terça-feira, 15 de outubro de 2019

Maria Firmina dos Reis - Verso & Reverso do Abolicionismo Brasileiro.

                                                                                                      Ubiracy de Souza Braga
                                                                                                 
 Un negro es un negro. Sólo en condiciones determinadas se convierte en esclavo ”. Marx (1973: 745)


Maria Firmina dos Reis nasceu na Ilha de São Luís, no Maranhão, em 1822. Obteve o registro de nascimento em 21 de dezembro de 1825, como filha de João Pedro Esteves e Leonor Felipe dos Reis. Era prima do escritor maranhense Francisco Sotero dos Reis por parte da mãe. Em 1830, mudou-se com a família para a vila de São José de Guimarães, uma das maiores do Estado “e com tantos moradores que forma uma companhia de auxiliares de oitenta praças”, escreveu Joaquim de Melo e Povoas ao governador em 1766. Viveu parte de sua vida na casa de uma tia materna mais bem situada economicamente. Em 1847, concorreu à cadeira de Instrução Primária nessa localidade e, sendo aprovada, ali mesmo exerceu a honrada profissão, como professora de primeiras letras, trabalhando de 1847 a 1881. Participou ativamente da vida intelectual maranhense, na imprensa, publicando livros e antologias, e, além disso, também foi musicista e compositora. Era abolicionista; nunca se casou. Sendo admitida no magistério, aos 22 anos de idade, sua mãe queria que fosse receber a nomeação de palanquim, mas optou por ir a pé, dizendo a sua mãe: - “Negro não é animal para se andar montado nele”. Chegou a escrever um “Hino da Abolição dos Escravos”.   
Do ponto de vista da economia política clássica, observou Marx (1973), que o processo de acumulação primitiva está consumado em maior ou menor medida. O regime capitalista submeteu diretamente toda a produção nacional ou, as condições ainda não estão desenvolvidas, controla, ao menos indiretamente, as camadas sociais que, decadentes, pertencentes ao modo de produção antiquado, continuam a existirão seu lado. O economista político aplica a esse mundo já pronto do capital as concepções de direito e propriedade vigentes no mundo pré-capitalista, e o faz com um zelo tanto mais ansioso e com unção tanto maior quanto mais fatos desmascaram as suas ideologias. O mesmo não ocorre nas colônias. Nelas o regime capitalista choca-se por toda parte contra o obstáculo do produtor, que, como possuidor de suas próprias condições de trabalho, enriquece a si mesmo por seu trabalho, e não ao capitalista. A contradição desses dois sistemas econômicos diametralmente opostos se efetiva aqui, de maneira prática, na luta entre eles. Onde o capitalista é respaldado pelo poder da metrópole, ele procura eliminar à força o modo de produção e apropriação fundado no âmbito do trabalho próprio. O mesmo interesse que, na metrópole, leva o sicofanta do capital, o economista político, as tratar teoricamente com base em seu oposto, leva-o aqui a falar sinceramente (“to make a clean breat of it”) e a proclamar a antítese entre os dois modos de produção, que engendram a pobreza e, sua armadura apologética se dilacera, pedaço por pedaço, como lenha podre.
   

       
Marina Firmina dos Reis, nossa anfitriã, descreveu-se, em 1863, como tendo “uma compleição débil, e acanhada” e, por conta disso, “não poderia deixar de ser uma criatura frágil, tímida, e por consequência, melancólica”. Os que a conheceram, com a idade avançada com a longevidade de 85 anos, raros ontem e hoje, descreveram-na como sendo “pequena, parda, de rosto arredondado, olhos escuros, cabelos crespos e grisalhos presos na altura da nuca”. Uma antiga aluna caracterizou-a como “uma professora enérgica, que falava baixo, não aplicava castigos corporais, nem ralhava, preferindo aconselhar”. Era reservada, mas acessível, sendo estimada pelos alunos e pelos moradores: tendo cariz toda passeata de Guimarães parava em sua porta, “ao que davam vivas e ela agradecia com um discurso improvisado”. Maria Firmina morreu cega e pobre, aos 92 anos, na casa de uma ex-escrava, Mariazinha, mãe de um dos seus “filhos de criação”.  Segundo o historiador e presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM), Euges Lima, a ideia de reunir os bustos de nomes de expressão da literatura, história e política de São Luís e do Maranhão foi uma sugestão feita à Câmara de Vereadores pelo IHGM e que obteve parecer favorável da Segunda Comissão permanente, no dia 29 de março de 1954. É a única mulher dentre os bustos da Praça do Pantheon, onde se encontram homenagens a grandes escritores e intelectuais maranhenses. Os pedestais com os bustos formam uma verdadeira galeria a céu aberto no Centro da cidade.
Os torsos homenageiam o escritor Josué Montello; o poeta modernista, Bandeira Tribuzi; a primeira mulher negra romancista do Brasil, Maria Firmina dos Reis; o teatrólogo e jornalista, Arthur Azevedo; o literário Gomes de Sousa; o escritor do Parnasianismo no Brasil Raimundo Correia; o cronista e ensaísta Nascimento de Morais. Em 2007, os bustos foram transferidos para o Museu Histórico e Artístico (MHAM), para evitar a ação de vândalos, mas retornaram à praça em 2018, com a reforma do espaço público.  Em levantamento da produção acadêmica sobre Maria Firmina dos Reis (1822-1917) se tornou realidade no Brasil somente nos últimos trinta anos, quando, em 1987, o primeiro trabalho do gênero foi apresentado no Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Desde então, novos estudos que tratam de determinados aspectos que permeiam a vida e a obra da escritora maranhense têm sido realizados nos demais programas de pós-graduação nas áreas de Letras, História, Ciências Sociais e de Educação, além de programas interdisciplinares como os de Cultura e Sociedade e de Estudos Brasileiros, tanto aqueles em nível de mestrado/doutorado. De modo sucinto, essa breve cronografia, segundo (Zin, 2018), serve para demonstrar que Maria Firmina teve participação relevante como letrada no II Reinado (1840-1889), “ao longo dos noventa e cinco anos de uma vida dedicada a ler, escrever e ensinar”.
Durante uma limpeza de rotina, feita, recentemente, em um salão do Centro de Cultura do município de Caxias, a 360 km de São Luís, foram descobertos documentos que datam dos séculos XIX e XX. Parte dos documentos são dois livros com registros de entrada e saída de mercadorias de uma fábrica de tecidos. Em uma das mais de 100 páginas, notas fiscais com escrituras da exportação de óleo de babaçu para Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Um jornal impresso de 1979, denominado O Pioneiro, também foi encontrado entre os documentos de forma bem preservada.  Os documentos encontrados estavam guardados em uma laje do Centro de Cultura. Acredita-se que foram separados para manipulação técnica durante uma restauração que ocorreu há exatos 28 anos. No Maranhão, a criação da Escola Normal aconteceu após a Proclamação da República, quando foi organizada a “Comissão incumbida da reforma da Instrução Pública” que constatou que o “péssimo estado da instrução primária” resultava da “não obrigatoriedade do ensino e da incapacidade dos professores primários”. A comissão indicou, dentre outras medidas, a “Fundação de uma Escola Normal”.
            
