sexta-feira, 22 de julho de 2016

À Primeira Vista – Visão ou Realidade na Questão de Interpretação.

                                                                                                             Ubiracy de Souza Braga*
                                                                                                 
                                           “Tudo o que se pensa ou é afeto ou aversão”. Robert Musil

                               

A realidade é “tudo o que existe”. Em sentido mais livre, o termo inclui tudo o que é, seja ou não perceptível, acessível ou entendido pela filosofia, ciência, arte ou qualquer outro sistema de análise. O real é tido como aquilo que existe fora ou dentro da mente. A ilusão quando existente é real e verdadeira em si mesma. Ela não nega sua natureza. Ela diz sim a si mesma. A realidade interna ao ser, seu mundo das ideias, imaginário, idealizado no sentido de tornar-se ideia, e ser ideia, pode - ou não - ser existente e real também no mundo externo. O que não nega a realidade da sua existência enquanto ente imaginário, idealizado. Quanto ao externo - o fato de poder ser percebido só pela mente - torna-se sinônimo de interpretação da realidade, de uma aproximação com a verdade. A relação íntima entre realidade e verdade, o modo em como a mente apreende a realidade, está no cerne da questão da imagem como representação sensível do objeto e da ideia do objeto como interpretação mental. Ter uma mente tranquila em meio à agitação e aos estímulos que estamos expostos na modernidade contemporânea não é uma atividade  que pode parecer um luxo.
Marx só pôde se tornar Marx fundando uma teoria da história e uma filosofia da distinção histórica entre ideologia e ciência e que em última análise essa fundação se tenha consumado na dissipação do que se chama “mito religioso da leitura”.  Mas é possível afirmar que na cultura da história humana nosso presente corre o risco de aparecer um dia como que assinalado pela provação mais dramática e mais laboriosa possível. A descoberta e o aprendizado do sentido dos atos mais “simples” da existência: ver, escutar, falar, ler. Não é à psicologia que devemos estes conceitos perturbadores, mas a homens como Karl Marx, Friedrich Nietzsche e Sigmund Freud. Depois de Freud é que começamos a suspeitar do quer-dizer o escutar, e, portanto o falar (e o calar) e o que quer-dizer do falar e do escutar revela, sob a inocência do falar e do escutar, a profundidade de uma fala inteiramente diversa, a fala do inconsciente. Freud refere-se aos aspectos que compõem um estado instintivo humano e que acaba por se tornar inibido em prol da convivência em comunidade. A inibição destes aspectos sociológicos que são instintivos, consiste numa privação de características que são inatas aos homens. Ipso facto, esta própria privação, acaba por consistir em determinados descontentamentos.


