser interpretadas de outro modo senão de um modo racional. A sociologia tem de procurar um acesso compreensivo a seu campo objetal porque encontra nele processos de entendimento pelos quais e nos quais o campo objetal já se havia constituído de antemão, antes de qualquer intervenção teorética.
O campo de objetos das Ciências Sociais abrange tudo a que se a descrição “parte constituinte de sua vida”. O
que significa essa expressão pode ser aclarado intuitivamente por meios de
remissões aos objetos simbólicos que criamos ao falar e agir: a começar por
exteriorizações imediatas, como atos da fala, atividades voltadas a um fim,
cooperações, passando por sedimentos dessas exteriorizações, como textos,
transmissões orais, documentos, obras de arte, teorias, objetos da cultura
material, bens, técnicas, etc., até construtos criados por via indireta, aptos
a organizar-se, que se estabilizam por si mesmos tais como instituições,
sistemas sociais e estruturas de personalidades. Falar e agir são conceitos
fundamentais inexplicados, aos quais recorremos quando queremos aclarar, mesmo
de maneira provisória, o pertencer a um mundo da vida sociocultural, o
ser-parte de um mundo como esse. O problema do “compreender” nas ciências
humanas e sociais ganhou importância metodológica sobretudo porque o cientista
não consegue acesso à realidade simbolicamente pré-estruturada somente por meio
da observação, e porque a compreensão de sentido não se deixa controlar
metodicamente da mesma maneira que a observação em experimentos científicos. O
cientista social não tem acesso diverso ao mundo a vida do que tem o leigo em
ciência sociais. De certa maneira, ele já tem de fazer parte do mundo da via
cujas partes constituintes pretende descrever e explicar.
Nas ciências humanas e sociais,
segundo Habermas (2012: 202), sem temor a erro, os procedimentos de
interpretação racional contam com uma reputação questionável, apenas crítica. Originalmente no âmbito filosófico a crítica ao platonismo modelar vinculado às ciências econômicas demonstra que
alguns intérpretes contestam o teor empírico e a fertilidade elucidativa dos
modelos racionais de decisão; restrições às abordagens cognitivistas da ética
filosófica e reparos à crítica da ideologia formada principalmente na tradição
hegeliano-marxista revelam que outros, por sua vez, duvidam da possibilidade de
uma fundamentação prático-moral de normas coercitivas de ação social e da
compensação entre interesses particulares e interesses passíveis de
generalização; e a difundida crítica à cientificidade da psicanálise revela que
muitos já consideram problemática a concepção do inconsciente e o conceito do
significado duplo e potencialmente manifesto, que se considera próprio às
exteriorizações de vivências. São restrições que se baseiam em assunções
fundamentais empiristas questionáveis. Ações comunicativas sempre exigem uma
interpretação que seja racional desde o início. No agir comunicativo o ponto de
partida da interação torna-se dependente de que os envolvidos tenham sido
capazes de acordo sobre um julgamento intersubjetivamente válido de suas
referências ao mundo. Segundo esse modelo de ação, uma interação só
pode lograr êxito à medida em que os envolvidos cheguem a um consenso uns com
os outros; e esse consenso, por sua vez, depende de posicionamentos do tipo
sim/não em face de preensões potencialmente baseadas em razões.
Black
Bag tem como representação social um filme de suspense e espionagem norte-americano
de 2025, dirigido por Steven Soderbergh e escrito por David Koepp, o nono
roteirista mais bem sucedido de todos os tempos em termos de bilheteria nos
Estados Unidos, com um ganho comercial total de 2,3 bilhões de dólares. Soderbergh
também foi, eventualmente, freelance como editor de filmes. Tornou-se famoso
por executar várias funções policompetentes, segundo E. Morin, dentro de um
mesmo filme, como direção de fotografia, edição, direção e roteiro. Writers
Guild of America (WGA) é um esforço conjunto de dois diferentes sindicatos
dos Estados Unidos que representam os roteiristas da televisão e cinema: O Writers
Guild of America, East com sede em Nova Iorque e o Writers Guild of
America, West com sede em Los Angeles. Como a WGA proíbe que o cineasta
exerça múltiplas funções dentro de um filme, ele assina sua obra sob diferentes
pseudônimos. É estrelado por Cate Blanchett, Michael Fassbender, Marisa Abela,
Tom Burke, Naomie Harris, Regé-Jean Page e Pierce Brosnan. No filme, o oficial
de inteligência britânico George Woodhouse (Fassbender) é “designado para
investigar uma lista de suspeitos de traição, um dos quais é sua esposa,
Kathryn (Blanchett)”. O filme foi anunciado em janeiro de 2024, após a
confirmação das participações de Soderbergh, Blanchett e Fassbender. O restante
do elenco foi formado em março e as filmagens começaram em maio, com filmagens
em Londres e no Pinewood Studios. Black Bag foi lançado nos cinemas
primeiro na França em 12 de março de 2025, pela Universal Pictures, e nos
Estados Unidos da América sendo dois dias depois, pela Focus Features. Recebeu
críticas positivas e arrecadou comercialmente US$ 43,4 milhões em todo o mundo.