Maria Firmina dos Reis 
Memorial Maria Firmina dos Reis resgata a história da escritora. O engajamento das normalistas maranhenses faz com que a escritora Maria Firmina dos Reis torne-se uma escritora de formação política, constituindo como parti pris o antiescravismo e uma interpretação singular sobre as mulheres de seu tempo. Não queremos perder de vista que a população maranhense no fim do século XVIII e início do século XX, era em sua maioria urbana negra ou mestiça. Em 1779 sua população era estimada em 78. 860 habitantes em que a parcela de negros africanos era de 40, 28% quase a metade e que o número de mestiços era de 23, 53% e os brancos de 36, 19%. Com a fundação da Companhia de Comércio do Grão Pará e Maranhão em 1755, justamente para absorver a entrada de negros africanos nessa região brasileira para trabalhar nas lavouras algodoeiras, calcula-se que entre 1757-77, 12. 857 africanos escravos entraram no Maranhão. E no período entre 1812-1820, vindos da costa africana ou de portos brasileiros, 36. 356 escravos e muitos outros vindos da Bahia que entravam “ilegalmente” ou por terra. A população da província era de 152. 843 habitantes dos quais 77. 914 eram escravos, representando 51% do total. Josué Montello, n` A Ficção Naturalista, afirma que A Normalista “sobressaía pela transplantação fiel e natural da vida da província e vigor na fixação dos temperamentos e dos caracteres”.
A indicação nesse sentido foi encaminhada através do Decreto n° 21 de 15 de abril de 1890, Art. 7° sancionada pelo governador José Tomás de Porciúncula. O projeto republicano que se configurava tinha um caráter amplo. Pensava-se em conceitos, como povo e nação, procurando-se identificar capacidades e possibilidades de sujeitos sociais, que mesmo já existentes e atuantes sob seus diversos aspectos, não eram percebidos pelos segmentos dominantes que conformam as estruturas de poder local. Essa “massa submersa” era convocada pelo discurso republicano a entrar em sintonia com mudanças, articuladas com novos símbolos do progresso e com os ditames indicadores da função de cada um na sociedade. A educação instrução das crianças e das mulheres seguindo determinadas modelações era, então, parte desse programa de desenvolvimento proposto para o Brasil. A trajetória social das normalistas, no início do século no Maranhão, inseriu-se nesses procedimentos peculiares às primeiras décadas do século XX, que tentava equilibrar os valores tradicionais em meio às mudanças sociais que se processavam nesse período em que os discursos e ações dirigidos às mulheres, principalmente no referente à sua instrução, assumiram visibilidade social. O recebimento do diploma implicava a denominação do cargo “professora normalista”, podendo significar para algumas, o destaque na primeira página de um jornal.
Maria Firmina desconstrói uma história literária etnocêntrica e masculina até mesmo em suas ramificações afrodescendentes. Neste sentido, pode-se afirmar que Úrsula não seria apenas o primeiro romance abolicionista da literatura brasileira, um fato social que nem todos os historiadores da literatura admitem. Mas é também o primeiro romance da literatura afro-brasileira, entendida esta como produção de autoria de uma escritora afrodescendente, tematiza o negro a partir de uma perspectiva interna e comprometida politicamente em recuperar e narrar a condição do ser negro no Brasil. Acrescenta-se a isto a incursão no processo civilizatório representado pela inscrição em língua portuguesa dos elementos da memória ancestral e das tradições africanas. Queremos dizer com isso que a função social do velho de rememorar, aconselhar, como um elo entre o passado e o presente, reclama o estilhaçamento da lembrança na sociedade globalizada, que se utiliza do velho apenas no que tange à sua força servil. Texto fundador, Úrsula polemiza literariamente com a tese segundo a qual nos faltava um “romance negro”, pois apesar de centrado nas vicissitudes da heroína branca, pela primeira vez em nossa literatura, tem-se uma narrativa da escravidão conduzida internamente e por uma perspectiva analítica de resgate da negritude literária.  
Segundo as professoras e pesquisadoras maranhenses, hic et nunc, cabia às instituições educacionais, e neste caso a função que detinha como representação como a Escola Normal que no Maranhão desde o início formou normalistas, em sua maioria mulheres - o reforço de atributos que qualificariam mulheres – com recursos para isso - a viver em sociedade. A erudição, o desenvolvimento dos dotes artísticos e das prendas domésticas, comuns a qualquer instituição de ensino no início do século XX voltada para o público feminino, dividia lugar com o conhecimento das patologias escolares, psicologia infantil, estrutura e dinâmica escolar, metodologias de ensino e antropologia. Em se tratando de mulheres esse conhecimento além do preparo para a docência, garantiria um melhor desempenho da função materna, em que ao acompanhar a trajetória de normalistas no Maranhão temos a compreensão de um comportamento caleidoscópico. Vivenciavam e reproduziam códigos comportamentais explícitos, que se imiscuíam nas relações cotidianas, através de um aparato de poder marcante; absorviam sociabilidades institucionais que se incorporavam ao seu modo de vestir e falar. O diretor era parte importante, na complexa engrenagem que regulava a vida escolar que não raro, extrapolava os muros da instituição escolar para a própria casa. A instrução parecia conceder às mulheres uma circulação mais segura. Na escola, com toda a carga regulatória, construíam nas relações cotidianas, códigos demonstradores da vontade de saber e perceber em que as alunas da Escola Normal tomavam iniciativas engajadas.
Frequentar a Escola Normal demandava condições mínimas de manutenção, o que transformava o acesso à mesma em um privilégio. Havia a necessidade de manter-se, o que não era facultado às pessoas muito pobres-mesmo com o recurso das pensões. Entrar para a Escola já era um distintivo, a começar pelo meio familiar que geralmente era o principal incentivador desse intento, principalmente quando se tratava de mulheres. Logo o ato de tornar-se professora normalista não era algo corriqueiro. Além disso, sobre as condições de deslocamentos que estavam sujeitas pessoas que vinham de outras cidades do Estado, para estudarem em São Luís, os relatos são de dificuldades, como observou Esmeralda - “daqui (Humberto de Campos), pra lá (São Luís) à vela (barco) eram três dias. Na época do verão, era melhor, a gente saía cedo e à tarde já estava em Ribamar, mas de lá para cá era muito demorado, três, quatro, cinco dias”. As mulheres enfrentavam dificuldades no prosseguimento dos estudos e criavam entre as adversidades, possibilidades na busca por instrução. Transformavam um “lugar praticado” com condutas e resultados diversos, e não apenas definido pelos desígnios discursivos. Ao adquirirem o título de normalista, estavam sujeitas a referenciais regulatórios. Mas encaminhavam-se para uma condição através da instrução e do trabalho a ter a capacidade de sobreviver. Isto é importante, na medida em que pela via do trabalho, passa a ser distinta, recebendo uma consagração que as fazia detentoras da competência social de ensinar. Homenagem a Maria Firmina dos Reis em frente ao prédio da Prefeitura Municipal no sesquicentenário de nascimento da primeira romancista do abolicionismo brasileiro, em 11 de outubro de 1975.