                                    
            Vale lembrar a tese segundo a qual a corpolatria é uma espécie de patologia da modernidade. Ela se caracteriza pela preocupação de “cuidados extremos com o corpo”, não exatamente no sentido da saúde ou de presumida falta dela, como no caso da hipocondria, mas particularmente no sentido narcisístico de sua aparência diante de um espelho em que se torna obsedante, incapaz de satisfazer-se com ela, sempre achando que pode e deve aperfeiçoá-la. A corpolatria se manifesta como exagero no recurso às cirurgias plásticas, gastos excessivos com roupas e tratamentos estéticos, abuso do fisiculturismo, entendido como musculação, uso de anabolizantes, etc. como temos na relação fútil entre aqueles que enformam a classe média com relação ao consumo em geral de tudo aquilo que envolve o seu corpo. O globo ocular recebe este nome por ter a forma de um globo, que por sua vez fica acondicionado dentro de uma cavidade óssea e protegido pelas pálpebras. Possuem em seu exterior seis músculos que são responsáveis pelos movimentos oculares, e também três camadas concêntricas aderidas entre si com a função de visão, nutrição e proteção. A camada externa é constituída pela córnea e a esclera e serve para proteção. A camada média ou vascular é formada pela íris, a coroide, o cório ou uvea, e o corpo ciliar a parte vascular. A camada interna é constituída pela retina que é a parte nervosa.
          Reconhecer a verdade é vê-la com os “olhos da alma”, ou, com os “olhos da inteligência” no sentido acadêmico. Assim como o Sol dá sua luz aos olhos e às coisas para que haja “mundo visível”, assim também a ideia suprema, a ideia de todas as ideias, o Bem (isto é, a perfeição em si mesma) dá à alma e às ideias sua bondade (sua perfeição) para que haja “mundo inteligível”. Assim como os olhos e as coisas participam da luz, assim também a alma e as ideias participam da bondade (ou perfeição) e é por isso que a alma pode conhecer as ideias. E assim como a visão é passividade e atividade do olho, assim também o conhecimento é passividade e atividade da alma: passividade, porque a alma precisa receber a ação das ideias para poder contemplá-las; atividade, porque essa recepção e contemplação constituem a própria natureza da alma. Assim como na treva não há visibilidade, assim também na ignorância não há verdade. A e a são para a alma o que a cegueira é para os olhos e a escuridão é para as coisas: são privações de visão e privação de conhecimento.
A realidade significa o ajuste que fazemos entre a imagem e a ideia da coisa, entre verdade e verossimilhança. O problema da realidade é matéria presente em todas as ciências e, com particular importância, nas ciências que têm como objeto de estudo o próprio homem: a antropologia e todas as disciplinas que nela estão implicadas: a filosofia, a psicologia, a semiologia e muitas outras, além das técnicas e das artes visuais. Na interpretação ou representação do real, enquanto verdade subjetiva ou crença, a realidade está sujeita ao campo das escolhas, isto é, determinado, por ser um fato social, ato ou uma possibilidade, algo adquirido a partir dos sentidos e do conhecimento adquirido. Dessa forma, a constituição das coisas e as nossas relações dependem de um intrincado contexto, que ao longo da existência cria a lente entre a aprendizagem e o desejo: o que vamos aceitar como real na vida social? A realidade é construída socialmente pelo sujeito consciente; ela não é dada pronta para ser descoberta.      
            A visão já não é então o fato social de uma pessoa individual, dotada da faculdade de “ver” a qual é exercida quer da atenção, quer da distração; a vista é o fato de suas condições estruturais, a vista é a relação de reflexão imanente do campo da problemática sobre seus objetos e seus problemas. A visão perde então seus privilégios religiosos da “leitura sagrada”: ela nada mais é que a reflexão da necessidade imanente que liga o objeto ou o problema às suas condições de existência, que têm a ver com as condições de sua produção. A rigor, não é mais o olho (olho do espírito) de uma pessoa que vê o que existe no campo definido por uma problemática teórica: é esse próprio campo que se vê nos objetos ou nos problemas que ele define, sendo a visão apenas a reflexão necessária do campo em seus objetos. Vale lembrar que o drama “À Primeira Vista” do cineasta Irwin Winkler  é um filme baseado no ensaio: “Ver e Não Ver” do neurologista Oliver Sacks, autor extraordinário com reconhecimento literários de vários best-sellers, incluindo coleções de estudos de casos de pessoas com distúrbios neurológicos.
             Em 1966 começou a trabalhar como neurologista, no Hospital Berth Abraham, no Bronx, em Nova Iorque. Na ocasião, conheceu um grupo de pacientes que se caracterizavam por estar há décadas num estado catatônico, incapazes de fazer qualquer tipo de movimento. Constatou que esses pacientes eram os sobreviventes de uma grande epidemia da doença do sono que assolou o mundo entre 1916 e 1927.  No ensaio: Ver e Não Ver, o personagem Virgil com 50 anos, era praticamente cego, sendo portador de uma doença hereditária que acabava aos poucos com sua retina. Amy era sua noiva e desejava que no dia do casamento que ele pudesse ver tudo que lhe acontecia. Um filme honesto, com excelentes interpretações com destaque para o ator Val Kilmer, com um roteiro adaptado com maestria, para não falarmos na boa edição e trilha sonora com destaque para a pianista jazzista Diana Krall, que dispensa comentários e tem uma pequena participação no filme. É baseado em artigo no jornal The New Yorker pelo neurocientista Oliver Sacks.    
        Na prática, o semáforo funciona assim: quando o sinal verde para pedestres é ligado, o equipamento emite um som com uma frequência específica, que muda quando o farol está prestes a fechar novamente. O sinal é completamente interrompido quando o semáforo fica vermelho. A CET tem dois anos para concluir a instalação dos equipamentos, mas antes diz que está fazendo um estudo técnico. Segundo João Álvaro de Moraes Felipe, especialista em orientação e mobilidade da Instituição Laramara, Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual, organização não-governamental que tem sede no bairro de Campos Elíseos, na região central da capital paulista. Os semáforos sonoros condicionaram os motoristas a pararem para deixar os cegos passarem. O equipamento foi instalado há quase 20 anos na Rua Conselheiro Brotero, em frente ao Laramara. Nesse período, não há registros de acidentes. Os sinais dão a possibilidade de o cego atravessar a rua sem pedir ajuda. O direito de sir e vir e ser independente em tese, deveria ser garantido por um conjunto de práticas sociais em torno do Estado, mas isto está infinitamente longe de acontecer.  
            Ora, entendemos que à fala pertence aquilo sobre o que se fala. A fala dá indicações sobre algo e isso numa determinada perspectiva condicionada socialmente. A fala retira o que ela diz como essa fala daquilo sobre que fala como tal. Na fala, enquanto processo social de comunicação, isso é o que se torna acessível à co-presença dos outros, na maior parte das vezes, através da verbalização da língua.  O que no apelo da consciência constitui o referido da fala, ou seja, o interpelado? Manifestamente a própria presença. Essa resposta é tão indiscutível quanto indeterminada. Mesmo que o apelo tivesse uma meta tão vaga, ele ainda seria para a presença um motivo de prestar atenção a si mesma. Pertence à presença, no entanto, de modo essencial, que, com a abertura de seu mundo, ela está aberta para si mesma, de tal modo que ela sempre já se compreende. O apelo alcança a presença nesse movimento de sempre já se ter compreendido na cotidianidade mediana das ocupações. O impessoalmente si mesmo do ser-com com os outros é também alcançado pelo apelo.
           A interpretação existencial da consciência deve expor um testemunho de seu poder-ser mais próprio que está sendo na própria presença. Amy é uma arquiteta que frequenta o Spa onde Virgil trabalha como massagista. Ela nem desconfia que Virgil não enxerga. Os dois tornam-se amigos e logo iniciam um relacionamento, pois percebem que estão completamente apaixonados um pelo outro. Além de encontrar um grande amor, o rapaz começa a acreditar que poderá, depois de anos, ter a visão de volta. A arquiteta começa uma busca incansável por médicos especialistas no assunto, até que ela conhece, num momento raro, um médico com tratamento inovador. No dia seguinte da operação do olho direito, Amy iniciou um diário contando tudo o que acontecia com seu noivo, suas primeiras sensações, visões e descobertas. Em geral, as pessoas reagem a estímulos externos, como sons e luz, e internos evidentemente associados às emoções. A principal função das emoções é garantir a sobrevivência social tanto quanto existencial do ser humano, visto que são elas que geram respostas e comportamentos responsáveis por impulsionar uma determinada fuga ou uma ação social.
Para Virgil houve uma enorme transformação em sua vida. Muitas vezes não conseguia utilizar da visão para identificar algo e sempre voltava a utilizar o tato como ferramenta. Depois da operação clínica do olho esquerdo Virgil melhorou a sua visão e se mostrava mais assentado em suas maneiras, apesar de tudo que passou se saiu muito bem, “mostrando um aumento constante em sua capacidade de apreender o mundo visual”. Enfim, após 4 meses da cirurgia, Virgil desfalecera com pneumonia lombar, o que fez com que perdesse a visão novamente e assim teve que reaprender a ser cego novamente. Esta história demonstra delicadamente o processo e o método de trabalho da visão onde é necessário o cérebro interpretar os sinais que recebe dos olhos. Essa história que tem base social e psicológica desde Freud serviu como base do roteiro do instigante filme “A Primeira Vista”.  
Este caso inspirou-o a escrever em 1973 o livro: “Awakenings”, que em 1990 foi adaptado para o cinema, no filme estrelado por Robin Williams e Robert De Niro.  A história é sobre como podemos perceber o mundo através dos sentidos. No filme, Virgil perde a visão na infância e aprende a reconhecer o mundo sem qualquer imagem. Após uma cirurgia, ele volta a enxergar e precisa incorporar imagens às outra sensações que ele aprendeu a atribuir às coisas. Uma cena ilustrativa é quando Virgil vê uma maçã pela primeira vez. Ao olhar aquela “bolinha vermelha”, ele fica confuso ao se lembrar do cheiro e da forma que ele conhece da fruta e ao que ele agora reconhece visualmente como maçã. Aos poucos ele vai aprendendo a lidar com esta nova visão da realidade. Daí, toda a fragilidade no sistema dos conceitos sociológicos, que constitui o conhecimento, reduzir-se à fraqueza psicológica do “ver”. Enfim, a sociedade modifica a natureza humana individual (o sonho) e coletiva (os mitos, os ritos, os símbolos) constituindo o homem numa comunidade determinada, adaptando-o a um processo vital que torna o indivíduo um ente social.  
Bibliografia geral consultada.
ALTHUSSER, Louis, “Freud et Lacan”. Disponível em: La Nouvelle Critique, n° 161-162, Paris, 1965; TOURAINE, Alain, La Voix et le Regard. Paris: Éditions du Seuil, 1978; BOSI, Ecléa, Memória e Sociedade: Lembranças de Velhos. São Paulo: T. A. Queiroz, 1979; HALL, Stuart, “et al”, Da Ideologia. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980; SCHEIBE, Karl, Espelhos, Máscaras, Mentiras e Segredos. São Pasulo: Editora Interamericanas, 1981; Idem, Self Studies. The Psychology of Self Identity. London: Praeger Publisheres, 1985; BLUMER, Herbert, Filmes e Conduta. Nova York: Macmillan Editor, 1983; DENZIN, Norman, A Sociedade Cinematográfica. Londres: Sage Publishers, 1995; SACKS, Oliver, Um Antropólogo em Marte. Sete histórias paradoxais. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 1995; SARAMAGO, José, Ensaio sobre a cegueira. Lisboa: Editorial Caminho, 1995; POSTMAN, Neil, O Desaparecimento da Infância. Rio de Janeiro: Editora Graphia, 1999; BLOOM, Harold, Gênio - Os 100 Autores Mais Criativos da História da Literatura. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2003; ROUDINESCO, Elisabeth, A Família em Desordem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003; CHAUÍ, Marilena, Desejo, Paixão e Ação na Ética de Espinosa. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2011; FREUD, Sigmund, Au-delà du Principe de Plaisir. Paris: Éditions Payot. Coll.  Petite Bibliothèque Payot, 2010; Idem, Totem e Tabu. Contribuição à História do Movimento Psicanalítico e outros textos (1912-1914). São Paulo: Editora Companhia da Letras, 2012; SYLVIO, Allan Rocha Moreira, Uma Interpretação Intencionalista da Imagem: Percepção e Comunicação Visuais Humanas. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento. Belém: Universidade Federal do Pará, 2012; SANDRI, Tammie Caruse Faria, Teoria Geral da Imagem e a Produção de Sentidos: Modelo Aplicado à Recepção. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2016; entre outros.
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).   