Desnecessário
dizer que o auge da popularidade dos filmes de espionagem é
frequentemente considerado a década de 1960, quando os medos da chamada Guerra
Fria se misturaram ao desejo notável do público de ver filmes emocionantes
e cheios de suspense. O filme de espionagem desenvolveu-se em duas direções
nessa época. Por um lado, os romances realistas de espionagem de Len Deighton e
John le Carré foram adaptados para thrillers relativamente sérios da Guerra
Fria que lidavam com algumas das realidades do mundo da espionagem. Alguns desses
filmes incluem The Spy Who Came in from the Cold (1965), The Deadly
Affair (1966), Torn Curtain (1966) e a série Harry Palmer,
baseada nos romances de Len Deighton, nascido em Marylebone, Londres, em 18 de
fevereiro de 1929, é um escritor britânico, de história, culinária e romances. Seu
pai era um motorista e mecânico, e sua mãe era uma cozinheira. Depois de deixar
a escola, trabalhou como balconista de trem, antes de executar seu serviço
nacional, passou como fotógrafo especial Investigation Branch (ramo
investigativo) da Força Aérea Real. Após a alta da RAF, ele estudou na Escola
de St. Martin of Art, em Londres, em 1949, e em 1952 ganhou uma bolsa de
estudos para o Royal College of Art, graduando-se em 1955. Sociologicamente a
chamada Guerra Fria representa a designação atribuída ao período
histórico de disputas estratégicas e conflitos indiretos entre os Estados
Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas,
compreendendo o período entre o final da 2ª guerra Mundial (1940-1945) e a
dissolução da União Soviética correu em 26 de dezembro de 1991, como resultado
da declaração nº 142-Н do Soviete Supremo da União Soviética. A declaração
reconheceu a Independência das antigas repúblicas soviéticas e criou a Comunidade
de Estados Independentes (CEI).
A conjuntura anterior representou um conflito extraordinário de ordem política, militar, tecnológica, econômica, social e ideológica entre as duas nações, no plano das relações políticas e econômicas e suas zonas conflitantes de influência político-militar. É chamada guerra “fria” porque não houve guerra direta entre as duas superpotências, dada a inviabilidade da vitória em uma batalha nuclear. A corrida armamentista pela construção de um grande arsenal de armas nucleares foi o objetivo central durante a primeira metade da chamada “Guerra Fria”, estabilizando-se na década de 1960-1970 e sendo reativada nos anos 1980 com o projeto do presidente dos Ronald Reagan chamado de “Guerra nas Estrelas”. Ronald Wilson Reagan foi um ator e político norte-americano, o 40.º presidente dos Estados Unidos e o 33º governador da Califórnia. Nascido e criado em pequenas cidades de Illinois, formou-se em economia e sociologia no Eureka College e em seguida trabalhou como radialista esportivo. A corrida espacial foi um dos episódios que marcaram a segunda metade do século XX e foi resultado direto da Guerra Fria. Ocorrida especificamente entre os anos de 1957 e 1975, a corrida espacial ficou caracterizada pela intensa exploração no espaço realizada por americanos e soviéticos. Um dos episódios geopolíticos de maior relevância da corrida espacial foi a estratégia global ocorrida com a chegada do homem à Lua. É neste âmbito de transformações sociais e políticas globais polarizadas que emerge na esfera política o Socialisme ou Barbarie representando um grupo socialista libertário radical francês do período pós-guerra. Seu nome vem de uma frase da economista marxista e dialética de Rosa Luxemburgo usada em um ensaio de 1916, The Junius Pamphlet.
O funcionário se prepara para uma carreira por concurso público, o que não impede que ocorra por determinado tempo a vigilância hierárquica para o cargo no serviço público. Foi esse tipo específico de poder que Michel Foucault chamou de “disciplina” ou “poder disciplinar”. E é justamente esse aspecto que explica o fato de que tem como alvo o corpo humano, não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para aprimorá-lo, adestra-lo. O que lhe interessa não é expulsar os homens da vida social, impedir o exercício de suas atividades, e sim gerir a vida dos homens, controla-los em suas ações para que seja possível e viável utilizá-los ao máximo, aproveitando suas potencialidades e utilizando um sistema de aperfeiçoamento gradual e contínuo de suas capacidades. É um objetivo ao mesmo tempo econômico e político: aumento do efeito de seu trabalho, isto é, tornar os homens força de trabalho dando-lhes uma utilidade econômica máxima; diminuição de sua capacidade de revolta, de resistência, de luta, de insurreição contra as ordens do poder, neutralização dos efeitos sociais de contrapoder, isto é, tornar os homens dóceis politicamente. Aumentar a utilidade econômica e diminuir os inconvenientes, os perigos políticos; aumentar a força econômica e diminuir expressivamente a sua força política. Situemos as suas características básicas.