        Inicialmente apenas uma atitude, um estado de espírito, o romantismo toma mais tarde a forma de um movimento social, e o espírito romântico passa a designar a complexidade da visão de mundo do indivíduo. Os autores românticos voltaram-se cada vez mais para si mesmos, retratando o drama humano, amores trágicos, ideais utópicos e desejos inusitados de escapismo. Se o século XVIII foi marcado pela objetividade, pelo Iluminismo e pela razão, o início do século XIX seria marcado pelo lirismo, pela subjetividade cultural, pela emoção e pela centralidade do eu. O termo romântico refere-se ao movimento estético, ou seja, à tendência idealista ou poética de alguém que carece de sentido objetivo. Fora de dúvida, o romantismo representa a arte do sonho e fantasia. Valoriza as forças criativas do indivíduo e da imaginação individual (o sonho) e coletiva (os mitos, os símbolos, os ritos de passagem). Opõe-se à arte equilibrada dos pensadores clássicos e contemporâneos e baseia-se na inspiração fugaz dos momentos fortes da vida subjetiva. Isto é, na fé, no sonho, na paixão, na intuição, na saudade, no sentimento da natureza e na força das lendas nacionais. Após 1850, a literatura romântica começa a apresentar escravos e escravas com maior densidade dramática. Tratava-se, na realidade, de uma literatura caracterizada por se apresentar, ao mesmo tempo, como antiescravidão e antiescravo, no qual as mazelas da escravidão recaíam especialmente nos afrodescendentes, que acabavam recebendo finais trágicos e eram expurgados da cena literária que surgia metaforicamente para purificação da sociedade.  
A pacificação da Balaiada da década de 1840 e os influxos da exportação do algodão maranhense durante a Guerra Civil norte-americana, nos anos 1860, promoveram um ambiente ideológico favorável à difusão da imprensa e dos grupos literários românticos, com autores que se projetaram nacionalmente, como Gonçalves Dias, João Lisboa, Cândido Mendes, Odorico Mendes, Sousândrade, Humberto de Campos e Sotero dos Reis. A efervescência cultural de São Luís produziu  valores compromissados com a manutenção do que a boa sociedade maranhense acreditava pertencer. Como mulher negra de poucas posses, educada em casa e com acesso limitado aos livros, tudo o que Maria Firmina dos Reis chegou a alcançar foi seu posto de primeira professora de primeiras letras de Viamão, escritora pioneira de romance abolicionista publicado em uma das principais tipografias da capital (Úrsula, 1859), autora de romance indianista (Gupeva, 1861) e conto (A Escrava, 1887), publicados nos jornais de São Luís, colaboradora de jornais literários, poetisa incluída em antologia dos poetas de seu tempo (“Parnaso Maranhense”, 1861, e “Cantos a Beira Mar”, 1871) representa primícias da vontade, sabedoria e decisão pessoal.
O engajamento das normalistas maranhenses faz com que a escrita de Maria Firmina dos Reis torne-se uma reveladora escritora política, constituindo como parti pris o antieescravismo e uma interpretação singular sobre as mulheres de seu tempo, “para constituir uma literatura que de determinada maneira, também se colocava naquilo que Machado de Assis intitulou “instinto de nacionalidade”, pois Machado entende que a primeira geração romântica como aquela que teve como propósito moldar e construir a própria ideia de nação (cf. Silva, 2013). Contudo, a escritora ficou esquecida entre os estudiosos da literatura que, atravessando a passagem da mão de obra escrava para  assalariada tomava formava uma importante geração brasileira. Sílvio Romero, José Veríssimo, Ronald de Carvalho, Nelson Werneck Sodré, Afrânio Coutinho, Antonio Candido e Alfredo Bosi, por exemplo, os quais a ignoram completamente. Os discursos antiescravistas, no Maranhão, surgem por volta de 1860, conjuntura política em que ressonância da literatura romântica se fazia presente no engajamento da escritora. Representou um movimento social artístico, político e filosófico surgido nas últimas décadas do século XVIII na Europa durante  parte do século XIX. Caracterizou uma visão de mundo contrária ao racionalismo e ao iluminismo e buscou um nacionalismo que viria a consolidar os Estados na Europa.
É desse Kulturpessimismus, segundo Löwy (2013), esse olhar desencantado sobre a modernidade, é na verdade uma das expressões da visão de mundo tardia do fim do século. Por romantismo, devemos compreender não uma corrente literária dos anos 1800, mas uma das principais estruturas de sensibilidade  da cultura moderna: o protesto contra a civilização capitalista/industrial moderna em nome de valores do passado. A clássica oposição entre Kultur, um conjunto de valores culturais, religiosos, estéticos ou políticos, e Zivilisation, o universo da técnica, dos negócios e da burocracia, ou então da tradição de Ferdinand Tönnies entre Gemeinschaft, a comunidade orgânica do passado, e Gesellschaft, a sociedade moderna fundada sobre o contrato e o mercado, está entre os principais temas do pessimismo cultural de inspiração romântica. Essa atitude era particularmente comum no mandarinato universitário alemão e profundamente hostil ao advento rápido e brutal da civilização industrial capitalista na Alemanha no fim do século XIX. O romantismo resignado desenvolveu-se na Alemanha, sobretudo a partir do fim século XIX, quando o processo de industrialização capitalista parecia irreversível e a modernidade capitalista, no plano global aceita como fatalidade, um destino inexorável. O pessimismo deles pode levar a uma espécie de visão trágica do mundo, baseada na convicção desesperada de que não existe nenhum meio de conter ou impedir o triunfo da civilização capitalista moderna, considerada uma fatalidade.
           Os pessimistas culturais e os críticos românticos da modernidade dividem-se em geral em dois polos: os passadistas, ou tradicionalistas, que sonham com um retorno ao passado pré-capitalista; e os utopistas, que investem a nostalgia do passado num projeto de futuro. O Maranhão do século XIX, contexto em que Maria Firmina dos Reis viveu e produziu sua obra foi demarcado pela hierarquia social, na qual uma elite política branca e escravocrata constituía-se como mandatária do poder local. Em função do tráfico de escravos interprovincial, eram extremamente necessários e a escravidão no Maranhão, ao longo deste século, representou mais do que uma “questão social”, ou de distinção, pois do ponto de vista escravista tornou-se a base de sustentação desta sociedade determinada historicamente pelo trabalho escravo. Não por acaso, Maria Firmina e outros poetas, escritores e abolicionistas versaram conta a escravidão ou sobre as fugas e liberdade, ou a alforria. Ela descreve a condição feminina da escravidão em seus dois ensaios mais importantes sobre a temática: Úrsula, de 1859, considerado o primeiro romance escrito por uma mulher no Brasil. O romance foi publicado com o pseudônimo “uma maranhense”. É o primeiro romance brasileiro escrito por uma mulher e o primeiro abolicionista em língua portuguesa. Sua obra e parte da biografia foram perdidos quando seu filho, Leude Guimarães, sofreu um assalto à mão armada no bairro onde residiam. 
O romance foi ter segunda edição, essa fac-similar, apenas 1975, motivada pela organização de Horácio de Almeida. Úrsula é um precursor da temática abolicionista na literatura brasileira, pois é anterior à poesia de Castro Alves e ao As vítimas-algozes, de Joaquim Manoel de Macedo; A Escrava, de 1887 e de seus diversos escritos na imprensa do período, pretende-se perceber como a escritora utilizou sua verve literária na construção de um ideário antiescravista no Maranhão do século XIX, se configurava nesse momento como umas das províncias com maior número de contingente escravo regional do período.  Úrsula e sua criadora só reapareceram em 1962, quando o pesquisador Horácio de Almeida encontraria um exemplar da primeira (e até então, única) edição do romance junto a um lote de livros usados que adquiriu em um sebo. Treze anos depois, é também ele o responsável pelo prefácio e lançamento do fac-símile do livro. Em 2017, por conta do centenário de sua morte, a vida e obra de Maria Firmina dos Reis ganharia destaque com novas edições, inúmeras pesquisas, artigos e homenagens. Composto por pouco mais de 150 páginas, relatadas por um narrador onisciente, que emite juízo e se demonstra empenhado em expor os valores e a realidade das vidas que narra, vemos retratados, além de uma história de amor e suas reviravoltas, as mais diversas formas de sofrimento no trabalho e a condição social de escritora.
                