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Erving Goffman – Máscaras, Sintomas & Estigmas Sociais

                                                                                                             Ubiracy de Souza Braga*

Sociedade é um manicômio de malucos dirigido pelos próprios pacientes”. Erving Goffman


Erving Goffman foi um sociólogo e escritor canadense. Obteve o grau de Bacharel pela Universidade de Toronto em 1945, de Mestrado e Doutorado pela Universidade de Chicago, onde estudou Sociologia e Antropologia Social. Em 1958 passou a integrar o corpo docente da Universidade da Califórnia, em Berkeley, tendo sido promovido a professor Titular em 1962. Ingressou na Universidade da Pensilvânia em 1968, atuando como professor de Antropologia e Sociologia. Em 1977 obteve o prêmio Guggenheim pela Fundação Memorial John Simon Guggenheim desde 1925, para aqueles “que demonstram excepcional capacidade para produtividade com a bolsa ou habilidade criativa excepcional em artes”. Foi presidente da Sociedade Americana de Sociologia, em 1981-1982 e realizou pesquisas na linha de orientação da sociologia interpretativa e cultural. O discurso presidencial na American Sociological Association, em 1982, não chegou a ser lido por ele devido à sua morte prematura, ocorrida em novembro daquele ano. Obras como A Representação do Eu na Vida Cotidiana, onde  o autor propõe uma abordagem microssociológica para interpretar a vida social a partir de uma análise das interações face a face, lançando mão de vocabulário e perspectiva provenientes do teatro e Estigma: Notas Sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada,  onde examina os conceitos de estigma e identidade social, o alinhamento grupal e a identidade pessoal, o eu e o outro, o controle da informação, os desvios e os desviantes, detendo-se em nos aspectos variáveis da situação estigmatizada: dos boêmios aos delinquentes, das prostitutas aos músicos de jazz, dos ciganos aos malandros de praia, do mendigo e outras relações ligadas à interação humana, tiveram papel relevante para antipsiquiatria e para a luta antimanicomial devido as suas colocações sobre a função social da psiquiatria na sociedade.
Erving Goffman tem sido considerado “o sociólogo norte-americano mais influente do século XX”. Listado em 2007 pelo “The Times Higher Education Guide” como o sexto autor nas ciências humanas e sociais mais citados, atrás apenas de Anthony Giddens e à frente de Jürgen Habermas (2015), e, institucionalmente representando o 73º lugar de presidente da “American Sociological Association”, fundada em 1905, com a denominação de “Sociedade Americana de Sociologia” presidida em 2014 por Annette Lareau. Sua contribuição mais conhecida no âmbito sociológico e em particular como constructo para a teoria social refere-se ao conceito de “interação simbólica”, desenvolvido com a análise dramatúrgica, em seu livro de 1959, A Representação do Eu. Outras obras importantes de Erving Goffman incluem Manicômios, Prisões e Conventos (1961), Estigma: Notas Sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada (1963), Interaction Ritual (1967), Frame Analysis (1974), e Forms of Talk (1981). Seus principais surveys incluíram a sociologia da vida cotidiana, a interação social, a construção social do eu, organização social da experiência, e elementos endógenos da vida social, denominados como instituições totais e estigmas.
Em sua perspectiva fenomenológica foi influenciado por Herbert Blumer, Émile Durkheim, Sigmund Freud, Everett Hughes, Alfred Radcliffe-Brown, Talcott Parsons, Alfred Schütz, Georg Simmel e W. Lloyd Warner. Hughes foi o “mais influente de seus professores”, de acordo com Tom Burns. Gary Alan Fine e Philip Manning afirma que Goffman nunca se empenhou em diálogos sérios com outros teóricos. Seu trabalho tem, no entanto, influenciado e foi debatido por vários sociólogos contemporâneos, talentosos com Anthony Giddens, Jürgen Habermas e Pierre Bourdieu. Embora Goffman seja frequentemente associado com a escola de interação simbólica do pensamento sociológico, ele não vê a si mesmo como um representante dela. O que condiz com a colocação de Fine e Manning que ele “não se encaixa facilmente dentro de uma escola específica de pensamento sociológico”. Suas ideias sociais são também consideradas aparentemente “difícil reduzir a uma série de temas-chave”; sua pesquisa pode ser genericamente descrita como prenhe de “uma sociologia comparativa, qualitativa com o objetivo de produzir generalizações sobre o comportamento humano”.

 
     
