sexta-feira, 17 de julho de 2020

Os Intrusos – Roubo Perfeito, Casa Vazia & Cofre Cheio de Dinheiro.

                                  Eu sempre tive a fantasia de que existe mais alguma coisa pra mim”. Intruso (2020)


          Em primeiro lugar, as motivações sociais que ordenam os símbolos não apenas já não formam longas cadeias de razões, mas nem sequer cadeias. A explicação linear do tipo de dedução lógica ou narrativa introspectiva já não basta para o estudo das motivações simbólicas. A classificação dos grandes símbolos da imaginação em categorias motivacionais distintas apresenta, com efeito, pelo próprio fato da não linearidade e do semantismo das imagens, grandes dificuldades. Metodologicamente, se se parte dos objetos bem definidos pelos quadros da lógica dos utensílios, como faziam as clássicas “chaves dos sonhos”, segundo as estruturas antropológicas do imaginário, cai-se rapidamente, pela massificação das motivações, numa inextricável confusão. Parecem-nos mais sérias as tentativas para repartir os símbolos segundo os grandes centros de interesse de um pensamento, certamente perceptivo, mas ainda completamente impregnado de atitudes assimiladoras nas quais os acontecimentos perceptivos não passam de pretextos para os devaneios imaginários. Tais são, de fato, em segundo lugar, socialmente as classificações mais profundas de analistas das motivações do simbolismo religioso ou da imaginação individual (o sonho) coletiva (os mitos, os ritos) de modo geral literária. No prolongamento dos esquemas explicativos, arquétipos e simples símbolos modernos pode-se considerar o mito. Lembramos, todavia, que não estamos tomando este termo na concepção restrita que lhe dão os etnólogos, que fazem dele apenas o reverso representativo de um ato ritual. 

        Entendemos por mito, “um sistema dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico que, sob o impulso de um esquema, tende a compor-se na narrativa”. O mito é já um esboço de racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se resolvem em palavras e os arquétipos em ideias. O mito explicita um esquema ou um grupo de esquemas. Do mesmo modo que o arquétipo promovia a ideia e que o símbolo engendrava o nome, podemos dizer que o mito promove a doutrina religiosa, o sistema filosófico ou, como bem observou Bréhier, a narrativa histórica e lendária. O método de convergência evidencia o mesmo isomorfismo na constelação e no mito. Enfim, para sermos breves, este isomorfismo dos esquemas, arquétipos e símbolos no seio dos sistemas míticos ou de constelações estáticas pode levar-nos a verificar a existência de protocolos normativos das representações imaginárias, bem definidos e relativamente estáveis, agrupados em torno dos esquemas originais e que antropologicamente a literatura refere-se como estruturas. Uma parte de sua obra, incluindo seus livros mais representativos sobre a tópica da chamada “intuição trabalhada” como: A Poética do Espaço (1957), A Poética do Devaneio (1991), A Água e os Sonhos e O Ar e os Sonhos (1998), é permeada por categorias sociais e conceitos que fogem ao lugar comum de análise e, na história social da filosofia, e pensando bem, sobretudo, do debate acadêmico contemporâneo da ciência institucionalizada em torno do sonho, devaneio, poética, alquimia, tempo, imaginação. 

        A riqueza de Bachelard consiste fundamentalmente do ponto de vista do processo de criação em trazer para sua produção intelectual um duplo projeto: o aspecto diurno da sua obra – onde se inscrevem os conceitos mais ligados à epistemologia – e o aspecto noturno – onde aparece a complementaridade dos sinais da poesia e do sonho – e posteriormente do devaneio e da ciência. Ao aproximar os dois aspectos, a sua concepção de história e filosofia demonstra que a cisão entre razão e imaginação fica bem clara se utilizarmos a via racional; se usarmos a via onírica, a razão e a imaginação se articulam, se interpenetram e se tornam complementares. A atividade dialética surge esboçada e a partir da análise da noção de “corpúsculo”. Tendo como certo que o filósofo deve tentar compreender a novidade da linguagem e ao mesmo tempo aprender a formar noções e conceitos completamente novos para resistir aos conhecimentos comuns e à memória cultural, Bachelard, tentando precisar a noção de “corpúsculo”, rememora uma sequência de teses: o corpúsculo não é um pequeno corpo. Não é fragmento de substância. O corpúsculo não tem dimensões absolutas definidas. Só existe nos limites do espaço em que atua.  Correlativamente, se o corpúsculo não tem dimensões definidas, não tem, portanto, forma reconhecida. Ou melhor, o elemento não tem geometria. E, ipso facto, não se lhe pode atribuir um lugar muito preciso em virtude do princípio da indeterminação de Heisenberg, a sua localização é submetida a tais restrições que a função de existência situada não tem mais valor absoluto.