Em primeiro lugar, a disciplina é um tipo de organização do espaço. É uma técnica de distribuição dos indivíduos através da inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. Isola praticamente em um espaço fechado, esquadrinhado, hierarquizado, capaz de desempenhar funções diferentes segundo o objetivo específico que deles se exige. Mas, como relações de poder disciplinar não necessitam de espaço fechado para se realizar, é essa sua característica menos importante. Em segundo lugar, e mais fundamentalmente, a disciplina é um controle do tempo. Isto é, ela estabelece uma sujeição do corpo ao tempo, com o objetivo de produzir o máximo de rapidez e o máximo de eficácia. Em terceiro lugar, a vigilância é um dos seus principais instrumentos de controle. Não uma vigilância que reconhecidamente se exerce de modo fragmentar e descontínuo; mas que é ou precisa ser vista pelos indivíduos que a ela estão expostos como forma contínua, perpétua, permanente; que não tenha limites, penetre nos lugares mais recônditos, esteja presente em toda extensão do espaço. Olhar invisível que permite impregnar quem é vigiado de tal modo que este adquira de si mesmo a visão panóptica de quem o olha. A disciplina implica um registro contínuo de conhecimento. O olhar que observa para controlar não é o mesmo que transfere as informações para os pontos mais altos da hierarquia do poder? Seu objetivo econômico e político é tornar o homem útil e dócil. A grande importância estratégica que as relações de poder disciplinar desempenham nas sociedades modernas depois do século XIX, vem do fato delas não serem negativas.
Mas positivas, quando
tiramos desses termos qualquer juízo de valor moral ou político e pensarmos
unicamente na tecnologia empregada. É então, que, segundo Foucault, surge uma
das teses fundamentais da genealogia: “o poder é produtor de individualidade”.
O indivíduo é uma produção do poder e do saber. Atuando sobre uma massa
confusa, desordenada e desordeira, o esquadrinhamento disciplinar faz nascer
uma multiplicidade ordenada no seio da qual o indivíduo emerge como alvo do
poder. O nascimento da prisão em fins do século XVIII, não representou uma
massificação com relação ao modo como anteriormente se era encarcerado. O
nascimento do hospício não destruiu a especificidade da loucura. É o hospício,
ao contrário, que produz o louco como doente mental. Um personagem
individualizado a partir da instauração de relações disciplinares. E antes da
constituição das ciências humanas, no século XIX, a organização das paróquias,
a institucionalização do exame de consciência e da direção espiritual e a
reorganização do sacramento da confissão, que aparecem como importantes
dispositivos de individualização. Em suma, o poder disciplinar não destrói o
indivíduo; ao contrário, ele o fabrica. O indivíduo não é o outro do poder,
realidade exterior, que é por ele anulado; é um de seus mais importes efeitos.
O objetivo é neutralizar a ideia que faz da ciência um conhecimento em que o
sujeito vence as limitações reais ou imaginárias de suas condições particulares
de existência, instalando-se na neutralidade objetiva no âmbito do universal e
da ideologia originalmente e um conhecimento em que o sujeito tem sua relação
com a verdade perturbada, obscurecida, velada pelas condições reais de
existência.
Todo conhecimento, seja ele científico ou ideológico, só pode existir a partir de condições políticas que são as condições para que se formem tanto o sujeito quanto os domínios do saber. A investigação do saber não deve remeter a um sujeito de conhecimento que seria a sua origem, mas a relações de poder que lhe constituem. Não há saber neutro. Todo saber é político. E isso não porque cai nas malhas do Estado, é apropriado por ele, que dele se serve como instrumento de dominação, descaracterizando seu núcleo essencial. Mas porque todo saber tem sua gênese em relações de poder. O fundamental da análise teórica é que saber e poder se implicam mutuamente; não há relação de poder sem constituição de um campo de saber, como também, reciprocamente, todo saber constitui novas relações de poder. Todo ponto de exercício do poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber. É assim que o hospital não é apenas local de cura, mas também instrumento de produção, acúmulo e transmissão de saber. Do mesmo modo comparativamente falando, que a escola está na origem da pedagogia, a prisão da criminologia, o hospício da psiquiatria. Mas a relação ainda é mais intrínseca: é o saber enquanto tal que se encontra dotado estatutariamente, institucionalmente, de determinado poder. O saber funciona dotado de poder. E enquanto é saber tem poder.