       Erving Goffman realizou avanços substanciais no estudo da interação face-a-face, elaborou a “abordagem dramatúrgica”, a interação humana, e desenvolveu inúmeros conceitos que tiveram uma grande influência, particularmente no campo da microssociologia da vida cotidiana. Muitas de suas obras tratam da organização do comportamento cotidiano, um conceito que ele chamou de “ordem da interação”. Ele contribuiu para o conceito sociológico de enquadramento (“frame analysis”), a teoria do jogo, discernindo o conceito de interação estratégica, e para o estudo das interações e da linguística. Com relação a este último, argumentou que a atividade de falar deve ser vista como um bem social, em vez de uma construção linguística. A partir de uma perspectiva metodológica, Goffman muitas vezes emprega abordagens qualitativas, a mais famosa em seu estudo sobre os aspectos sociais da doença mental, em particular o funcionamento das instituições totais, comparativamente como se torna um clássico na interpretação de Jack Nicholson, no filme: O Estranho no Ninho (1965). Se a psiquiatria não existisse, o cinema a teria inventado. Mas coincidem ambas em suas criações. No cinema, em sua progênie surge uma imagem da psiquiatria com “métodos de tratamento, nosologia, teorias e profissionais próprios, podendo estar bem longe da realidade da profissão. O cinema e a psiquiatria têm pontos em comum em relação a questões teóricas e práticas e a seus interesses e em suas trajetórias históricas.
O filme Um Estranho no Ninho representa um drama norte-americano de 1975  dirigido por Miloš Forman, baseado no romance de mesmo nome de 1962, escrito por Ken Kesey. É estrelado por Jack Nicholson, Louise Fletcher, Willian Redfield, Will Sampson e Brad Dourif; a obra também marcou a primeira atuação de Christopher Lloyd no cinema. Em 1963, no estado americano de Óregon, o criminoso reincidente Randle Patrick McMurphy é transferido para uma instituição psiquiátrica depois de cumprir uma sentença curta realizando tarefas compulsórias em uma prisão por “estupro estatutário” em uma garota de 15 anos. Embora não seja realmente doente mental, McMurphy espera evitar o trabalho forçado e servir o resto de sua sentença em um ambiente descontraído. Ao chegar ao hospital, ele reconhece a enfermaria administrada pela rígida e engajada Drª Mildred Ratched, que sutilmente suprime as ações em torno de manifestações orais e visuais de seus pacientes por meio de uma rotina burocrática passivo-agressiva, intimidando os internos. Os outros pacientes incluem o jovem ansioso e gago Billy Bibbit; Charlie Cheswick, que é propenso a birras infantis; o delirante Martini; o bem-educado e paranoico Dale Harding; o beligerante Max Taber; o epilético Jim Sefelt; e o chefe Bromden, um nativo norte-americano alto presumidamente surdo e mudo.
        Mildred Ratched logo percebe a presença animada e rebelde de McMurphy como uma representação curiosa de insanidade e de ameaça à sua autoridade, confiscando os cigarros dos pacientes e racionando-os. Durante seu tempo na enfermaria, McMurphy entra em uma batalha de liderança com Ratched. Ele rouba um ônibus do hospital, fugindo com vários pacientes para uma pescaria, encorajando-os a se tornarem mais autoconfiantes e menos dependentes da enfermeira. O filme segue a história social de Randall McMurphy, um meliante que após ser preso, finge de louco para ir para um hospital psiquiátrico e assim esquivar-se de uma porção de trabalhos forçados na prisão. Após seu enquadramento ele influencia os outros internos e começa a sofrer oposição sistemática da servil, cruel e sádica enfermeira Mildred Ratched. Mas com poder persuasivo ele instaura uma reviravolta na clínica, não sabendo ainda o que isto lhe pode custar. 
           As duas áreas tratam, fundamentalmente, do comportamento humano, e depois de um período de aceitação e popularidade, se tornaram importantes influências culturais que interagem num espaço da modernidade em constante modificação. No final do século XIX, Jean-Martin Charcot (1825-1893), um eminente neurologista francês, que empregava a hipnose para estudar a histeria, demonstrou que ideias mórbidas podiam produzir manifestações físicas. Seu aluno, o psicólogo francês Pierre Janet, considerou como prioritárias, para o desencadeamento do quadro histérico, muito mais as causas psicológicas do que as físicas. Posteriormente, Sigmund Freud, em colaboração com Josef Breuer, começou a pesquisar os mecanismos psíquicos da histeria e postulou em sua teoria que essa neurose era causada por lembranças reprimidas, de grande intensidade emocional. A sintomatologia, que ao mesmo tempo frustrou e estimulou os médicos do século XIX, foi o grande desafio para Freud, que, a partir desse quadro, desenvolveu técnicas específicas para conduzir o tratamento de suas pacientes: nascia a Psicanálise, como resposta a esse extraordinário desafio.
           Aos poucos a observação permitiu a compreensão de que a histeria não era um distúrbio que acometia exclusivamente as mulheres, mas no entanto, nelas predominava. Teorizou-se outra segmentação da estrutura neurótica: estava-se diante dos obsessivos que, com sintomas diferentes, também apresentavam grande sofrimento psíquico. Esta sintomatologia, embora predominantemente masculina, não pode ser tratada como exclusiva dos homens. Nas palavras de Freud:- "O nome “histeria” tem origem nos primórdios da medicina e resulta do preconceito, superado somente nos dias atuais, que vincula as neuroses às doenças do aparelho sexual feminino. Na Idade Média, as neuroses desempenharam um papel significativo na história da civilização; surgiam sob a forma de epidemias, em consequência de contágio psíquico, e estavam na origem do que era fatual na história da possessão e da feitiçaria. Alguns documentos daquela época provam que sua sintomatologia não sofreu modificação até os dias atuais. Uma abordagem adequada e compreensiva da doença tiveram início apenas com os trabalhos de Charcot e da escola do Salpêtrière, inspirada por ele. Até essa época, a histeria tinha sido a bête noire da medicina. As histéricas, que em séculos tinham sido lançadas à fogueira ou exorcizadas, em épocas mais esclarecidas, ainda estavam sujeitas à maldição do ridículo. Seu estado era indigno de observação clínica, como simulação e exagero.   
         O talento e o reconhecimento de Edgar Allan Poe com suas histórias de fantasia e horror são imensuráveis. O filme: Refúgio do Medo é baseado no conto “O Sistema do Doutor Alcatrão e do Professor Pena” de 1945. Narra a história de um doutor que vai ao Manicômio Stonehearst para ter “experiência clinica”. Lá ele conhece Eliza que é acusada de violentar o marido, mas apesar de estar no manicômio “é a paciente mais sã”. O jovem doutor logo descobre o paradoxo segundo o qual “os pacientes tomaram conta do hospital e que estão fingindo serem os médicos e enfermeiros, enquanto os verdadeiros estão presos no porão”. O jovem doutor chamado Edward passa a tentar liberar os verdadeiros médicos e fugir para a cidade. O filme é processado num continuum, os acontecimentos são muito rápidos e são justificados. Os chamados lunáticos só tomam o hospital por que as práticas técnicas e sociais utilizadas pelos médicos são muito abusivas e ao invés de tratar o paciente, eles os enchiam de remédios, jogavam jatos de água no rosto, sedavam, utilizavam choques e diversas outras práticas que estavam mais para tortura em campos de concentração do tipo nazi. Na antiguidade a trepanação era muito utilizada em hospícios ou clínicas para doentes mentais. A técnica era realizada por cirurgiões que acreditavam com a trepanação os demônios e espíritos malignos iriam sair do corpo, mesmo que causando morte muitas vezes.
         Quando realizada de forma única, a trepanação serve para se criar uma abertura por onde se pode drenar um hematoma intracraniano ou se inserir um cateter cerebral. Em uma craniotomia, várias trepanações são feitas para se criar os vértices de um polígono ósseo que será retirado do crânio. Com o auxílio da serra neurocirúrgica, uma linha ligando cada vértice é serrada e o polígono ósseo do crânio é retirado, liberando o cirurgião para abordar a massa encefálica. Ipso facto a representação ocorre no século XX, quando a medicina ainda se encontrava em determinado estágio pré-freudiano para o tratamento da histeria tendo em vista que o corpo clínico sanatorial usavam ainda tratamentos antiquados, violentos e de subjugação do paciente á tortura como a trepanação. Dentro da medicina moderna consiste na abertura de um ou mais furos no crânio, com uma broca neurocirúrgica. Para fazer a perfuração, eram usadas pedras pontudas e lâminas de obsidiana nos primeiros registros etnográficos. Quando aprenderam a manipular metais, na era do bronze, bisturis e serras primitivas foram usados até desenvolverem técnicas de cirurgia com vidro.
        No entanto foi em 400 a. C. que o grego Hipócrates, considerado o pai da medicina, escreveu um tratado sobre o cérebro e revelou mais detalhes sobre a trepanação. De acordo com o neurocirurgião Graham Martin, em uma publicação no Journal of Clinical Neuroscience, Hipócrates nunca havia feito uma trepanação, mas havia aprendido sobre a técnica em uma viagem para Marselha, onde o procedimento já era feito há 1500 anos. Ele compreendeu que a técnica era usada para aliviar a pressão no cérebro causada por sangue, demônios, ou qualquer que fosse o diagnóstico do médico. Na civilização pré-colombiana dos zapotecas, no entanto, temos uma situação bem diferente: a trepanação era usada várias vezes - foram encontrados vários crânios com múltiplas perfurações. Acredita-se que era um tratamento popular para dores de cabeça. Tudo isso é especulação - não se sabe, por exemplo, se o procedimento era feito em voluntários. Afinal, ele não deveria ser nada agradável. No século XV, a trepanação foi um pouco mais documentada, inclusive por pintores renascentistas, pois quadros mostravam que a cirurgia era usada para curar, de forma sobrenatural, problemas mentais. Um deles era chamado de pedra da loucura. A tal pedra precisava ser retirada do cérebro do doente antes que contaminasse inteiro e foi retratada por Hieronymus Bosch no quadro A extração da pedra da loucura. 
   É uma das obras pictóricas pertencentes à primeira etapa do pintor holandês Hieronymus Bosch, realizada entre 1475 e 1480, e incluída num conjunto de gravuras satíricas e burlescas que se realizavam nos Países Baixos. É um óleo sobre madeira, de 48 x 35 cm. Atualmente encontra-se no Museu do Prado, em Madrid. Os símbolos permitem que um ator compreenda uma pessoa que conhece, a qualquer tempo, mediante uma comparação entre tipos de conduta e de aparência, com base em experiências prévias de como se comportam outras pessoas. Se um indivíduo é totalmente desconhecido, os observadores podem obter, a partir de sua conduta e aparência, indicações que lhes permitam utilizar uma experiência anterior, que tenha tido com indivíduos aproximadamente parecidos, e aplicar-lhes “estereótipos não comprovados”. A informação a respeito do indivíduo serve para definir a situação, tornando os outros capazes de conhecer o que deles se pode esperar. Assim informados, saberão qual a melhor maneira de agir socialmente para dele obter uma resposta desejada e, além disso, para dirigir inteligentemente sua própria atividade. As máscaras, para ele, tecnicamente constituem uma ferramenta expressiva padrão. Elas são compostas por uma ambientação, uma aparência social e por modelos de representação. Como os modelos se constroem mediante a relação natural entre a ambientação e a aparências, os signos e o status social desempenham um papel decisivo para a interpretação que comumente a sociologia entende e analisa por ser uma máscara social.
         O símbolo não sendo já de natureza linguística deixa de se desenvolver numa só dimensão. As motivações que ordenam os símbolos não apenas já não formam longas cadeias de razões, mas nem sequer cadeias. A explicação linear do tipo de dedução lógica ou narrativa introspectiva já não basta para o estudo das motivações simbólicas. A classificação dos grandes símbolos da imaginação em categorias motivacionais distintas apresenta, com efeito, pelo próprio fato da não linearidade e do semantismo das imagens, grandes dificuldades. Metodologicamente, se se parte dos objetos bem definidos pelos quadros da lógica dos utensílios, como faziam as clássicas “chaves dos sonhos”, segundo as estruturas antropológicas do imaginário, cai-se rapidamente, pela massificação das motivações, numa inextricável confusão. Parecem-nos mais sérias as tentativas para repartir os símbolos segundo os grandes centros de interesse de um pensamento, certamente perceptivo, mas ainda completamente impregnado de atitudes assimiladoras nas quais os acontecimentos perceptivos não passam de pretextos para os devaneios imaginários. Tais são as classificações mais profundas de analistas das motivações do simbolismo religioso ou da imaginação de modo geral literária.  
         Tanto escolhem como norma classificativa uma ordem de motivação cosmológica e astral, na qual são as grandes sequências das estações, dos meteoros e dos astros que servem de indutores à fabulação, tanto são os elementos de uma física primitiva e sumária que, pelas suas qualidades sensoriais, polarizam os campos de força no continuum homogêneo do imaginário; tanto, enfim, se suspeita que são os dados sociológicos do microgrupo ou de grupos que se estendem aos confins do grupo linguístico que fornecem quadros primordiais para os símbolos. Quer a imaginação estreitamente motivada seja pela língua, seja pelas funções sociais, se modele sobre essas matrizes sociológicas e antropológicas, quer pelos seus genes raciais intervenham bastante misteriosamente para estruturar os conjuntos simbólicos, distribuindo seja as mentalidades imaginárias, sejam os rituais religiosos, querem ainda, com uma matriz evolucionista, se tente estabelecer uma hierarquia das grandes formas simbólicas e restaurar a unidade no dualismo de Henri Bergson das Deux Sources, quer enfim que atravessando a técnica da psicanálise se tente encontrar uma síntese entre as pulsões de uma libido em evolução e as pressões recalcadoras do microgrupo familiar. São estas diferentes classificações das motivações simbólicas que precisamos criticar antes de estabelecer um método de análise pretensamente firme na ordem das motivações. 
        Ao que parece o ator social, queira ou não, está orientado de acordo com um conjunto de restrições culturais. Podemos citar também um processo social identificado pelo  sociólogo norte-americano de institucionalização das máscaras, que seriam “expectativas abstratas e estereotipadas” sobre um papel específico. A máscara se converteria então, em uma “representação coletiva” uma vez que estas são construídas em “performances” individuais que não são mais do que a forma ou expressão dessas representações coletivas individualizadas e personalizadas com as características de cada indivíduo. Quando, por exemplo, um ator social adentra um grupo social específico, encontra correspondente a ele, a fixação de uma máscara particular. Goffman chega a sugerir o caráter abstrato e geral das máscaras sociais e as converte em veículos ideais no processo de socialização, pois o que as representações coletivas traduzem é o modo como o grupo se pensa em suas relações com os objetos que o afetam. Através das máscaras sociais a atuação é “modelada e adaptada a compreensão e as expectativas da sociedade na qual se apresenta”. E através deste ajustamento que não é constituído da mesma maneira que o indivíduo e as coisas que o afetam são de outra natureza. 
Bibliografia geral consultada.
BOURDIEU, Pierre, “La Mort du Sociologue Erving Goffman. Le Découvreur de l`Infiniment Petit”. In: Le Monde, 04/12/1982; BRAIER, Eduardo Alberto, Psicoterapia Breve de Orientação Psicanalítica. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1991; TAVARES, Almir, Compêndio de Neuropsiquiatria Geriátrica. 1ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 2005; NASCIMENTO, Manoel Alves do, Erving Goffman, as Interações no Cotidiano Escolar, Desvendando o Estigma dentro da Inclusão Escolar. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação e Letras. Universidade Metodista de São Paulo, 2009; MARTINS, Carlos Benedito, “A Contemporaneidade de Erving Goffman no Contexto das Ciências Sociais”. In: Rev. bras. Cien. Soc. Vol. 26 n° 77. São Paulo Oct. 2011; JUNQUEIRA, Flávia, A Teatralidade na Vida Cotidiana. Dissertação de Mestrado. Escola de Comunicações e Artes. Universidade de São Paulo, 2014; VICENTE, Monique da Silva, A Interação no Contexto da Saúde: Um Olhar para o Estigma em Consulta Ambulatorial. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2014; CYRENO, Alexsandra Barbosa de Souza, A Gestão como Representação: Uma Análise Dramatúrgica da Atuação do Docente-Gestor na Universidade Federal Rural de Pernambuco. Dissertação de Mestrado. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2016; SILVA, Lucas Eustáquio de Paiva, Um Estudo sobre um Grupo de Jovens Estigmatizados como Pertencentes à Carreira Criminosa e ao Comportamento Desviante em uma Escola Pública de contagem/MG. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2016; BACH, Augusto, Michel Foucault e a História Arqueológica. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia e Metodologia das Ciências. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016; entre outros.  
______________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ) e Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