                                                

      Em várias circunstâncias sociais, a microfísica põe como um verdadeiro princípio a perda da individualidade do corpúsculo. Uma última tese que contradiz o axioma fundamental do atomismo filosófico. Complementarmente com as suas reflexões acerca da imaginação criadora e da poética, Bachelard infere que os corpúsculos, não sendo dados dos sentidos, “nem de perto nem de longe”, também não são dados escondidos. No entanto, apenas é possível conhecê-los, descobrindo-os, ou melhor, inventando-os, porque eles são a prova de que algo está no limite da invenção e da descoberta. Admirável é, então, a referência que Bachelard faz à noção de intuição trabalhada. Em Études, no ensaio “Idealismo discursivo” ele sublinha que tem alguma confiança na intuição para descrever positivamente o seu ser íntimo. Diz mesmo que o fato socialemte e de exercermos uma preparação discursiva dá à intuição uma nova jeunnesse. De maneira que aconselha a fecharmos os olhos como uma forma de nos prepararmos para termos uma visão do nosso ser. A intuição será a via de comunicação refletida de renunciar aos acidentes na história e significa um recurso metafísico de compreensão “de si”. Interessa, então, a intuição trabalhada e não a intuição imediata, a intuição que permite uma espécie de “repouso”, mesmo sabendo que na ciência, esse “repouso” na intuição pode ser “quebrado” pela necessidade de rigor e necessidade de encadear mais as teorias sociais.

        O tempo, como a unidade negativa do ser-fora-de-si, é igualmente um, sem mais nem menos, abstrato, ideal. Ele é o ser, que, enquanto é, não é, e enquanto não é; ele é o vir-a-ser intuído, segundo a análise dialética de Friedrich Hegel, isto é, analogamente, tal que são determinadas as diferenças simplesmente momentâneas, as que imediatamente se suprassumem como exteriores, isto é, que são apesar disso exteriores a si mesmas. O tempo é como o espaço uma pura forma de sensibilidade ou do intuir, é o sensível, mas, assim como a este espaço, também ao tempo não diz respeito a diferença de objetividade e de uma consciência subjetiva contra ela. Quando se aplicam estas determinações de espaço e tempo,  então seria aquele a objetividade abstrata, este [o tempo], porém a subjetividade abstrata. O tempo social é o princípio representativo que o Eu=Eu da autoconsciência pura; mas é o mesmo princípio ou o simples conceito ainda em sua total exterioridade e abstração – como o mero vir-a-ser intuído, o puro ser-em-si como um vir-fora-de-si. O tempo é contínuo como o espaço, pois ele é a negatividade abstratamente referindo-se a si e nesta abstração ainda não há nenhuma diferença real. No tempo, diz-se, tudo surge e perece, se se abstrai de tudo, a saber, do recheio do tempo e igualmente do recheio do espaço, fica de resto o tempo vazio como o espaço vazio, são então postas e representadas estas abstrações de exterioridade, como se elas fossem por si. O real é limitado, e o outro para esta negação está fora dele, a determinidade é nele exterior a si, e daí a contradição de seu ser; a abstração opera nessa exterioridade de sua contradição e a inquietação da mesma é o próprio tempo.

