quarta-feira, 13 de abril de 2016

Eleições - tribos urbanas & manipulação política.



                                                                                                    Ubiracy de Souza Braga*

     
Eleição é uma comédia estadunidense escrita em 1999 e adaptada do romance de 1998 de Tom Perrotta, escritor estadunidense. Seus livros “Election” e “Little Children” geraram filmes que foram indicados ao Globo de Ouro. Em ambos os filmes, Tom participou da produção, ajudando na adaptação do roteiro, figurino etc. O enredo gira em torno de uma eleição na escola, e satiriza a vida suburbana numa tribo urbana e articulada ao movimento estudantil. O filme é estrelado por Matthew Broderick, Reese Witherspoon e Chris Klein e narra a vida de Jim McAllister (Broderick), um professor de história do subúrbio de Omaha, Nebraska, e uma de suas alunas, Tracy Flick (Witherspoon), em torno das eleições do corpo discente. O envolvimento de McAllister com várias funções relacionadas com a escola mascara sua frustração com outros aspectos da sua vida. Na trama Tracy é uma perfeccionista determinada a entrar em uma boa faculdade. Quando Tracy qualifica para concorrer à presidência da classe na eleição da escola, McAllister acredita que ela não merece o título, e tenta impedi-la de ganhar. No filme as eleições são fraudadas e é preciso fazer una recontagem dos votos. No universo de uma escola secundária de Omaha nos EUA, o diretor consegue representar todas as emoções, intrigas e manipulações que existem por trás de uma eleição.
As “tribos urbanas”, também chamadas de “subsociedades” ou metropolitanas ou regionais são constituídas de microgrupos que têm como objetivo principal estabelecer redes de amigos com base em interesses comuns. Essas agregações apresentam uma conformidade de pensamentos, hábitos e maneiras de se vestir. Um bom exemplo de tribo urbana são os punks. A expressão “tribo urbana” foi criada pelo sociólogo francês Michel Maffesoli (1987; 1996), que começou usá-la nos seus artigos a partir de 1985. A expressão ganha força três anos depois com a publicação do seu livro: “O Tempo das Tribos: O declínio do individualismo nas sociedades de massa”. Segundo Maffesoli, as relações sociais nas tribos urbanas se constituem através das diversas redes, grupos de afinidades [eletivas] e de interesse, laços de vizinhança que estruturam nossas megalópoles. Seja ele qual for, o que está em jogo é a potência contra o poder, mesmo que aquela não possa avançar senão mascarada para não ser esmagada por este.
Tom Perrotta nasceu em Garwood, New Jersey, filho de um carteiro e uma secretária e foi criado dentro do catolicismo. Desde criança, Tom já adorava ler, tendo O. Henry, J. R. R. Tolkien e John Irving dentre seus escritores favoritos. Começou já no ensino médio, escrevendo contos para uma revista literária chamada “Pariah”. Cursou Inglês na Universidade de Yale, entrando em 1983 e logo em seguida fez Mestrado em Artes na Universidade de Siracusa. Em 1991, Tom Perrotta casou-se com a também escritora Mary Granfield, com quem teve dois filhos: Nina, nascida em 1994 e Luke, que nasceu em 1997. O primeiro livro publicado no Brasil foi “Little Children”, com o título “Criancinhas”, editora Objetiva, em 2005. Em 2010 a Benvirá edita “The Abstinence Teacher” (“A Professora de Abstinência”). Em janeiro de 2012, a editora Intrínseca comprou os direitos de “The Leftovers” publicando-o no Brasil em 2012 sob o título “Os deixados para trás”. O livro recebeu o seguinte elogio de Stephen King: “Tom Perrotta escreveu um conturbador ensaio sobre como pessoas comuns reagem a acontecimentos extraordinários e inexplicáveis, o poder da família para ferir e curar e a sutil facilidade com que a fé se transforma em fanatismo”.  