 Um intelectual afrodescendente como Oswaldo de Camargo (1987), em sua coletânea O Negro Escrito, de suma importância para o resgate de escritores afro-brasileiros, não faz referência alguma a Maria Firmina dos Reis. Em 1978, Camargo integra a histórica edição do primeiro número de Cadernos Negros. Juntamente com Paulo Colina e Abelardo Rodrigues, une-se aos jovens estudantes e intelectuais afro-brasileiros que buscavam se organizar na resistência pacífica ao regime militar e de mobilização pela redemocratização, como mediador entre a nova geração de escritores e os remanescentes do Movimento Negro, propiciando desta forma o resgate de iniciativas históricas e da memória literária. Dentre outros expoentes da historiografia literária nacional, muitos fizeram o mesmo, à exceção de Sacramento Blake (1970), que foi contemporâneo da autora; Raimundo de Menezes (1978), que soube da existência de Úrsula após seu ressurgimento. Acabou incluindo um verbete sobre a escritora na segunda edição de seu Dicionário Literário Brasileiro; e o notável articulista Wilson Martins (2010), que na História da Inteligência Brasileira, apenas cita seu nome, é o título do seu monumental ensaio em sete volumes, que inicia seu discurso literário declarando limpidamente que “a história da inteligência brasileira começa em 1550, quando o padre Leonardo Nunes inicia os estudos rudimentares de latim no Colégio dos Meninos de Jesus, em São Vicente”.
            Os demais documentos de e sobre Maria Firmina dos Reis foram recuperados a partir de 1973, pelo professor, poeta e jornalista maranhense José Nascimento Morais Filho, que realizou pesquisa nos jornais do século XIX e início do XX da Biblioteca Pública Benedito Leite, em São Luís e quando entrevistou, entre personalidades, mas principalmente os dois filhos adotivos da escritora feminista, Leude Guimarães e Nhazinha Goulart. Leude Guimarães, um dos filhos queridos de criação da escritora, revelou a José Nascimento Morais Filho que a mãe deixara muitos manuscritos ao falecer. Esse material consistia de “cadernos com romances e poesias, e um álbum onde havia muita coisa de sua vida e da nossa família”. Leude levou esse legado materno ao hotel onde estava hospedado em São Luís, guardando-o em um baú. Quase todo o material se perdeu quando ladrões invadiram o quarto e arrombaram o baú, à procura de bens valiosos. O “Álbum” de Maria Firmina é justamente tudo o que sobrou desse conteúdo para sempre perdido da autora maranhense. As duas entradas que limitam o texto do “Álbum”, a primeira e a última, tratam de um tema onipresente no diário: a morte de pessoas queridas. Em 20 de maio de 1853 Maria Firmina escreve o texto “Uma lágrima sobre um túmulo” (sobre o falecimento da própria mãe, em 9 de janeiro daquele ano); e em algum dia de 1910 registra o falecimento de Djalma, um filho de criação. Em termos etários, esse período vai dos 30 aos 88 anos de idade de Maria Firmina dos Reis. 
Bibliografia geral consultada:
MARX, Carlo, El Capital. Crítica de la Economía Política. Libro Primero. Buenos Aires: Editorial Cartago, 1973; pp. 744 e ss.; RESENDE, Rafael Serra, “Da Ágora ao Pantheon: Intelectuais de Atenas e a Literatura Romântica no Maranhão”. In: Outros Tempos, vol. 4, n°4, 2007; BAILEY, Cristina Ferreira-Pinto, “The Slave Woman. A Short by Maria Firmina dos Reis”. In: Afro-Hispanic Review. Volume 22, n° 1. EUA: Vanderbilt University, 2012; SILVA, Régia Agostinho da, A Escravidão no Maranhão: Maria Firmina dos Reis e as Representações sobre Escravidão e Mulheres no Maranhão na Segunda Metade do Século XIX. Tese de Doutorado em História. Programa de Pós-Graduação em História Econômica. Departamento de História. Universidade de São Paulo, 2013; ABREU, José António Carvalho Dias de, Os Abolicionismos na Prosa Brasileira: de Maria Firmina dos Reis a Machado de Assis. Tese de Doutorado em Letras. Faculdade de Letras. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2013; LÖWY, Michael, Le Cage d`Acier: Max Weber et le Marxisme Wébérien. Paris: Éditions Stock, 2013; SANTOS, Katiana Souza, Relações de Gênero na Segunda Metade do Século XIX na Perspectiva de Maria Firmina dos Reis: Analise do Romance Úrsula. Dissertação de Mestrado. São Luís: Universidade Federal do Maranhão, 2015; COSTA, Dayana dos Santos Delmiro, A Magistratura no Maranhão e as Relações de Gênero: Origens Sociais, Carreiras e Representações das Juízas. Tese de Doutorado em Ciências Sociais. São Luís: Universidade Federal do Maranhão, 2015; ANDRETA, Bárbara Loureiro, Visões da Escravatura na América Latina: “Sab” e “Úrsula”. Dissertação de Mestrado em Letras. Centro de Artes e Letras. Sana Maria: Universidade Federal de Santa Maria,  2016; ZIN, Rafael Balseiro, “Consolidando a Fortuna Crítica de Maria Firmina dos Reis; Uma Avaliação Preliminar das Dissertações e Teses Acadêmicas sobre a Autora Desenvolvidas em Programas de Pós-Graduação Brasileiros nos últimos Trinta Anos (1987-2016)”. In: Itinerários. Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários. Araraquara: Universidade Estadual Paulista, n° 46, jan./jun., 2018; pp. 63-81; QUADROS, Dênis Moura de, “Maria Firmina dos Reis e Carolina Maria de Jesus: Duas Resistentes Marias na Literatura Afro-Feminina”. In: Grau Zero. Revista de Crítica Cultural, vol. 6, n° 1, 2018; LUZ, Giselle, “Escrevivencia de Maria Firmina dos Reis no Conto A Escrava. In: Revista Travessias. Cascavel, vol. 12, n° 1, pp. 193-204, jan./abr. 2018; MACHADO, Maria Helena Pereira Toledo, “Maria Firmina dos Reis: Escrita Intima na Construção do si Mesmo”. In: Estud. av. vol.33, n° 96. São Paulo, maio/agosto de 2019; entre outros.

domingo, 6 de outubro de 2019

Ideologias & Pedagogias - História & Disciplinaridade Brasileira.

                                                                        Ubiracy de Souza Braga
         Escolas cívico-militares têm clara inspiração fascista”. Luís Fernando Veríssimo

                
Um projeto foi lançado no congresso nacional “Ações de Responsabilidade Social em Educação: Melhores Práticas na América Latina”, realizado no Museu do Ipiranga, São Paulo. Em setembro de 2006 o movimento lançou oficialmente o projeto “Compromisso Todos Pela Educação”, elaborado para desenvolver as ações sociais do organismo. No evento, foram anunciadas as cinco metas que compõem o projeto: 1) Toda criança e jovem de 4 aos 17 anos estará na escola; 2) Até 2010, 80% e, até 2022, 100% das crianças de 8 anos de idade estarão plenamente alfabetizadas; 3) Todo aluno aprenderá o que é apropriado para a sua série; 4) Todo aluno concluirá o Ensino Fundamental até os 16 anos de idade e o Ensino Médio até os 19 anos; 5) O investimento em educação deve ser garantido e gerido de forma eficiente e ética. A partir desse projeto, o movimento consegue divulgar e monitorar a situação da educação no país. Todos pela Educação (TPE) é uma organização social sem fins lucrativos e compostos por diversos setores da sociedade brasileira com o objetivo de assegurar o direito à Educação Básica. Não é de hoje que circula no país a ideologia difundida erroneamente de que a educação militar é “superior” ao modelo de formação civil. Inúmeros estudos demonstraram que a educação durante os regimes militares não teve resultados positivos.
Antes do golpe civil-militar de 1° de abril de 1964, a educação no Brasil vinha sendo elaborada, sobretudo depois do Estado Novo nos anos 1930-45, e com a democratização política por diversos setores sociais. Os desafios mais flagrantes consistiam na alfabetização de crianças, jovens e adultos e no acesso a um ensino público de qualidade, tanto no nível básico, fundamental, quanto no ensino superior. Uma série de reivindicações, causas, pautas, projetos e lutas de educadores, da sociedade civil e de estudantes intensificam-se nos anos 1940 e 1950, mas acabam sendo interrompidas a partir de 1964. Os educadores mais atuantes pela causa de uma educação pública de qualidade, como Anísio Teixeira, principal idealizador das grandes transformações da educação brasileira no século XX, Paulo Freire, criador do método de análise desenvolvimentista, Darcy Ribeiro, ativo nas políticas institucionais, chegando a ser ministro da Educação, foi o idealizador dos Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), apelidados de Brizolões, um projeto educacional de autoria do laureado antropólogo Darcy Ribeiro (1994), que os considerava “uma revolução na educação pública do País, e o bravo Florestan Fernandes, são exilados e têm suas políticas públicas educacionais, métodos e causas impedidas de realização plena pela ditadura militar.
Educação na ditadura militar brasileira refere-se a políticas, processos e práticas educacionais adotadas no Brasil durante o regime militar que durou de 1964 a 1985. A política educacional do governo João Goulart foi capitaneada pelo antropólogo Darcy Ribeiro, que deixou a reitoria da Universidade de Brasília (UnB), em que tinha sido nomeado em 1961 e idealizou em 1959 naquele contexto da construção de Brasília, para ir à frente do Ministério da Educação e Cultura de setembro de 1962 a janeiro de 1963, quando o gabinete era chefiado pelo primeiro-ministro Hermes Lima, no modelo parlamentarista, e por Júlio Sambaqui, que ocupou a pasta no período presidencialista, de outubro de 1963 até o golpe militar de 1° de abril de 1964. Houve uma ingerência conservadora dos militares no ensino brasileiro durante o período que se estende em torno de 20 anos. Para a historiografia, considerando a censura, os exílios, assassinatos de lideranças civis, perseguições, há relatos etnográficos pós-censura e fatos sociais e políticos do período de 21 anos ter sido de tempos sombrios para a educação e a sociedade brasileira. O ensino tinha um público alvo bem particular, adotando uma tendência mundial de padronização taylorista-fordista técnico-científica.   
Tampouco há evidências de que as atuais escolas cívico-militares tenham resultados expressivamente superiores no Ideb – Índice de desenvolvimento na educação básica, criado em 2007 reúne, em um só indicador, os resultados de dois conceitos igualmente importantes para a qualidade da educação: o fluxo escolar e as médias de desempenho nas avaliações. Ele é calculado a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e das médias de desempenho nas avaliações do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC). Seu objetivo é promover estudos, pesquisas e avaliações periódicas sobre o sistema educacional brasileiro, o Sistema de Avaliação da Educação Básica para as unidades da federação e para a Prova Brasil, particularmente  para os municípios. Atuando em conjunto o Ideb concentra os resultados das avaliações em larga escala do Inep a possibilidade de resultados sintéticos, facilmente assimiláveis, e que permitem traçar metas de qualidade educacional para os sistemas educacionais e de ensino.  