A configuração do que Foucault denomina de “intelectual específico” se desenvolveu na 2ª grande guerra, e talvez o físico atômico tenha sido quem fez a articulação entre intelectual universal e intelectual específico. É porque tinha uma relação direta e localizada com a instituição e o saber científico que o físico atômico intervinha; mas já que a ameaça atômica concernia todo o gênero humano e o destino do mundo, seu discurso podia ser ao mesmo tempo o discurso do universal. Sob a proteção deste protesto que dizia respeito a todos, o cientista atômico desenvolveu uma posição específica na ordem do saber. E admite Foucault, pela primeira vez o intelectual foi perseguido pelo poder político, não mais em função do seu discurso geral, mas por causa do saber que detinha: é neste nível que ele se constituía como um perigo político. Mas o intelectual específico deriva de uma figura muito pobre e diversa do “jurista-notável”. O “cientista-perito”. O importante é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder. A verdade é deste mundo, produzida nele graças a múltiplas coerções que produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, seus tipos de discursos que faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados, sob nosso olhar, para a obtenção da verdade. Quem está de fora do poder, mas tem a capacidade de interpretar o estatuto que delimita o seu campo de saber, percebe os efeitos de poder do que funciona como verdadeiro.
Historicamente
o gênero de filmes de espionagem começou na Era do Cinema Mudo, com a
paranoia da literatura de invasão e o início da 1ª grande guerra
(1914-1918). Esses medos produziram o britânico The German Spy Peril, de
1914, concentrado em uma conspiração para explodir o Parlamento, e o OHMS, de
1913, que significa “Our Helpless Millions Saved” (Nossos Milhões
Desamparados Salvos), bem como On His Majesty`s Service e
apresentando pela primeira vez uma personagem feminina forte que ajuda o
herói). Em 1928, Fritz Lang dirigiu o filme Espiões, que continha muitos
tropos que se tornariam populares em dramas de espionagem posteriores, incluindo
quartéis-generais secretos, um agente reconhecido por um número e a bela agente
estrangeira que se apaixona pelo herói. Os filmes de Dr. Mabuse de Lang,
também contêm elementos de thrillers de espionagem, embora o personagem
central seja “um gênio do crime interessado apenas em espionagem para fins
lucrativos”. Além disso, vários filmes norte-americanos de Lang, como “Os
Carrascos Também Morrem” abordam espiões durante a 2ª guerra mundial
(1939-1945). Por outro lado, Alfred Hitchcock contribuiu significativamente
para a popularização do cinema de espionagem na década de 1930 com seus
influentes thrillers “O Homem Que Sabia Demais” (1934), “Os 39 Degraus”
(1935), “Sabotagem” (1937) e “A Dama Oculta” (1938). Estes filmes frequentemente
envolviam civis inocentes envolvidos em conspirações internacionais ou redes de
sabotadores no front doméstico, como em “Sabotador” (1942).
Alguns, no entanto,
tratavam de espiões profissionais, como em “O Agente Secreto” (1936), de
Hitchcock, baseado nas histórias de Ashenden, de W. Somerset Maugham, ou na
série “Mr. Moto”, baseada nos livros de John P. Marquand. Nas décadas de 1940 e
início de 1950, diversos filmes foram produzidos sobre as façanhas de agentes
aliados na Europa ocupada, o que poderia ser considerado um subgênero. 13 Rue
Madeleine e OSS eram histórias fictícias sobre agentes americanos na França ocupada
pelos alemães. Houve vários filmes baseados em histórias reais de
agentes britânicos do Serviço de Energia Atômica (S.O.E.), incluindo Odette
e Carve Her Name With Pride. Um exemplo ficcional mais recente é
Charlotte Gray – Paixão sem Fronteiras (2001), baseado no romance de Sebastian
Faulks. Também durante o período, houve muitos filmes de detetive, The Thin
Man Goes Home e Charlie Chan em Serviço Secreto, por exemplo, em que
o mistério envolvia a estratégia de quem provavelmente roubou os projetos
secretos ou quem sequestrou o famoso cientista. Em meados da década de 1950,
Alfred Hitchcock retornou ao gênero de espionagem com O Homem Que Sabia
Demais (1956), representando um remake de seu filme de 1934. Ele
seguiu em 1959 com Intriga Internacional (1959), amplamente considerado
uma das obras mais influentes do gênero de espionagem. O auge da popularidade comercial
dos filmes de espionagem é frequentemente considerado a década de 1960, quando
os medos da Guerra Fria se misturaram ao desejo do público de ver filmes
emocionantes e cheios de suspense.