terça-feira, 12 de julho de 2016

Touradas – Cultura, Tradição & Metáfora de Guerra

                                                                                                             Ubiracy de Souza Braga*

   “Essa relação entre guerra e a tourada acaba se tornando política”. Luís Felipe Sobral

                               
                   
O consagrado “toureiro a pé” português, Manuel dos Santos (1925-1973) recebeu o nome do avô, o bandarilheiro Manuel dos Santos “Passarito”, que o criou na Golegã. O ambiente da terra, a influência de familiares ligados à arte de tourear e a existência de várias ganadarias na região, fizeram com que se apresentasse em público com apenas 13 anos. Tratava-se apenas de uma vacada, mas chamou a atenção do bandarilheiro Patrício Cecílio. Cecílio tornar-se-ia o seu mestre e o jovem aprendiz de toureiro o primeiro discípulo da chamada “Escola de Toureio da Golegã”. Manuel dos Santos começou por tomar a alternativa de bandarilheiro, que lhe concedeu Alfredo dos Santos, na Monumental do Campo Pequeno, a 26 de julho de 1944. Para não deixar os estudos na Escola Comercial de Tomar, só em 1946 se deixaria levar pela paixão de tourear. Nesse ano partiu para Sevilha preparando-se intensamente chegar, mais tarde, à alternativa de matador. Um ano depois, mais precisamente em 26 de junho de 1947, debutava como novilheiro na Praça de Badajoz. Nessa tarde cortou três orelhas e um rabo aos dois touros que lhe foram apresentados e saiu levado em ombros, perante uma multidão rendida. Esta seria apenas a primeira exibição em que teria tal efeito no público. Na mesma temporada, apresentou-se em Portugal já como um novilheiro.       


sábado, 9 de julho de 2016

Programa de Pós-Doutorado - Green Card do “Cientista” Brasileiro?