O índice estatístico varia de zero a 10 e a combinação entre fluxo e aprendizagem tem o mérito de equilibrar as duas dimensões: se um sistema de ensino retiver seus alunos para obter resultados de melhor qualidade no Saeb - Sistema de Avaliação da Educação Básica ou Prova Brasil, o fator fluxo será alterado, indicando a necessidade de melhoria do sistema. Se, ao contrário, o sistema apressar a aprovação do aluno sem qualidade, o resultado das avaliações indicará igualmente a necessidade de melhoria do sistema. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) também é importante por ser condutor de política pública em prol da qualidade da educação. É a ferramenta para acompanhamento das metas de qualidade do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) para a educação básica, que tem estabelecido, como meta, que em 2022 o Ideb do Brasil seja 6,0 - média que corresponde a um sistema educacional de qualidade comparável a dos países ditos desenvolvidos. O que está em curso, é um sistema educacional perverso politicamente porque reprova sistematicamente seus estudantes. Seus efeitos sociais vem fazendo com que grande parte deles abandone a rede escolar antes mesmo de completar a educação básica. O que não é desejável, mesmo para os que concluem essa etapa de ensino e atinjam elevadas pontuações nos exames padronizados.
Isto é, um sistema de representação social em que todos os alunos concluem o Ensino Médio no período correto não é de interesse caso os alunos aprendam muito pouco na escola. Em suma, um sistema de ensino ideal seria aquele em que todas as crianças e adolescentes tivessem acesso à escola, não desperdiçassem tempo com repetências, não abandonassem a escola precocemente e, ao final de tudo, aprendessem. A combinação entre fluxo e aprendizagem vai expressar em valores o andamento dos sistemas de ensino, em âmbito nacional, nas unidades da Federação e municípios. Temos o indicador objetivo para a verificação do cumprimento das metas fixadas no Termo de Adesão ao Compromisso “Todos pela Educação”, base do Plano de Desenvolvimento da Educação, do Ministério da Educação, que trata da educação básica. Nesse âmbito é que se enquadra a idéia das metas intermediárias para o Ideb. A lógica é a de que para que o Brasil chegue à média 6,0 (seis) em 2021, em cada sistema deve evoluir segundo pontos de partida distintos, inversamente daqueles que partem em pior situação, com um objetivo implícito de redução da desigualdade educacional. 
A questão é: Por que afirmar com tanta veemência ideológica, contrariando as evidências empíricas, que ordem e disciplina são a solução para a educação? A resposta é simples: ideologia, que interpela os indivíduos constituindo-os em sujeito. A defesa de uma escola baseada em valores militares é tão ideológica, e, portanto, a-histórica, baseada em um conjunto de ideias e crenças meramente disciplinares quanto a religiosa. Escolhe-se uma instituição de ensino cristã ou judaica, por exemplo, não somente mirando em resultados acadêmicos, mas, sobretudo pela oferta de valores religiosos e culturais. Escola religiosa, entretanto, é opcional e não deve ser imposta a ninguém, muito menos por um agregado incoerente de militares. O mesmo deveria se aplicar à fé na ordem e progresso, ou à adoração de objetos sacrossantos, como a bandeira nacional. A crença de alguns líderes não deveria se traduzir em plano global de nação. Num país tão diverso, Deus e Pátria seguramente não “estarão acima de tudo ou de todos”.
As escolas cívicos-militares têm a administração compartilhada entre militares e  civis. Segundo o Ministério da Educação (MEC), há 203 unidades no país com esse modelo em 23 Estados e no Distrito Federal (DF), que atendem 192 mil alunos. Mas há diferenças. Atualmente, as escolas cívico-militares existem graças a uma parceria entre Secretaria Estadual de Segurança Pública e Secretaria Estadual de Educação. Com o novo modelo, o governo federal entra com dinheiro: R$ 1 milhão por escola. A maioria está em Goiás, mas há unidades no Amazonas, Minas Gerais, Roraima e Distrito Federal. Em São Paulo, existem algumas escolas, mas o modelo é distinto, porque ainda não há unidades estaduais com a parceria com os militares, apenas particulares. As escolas deverão fazer consultas públicas para ver se há interesse na adesão. Os Estados da federação deverão, então, informar o governo federal quais são essas unidades. Segundo o MEC, duas escolas poderão já começar 2020 com o modelo de gestão compartilhada. Numa leitura atenta, do ponto de vista da análise crítica, observa Campos (2019), que enquanto o governo advoga pelo militarismo, a elite brasileira procura cada vez mais por pedagogias “modernas” e “alternativas” para seus filhos.


Nas grandes capitais modernas do país, por exemplo, aumentam as filas de alunos aguardando a chance de estudar em instituições de excelência, que trabalham para desenvolver a criatividade, autonomia e pensamento crítico, habilidades apontadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, uma organização internacional de 36 países que aceitam os princípios da democracia representativa e da economia de mercado, que procura fornecer uma plataforma para comparar políticas econômicas, solucionar problemas comuns e coordenar políticas domésticas e internacionais, como essenciais para o século XXI. Em geral, famílias brasileiras com maior poder aquisitivo passam longe da educação militar. Se não para os mais ricos, é importante questionar para quem toda a ordem e disciplina do novo decreto será direcionada? A se considerar suas perspectivas de expansão previstas em 200 escolas públicas nos próximos três anos, combinadas às ideias desacertadas de alguns governadores e prefeitos, o decreto pode acabar, como um hábito tão certo como o calor do fogo, mirando no aluno das periferias nas cidades brasileiras. São os filhos da classe trabalhadora, justamente aqueles que vivem em ambientes onde imperam a imposição da disciplina, a hierarquia e o autoritarismo de milicianos, traficantes e policiais, alguns corruptos - que serão vigiados e punidos pela nova escola cívico-militar.
O atual presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto que regulamenta a adesão ao Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares. Mas antes exonerou a presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep), Maria Inês Fini, e outras três diretoras do órgão. Maria Inês estava no Inep desde 2016, levada pelo então ministro da Educação, Mendonça Filho, no início do governo Michel Temer. Ligada ao PSDB, Maria Inês é doutora em educação e pedagogia, ela ocupou o mesmo cargo durante o governo Fernando Henrique Cardoso. O novo presidente do Inep é o engenheiro Marcus Vinicius Rodrigues, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. A diretoria de avaliação da educação básica, que cuida do Enem, ficará a cargo de Murilo Resende, doutor em economia também pela FGV. Professor universitário em Goiás desde 2015, Resende já foi aluno do curso online do escritor Olavo de Carvalho, apontado como “guru da direita” e responsável naquela conjuntura pela indicação de Ricardo Vélez Rodríguez ao cargo de ministro da Educação.
O modelo de escola cívico-militar é uma proposta do governo federal para uma gestão escolar compartilhada entre educadores e militares. Com o programa, a União vai colocar à disposição de governos estaduais e municipais a estrutura e os profissionais das Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Força Aérea, são instituições nacionais, permanentes e regulares que têm como missão políticas constitucional zelar pela defesa da Pátria, pela garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa destes, da lei e da ordem que atuarão em funções administrativas e de gestão regulamentada nas escolas. De acordo com o Ministério da Educação, aparentemente professores civis continuarão responsáveis pela sala de aula, nas 203 escolas desse tipo, em 23 unidades da federação. O Ministério da Educação e Cultura (MEC) afirmou que a meta agora é construir 216 escolas neste modelo em todos os 26 estados e no Distrito Federal até 2023. Os militares da reserva das Forças Armadas irão trabalhar nas escolas que aderirem ao programa. Devem contratados por meio de processo seletivo com tempo mínimo de serviço de dois anos prorrogável por até 10 anos. Governo nega, mas “escolas de lata” resistem na periferia de São Paulo.           