O filme de espionagem
desenvolveu-se em duas direções nessa conjuntura histórica nacionalista. Por um
lado, os romances realistas de espionagem de Len Deighton e John le Carré foram
adaptados para thrillers relativamente sérios da Guerra Fria que lidavam
com algumas das realidades do mundo da espionagem. Alguns
desses filmes incluem The Spy Who Came in from the Cold (1965), The
Deadly Affair (1966), Torn Curtain (1966) e a serie Harry Palmer,
baseada nos romances de Len Deighton. Em
outra direção, os romances de James Bond de Ian Fleming foram adaptados em uma
série cada vez mais fantástica de filmes de aventura irônicos pelos
produtores Harry Saltzman e Albert R. Broccoli, com Sean Connery como a
estrela. Eles apresentavam supervilões secretos e extravagantes, um arquétipo
que mais tarde se tornaria um grampo da explosão de filmes de espionagem em
meados do final da década de 1960. O sucesso fenomenal da série Bond leva a uma
enxurrada de imitadores, como o gênero eurospy e vários da América.
Exemplos notáveis incluem os dois filmes de Derek Flint estrelados por James
Coburn, The Quiller Memorandum (1966) com George Segal, e a série Matt
Helm com Dean Martin. A televisão também entrou em ação com séries como The
Man from UNCLE e I Spy nos EUA, e Danger Man e The
Avengers, na Grã-Bretanha. Os espiões permaneceram populares na TV até os
dias atuais com séries como Callan, Alias e Spooks. Os
filmes de espionagem também tiveram um certo renascimento no final da década de
1990, embora frequentemente fossem filmes de ação com elementos de espionagem
ou comédias como Austin Powers. Alguns críticos identificam uma
tendência de afastamento da fantasia em favor do realismo, como observado em
Syriana, na série de filmes Bourne e nos filmes de James Bond estrelados por
Daniel Craig desde Cassino Royale (2006).
Em outra direção, os romances de James Bond de Ian Fleming foram adaptados em uma série cada vez mais fantástica de filmes de aventura irônicos pelos produtores Harry Saltzman e Albert R. Broccoli, com o extraordinário Sean Connery (1930-2020) como a estrela (cf. Morin, 1993). Eles apresentavam supervilões secretos e extravagantes, um arquétipo que mais tarde se tornaria “um grampo da explosão de filmes de espionagem em meados do final da década de 1960”. O sucesso fenomenal da série Bond leva a uma enxurrada de imitadores, como o gênero eurospy e vários da América. Exemplos notáveis incluem os dois filmes de Derek Flint (1966) estrelados por James Coburn, The Quiller Memorandum (1966) com George Segal, e a série Matt Helm com Dean Martin. É um personagem de ficção criado pelo escritor norte-americano Donald Hamilton em 1960. Um agente secreto especializado em contraespionagem, diferente do espião relativamente comum, para ser diferenciado de James Bond, criado em 1953 por Ian Fleming, por seu autor, apareceu em 27 livros escritos entre 1960 e 1993. A televisão também entrou em ação com séries competitivamente no mercado como The Man from UNCLE e I Spy nos Estados Unidos da América, e Danger Man e The Avengers na Grã-Bretanha. Os espiões permaneceram populares na TV até hoje com séries como Callan, Alias e Spooks. Os filmes de espionagem também tiveram um certo “renascimento” no final da década de 1990, embora frequentemente fossem filmes de ação com elementos de espionagem ou comédias como Austin Powers. Alguns críticos identificam uma tendência de afastamento da fantasia em favor do realismo, como observado em Syriana, na série de filmes Bourne e nos filmes de James Bond estrelados por Daniel Craig desde Cassino Royale (2006).
Todo ponto de exercício do poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber. É assim que o hospital não é apenas local de cura, mas também instrumento de produção, acúmulo e transmissão de saber. Do mesmo modo que a escola está na origem da pedagogia, a prisão da criminologia, o hospício da psiquiatria. Mas a relação ainda é mais intrínseca: é o saber enquanto tal que se encontra dotado estatutariamente, institucionalmente, de determinado poder. O saber funciona dotado de poder. E enquanto é saber tem poder. A configuração do que Foucault denomina de “intelectual específico” se desenvolveu na 2ª grande guerra, e talvez o físico atômico tenha sido quem fez a articulação entre intelectual universal e o específico. É porque tinha uma relação direta e localizada com a instituição e o saber científico que o físico atômico intervinha; mas já que a ameaça atômica concernia todo o gênero humano e o destino do mundo, seu discurso podia ser ao mesmo tempo o discurso do universal. Sob a proteção deste protesto que dizia respeito a todos, o cientista atômico desenvolveu uma posição específica na ordem do saber. E admite Foucault, pela primeira vez o intelectual foi perseguido pelo poder político, não mais em função do seu discurso geral, mas por causa do saber que detinha: é neste nível que ele se constituía como um perigo político. Mas o intelectual específico deriva de uma figura muito pobre e diversa do “jurista-notável”. O “cientista-perito”. O importante é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder.