                                                                                                             Ubiracy de Souza Braga*

                  Estamos há 13 anos no governo, mas eu tenho pós-doutorado em oposição”. Aloizio Mercadante (PT)                         

Aloizio Mercadante Oliva, nascido em Santos, em 13 de maio de 1954, é professor, acadêmico, economista e político brasileiro filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), do qual foi fundador. Descendente matrilinear de italianos, é filho do general de exército e ex-comandante da Escola Superior de Guerra (1988–1990) Oswaldo Muniz Oliva. Foi ministro da Educação, da Ciência, Tecnologia e Inovação e da Casa Civil durante o governo Dilma Rousseff, vice-presidente do PT e presidente da Fundação Perseu Abramo, braço acadêmico do partido, além de senador e deputado federal por São Paulo. Descendente matrilinear de italianos, é filho do general de exército e ex-comandante da Escola Superior de Guerra (1988–1990) Oswaldo Muniz Oliva. Em 1973, ingressou na Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e começou a participar do Movimento Estudantil que se opunha à ditadura militar. Nesse contexto, ajudou a reconstruir o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da USP. Em 1975, presidiu o Centro Acadêmico dos Estudantes de Economia e tornou-se monitor do Departamento de Economia da USP. Em 1976, graduou-se e, nos dois anos seguintes, fez o mestrado em economia na Universidade de Campinas (Unicamp). Na mesma época, participou de pesquisas realizadas pela Fundação Osvaldo Cruz (1977) e pelo Centro Ecumênico de Documento e Informação, em São Paulo (1978–1980).

Em dezembro de 2010, concluiu o doutorado em economia pela Unicamp. É professor licenciado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Mercadante foi vice-presidente nacional do Partido dos Trabalhadores e secretário de relações internacionais, além de integrante do Diretório Nacional e da Executiva Nacional. Participou da elaboração dos programas de governo do PT e foi coordenador da campanha presidencial do partido nas eleições de 1989 e 2002. Foi candidato à vice-presidência da República na chapa de Lula nas eleições de 1994. A estreia mais efetiva de Mercadante na vida política começou na época da faculdade de Economia na USP. Ele foi presidente do Centro Acadêmico Visconde de Cairu (CAVC) em 1974 e 1975 e ajudou a organizar protestos contra os assassinatos do estudante Alexandre Vannucchi Leme e do jornalista Vladimir Herzog. Em outubro de 1990, foi eleito deputado federal por São Paulo na legenda do PT com 119.765 votos. Assumiu o mandato em fevereiro do ano seguinte e centrou sua atuação no Congresso na discussão de assuntos da área econômica e no combate à corrupção. Primeiro-vice-líder do PT na Câmara dos Deputados, integrou a Comissão de Finanças e Tributação, na qual permaneceu até 1994, e a Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização.

Entre 1991 e 1998 foi também vice-presidente nacional do PT. Na campanha de 1994, Mercadante abriu mão de uma provável reeleição para a Câmara dos Deputados e concorreu a vice-presidente da República na chapa de Lula. Em 1996, coordenou o programa de governo do PT e foi candidato a vice-prefeito de São Paulo na chapa de Luiza Erundina. Foi protagonista no debate econômico nacional, participando de palestras e publicando artigos propondo um modelo alternativo de desenvolvimento. Este período resultou no lançamento do livro: O Brasil Pós-Real, organizado por Mercadante. Em 1998, Mercadante voltou à Câmara dos Deputados como o terceiro deputado mais votado do país — 241.559 votos. No segundo mandato, participou de comissões especializadas nas áreas econômica, financeira e tributária. Presidiu a Comissão de Economia, Indústria e Comércio (1999), foi líder da Bancada do PT (2000) e membro das comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional e de Finanças e Tributação (2001).  Ao concorrer a uma vaga no Senado em 2002, Mercadante obteve a maior votação da história do país até então — 10 497 348 votos, recorde posteriormente superado por Aloysio Nunes, do PSDB, que obteve 11 182 669 votos nas eleições de 2010 e por José Serra, também do PSDB, que obteve 11 105 874 votos nas eleições de 2014. Em 2003, Mercadante foi admitido pelo presidente Luiz Inácio Lula daSilva à Ordem do Mérito Militar no grau de Grande-Oficial especial. 

                      

No Senado, exerceu a liderança do governo até junho de 2006. Em 2006, foi candidato ao governo de São Paulo pelo PT, quando obteve o maior número de votos do partido no Estado - 6 771 582 votos. Derrotado por José Serra, retornou ao seu mandato no Senado. Nesse mesmo ano, lançou o livro: "Brasil–Primeiro Tempo", uma análise comparativa do Governo Lula. De 2007 a 2008, presidiu a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Durante o processo de cassação do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), defendeu a junção de todas as denúncias contra Calheiros, para que os processos fossem julgados de única vez, em sessão aberta. Em discurso, defendeu sua posição: “Meu voto não foi de omissão, como alguns disseram. Foi um voto transparente, de quem entende que o julgamento de mérito se faz com base na conclusão do processo”. Em janeiro de 2009, foi eleito líder do PT no Senado. Em 20 de agosto de 2009, anunciou que iria renunciar ao cargo, por causa da decisão de seu partido de arquivar a abertura de investigação pelo Conselho de Ética contra o presidente da Senado Federal, José Sarney. No dia seguinte, porém, em discurso no Senado, após longa conversa noturna com o presidente Lula, afirmou que — contra a vontade de sua família — aceitava o pedido do presidente para que continuasse na liderança. 

Aliás, Lula utilizou máscara de Aloizio Mercadante em São Bernardo do Campo na campanha de 2010. Foi convidado a integrar o governo da presidente Dilma Rousseff, assumindo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação em 2011. Em 18 de Janeiro de 2012, foi convidado para assumir o Ministério da Educação, devido à saída do então ministro Fernando Haddad para concorrer à Prefeitura de São Paulo. Em 2012, defendeu Octávio Frias e o jornal Folha de S. Paulo de acusações de colaboracionismo com a ditadura militar dizendo que teve “a oportunidade de testemunhar o papel desempenhado pelo jornal, sob o comando de Seu Frias, na luta pelas liberdades democráticas”. Tornou-se ministro da Casa Civil em 3 de fevereiro de 2014, sendo confirmado no cargo em 31 de dezembro de 2014 para o segundo mandato de Dilma Rousseff. Em 2 de outubro de 2015, retornou ao cargo de ministro da Educação, nele permanecendo até o afastamento da presidente Dilma em razão de processo golpista de impeachment instaurado contra ela, quando foram exonerados todos os ministros. 