A estratégia governamental é que o contrato social com os militares pode ser cancelado a qualquer momento. Os profissionais vão ganhar 30% da remuneração que recebiam antes de se aposentar. Estados podem destinar policiais e bombeiros para ajudar na administração. O Ministério da Educação (MEC) repassará verba aos governos, que devem investir na infraestrutura das unidades escolares, em material escolar e reformas. Serão gastos R$ 54 milhões por ano – R$ 1 milhão por escola. Segundo o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, general do exército brasileiro, na primeira fase do programa serão usados 540 militares da reserva para atuar em 30 escolas. Ele afirmou que 203 instituições, em 23 unidades da federação, já adotaram a gestão compartilhada. Em 1990, foi designado Ajudante de Ordens do Presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992), com quem permaneceu até seu impeachment em 1992. Nos anos de 1993-94, realizou o curso de Comando e Estado-Maior na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, sendo promovido a Tenente-Coronel em 31/08/94.
 Ascendeu ao posto de Coronel em 30 de abril de 1999 e foi comandante do 2º Batalhão de Infantaria Leve, em São Vicente. Em 2002, realizou o Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Serviu no Gabinete do Comandante do Exército, onde chefiou a Assessoria Parlamentar, foi instrutor da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e participou da missão de paz no Haiti. Promovido a General de Brigada em 31 de março de 2007, foi nomeado Comandante da Brigada de Infantaria Paraquedista, onde ficou até 2009. Em seguida, comandou o Centro de Capacitação Física do Exército e Fortaleza de São João, entre 2009 e 2011. Em 31 de março de 2011, ascendeu ao posto de General de Divisão e foi designado chefe do Departamento do desporto Militar e presidente da Comissão Desportiva Militar do Brasil do Ministério da Defesa. Foi presidente da Autoridade Pública Olímpica de 2013 a 2015.  Atingiu o posto máximo da carreira, em 31 de julho de 2014, quando foi promovido a General de Exército. Assumiu o Comando Militar do Leste, no Rio de Janeiro, onde foi o responsável pela segurança das Olimpíadas de 2016.  Sua última missão no serviço ativo foi a de Chefe do Estado-Maior do Exército, que exerceu de setembro de 2016 a agosto de 2018. Posteriormente, atuou como assessor do presidente do Supremo Tribunal Federal, José Antônio Dias Toffoli, jurista e magistrado brasileiro, atual ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), tendo sido advogado-geral da União durante o Governo Lula e ministro e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
 Ingressou na advocacia em 1991, tendo sido consultor jurídico na Central Única dos Trabalhadores (CUT), de 1993 a 1994, assessor parlamentar na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 1994 e assessor jurídico da liderança do Partido dos Trabalhadores (PT) na Câmara dos Deputados de 1995 a 2000. Atuou como advogado de três campanhas presidenciais de Luiz Inácio da Silva (PT), nas eleições de 1998, 2002 e 2006. De origem pobre, migrou ainda criança de Pernambuco para São Paulo com sua família. Foi metalúrgico e sindicalista, época em que recebeu a alcunha “Lula”, forma hipocorística de “Luís”. Durante a ditadura militar, liderou greves de operários no ABC Paulista; foi durante o processo de abertura política que o Partido dos Trabalhadores foi fundado em 1980. No período da redemocratização foi uma das principais lideranças da campanha Diretas Já, dando iniciou a sua carreira política: em 1986 elegeu-se deputado federal por São Paulo com votação recorde.
A sigla vem das três cidades que, originalmente, formavam a região, sendo: Santo André (A), São Bernardo do Campo (B) e São Caetano do Sul (C). Às vezes, Diadema (D) é incluída na sigla. A sigla foi dada em ordem alfabética no ato de suas fundações, devido à influência da religião católica na região, fato este que deu a origem da sigla “ABC” Paulista, a região dos 3 santos de São Paulo. É relativamente comum encontrar também ABCDMRR que também inclui os municípios de Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Apesar de não contribuírem à sigla original, também fazem parte da região Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, pois eram extensão do município de Santo André, antes da divisão e Diadema. A Represa Billings banha 6 dos 7 municípios da região, exceto São Caetano do Sul. Os 7 municípios somados perfazem uma área de 825 km², e reúnem uma população de mais de 2,5 milhões de habitantes na estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística para 2007. Em Santo André estão ainda localizados os distritos de Parque Capuava e Paranapiacaba, bem como o subdistrito de Utinga, também chamado de 2º subdistrito. Em São Bernardo do Campo, o distrito de Riacho Grande e o bairro de Rudge Ramos; os bairros de Piraporinha e de Eldorado, em Diadema.
Em Mauá, os bairros de Jardim Zaíra, Bairro Capuava, Jardim Guapituba não constituem legalmente distritos, mas desempenham funções polarizadoras em suas respectivas áreas. Em Ribeirão Pires está o distrito de Ouro Fino Paulista. São Caetano do Sul é o município com menor área territorial do Grande ABC, com 15,3 km²; a menor população residente é a de Rio Grande da Serra (42 405 habitantes em 2007). São Bernardo do Campo possui a maior população residente (781 390 habitantes em 2007) e também a maior área (406 km², quase a metade de toda a região). O acesso da cidade de São Paulo a esta região é feito principalmente pelas rodovias Anchieta e Imigrantes, pelas avenidas Cupecê, Engenheiro Armando de Arruda Pereira, dos Bandeirantes, do Estado, Salim Farah Maluf, Anhaia Melo, Oratório e pelos corredores de trólebus e pelos trens urbanos da CPTM. A história social da região do ABC Paulista começa com sua ocupação pelos indígenas e pelos portugueses que, liderados por Martim Afonso de Sousa e João Ramalho, fundaram em 1553 a vila de Santo André da Borda do Campo, de onde se iniciou a ocupação de todo o planalto paulista e que daria origem, no ano seguinte, à vila de São Paulo de Piratininga, atual cidade de São Paulo. Passados alguns anos a vila de Santo André foi extinta, e os habitantes transferidos para São Paulo.
A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) é uma sociedade de economia mista operadora de transporte ferroviário vinculada à Secretaria dos Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo. Criada pela lei nº 7 861 de 28 de maio de 1992, a partir de ferrovias já existentes na Região Metropolitana de São Paulo. A CPTM possui atualmente 57 estações ativas em cinco linhas, que totalizam 196 km na sua malha ferroviária. Este sistema faz parte do Trem Metropolitano de São Paulo. Cada uma das linhas tem uma de suas extremidades localizada no município de São Paulo. A outra extremidade, incluindo extensões operacionais, fica localizada em outro município da Região Metropolitana, exceto a Linha 7 que ultrapassa os limites territoriais da Região, atendendo a Região Metropolitana de Jundiaí. A CPTM teve sua criação em 28 de maio de 1992, pelo Governo do Estado de São Paulo (Lei nº 7.861), sendo que a nova Companhia deveria assumir os sistemas de trens da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) em substituição à Superintendência de Trens Urbanos de São Paulo (STU/SP) e à FEPASA DRM, de forma a assegurar a continuidade e melhoria dos serviços. O efetivo controle do sistema pertencente a CBTU, ocorreu somente no ano de 1994.
Em 1998, foram iniciadas pela CPTM as obras civis básicas da então chamada Linha G, que havia sido planejada há anos pela Fepasa como Ramal do Campo Limpo. O trecho entre Largo Treze e Capão Redondo, na zona sul de São Paulo, envolveu a aplicação de 7 km de vias elevadas, 1 km de vias superficiais e 850 metros subterrâneos, além da construção de um pátio para manutenção e manobras em Capão Redondo. Porém, o trecho foi repassado em 2001 ao Metrô em troca do Expresso Leste, construído pela Companhia do Metropolitano. O ramal da zona sul seria posteriormente renomeado para Linha 5 do Metrô de São Paulo. As linhas da FEPASA foram incorporadas à CPTM em 1996 para que se iniciasse a privatização da malha da FEPASA e permanecesse os serviços de transporte metropolitano de passageiros sob controle do estado. No início da gestão da CPTM, a ocorrência frequente de panes, assédio contra mulheres, comércio ambulante, greves, entre outros, levaria parte dos passageiros dos trens a causarem uma série de depredações em trens e estações entre 30 de setembro e 16 de outubro de 1996, causando a interrupção dos serviços da então Linha A, por seis meses.