A verdade é deste mundo, produzida nele graças a múltiplas coerções que produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, seus tipos de discursos que faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados, sob nosso olhar, para a obtenção da verdade. Quem está de fora do poder, mas tem a capacidade analítica de interpretar o estatuto que delimita o seu campo de saber, percebe os efeitos de poder do que funciona como verdadeiro. É preciso repensar os problemas políticos dos intelectuais não mais em termos exclusivos da relação entre ciência e ideologia, mas sem abandoná-la, tendo em vista que a universidade pública é um domínio de casta, “a forma natural pela qual costumam socializarem-se as comunidades étnicas que creem no parentesco de sangue com os membros de comunidades exteriores e o relacionamento social. Essa situação de casta é parte do fenômeno de povos párias e se encontra em todo o mundo” (cf. Weber, 1982), a análise pode ser religada na medida em que a questão da profissionalização do intelectual, da divisão entre trabalho intelectual, na esfera pública pode ser retomada. A verdade está ligada a sistemas de poder que a produzem e apoiam, e a efeitos de poder que ela induz e a reproduzem. Ipso facto, o problema político essencial para o intelectual não é apenas criticar os conteúdos ideológicos que privilegiam grupos no sistema educacional que estariam ligados à ciência ou fazer com que sua prática científica seja acompanhada por métodos de inclusão democráticos. O que está em jogo num sistema de castas, que tomou o poder na universidade pública nos últimos 20 anos, é se podemos constituir uma nova arena política da verdade. Mas não se trata de libertar a verdade do sistema de poder, mas de desvincular o poder da verdade das formas com as quais ele legitima suas formas de saber. A genealogia exige a minúcia do saber, evidenciando um grande número de materiais acumulados.
Na universidade estes materiais se esgueiram como sombras. Fazer a genealogia dos valores, da moral, do ascetismo, do conhecimento não será, portanto, partir em busca do que lhe é originário, mas ao contrário, se demorar nas meticulosidades e nos acasos dos projetos interrompidos pelos predecessores, prestar uma atenção escrupulosa à sua derrisória maldade; esperar vê-los surgir, máscaras enfim retiradas, com o rosto do outro, num trabalho de escavação incessante no campus, nos arquivos, sem deixar-lhes o tempo emascular o labirinto onde nenhuma verdade as manteve jamais sob a guarda. É preciso saber reconhecer os acontecimentos da história, seus abalos, suas surpresas, as vacilantes vitórias, as derrotas mal digeridas que dão conta dos atavismos e das hereditariedades. A história, com suas intensidades, seus desfalecimentos, seus furores secretos, suas grandes agitações febris como suas síncopes, é o próprio corpo do devir. É preciso ter um espírito metafísico para encontrar na alma a idealidade distinta. A pesquisa da proveniência não funda, muito pelo contrário: ela agita o que se percebia imóvel, ela fragmenta o que se pensava unido; ela mostra a heterogeneidade do que se imaginava em conformidade consigo mesmo. Bastam para tanto que façamos a análise genealógica em sua atenção “desinteressada”, em sua ligação à objetividade.
Longe de ser uma
categoria de semelhança, tal origem permite ordenar, para coloca-las a parte,
todas as marcas diferentes. O genealogista parte em busca do começo, esta marca
quase apagada que não saberia enganar um olho, por pouco histórico que seja; a análise
da proveniência permite dissocia o Eu e fazer pulular lugares e recantos de sua
síntese vazia, entre acontecimentos aparentemente perdidos. A proveniência
permite também reencontrar sob o aspecto único de um caráter ou de um conceito
a proliferação dos acontecimentos através dos quais eles se formaram.
Metodologicamente a genealogia não pretende recuar no tempo para restabelecer
uma grande continuidade para além da dispersão do esquecimento; sua tarefa não
é a de mostrar que o passado ainda está lá, bem vivo no presente, animando-o
ainda em segredo, depois de ter imposto a todos os obstáculos do percurso uma
forma delineada desde o início. Seguir o filão complexo da proveniência é, ao
contrário, manter o que se passou na dispersão que lhe é própria: é demarcar os
acidentes, os ínfimos desvios, os erros, as falhas na apreciação, os maus
cálculos que deram nascimento ao que existe e tem valor para nós; é descobrir
que na raiz daquilo que nós conhecemos e daquilo que nós somos – não existem a
verdade e o ser, mas a exterioridade do acidente. Na universidade basta o que
ficou da gestão passada para compreendermos o presente. Na vã política em geral
e particularmente na gestão acadêmica o passado nos condena.