           Por isso o finito é transitório e temporário, porque ele não é, como o conceito nele mesmo, a negatividade total, mas tem em si, como sua essência universal, entretanto – diferentemente da mesma essência – é unilateral, e se relaciona à mesma como à sua potência. Só o natural, na vida, na realidade concreta é, portanto, enquanto é finito, sujeito ao tempo; o verdadeiro, porém, a ideia, o espírito, é eterna. A intemporalidade absoluta é diferente da duração; é a eternidade que é sem o tempo natural. Mas o próprio tempo é, em seu conceito, eterno; pois historicamernte ele, não quer qualquer tempo, isto é, nem o entendimento agora, mas significativamente o tempo-enquanto-tempo, é seu conceito; este tempo, porém, como cada conceito em geral, é o eterno, e também é presente absoluto. O que não está no tempo é o sem-processo; o péssimo e o mais perfeito não estão no tempo, dura. O péssimo, da pior qualidade, porque ele é uma universalidade abstrata, assim espaço, assim tempo mesmo; sua duração não é vantagem. O duradouro é mais altamente cotado do que o transitório; mas toda florescência, toda bela vitalidade tem morte cedo. Mas também o mais perfeito dura, não só o universal sem-vida, inorgânico, mas também o outro universal, o concreto em si, o gênero, a lei, a ideia, o espírito. Representa o processo total ou apenas um momento do processo que entra no tempo enquanto os momentos do conceito têm a aparência da independência; mas as diferenças excluídas portam-se como reconciliadas e retomadas à paz. A noção de desenvolvimento passa a ser central depois dessa concepção na filosofia da história e, para o bem ou para o mal até os dias presentes.

Mesmo a ideia de progresso, que implicava o depois poder ser explicado em função do antes, encalhou, de certo modo nos recifes materiais do século XX, ao sair das esperanças ou das ilusões que acompanharam a chamada “travessia do mar” aberto pelo século XIX. Esse questionamento refere-se a várias ocorrências distintas entre si que não atestam um progresso moral da humanidade, e sim, uma dúvida sobre a história como portadora de sentido, dúvida renovada, per se no que se refere ao seu método, objeto e como tal nas grandes dificuldades não só em fazer do tempo um princípio de inteligibilidade, como em inserir aí um princípio de identidade. A história humana, isto é, uma série de acontecimentos realmente reconhecidos como acontecimentos por muitos, acontecimentos que podemos pensar que importarão aos olhos dos historiadores de amanhã e, ao qual cada um de nós, por mais consciente que seja de nada representar nesse caso pode vincular algumas circunstâncias ou imagens particulares, como se fosse a cada dia menos verdadeiro que os homens, que fazem a história, pois, senão, quem mais senão homens, não sabem que a fazem. Hegel dizia que a verdade é o todo. Esta é a questão fundamental da filosofia. Se não enxergamos o todo, podemos atribuir valores exagerados a verdades limitadas, prejudicando a compreensão da verdade geral. Essa visão é sempre provisória, não alcança uma etapa definitiva e acabada, caso contrário a dialética negaria a si própria. O método dialético nos incita a revermos o passado, à luz do que está acontecendo, ele questiona o presente em nome do futuro, o que está sendo na realidade em nome do que “ainda não é”.                  

              

Para Friedrich Hegel, o trabalho é o conceito chave para compreensão da superação da dialética na história, atribuindo o verbo suspender com três significados: negação de uma determinada realidade, conservação de algo essencial dessa realidade e elevação a um nível superior. A filosofia descreve a realidade e a reflete, portanto, a dialética busca, não interpretar, mas refletir acerca da realidade. A dialética é a história das contradições. O reprimido permanece dentro da totalidade social. Esta contradição não é apenas do pensamento, mas da realidade concreta. Então, tudo está em processo de constante devir. Esse padrão é nosso velho conhecido, visto que é algo do qual a filosofia durante séculos de elaboração utilizou para de fato conhecer. E isto fica claro da seguinte maneira; se o saber é igual ao conceito e a essência corresponde o objeto, logo o conceito precisa corresponder ao objeto e vice-versa, basta para nós, portanto, verificar em nosso exame, diz Hegel (2007) se o objeto corresponde ao conceito. Por isso, é necessário manter os dois momentos do exame; o conceito, quer dizer, “ser para outro e o objeto consequentemente ser em si mesmo”. Com isso verificamos que não é necessário um “padrão de medida”, no sentido funcionalista, um instrumento que capte o raio, mas de outro modo, é necessário investigar a partir do que é dado, embora, aquilo que é dado fique no limite da própria consciência. Dessa forma, a consciência é consciência do objeto e por identificar este objeto como um elemento extrínseco torna-se “consciência de si mesmo”. A consciência do que é verdadeiro é do “seu saber da verdade”, que estabelece na relação entre tempo e espaço é a própria consciência.