Por ter uma malha ferroviária tão extensa e degradada, a CPTM começou a modernizar seus sistemas, investindo 1,5 bilhão de dólares na rede entre 1995 e 2004. Em novembro de 2006, foi inaugurado em uma área contígua à Estação Brás, o prédio do Centro de Controle Operacional da CPTM, que além dos trens metropolitanos, também gerencia a circulação dos trens de carga nos trechos em que compartilham as vias com os de passageiros. O Centro de Controle Operacional passou a ser responsável pela operação das então seis linhas da CPTM: 7-Rubi, 8-Diamante, 9-Esmeralda, 10-Turquesa, 11-Coral e 12-Safira, que anteriormente eram comandadas de pontos distintos. Os painéis na Estação Brás continham somente o controle das linhas 11-Coral e 12-Safira. Já os controles das linhas 7-Rubi e 10-Turquesa eram feitos no Centro de Tráfego e Controle, na Luz. E por fim, as linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda que eram controladas pelo CCO de Presidente Altino, em Osasco. Desde 2007 a companhia vem passando por um profundo processo de modernização que visa retirar de circulação todas as frotas antigas, afim de oferecer frotas novas capazes de rodar em qualquer linha conforme a necessidade e com o que há de mais moderno em tecnologia ferroviária, aumentando também sua quantidade de trens e diminuindo intervalos.
Para promover “a uniformização da comunicação visual dos dois sistemas e para facilitar a locomoção e a localização dos usuários e de turistas” o governo do Estado alterou, em março de 2008, a nomenclatura das Linhas pertencentes à CPTM, integrando-as à nomenclatura utilizada pelo Metrô de São Paulo. Foi atribuído a cada linha um número, (a começar do número 7), somando-se às linhas outras seis linhas do Metrô já em operação, em construção ou em projeto) e o nome de uma pedra preciosa. Em dezembro de 2013, a CPTM iniciou as obras do projeto do Trem de Guarulhos, renomeado para Linha 13–Jade. A fase I foi definida com 12,2 quilômetros de extensão e três estações: Engenheiro Goulart, Guarulhos CECAP e Aeroporto–Guarulhos, sendo parte do trajeto feita em superfície (4,3 km) e outra em elevado (7,9 km). Em 31 de março de 2018, após pouco mais de quatro anos de construção, a primeira fase da linha foi inaugurada, sendo a primeira linha totalmente construída e operada pela CPTM. São transportados pelas 7 linhas, que “cortam” 23 municípios, cerca de 2,7 milhão de usuários por dia, atingindo um recorde de mais de 3 milhões de passageiros em novembro de 2013. 
Em 1989 concorreu pela primeira vez à presidência da República, perdendo no segundo turno para Fernando Collor de Mello. Também foi candidato a presidente outras duas vezes, em 1994 e 1998, perdendo ambas as eleições no primeiro turno para Fernando Henrique Cardoso. Venceu a eleição presidencial de 2002, contra José Serra, e foi empossado em janeiro de 2003. Na eleição de 2006 derrotou Geraldo Alckmin. A particularidade utópica e história do Partido dos Trabalhadores (PT) é que nasceram com uma postura de crítica política ao reformismo dos partidos políticos socialdemocratas. Nas palavras descritas em seu programa original: - “As correntes socialdemocratas não apresentam, hoje, nenhuma perspectiva real de superação histórica do capitalismo imperialista”. O Partido dos Trabalhadores (PT) organizou-se, no papel, com formulações de intelectuais marxistas, que continham em seu bojo, desde o nascimento, ideologias espontâneas dos movimentos sindicalistas nacionais que constituíram o seu núcleo duro organizacional. Ideologias estas que apontavam para uma aceitação da ordem democrático-burguesa, e cuja importância social tornou-se cada vez maior na medida em que o partido político adquiria bases materiais como máquina autoritária do processo burocrático-eleitoral. Originalmente, este novo movimento trabalhista, que se origina no “coração da fábrica”, buscava fazer política exclusivamente na esfera sindical.
No entanto, a sobrevivência de um sindicalismo controlado pelo Estado, expresso na recriação da CGT, que reunia líderes conservadores como o pelego Joaquim dos Santos Andrade, apelidado “Joaquinzão”, e Luiz Antônio Medeiros, somado à persistente influência de partidos de esquerda, como o Partido Comunista Brasileiro (PCB) sobre o movimento sindical, fizeram com que os trabalhadores do ABC, e reconhecidas cidades operárias de Santo André, São Bernardo e São Caetano, estimulados por lideranças de esquerda, procurassem identidade própria na criação de seu partido político – uma estratégia diferente à realizada pelo Solidarność, na Polônia. Enfim, nos anos 1980 um encontro político em Roma entre Lech Wałęsa e Lula da Silva demonstrou que suas visões políticas eram distintas, mas cristalizadas pela religião católica, no caso latino-americano da Teologia da Libertação e Lech Wałęsa como ativista dos Direitos Humanos e do pluralismo na política sindical. Lula defenderia a união dos sindicatos em uma central única de trabalhadores representativa (CUT).  
 O governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou através de “suas” redes sociais, na quinta-feira (3/10/2019), que o estado não aderiu a nenhum novo modelo de ensino ao aceitar recursos federais para a construção de escolas militares. Ele ainda destacou que o estado é “referência” em matéria de educação. - “Algumas pessoas têm me perguntado sobre o fato do Governo do Ceará ter aderido ao Programa das Escolas  Cívico-Militares, do Governo Federal. Quero deixar bem claro que o Ceará não aderiu a nenhum novo modelo de educação, mas a um programa que prevê recursos federais para a construção de duas unidades de ensino. Aliás, o Ceará já possui três escolas militares, duas da PM e uma dos Bombeiros, num universo de 728 escolas estaduais, sendo 252 de tempo integral. Quem tenta emplacar essa informação errada, ou desconhece os excelentes resultados da educação pública do Ceará, considerada referência no Brasil, e que serve de modelo para vários estados, ou age de má fé. Meu compromisso – afirma Camilo Santana - é fortalecer cada vez mais nosso modelo cearense de educação pública, aumentar as nossas escolas de tempo integral, investir cada vez mais nos nossos alunos e professores, e melhorar ainda mais nossos resultados. O resto da discussão é guerra ideológica, que não leva a absolutamente nada”, descreveu o governador petista.
Salão Verde: “Anjo”, de Ceschiatti (2016)
No segundo dia de governo e no mesmo em que assumiu o cargo, sem anúncio oficial sobre a publicação do ato, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou decreto para começar a implantar um modelo de educação “cívico-militar” no país. Para dar suporte ao programa, criou uma unidade específica, intitulada: Subsecretaria de Fomento às Escolas Cívico-Militares, vinculada à Secretaria de Educação Básica. O Decreto 9.465 muda parte da estrutura do Ministério da Educação e remaneja ou acaba com cargos comissionados. Em seus anexos, descreve como funcionarão os órgãos internos do Ministério de Educação e Cultura. E no primeiro artigo fica estabelecida a possibilidade de promover parcerias com instituições civis e militares. O escopo será tanto o ensino fundamental quanto o médio, mas, preferencialmente, no que chama de “escolas em situação de vulnerabilidade social”. Caberá à Subsecretaria, de acordo com o texto, “promover, fomentar, acompanhar e avaliar, por meio de parcerias, a adoção por adesão do modelo de escolas cívico-militares nos sistemas de ensino municipais, estaduais e distrital tendo como base a gestão administrativa, educacional e didático-pedagógica adotada por colégios militares do Exército, Polícias e Bombeiros Militares”.
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva do Partido dos Trabalhadores (PT) teve como marco social a realização dos programas Bolsa Família e o programa Fome Zero ambos reconhecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) como os programas que possibilitaram “a saída do país do mapa da  fome”. Durante seus dois mandatos empreenderam reformas sociais e mudanças radicais que produziram transformações sociais e econômicas globais no Brasil, que triplicou seu PIB per capita e alcançou o grau de investimento. Na política externa, desempenhou um papel de destaque, incluindo atividades relacionadas ao programa nuclear do Irã, ao aquecimento global, ao Mercosul e aos BRICS. O presidente Lula foi considerado dos políticos mais populares da história do Brasil e, enquanto presidente, foi um dos mais populares do mundo. A chefa da Casa Civil, Dilma Rousseff, derrotou José Serra (PSDB) na eleição de 2010 e foi reeleita em 2014 ao derrotar Aécio Neves. Dias Toffoli foi subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil da Presidência da República de 2003 a 2005. Em 2007, foi indicado pelo então presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, para o cargo de advogado-geral da União, permanecendo neste até 2009, quando foi indicado pelo mesmo presidente ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Exerceu também a função de ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo presidindo-o no biênio de 2014 a 2016, além de presidir a comissão de juristas responsável pela elaboração do anteprojeto do novo Código Eleitoral brasileiro.