A cena pública da verdade é sempre a mesma em que repetem indefinidamente os dominadores e os dominados. Homens dominam outros homens e é assim que nasce a diferença de valores; classes dominam classes e é assim que nasce a ideia de liberdade, homens se apoderam de coisas das quais eles têm necessidade para viver, eles lhes impõem uma duração que elas não têm, ou eles as assimilam pela força – e é o nascimento da lógica. Nem a relação de dominação é mais uma relação, nem o lugar onde ela se exerce é um lugar. E é por isto precisamente que em cada momento da história a dominação se fixa em um ritual; ela impõe obrigações e direitos; ela constitui cuidadosos procedimentos. Ela estabelece marcas, grava lembranças e até nos corpos; ela se torna responsável pelas dívidas. Universo de regras que não é destinado a adoçar, mas ao contrário a satisfazer a violência. A regra é o prazer calculado da obstinação, é o sangue prometido. Ela permite reativar sem cessar o jogo da dominação; ela põe em cena uma violência meticulosamente repetida. A humanidade não progride lenta de combate em combate, ela instala cada uma de suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim num processo ad infinitum de dominação em dominação. É justamente a regra que permite que seja feita a violência à violência e que uma outra dominação possa dobrar aqueles que dominam.
Em si mesmas as regras são vazias, violentas, não finalizadas; elas são feitas para servir a isto ou aquilo; elas podem ser burladas ao sabor da vontade de uns e outros. O grande jogo da história será, segundo Foucault, de quem se apoderar das regras, de quem tomar o lugar daqueles que as utilizam, de quem se disfarçar para perverte-las, utilizá-las ao inverso e volta-las contra aqueles que as tinham imposto; de quem, se introduzindo no aparelho complexo, o fizer funcionar de tal modo que os dominadores encontrar-se-ão dominados por suas próprias regras. As diferenças emergenciais que se podem demarcar não são figuras sucessivas de uma mesma significação; são efeitos de substituição, reposição e deslocamento, conquistas disfarçadas, inversões sistemáticas. Se interpretar eras colocar lentamente em foco uma significação oculta na origem, apenas a metafísica poderia interpretar o devir da humanidade. Mas se interpretar é se apoderar por violência ou sub-repção, de um sistema de regras que não tem em si significado essencial, e lhe impor uma direção, dobrá-lo a uma nova vontade, fazê-lo entrar noutro jogo e submetê-lo a novas regras, então o devir da humanidade é uma série de interpretações. E a genealogia dever ser a sua história: história das morais, dos ideais (uma universidade de verdade), dos conceitos metafísicos, história do conceito de liberdade ou da vida ascética, como emergências de interpretações diferentes. Trata-se de fazê-las aparecer como acontecimentos reais no teatro dos procedimentos. O genealogista sabe o que é necessário pensar.
Não que ele a rechace por espírito de seriedade; ele quer leva-la ao extremo: porque quer por em cena um grande carnaval (cf. DaMatta, 1981) do tempo em que as máscaras reapareçam incessantemente. Não queremos perder de vista que a disciplina é, antes de tudo, a análise do espaço. É a individualização pelo espaço, a inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. A disciplina exerce seu controle, não sobre o resultado de uma ação, mas sobre seu desenvolvimento. No século XVII, nas oficinas de tipo corporativo, o que se exigia do companheiro ou do mestre era que fabricasse um produto com determinadas qualidades. A maneira de fabricá-lo dependia da transmissão de geração em geração. Do mesmo modo, se ensinava o soldado a lutar, a ser mais forte do que o adversário na luta individual da batalha. A partir do século XVIII, se desenvolve uma arte do corpo humano. Observa-se de que maneira os gestos são feitos, qual o mais eficaz, rápido e melhor ajustado. Nas oficinas aparece o famoso e sinistro personagem do contramestre, destinado não só a observar se o trabalho foi feito, mas como é feito, como pode ser mais rapidamente realizado e com gestos humanos melhor adaptados. O famoso Regulamento da Infantaria Prussiana, que assegurou as vitórias de Frederico da Prússia (1712-1786), consiste em mecanismos de gestão disciplinar dos corpos. A disciplina é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos.
Não basta olhá-los às vezes ou ver se o que o que fizeram é conforme à regra. É preciso vigiá-los durante todo o tempo da atividade e submetê-los a uma perpétua “pirâmide de olhares”. Mas a disciplina implica um registro contínuo. Anotação do indivíduo e transferência da informação de baixo para cima, de modo que, no cume da pirâmide disciplinar escape a esse saber. No sistema clássico o exercício do poder era confuso, global e descontínuo, do soberano sobre grupos constituídos por famílias, cidades, paróquias, isto é, por unidades globais, e não um poder contínuo atuando sobre o indivíduo. A disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os sistemas de poder vão ter por alvo e resultado os indivíduos em sua singularidade. O exame é a vigilância permanente, classificatória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-los, localizá-los e, por isso, utilizá-los ao máximo. Através do exame, a individualidade torna-se um elemento para o exercício do poder. A invenção dessa nova anatomia política não deve ser entendida como uma descoberta súbita. Mas como uma multiplicidade de processos muitas vezes mínimos, de origens diferentes, de localizações esparsas, que se recordam, se repetem, ou se imitam, apoiam-se uns sobre os outros, distinguem-se segundo seu campo de aplicação, entram em convergência e esboçam aos poucos a fachada de um presunçoso método geral.