Friedrich Hegel, admite Marx, não enxerga a dimensionalidade do trabalho em toda a sua contraditória materialidade no tempo/espaço, e por isso o idealiza e o vê de maneira unilateralmente positiva, minimizando a força da sua negatividade: a essência humana, o ser humano, equivale para Hegel à consciência de si, em vez de reconhecer na consciência de si a consciência de si do homem, quer dizer, “de um homem real, que vive num mundo real, objetivo, e é condicionado por ele”. Por isso, Hegel, na interpretação de Marx da Introdução de 1857, caiu na ilusão de conceber o real como resultado do pensamento, que se encontra em si mesmo, se aprofunda em si mesmo e se movimenta por si mesmo, enquanto o método que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto é para o pensamento precisamente a maneira de se apropriar do concreto, de reproduzi-lo como concreto espiritual. Portanto, ao assumir o conceito hegeliano de dialética, Marx foi levado a modificá-lo, mas a perspectiva de Marx implicava não só uma reavaliação do papel do trabalho material na autocriação da sociedade e na autotransformação do ser humano, como também exigia uma reavaliação dos trabalhadores e de sua concepção orgânica como força material de trabalho capaz de dar prosseguimento à autotransformação da humanidade na modernidade. A definição histórica do sábado e do domingo como dias de descanso semanal remunerado é uma conquista relativamente recente dos trabalhadores. Foi resultado da luta operária surgida na Inglaterra historicamente depois da Revolução Industrial, no início do século XIX.

Na Antiguidade, comparativamente, os romanos e os adeptos de religiões pagãs dedicavam o sábado ao deus Saturno, que regia a agricultura. Esse dia reservado para o descanso, “numa forma de agradecimento ao deus por uma boa colheita”. Em outras religiões, como no judaísmo, o sábado também já era consagrado como um dia de repouso semanal. O domingo ganhou esse “status” um pouco mais tarde. Só na Era Cristã é que passou a ser considerado sagrado, “porque Jesus ressuscitou dos mortos neste dia”. Por conta disso, os cristãos consagraram o domingo ao Senhor e, para que os fiéis pudessem ir tranquilamente aos cultos, era natural que fosse reservado um dia sem trabalho. Porque pode fazer história e revolucionar a estrutura dessa sociedade, em sua transitoriedade assimilando assim as conquistas mais profundas da filosofia. Utilizando o conhecimento para superar/conservar a situação particular de classe que lhes é imposta. Em sua concepção dialética, a filosofia, “não pode se realizar sem a superação do proletariado; e o proletariado não pode se superar sem a realização da filosofia”.  O modo de pensar dialético atento à infinitude do real e a irredutibilidade do real ao saber distingue os planos de análise e de realidade de quem opera sociologicamente. Implica uma interpretação da consciência no sentido dela se abrir para o reconhecimento do novo, inédito, no âmbito das “mediações complexas” e das contradições sociais que irrompem no campo visual do sujeito e lhe revelam a existência de problemas que não estava enxergando. Hegel é o primeiro pensador da modernidade a ter visibilidade na Filosofia colocando a questão da consciência e autoconsciência vis-à-vis à consciência do homem comum. É conspícuo a jornada de trabalho que evidência a interrupção do trabalho, fora das crenças religiosas, para que o homem possa gozar na vida cotidiana e reconstituir-se.   