Uma pesquisa de pós-doutorado ou pós-doutoramento, no caso europeu, consiste em uma atividade especializada ou estágio supervisionado de pesquisa em universidade, realizado após a conclusão do doutorado. Quem termina um doutorado e quer continuar se aprimorando como pesquisador tem a opção de fazer um pós-doutorado, que lhe dará um nível aparente de excelência em determinada área do conhecimento. Ao contrário da pós-graduação (mestrado e doutorado), o estágio de pós-doutorado não visa obtenção de um título. Em outras palavras não existe o título pós-doutor. O pesquisador de pós-doutorado não tem vínculo trabalhista com a instituição que o recepciona e pode ou não ter bolsa de estudos que o financiará. É comum haver um professor supervisor na instituição, que será responsável por “fiscalizar” a realização dos objetivos da pesquisa. O objetivo maior é o “aprofundamento da pesquisa em dada área do conhecimento”. Mas pode haver também a possibilidade do “pós-doutorando” ter atividades paralelas, tais como oferecer cursos, aulas e palestras, assim como participar em bancas como no caso de avaliações de mestrados e doutorados.
Desnecessário dizer que o pós-doutorado, também chamado de estágio pós-doutoral, é considerado um complemento na carreira acadêmica do professor, pois não se trata de curso de formação, e sim de atualização de professores e pesquisadores já formados diante do processo de globalização. É um processo de interação entre universidades, com a intenção de atualização dos conhecimentos em determinada perspectiva de pesquisa. Nesse período, os pesquisadores têm a chance de interagir com instituições envolvidas com o estado da arte de uma determinada área. Uma das características na partilha de conhecimento entre os pesquisadores no que concerne ao estágio pós-doutoral, é a qualidade tácita em que ocorre a interação social de conhecimentos. A pesquisa de pós-doutorado, mundialmente conhecido como “postdoc”, tem várias faces.

O que é exigido de você e o que você tem a ganhar dependem principalmente do país em que você está, mas algumas características valem em toda parte. Em primeiro lugar, o “postdoc” não é um curso e não dá um título, apesar do que muitos acadêmicos pensam como status de poder. Outros ainda o confundem com o título de Ph.D., que na verdade é a mesma coisa que o D.Sc. brasileiro, ou o “Doctor rerum naturalium” alemão, de forma abreviada na sigla: “Dr. rer.  Nat”., literalmente o "Doctor of the things of nature", “Doctor of Natural Sciences”, pois, todos são concebidos na nomenclatura títulos de doutor equivalentes. É realizado tipicamente por recém-doutores, i.e., com menos de 10 anos desde a defesa da tese. Quando um professor pede licença por um ano ou mais para deixar a universidade dele e desenvolver um projeto em outra instituição, ele está fazendo um sabático, e não um “postdoc”, ao contrário do que se diz erroneamente no Brasil. Não exige cursar disciplinas. Não exige defender uma tese. Seu escopo é a pesquisa, estamos falando de pesquisa empírica, metódica visando descrever algum problema avançado, e gerando publicações mais amadurecidas nas humanidades ou nas ciências aplicadas de base tecnológica de dita de ponta.  
            O “Green card”, oficialmente: “United States Permanent Resident Card” é um “visto permanente de imigração” concedido pelas autoridades daquele país. Diferentemente dos outros tipos de vistos ele não restringe ou “limita as ações de quem o tem”. Todos os outros tipos de visto são temporários e atrelados à sua especificidade, enquanto o “green card” é permanente e sem vínculos. Por exemplo, o visto de estudo não lhe permite trabalhar, o visto de trabalho só permite que se viva nos EUA enquanto se trabalhar para a empresa que patrocinou o visto. Já o “green card” dá a quem o tem praticamente todos os direitos de um cidadão americano. O portador do “green card” poderá sair e entrar nos Estados Unidos, trabalhar em qualquer região e estudar por preços mais acessíveis. A única restrição é não ficar mais de um ano ou sucessivos períodos muito longos fora dos Estados Unidos pois, como é um visto de imigração permanente, pressupõe-se que a pessoa que o possui deseja efetivamente fixar residência nos Estados Unidos. Apesar do nome, o “green card” não é um cartão verde e sim branco. Anteriormente, o documento era verde, o que lhe conferiu o título.
            O governo norte-americano, todos os anos, desde 1991, sorteia de 50 mil a 55 mil vistos entre diversos países do mundo que são tidos como de baixa representação no país, por meio do “Programa de Diversidade de Vistos”, a Loteria de “Green cards”. Para participar, é necessário ter o 2º grau completo ou ter trabalhado pelo menos dois anos, nos últimos cinco anos, em algum tipo de emprego que necessite de 2 anos ou estar terminando este ano. Um total de 100 mil pessoas são selecionadas e recebem a “carta informativa de sorteio e diversos formulários”. Destas, as 50 mil primeiras que enviarem de volta estes formulários preenchidos corretamente serão chamadas para uma entrevista no consulado norte-americano. Nesta, deve-se levar toda a documentação exigida e, em caso de aceitação, a pessoa sorteada e sua família (cônjuge e filhos solteiros menores de 21 anos) receberão o protocolo do “Green card” e terão 6 meses para providenciar a mudança de residência para os Estados Unidos da América. Existem outras formas de se conseguir o “Green card”. Todas, porém, são incertas e em caso de sucesso demoram relativamente alguns anos e por vezes são muito dispendiosas.
           Na análise comparada na Europa e nos EUA, o ”postdoc” é considerado um pesquisador associado. Ao contrário do “Green card”, o contrato social para a pesquisa de  “postdoc” pode ser tanto realizada  como bolsista de alguma fundação, quanto ter a carteira assinada pela universidade, uma agência de fomento ou um grande projeto. .Nesses países, o “postdoc” é condicionado como uma fase necessária para o amadurecimento do doutor já independente, que em geral é imaturo como recém- doutorado em qualquer lugar e espaço do mundo. Antes de dois ou mais “postdocs” em instituições diferentes, nem pensar em se candidatar a um emprego estável como professor ou pesquisador. Em outros lugares, incluindo o Brasil e a maioria dos países latino-americanos, o “postdoc” raramente é visto como um cientista independente, sendo muitas vezes tratado como aluno ou agindo como tal. O poder aquisitivo da bolsa ou salário de “postdoc” varia muito entre países e mesmo entre cidades de um mesmo país, dependendo também da agência que custeia o benefício.
            Por exemplo, as bolsas de “postdoc” da FAPESP – Fundação de Amparo á Pesquisa do Estado de São Paulo são muito mais bem pagas comparativamente do que as do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, mas o quanto a bolsa rende na prática varia muito em função de você morar na capital São Paulo ou no interior. Contudo, em um país pobre e desigual regionalmente como o Brasil, não dá para reclamar nem das bolsas menos valorizadas economicamente. Há ainda a questão da duração. No Brasil, o “postdoc” clássico dura no máximo 2 anos na maioria das agências de fomento como as FAPs, Capes, CNPq etc., mas pode-se fazer mais de um “postdoc”, desde que por agências diferentes, e geralmente em instituições diferentes. Contudo, há alguns programas antigos, como o JP da FAPESP e novos, como o PNPD da CAPES, que têm perfil de pós-doutorado e duram até 5 anos. Na Europa, um contrato de “postdoc” em geral dura dois anos para a realização da pesquisa, mas pode se estender por até 6 anos, e a regra é fazer mais de um “postdoc” em locais diferentes, tendo em vista a diversidade institucional e cultural etc.
Na verdade, a cultura científica, mesmo considerando-se apenas uma de suas comunidades especializadas, por exemplo, a Ecologia, varia até mesmo entre universidades de uma mesma cidade. Assim, um bom “networking”, feito através de estágios temporários e visitas a outras instituições, é fundamental para um cientista tornar-se reconhecido pela sua comunidade, aumentando o seu acesso em primeira mão a novidades e melhorando a chance de os seus trabalhos e ideias não passarem despercebidos em um nível internacional. Terceiro, porque, se a instituição ou o país em que o aspira se “entocar” tiverem sérios problemas de infraestrutura ou mentalidade, isso pode causar uma falsa impressão de que a ciência como um todo é determinada. Portanto, a maior barreira cultural entre comunidades científicas se dá no país, criado por diferenças entre cientistas, especialmente entre países caracterizados por regionalismos secularizados como, p. ex., no caso do Nordeste brasileiro.
O secularismo refere-se ao princípio da separação entre instituições governamentais e as pessoas mandatadas para representar o Estado a partir de instituições religiosas e dignitários religiosos. Em certo sentido, o secularismo pode afirmar o direito de ser livre do jugo e ensinamento religioso, bem como o direito à liberdade da imposição governamental de uma religião sobre o povo dentro de um Estado que é neutro em matéria de crença. Em outro sentido, refere-se à visão de que as atividades humanas e as decisões, especialmente as políticas, devem ser imparciais em relação à influência religiosa. Alguns estudiosos argumentam que a própria ideia do secularismo tende a mudar. Contudo, os propósitos e argumentos sociológicos e filosóficos em apoio ao secularismo variam amplamente. No laicismo europeu, comparativamente tem-se argumentado que o secularismo é um movimento social em direção à modernização, longe de valores religiosos tradicionais, também conhecidos como “secularização”.
        Este tipo de secularismo, a nível ideológico, constituído em sujeitos ou social e filosófico, tem frequentemente ocorrido, mantendo-se uma igreja oficial do Estado ou apoiando oficialmente uma religião. Nos Estados Unidos da América, por exemplo, alguns argumentam que o Estado secular tem servido, em uma maior medida, para proteger a religião da interferência governamental, enquanto o secularismo em nível social é menos prevalente. Diferentes países, bem como diferentes movimentos políticos, apoiam o secularismo por razões variadas. Portanto, é feita a distinção entre secularismo e secularidade. Secularismo é mais radical. – distingue-se do laicismo por ser muito tolerante em relação à visibilidade pública da religião, e permitir a exposição dos símbolos religiosos no domínio público. Implica restringir a religião ao espaço privado exclusivamente. Já a secularidade supõe a permissão das expressões religiosas controladas no espaço público como afirmação da própria liberdade em geral reconhecida como aquelas de todos os cidadãos.
Mergulhando-se especificamente em como o estágio de pós-doutorado pode seguir  influenciando e desenhando desempenhos diferenciados em função da principal variável preditora, "nota-se uma tendência do pós-doutorado apresentar resultados pífios quando existe menor o interstício entre a conclusão do doutorado e a realização do pós-doc e resultados mais expressivos à medida que o tempo após a conclusão se amplia” (cf. Calvosa; Repossi; Castro, 2011). Chama a atenção o dado de que os pós-doutorados que foram realizados pelos recém-doutores tendem a não diferenciá-lo positivamente em relação a seus pares no que diz respeito à produção científica. Com interstícios menores que cinco anos após a titulação de doutorado, a tendência é de variação negativa; essa informação que pode ser visualizada nitidamente nos dados da pesquisa mostra que para essas quatro áreas investigadas um, dois, três ou quatro anos de interstício entre doutorado e pós-doutorado ainda é pouco, sugerindo a não necessidade de realização do “pós-doc” de forma imediata. Análise que faz sentido e é plausível resgatando-se a perspectiva de que o que se espera de um recém-titulado em nível de doutorado é que o mesmo esteja atualizado e em consonância com o estado da arte.
 