Não
se trata de fazer aqui a história das diversas instituições disciplinares no
que podem ter cada uma de singular: 1) ambas, neste caso, são instituições
públicas gerenciadas por uma casta no poder (cf. Weber, 1982; Dumont, 1992); 2)
Existe uma série de exemplos de algumas das técnicas essenciais empregadas que,
de uma a outra, se generalizaram mais facilmente. Pequenas astúcias dotadas de
um grande poder de difusão, arranjos sutis, de aparência inocente, mas
profundamente suspeitos, são dispositivos que obedecem a economias
inconfessáveis, ou que procuram coerções sem grandeza (assédio moral), são eles,
entretanto que levaram à mutação do regime punitivo contemporâneo; 3)
Descrevê-los metodicamente, nominalmente, implicará a demora sobre o detalhe da
corrupção do pensamento e a atenção às minúcias: sob as mínimas figuras,
procurar não um sentido, mas uma precaução; recoloca-las não apenas na
solidariedade de um funcionamento, mas na coerência de uma tática; 4) Astúcias,
não tanto de grande razão que trabalha até durante o sono, no sentido analítico
freudiano, e dá coerência ao insignificante quando da atenta malevolência que
de tudo alimenta. Nunca é demais repetir, a disciplina é uma anatomia política do detalhe. O que
nos interessa, sociologicamente, é a racionalização utilitária do detalhe na contabilidade moral e
no controle político. A regra das localizações funcionais vai pouco a pouco
codificar um espaço que a arquitetura deixava livre e pronto para
vários usos.
Bibliografia Geral Consultada.
CASTORIADIS, Cornelius, L`Institution Imaginaire de la Société. Paris: Éditions Du Seuil, 1975; GALLIE, Walter Bryce, Os Filósofos da Paz e da Guerra: Kant, Clausewitz, Marx, Engels e Tolstoi. Rio de Janeiro: Editora Artenova; Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1979; HORKHEIMER, Max, Dialética do Esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985; BERNSTEIN, Richard; GIDDENS, Anthony; RORTY, Richard, “et al”, Habermas y la Modernidad. Madrid: Catedra Ediciones, 1994; GIDDENS, Anthony, As Consequências da Modernidade. São Paulo: Editora Unesp, 1991; DUMONT, Louis, Homo Hierarchicus. O Sistema de Castas e suas Implicações. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992; WEBER, Max, Parlamento e Governo na Alemanha Reordenada: Crítica Política da Burocracia e da Natureza dos Partidos. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1993; GOTTRAUX, Philippe, Socialisme ou Barbarie, un Engagement Politique et Intellectuel dans la France de l`après Guerre. Suisse: Editions Payot Lausanne, 1997; KEHL, Maria Rita, Ressentimento. São Paulo: Editor Casa do Psicólogo, 2007; JAY, Martin, A Imaginação Dialética: História da Escola de Frankfurt e do Instituto de Pesquisas Sociais, 1923-1950. Rio de Janeiro: Contraponto Editora, 2008; GOFFMAN, Erving, Os Quadros da Experiência Social. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2012; FOUCAULT, Michel, El Orden del Discurso. Barcelona: Ediciones Tusquets, 1973; Idem, Nietzsche, Marx, Freud. Buenos Aires: Ediciones Anagrama, 2010; Idem, Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão. 42ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2014; FERREIRA, Tiago Alfredo da Silva, Entendimento, Conhecimento e Autonomia: Virtudes Intelectuais e o Objetivo do Ensino de Ciências. Tese de Doutorado em Ensino, História e Filosofia das Ciências. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2015; HABERMAS, Jürgen, Teoria do Agir Comunicativo. Racionalidade da Ação e Racionalização Social. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012; Idem, A Nova Obscuridade: Pequenos Escritos Políticos V. 1ª edição. São Paulo: Editora Unesp, 2015; BENZAQUEM, Guilherme Figueredo, “Quando o Indivíduo se Transforma: Reflexões a partir de Mead, Goffman e Garfinkel”. In: Ponto e Vírgula. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, nº 24, 2º semestre de 2018; pp. 97-112; Artigo: “Revisão da Bolsa Preta: O Elegante Thriller de Espião de Steven Soderbergh É Um Bom Tempo Inteligente e Escaldante”. Disponível em: https://universocinema.com.br/7/03/2025; entre outros.
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