The Owners (Os Intrusos) tem como representação social um filme de suspense e terror de 2020, adaptado da história em quadrinhos Une Nuit de Pleine Lune de Hermann e Yves H., nascido em Malmedy, Bélgica, em 17 de julho de 1938, é um quadrinista belga. É um filme francês dirigido por Éric Rohmer e lançado em 1984. É o quarto filme da série Comédias e Provérbios. Ilustra o suposto provérbio de Champagne, inventado em alusão a Chrétien de Troyes, um poeta e trovador francês do final do século XII. Foi um dos primeiros autores de romances de cavalaria, sendo também considerado o primeiro grande novelista original em língua francesa. Suas obras inspiraram a literatura em toda a Europa Ocidental durante a Idade Média, pelo próprio Rohmer: “Quem tem duas esposas perde a alma, quem tem duas casas perde a razão”. O filme acompanha Louise, que mora com Rémi e decide assumir seu apartamento em Paris para aproveitar ao máximo suas saídas à noite e ter um pied-à-terre no centro da cidade. Seu parceiro encara essa escolha com desconfiança, convencido de que Louise está tentando escapar dele. Acompanhada por Octave, um amigo que nutre sentimentos ambivalentes por ela, ela vivenciará esse estilo de vida e sofrerá as consequências. Às vezes escrito Malmédy, é uma cidade e também um município da Bélgica localizado no distrito de Verviers, província de Liège, região da Valônia.  

Culturalmente é uma cidade de língua francesa com instalações para seus habitantes de língua alemã que gira em torno de 5% de seus cidadãos. É definitivamente anexado à Bélgica em 10 de junho de 1925, em execução do Tratado de Versalhes. Com o florescimento do comércio no fim da Idade Média, a função de banqueiro se tornou algo muito comum na Europa. Nas feiras da Europa Central, quando as pessoas chegavam com valores em ouro para trocar por outro produto, era exatamente o banqueiro, a figura do financista quem fazia a pesagem de moedas, avaliação da autenticidade e qualidade dos metais, “em troca de uma comissão”. Com o passar do tempo, os banqueiros passaram a aceitar depósitos monetários e, em troca, o banco emitia uma espécie de certificado. Todavia, foi após a percepção de que nem sempre as pessoas retiravam tudo o que haviam depositado, melhor dizendo, sempre haveria dinheiro para circular, que surgiu a ideia de conceder empréstimos mediante o pagamento de juros. Esta foi a base para o enriquecimento dos banqueiros, que deixaram de ser simplesmente “cambistas” ou agiotas. Contudo, a cobrança de juros era algo de total desaprovação da Igreja, aspecto que explica o porquê da existência de muitos judeus no ramo bancário naquele período histórico e social.

           

            Lembrava Marx que num debate parlamentar sobre os Bank-Actas de Sir Robert Peel de 1844 e 1845, Gladstone observava que “nem mesmo o amor levou tantas pessoas à loucura como o cismar sobre a essência do dinheiro”. Ele falava de britânicos para britânicos. Os holandeses, ao contrário, que apesar da dúvida de Petty possuíam desde tempos imemoriais uma “malícia angelical” para a especulação com o dinheiro, nunca perderam sua malícia na especulação sobre o dinheiro. A principal dificuldade da análise sobe o dinheiro é vencida quando se compreende que o dinheiro tem a sua origem na própria mercadoria. Desse pressuposto, apenas resta conceber nitidamente as idades que lhe são próprias; o que é dificultado em certa medida pelo fato de que todas as relações burguesas aparecem transformadas em ouro ou prata, aparecendo como relações monetárias. E a forma dinheiro parece possuir, por conseguinte, um conteúdo fetichista infinitamente variado que lhe é estranho, mas o primeiro ato necessário desse processo consiste em que as mercadorias excluam uma mercadoria específica, digamos o ouro, como encarnação imediata do tempo de trabalho geral, ou seja, como equivalente geral.

Porque todas as mercadorias medem seus valores de troca pelo ouro, na proporção em que determinada quantidade de ouro e determinada quantidade de mercadoria contêm a mesma quantidade de tempo de trabalho, o ouro se torna medida de valor, e só se torna equivalente geral (ou dinheiro), unicamente através dessa determinação como medida de valores, medida que como tal mede seu próprio valor de imediato por todo o conjunto de equivalentes-mercadorias. Por outro lado, o valor de troca de todas as mercadorias expressa-se em ouro. Deve-se distinguir nessa expressão: um momento qualitativo e outro quantitativo. Primeiro, o valor de troca da mercadoria existe como encarnação do mesmo tempo de trabalho uniforme; segundo, do ponto de vista econômico sua grandeza de valor se apresenta na mesma proporção em que as mercadorias são igualadas ao ouro também igualadas entre si. De um lado, aparece o caráter geral e utilidade de uso do tempo de trabalho contido; de outro, sua quantidade expressa em seu equivalente ouro. O valor de troca das mercadorias assim expresso como equivalência geral e ao mesmo tempo como grau dessa equivalência em relação a uma mercadoria específica, ou expresso ainda numa só equação ligando as mercadorias a uma mercadoria específica é o preço.