Em recente diagnóstico, intitulado “Pós-Doutorado, essencial ou opcional? Uma radiografia crítica no que diz respeito às contribuições para a produção científica” (2013), com base nos resultados empíricos de pesquisa, que parecem colocar o pós-doutorado em uma região híbrida ou intermediária, uma primeira resposta precipitada seria a de que o estágio pós-doutoral em nada contribui para o incremento da produção, vez que, realizar ou não realizá-lo, não embute nenhum acréscimo ou melhora, não sendo um diferencial sobre o desempenho no que tange aos produtos científicos. Uma segunda resposta para os pesquisadores, ainda precipitada seria, então, a de que o pós-doutorado passaria a ser imprescindível e essencial a partir de um determinado estágio da carreira docente, contrariando os órgãos fomentadores de pesquisa no Brasil. Notadamente, pelo fato de mesmo após um maior tempo de conclusão do doutorado, diversos pesquisadores com e sem realização de estágio pós-doutoral encontrarem-se com desempenhos em termos de produção praticamente nos mesmos patamares, e também os altos escores das constantes (interceptos), abre espaço para a discussão de que além do pós-doutorado outros quesitos, que não foram aqui não objeto de estudo, podem sim contribuir para a qualificação e atualização do docente.
Portanto, para os pesquisadores no que tange à influência da realização do pós-doutorado sobre as publicações científicas, essa não é tão forte e incisiva, mas o resultado que mais se destaca “é que o pós-doutorado possui influência mais visível sobre a produção quando em maiores interstícios”. No cenário exposto, os dados reforçam o caráter opcional do pós-doutorado e inserem a pesquisa na proposição da qualificação docente como importante nas discussões sobre a quantidade e a qualidade dos serviços de pesquisa que são executados pela universidade. Por fim, é indispensável reconhecer que no caso do pós-doutorado a ênfase restrita a recursos financeiros, econômicos e/ou tecnológicos não é suficiente para proporcionar a dinâmica e a capacidade da ação universitária no subsistema pós-graduação. Uma das chaves para o aumento de produtividade é o investimento no fator humano, que no caso da pós-graduação se traduz em uma palavra-crucial: os docentes, no sentido de que a produção científica resulta em produtos como livros, artigos, etc., mas o tempo-espaço do trabalho não há separação do produto do ato humano de produção.
Bibliografia geral consultada.
VELLOSO, Jacques (Org.), Formação no País ou no Exterior? Doutores na Pós-Graduação de Excelência. Brasília-DF: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, 2002; CASTRO, Pedro Marcos Roma; PORTO, Geciane Silveira, “Retorno ao Exterior Vale a Pena? A Questão dos Estágios Pós-doutorais sob a Perspectiva da Produção em C&T”. Disponível em: Organizações & Sociedade. Salvador, Vol. 15, n° 47, pp. 155-173, 2008; CALVOSA, Marcello Vinicius Doria; REPOSSI, Melina Garcia; CASTRO, Pedro Marcos Roma, Avaliação de Resultados da Capacitação Docente: O Pós-doutorado na Universidade Federal Fluminense sob a ótica da Produção Científica e Bibliográfica. Avaliação. Campinas; Sorocaba, vol. 16, n° 1, pp. 99-122, 2011; MONTEIRO, Rose Cleide Mendes, Inserção Internacional da Produção de Docentes da Pós-graduação: Um Estudo na Economia, Ciência da Computação e Educação. Tese de Doutorado. Programa de Pós-graduação em Educação. Faculdade de Educação. Universidade de Brasília, 2012; CASTRO, Pedro Marcos Roma de; PORTO, Geciane Silveira; KANNEBLEY JÚNIOR, Sérgio, Pós-Doutorado, Essencial ou Opcional? Uma Radiografia Crítica no que diz respeito às Contribuições para a Produção Científica. Avaliação (Campinas). Vol. 18,  n° 3. Sorocaba, nov. 2013; SANT`ANNA, Sérgio Luiz Pinheiro, Do Mercosul à Unasul: As Estratégias do Brasil no Processo de Integração Regional Sul-americano. Tese de Doutorado. Program de Pós-Graduação em Ciência Política. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2013;  BEAL, Marcos Antônio, Fernando Henrique Cardoso e o Pensamento  Político Brasileiro. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2015; NASCIMENTO, Bruno Santos do, Seleção e Apresentação de Informações Contextuais em Ambientes Complexos. Tese de doutorado. programa de Pós-Graduação em Informática. Instituto de Matemática e Instituto Tércio Pacciti. Rio de Janeiro: Universidade Fedreal do Rio de Janeiro, 2016; entre outros.
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).