Desde o anúncio do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares, proposto pelo ministro Abraham Weintraub, e pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), várias autoridades e especialistas já se manifestaram contrários à ideia. Uma das críticas mais contundentes partiu da Comissão Permanente de Educação (COPEDUC) do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que acusou “a iniciativa de ferir os princípios da reserva legal, da gestão democrática do ensino público e do processo da valorização dos profissionais da educação”. Por outro lado, há também quem defenda o modelo, como a Secretaria de Educação de Goiás, estado onde ele já é “aplicado”. Em recente entrevista ao jornal Estadão, a secretária Fátima Gavioi afirmou que “esse tipo de gestão é visto como um caso de grande sucesso, marcado por um sistema de organização e de metodologia diferenciados”. O processo de adesão ao Programa é voluntário e são os estados que definem quais escolas fazem parte da iniciativa. Mas nem todas as unidades da federação demonstraram interesse em fazer parte do mesmo.
A iniciativa é citada meio a atribuições da pasta ministerial como desenvolver metodologias e tecnologias educacionais ou coordenar a alfabetização de jovens e adultos. É um dos 31 tópicos referentes ao Sistema Educacional Brasileiro (SEB). Não há, no documento ou no portal do Ministério da Educação, detalhes como a definição de “concepção de escolas cívico-militares”, expressão usada no ato. O decreto delega à Subsecretaria a incumbência de “promover, progressivamente, a adesão ao modelo”, ainda que por meio de adesão voluntária, implementando um projeto nacional. À unidade compete ainda “criar, gerenciar e coordenar programas nos campos didático-pedagógicos e de gestão educacional que considerem valores cívicos, de cidadania e capacitação profissional necessários aos jovens”. O texto inclui, ainda, futuras escolas militares, que virão a ser construídas. Um dos itens descreve atribuição de avaliar das demandas dos pedidos de manutenção, conservação e reformas das novas instalações das escolas cívico-militares.
O projeto de gestão compartilhada entre a Secretaria de Educação e a Polícia Militar em escolas públicas do Distrito Federal foi apresentado no primeiro semestre deste ano. Atualmente, quatro escolas da capital já funcionam nesse modelo. Outras quatro unidades também estão em processo de adoção do esquema. No modelo proposto pelo Governo do Distrito Federal (GDF), a Polícia Militar fica responsável pela segurança – incluindo o controle de entrada e a saída dos estudantes. Já a Secretaria de Educação lidera a parte pedagógica. Segundo informações do governo, “os militares também trabalham no dia a dia dos estudantes com conceitos de ética e de cidadania, além de promoverem atividades esportivas e musicais no contraturno”. Outra mudança é que os estudantes são obrigados a adotar um padrão de corte de cabelo – curto para meninos e coque para meninas. Como uniforme, eles usam camisa branca e calça jeans. A previsão é de que o uniforme militar seja obrigatório, mas até agosto do corrente ano, as roupas ainda não tinham sido distribuídas. O programa lançado pelo governo federal prevê que a União disponibilize aos governos estaduais e municipais a estrutura e os profissionais das Forças Armadas envolvidos, que atuarão em funções administrativas e de gestão nas escolas. A adesão de estados e municípios é aparente e voluntária.
Os militares passarão por treinamento e receberão 30% da remuneração que recebiam antes da aposentadoria. O governo informou que estados e municípios poderão destinar policiais e bombeiros militares para auxiliarem na disciplina e organização das escolas. O Ministério da Educação repassará recursos para os governos, que terão de fazer investimentos em infraestrutura e material escolar. O investimento previsto é de R$ 54 milhões por ano. O secretário de Educação Básica do Ministério da Educação, Jânio Carlos Endo Macedo, explicou que, no dia a dia das escolas, os militares cuidarão da “gestão comportamental”. É bacharel em Direito, pelo Instituto Toledo de Ensino em Bauru (SP), e MBA em Formação Geral para Altos Executivos, pela Fundação Instituto de Administração (FIA), da Universidade de São Paulo (USP). Pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), concluiu MBA em Aperfeiçoamento em Marketing. No governo federal, foi secretário-Executivo do Ministério do Trabalho e secretário-adjunto da Secretaria de Gestão e Desenvolvimento de Pessoal do Ministério da Economia. É concursado do Banco do Brasil, no qual já exerceu vários cargos executivos. Enfim, é mais um burocrata da cultura, como lembrava o filósofo José Arthur Giannotti. Nesses modelos de escola há regras para uso do uniforme e corte de cabelo. - “Os militares são responsáveis pela gestão da escola, a gestão comportamental. A parte didática continua sendo dos professores”.
O subsecretário de Fomento às Escolas Cívico-Militares do MEC, Aroldo Ribeiro Cursino, explicou que o projeto prevê que os militares também cuidarão de ações na área psicossocial, na identificação de problemas dos alunos que exijam acompanhamento de psicólogo ou assistente social. - “Qual é o objetivo dos militares na escola cívico-militar? Trabalhar com monitor para que eles possam acompanhar os alunos, permitindo que o aluno tenha segurança e um ambiente confortável para que ele possa desempenhar seu papel no processo de ensino-aprendizagem”. Os colégios devem ter de 500 a mil alunos do 6º ao 9º ano do ensino fundamental ou ensino médio. A comunidade escolar terá de aceitar a mudança no perfil das escolas. O ministério definiu que estados e municípios terão de fazer uma consulta pública sobre a adesão ao programa. Em seguida, o presidente concluiu: - “Nós não queremos que essa garotada cresça e, no futuro, seja um dependente até morrer de programas sociais do governo”. No entanto, a fala do presidente da República contraria um dos requisitos para adesão ao programa: “o fato de ser voluntária e necessitar da realização de consultas públicas”. Autoritário, o presidente Jair Messias Bolsonaro defendeu a imposição das escolas cívico-militares para as pessoas não dependerem de programas sociais “até  morrer”.
Ele não detalhou qual seria a relação social entre o atual modelo de escolas e a “dependência” de pessoas de programas sociais. Bolsonaro participou de uma cerimônia no Palácio do Planalto na qual lançou “um programa que visa incentivar a criação de escolas cívico-militares”. O Distrito Federal (DF) já adota a militarização em algumas unidades de ensino, e o governador Ibaneis Rocha (MDB) participou do evento no Planalto. Bolsonaro, que se dirigiu a Ibaneis e declarou: - “Temos aqui a presença física do nosso governador do Distrito Federal, Ibaneis. Parabéns, governador, com essa proposta. Vi que alguns bairros tiveram votação e não aceitaram. Me desculpa, não tem que aceitar, não. Tem que impor”. O governo do DF chegou a fazer eleições em algumas escolas para a população votar a favor ou contra a militarização nessas unidades de ensino. Nos locais onde a maioria foi contra, Ibaneis Rocha chegou a dizer que programaria a medida “de qualquer jeito”. Depois, voltou atrás. O governo federal pretende programar essa gestão em 216 instituições até 2023, com 54 lugares por ano. Questionado sobre a fala de Bolsonaro, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, reforçou que a adesão ao programa é voluntária. Mas disse que há fila de pais e gestores interessados. E ponderou que a “última palavra” para os assuntos do governo é do Executivo. A ideia é que os militares atuem em tutorias e na área administrativa. Mentoring é uma proposta de suporte e apoio aos estudantes baseada no acompanhamento regular de um grupo de alunos com seu “mentor/professor” durante todos os anos da formação na graduação. Eles não vão substituir os professores dentro da sala de aula.
Bibliografia geral consultada.
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