Portanto, o preço é a forma transformada sob a qual aparece o valor de troca das mercadorias no interior do processo de circulação. Ipso facto, através do mesmo processo pelo qual as mercadorias apresentam seus valores em preços-ouro, apresentam também o outro como medida dos valores e, daí, como dinheiro. O ouro só se torna medida dos valores porque é por ele que todas as mercadorias avaliam seu valor de troca. Não é senão pura aparência do processo de circulação a impressão de que o dinheiro faz as mercadorias comensuráveis, pois a medida entre ouro e mercadoria é o tempo de trabalho, e o ouro só se torna medida dos valores pelo fato de que as mercadorias se meçam com ele. Ao contrário, não é senão a comensurabilidade das mercadorias como tempo de trabalho objetivado que permite ao ouro transformar-se em dinheiro. Ao entrar para o processo de troca, as mercadorias assumem a figura real de valores de uso. Somente através da sua alienação é que se tornam equivalente geral. A determinação de seu preço é a sua transformação ideal em equivalente geral, é equação com o ouro que ainda está por se realizar. Mas como as mercadorias estão transformadas em ouro apenas idealmente, ou apenas em ouro representado, seu ser dinheiro não está ainda efetivamente separado de seu ser real, o ouro; por enquanto, está transformado apenas em dinheiro ideal, em medida dos valores, e, de fato, determinadas quantias de ouro funcionam por enquanto apenas como nomes para determinadas quantias de tempo de trabalho.  

A determinidade formal em que o ouro se cristaliza como dinheiro depende em cada caso do modo determinado em que as mercadorias apresentam, umas as outras, seu próprio valor de troca. Nessa diferença entre valor de troca e preço, observa-se o seguinte: o trabalho individual particular contido na mercadoria precisa primeiro ser apresentado, pelo processo de alienação, em seu contrário, em seu trabalho sem individualidade, abstratamente geral e, somente dessa forma, em trabalho social, ou seja, em dinheiro. O mal dinheiro põe-se de emboscada na invisível capa da medida de valor. O ouro é medida de valor como tempo de trabalho objetivado. Padrão de preços ele o é como determinado peso de metal. Torna-se medida de valor ao relacionar-se como valor de troca com as mercadorias (trabalho) enquanto valores de troca; uma determinada quantia de ouro, como padrão de preços, serve a outras quantias de ouro como unidade. O ouro é a medida de valor porque seu valor é variável, e é padrão de preços porque é fixado como unidade de peso invariável. Aqui, como em todas as determinações de grandezas nominalmente iguais, solidez e determinidade das relações de medidas são decisivas.

 

A necessidade de se fixar uma quantia de ouro como unidade de medida e partes alíquotas como subdivisões dessa unidade produziu a representação de que uma determinada quantia de ouro, que naturalmente tem um valor variável, se colocasse numa relação de valor fixa com os valores de troca das mercadorias, no que se perdeu de vista que os valores de troca das mercadorias estão transformados em preços, em quantias de ouro antes mesmo que o ouro se desenvolva como padrão dos preços. Assim como o valor do ouro varia, diferentes quantias de ouro apresentam entre si permanente a mesma proporção de valor. O preço de uma mercadoria ou de forma de equivalente geral a quantia de ouro, na qual se transforma idealmente, se expressa agora, portanto, nos nomes monetários do padrão-ouro. A forma própria com que essas mercadorias dão os seus valores de troca está transformada em nomes monetários, pelo quais expressam mutuamente o que elas valem. O dinheiro, por sua vez, torna-se moeda de cálculo. O dinheiro, compreendido como moeda de cálculo, pode existir apenas idealmente (teoria), enquanto o dinheiro que circula efetivamente (prática) é cunhado em um outro padrão totalmente diferente. Em muitas colônias inglesas da América do Norte, a moeda circulante, até boa parte do século XVIII, consistia em moedas portuguesas e espanholas, enquanto, por toda parte, a moeda de cálculo era a mesma da Inglaterra.