O romance foi inspirado por dois eventos principais. O primeiro foi o da Eleição presidencial nos Estados Unidos em 1992, no qual Ross Perot entrou como um terceiro candidato do partido (um movimento repetido por Tammy Metzler). O segundo foi um incidente no Memorial High School em Eau Claire, Wisconsin, no qual uma estudante grávida foi eleita rainha do baile, mas a equipe anunciou uma vencedora diferente e queimaram as cédulas para encobri-la. O filme foi originalmente realizado com uma estreita relação encontrada no romance, com Jim McCallister trabalhando em uma loja de automóveis, onde Tracy visita-o antes de sair para a faculdade. Depois de testar mal com o público, o final acabou por ser refeita. O final original era invisível até a descoberta acidental de um VHS do filme em um mercado de pulgas em 2011. O final original também apareceu no YouTube, mas a Paramount Pictures, fez sua retirada alegando violação de direitos autorais. Ele ainda pode ser encontrado em outros sites.
Além disso, o diretor de elenco do filme é o jogador de futebol que aparece no filme. Muitos estudantes Omaha locais e professores foram usados ​​no filme para os papéis de alunos e professores. Um em especial foi Chris Klein, que acabaria se tornando um dos pilares em Hollywood e estrela em outros filmes. Payne encontrou quando ele estava de aferição para as escolas locais para fotografar e um professor em uma das escolas apresentou-o a Klein. Witherspoon estava começando em filmes moderadamente bem-recebidos no início de 1990. Nicholas D'Agosto, que apareceu no final do filme como presidente da comissão Larry Fouch, era apenas um estudante na Creighton Preparatory School, em Omaha, a mesma alta Payne escola participou, quando ele fez este filme. Ele iria para a faculdade na Marquette University, em Milwaukee antes de se mudar para Los Angeles para prosseguir uma carreira de ator. O senador Kirsten Gillibrand ganhou o apelido de "Tracy Flick" no âmbito da delegação do Congresso de Nova York antes de sua nomeação em janeiro de 2009 pelo governador de Nova York David Paterson para preencher o assento de Hillary Clinton, de acordo com o colunista Maureen Dowd do The New York Times.
“Eleição” foi comercializado como comédia adolescente, quando não é. Ou melhor, é bem mais do que isso – trata-se de uma sátira demolidora sobre a classe média dos EUA, com humor mais ácido e inteligente do que a média. Os dois personagens principais são professor e aluna de uma modorrenta cidadezinha. Ao contrário do que muitos poderiam esperar, contudo, não se trata de um filme sobre a paixão avassaladora de um homem mais velho por uma ninfeta. Bem ao contrário. Jim McAllister (Matthew Broderick), um dedicado e premiado professor de escola média no estado conservador do Nebraska (EUA), sofre de antipatia congênita por Tracy Flick (Reese Whiterspoon). A aluna, ambiciosa e empreendedora ao extremo, é a única concorrente à eleição para o grêmio estudantil, cargo que ela vê como um degrau para vencer na vida.
Payne a retrata como uma criatura mecanizada que persegue uma versão suburbana do “sonho americano” sem refletir sobre o que faz realmente na vida. Tracy é uma aluna estudiosa, quase perfeita, que em teoria deveria ser amada por Jim, um professor que valoriza os bons estudantes. Mas por algum motivo ele não a suporta. Tenta ignorá-la até mesmo quando faz uma pergunta à classe e ela é a única a saber a resposta, situação que incomodamente se repete com frequência alarmante. Por causa dessa antipatia, Jim acaba estimulando o galã da escola, Paul (Chris Klein), a lançar uma candidatura alternativa ao grêmio, apenas para pôr uma pedra no caminho de Tracy. O filme atribui a antipatia ao decisivo papel da aluna na demissão de outro professor (Mark Harelik), um bom amigo de Jim. Mas o buraco é, na verdade, mais embaixo. Tracy e Jim são os dois lados dessa moeda chamada “sonho americano”.


Remando ao contrário da maré, o filme “Eleição” não poupa seus personagens, revelando-se muitas vezes mais cruel com eles do que poderíamos imaginar politicamente. É justamente nesse ponto que “Eleição” se afasta de outra pérola independente que lida com o mesmo universo estudantil, o ótimo “Três é Demais”, de Wes Anderson, que ampara seu protagonista com indisfarçável carinho. Em resumo, “Eleição” é um filme inteligente que alfineta sem pudor, mas com elegância, a hipocrisia deliberada do “sonho americano”, e merece ser redescoberto pelo público que faria dos trabalhos posteriores de Payne, os bons “As Confissões de Schmidt” e “Sideways” verdadeiros ícones do crescente e criativo cinema independente dos EUA. A narrativa, porém, não poupa o próprio professor, enfocando-o como alguém impessoal, fútil e vazio, um fracassado de paletó e gravata. As cenas que mostram o relacionamento frio e quase assexuado com a esposa (Molly Hagan) são uma demonstração inequívoca do fracasso de Jim como homem, como pessoa. Ensinar é tudo o que lhe resta. E a decisão aparentemente boba de se colocar contra Tracy dentro da escola pode se revelar uma estratégia perigosamente suicida para alguém como ele.  

Bibliografia geral consultada:

VIERECK, P., Conservatism: from John Adams to Churchill. N. Jersey: Van Nostrand; 1956; ROSSITER, C., Conservatism in America: the tankless persuasion. New York: Random House, 1962; OAKESHOTT, Michael, Rationalism in Politics. London: Methuen, 1962; MAFFESOLI, Michel, O Tempo das Tribos. O Declínio do Individualismo nas Sociedades de Massa. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1987; Idem, Éloge de la Raison Sensible. Paris: Éditions Grasset & Fasquelle, 1996; NISBET, Robert, O Conservadorismo. Lisboa: Editorial Estampa, 1987; BOBBIO, Norberto, A era dos direitos. Rio de Janeiro: Editor Campus, 1992;  FEARSTHERTONE, Mike (org.), Cultura Global. Nacionalismo, Globalização e Modernidade. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1994; TOCQUEVILLE, Alexis de, A democracia na América. São Paulo: Martins Fontes, 2000; BAILYN, Bernard, As origens ideológicas da Revolução Americana. Bauru: EDUSC, 2003; JASMIN, Marcelo, Alexis de Tocqueville: a historiografia como ciência da política. 2ª edição. Belo Horizonte: Editora da UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2005; MERLEAU-PONTY, Maurice, Fenomenologia da Percepção. 3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2006; WELLER,Wivian, “A atualidade do conceito de gerações de Karl Mannheim”. In: Soc. estado. vol.25 no.2 Brasília May/Aug. 2010, entre outros.

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* Sociólogo (UFF), cientista político (UFRJ) e doutor em ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).

Um comentário:

  1. Adorei a dica de filme. O que não faltam são boas sugestões de filmes políticos. Eu gosto muito de filmes de época ou baseados em fatos reais. Dos citados, o que eu mais gostei foi Dama de ferro. Eu, pessoalmente, adoro pesquisar e ver filmes europeus e documentarios, em geral eles tem uma boa diversidade de filmes políticos. São sempre bem produzidos e dirigidos, nos atraindo sempre. Tem outro ritmo e são bem conduzidos além de ter uma linguagem própria. Eu adoro e indico.

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