A cidade de Malmedy está localizada na confluência do Warche e do Warchenne. O Warche é um rio no Leste da Bélgica (província de Liège). De sua nascente em Losheimergraben, na fronteira entre a Bélgica e a Alemanha, ele flui aproximadamente para Oeste por cerca de 50 km (31 milhas), através do Sul da região de Hautes Fagnes. Ele passa pela cidade de Malmedy, e os lagos artificiais de Robertville e de Bütgenbach são formados por represas no Warche. Éric Rohmer é mais reconhecido pela série pós-apocalíptica Jeremiah, que deu origem à série de televisão homônima. Ganhou o Troféu HQ Mix de 1999 pela edição brasileira do álbum Caatinga. Dirigido pelo diretor estreante Julius Berg, com roteiro de Mathieu Gompel e Julius Berg em colaboração com Geoff Cox, estrelado por Maisie Williams, Sylvester McCoy, Rita Tushingham, Jake Curaram, Ian Kenny e Andrew Ellis. The Owners foi lançado nos Estados Unidos da América em 4 de setembro de 2020, pela RLJE Films. Na comédia Gaz, Nathan e Terry decidiram “invadir a casa do Dr. Richard Huggins e sua esposa Ellen, pois fica no interior e dizem que tem um grande cofre cheio de dinheiro”. Mary, a namorada de Nathan, complica as coisas quando chega para pegar o carro emprestado, mas é persuadida a ir junto. Ela entra em casa depois que os meninos não conseguem acessar o cofre, pois ela estava esperando há muito tempo. Uma vez lá dentro, ela diz a Nathan que está grávida. Quando os Huggins voltam, os meninos amarram o casal e tentam ameaçá-los para que abram o cofre.

No cenário dramático do filme, Richard reconhece Nathan e Terry de quando eram crianças, fazendo com que Nathan relutasse em continuar o roubo. Em uma tentativa de assumir o controle, Gaz pega uma briga séria com Nathan e o esfaqueia. Ele então tenta machucar Ellen, apenas para Mary matá-lo com uma marreta. Enquanto ela e Terry desamarram o casal, Ellen parece reconhecer Mary. Richard engana Terry e Mary oferecendo-se para operar Nathan e fingindo chamar uma ambulância. Ellen então droga secretamente Terry, que alucina a irmã gêmea de Mary, Jane, que está desaparecida e presume-se que fugiu. Mary finalmente percebe que eles foram enganados. Richard tenta persuadir ela e Terry a beber chá com eles, durante o qual eles discutem a morte prematura da filha do casal, Kate, anos antes, bem como o misterioso desaparecimento de várias adolescentes na área. Agora ciente do perigo que o casal representa, Mary tenta, sem sucesso, escapar. Ela e Terry chegam à garagem, apenas para Terry atirar em Mary nas costas. Enquanto ela sangra até a morte, Richard diz a Mary que eles capturariam e aprisionariam várias garotas em seu cofre, onde as vestiriam como garotinhas e as chamariam de Kate. Eles não encontraram nenhum que se encaixasse no papel até que capturaram a irmã de Mary, Jane, que ainda está em cativeiro. Como recompensa por ajudá-los, o casal aprisiona Terry no cofre com Jane. O filme termina de uma forma macabra e aparentemente ingênua, com a mãe de Terry questionando os Huggins sobre o desaparecimento de seu filho, last but not least, sem saber do envolvimento do casal e da presença dos corpos recém-enterrados de Gaz, Nathan e Mary no jardim.

O tempo, como a unidade negativa do ser-fora-de-si, é igualmente um, sem mais nem menos, abstrato, ideal. Ele é o ser, que, enquanto é, não é, e enquanto não é; ele é o vir-a-ser intuído, segundo Hegel, isto é, analogamente, tal que são determinadas as diferenças simplesmente momentâneas, as que imediatamente se suprassumem como exteriores, isto é, que são apesar disso exteriores a si mesmas. O tempo é como o espaço uma pura forma de sensibilidade ou do intuir, é o sensível, mas, assim como a este espaço, também ao tempo não diz respeito a diferença de objetividade e de uma consciência subjetiva contra ela. Quando se aplicam estas determinações de espaço e tempo, então seria aquele a objetividade abstrata, este [o tempo], porém a subjetividade abstrata. O tempo é o princípio representativo que o Eu=Eu da autoconsciência pura; mas é o mesmo princípio ou o simples conceito ainda em sua total exterioridade e abstração – como o mero vir-a-ser intuído, o puro ser-em-si como um vir-fora-de-si. O tempo é igualmente contínuo como o espaço, pois ele é a negatividade abstratamente referindo-se a si e nesta abstração ainda não há nenhuma diferença real. No tempo, diz-se, tudo surge e perece, se se abstrai de tudo, a saber, do recheio do tempo e igualmente do recheio do espaço, fica de resto o tempo vazio como o espaço vazio, são então postas e representadas estas abstrações de exterioridade, como se elas fossem por si. O real é limitado, e o outro para esta negação está fora dele, a determinidade é assim nele exterior a si, e daí a contradição de seu ser; a abstração opera nessa exterioridade de sua contradição e a inquietação da mesma é o próprio tempo.

Por isso o finito é transitório e temporário, porque ele não é, como o conceito nele mesmo, a negatividade total, mas tem em si, como sua essência universal, entretanto – diferentemente da mesma essência – é unilateral, e se relaciona à mesma como à sua potência. Só o natural, na vida, na realidade concreta é, portanto, enquanto é finito, sujeito ao tempo; o verdadeiro, porém, a ideia, o espírito, é eterna. A intemporalidade absoluta é diferente, comparativamente, da duração; é a bendita eternidade que é representada sem o tempo natural. Mas o próprio tempo é, em seu conceito, eterno; pois ele, não quer qualquer tempo, nem o agora, mas significativamente o tempo-enquanto-tempo, é seu conceito; este tempo, porém, como cada conceito em geral, é o eterno, e também é presente absoluto. O que não está no tempo é o sem-processo; o péssimo e o mais perfeito não estão no tempo, dura. O péssimo, da pior qualidade, porque ele é uma universalidade abstrata, assim espaço, assim tempo mesmo; sua duração não é vantagem. O duradouro é mais altamente cotado do que o transitório; mas toda florescência, toda bela vitalidade tem morte cedo. Mas também o mais perfeito dura, não só o universal sem-vida, inorgânico, mas também o outro universal, o concreto em si, o gênero, a lei, a ideia, o espírito. Representa o processo total ou apenas um momento do processo que entra no tempo enquanto os momentos do conceito têm a aparência da independência; mas as diferenças excluídas portam-se como reconciliadas e retomadas à paz. A noção de desenvolvimento passa a ser central depois dessa concepção na filosofia da história e, para o bem ou para o mal até os dias presentes. Mesmo a ideia de progresso, que implicava o depois poder ser explicado em função do antes, encalhou, de certo modo nos recifes materiais do século XX, ao sair das esperanças ou das ilusões que acompanharam a chamada “travessia do mar” aberto pelo século XIX.

Esse questionamento refere-se a várias ocorrências distintas entre si que não atestam um progresso moral da humanidade, e sim, uma dúvida sobre a história como portadora de sentido, dúvida renovada, per se no que se refere ao seu método, objeto e como tal nas grandes dificuldades não só em fazer do tempo um princípio de inteligibilidade, como em inserir aí um princípio de identidade. A história humana, isto é, uma série de acontecimentos reconhecidos como acontecimentos por muitos, acontecimentos que podemos pensar que importarão aos olhos dos historiadores de amanhã e, ao qual cada um de nós, por mais consciente que seja de nada representar nesse caso pode vincular algumas circunstâncias ou imagens particulares, como se fosse a cada dia menos verdadeiro que os homens, que fazem a história, pois, senão, quem mais senão homens, não sabem que a fazem. Hegel dizia que a verdade é o todo. Esta é a questão fundamental da filosofia. Que se não enxergamos o todo, podemos atribuir valores exagerados a verdades limitadas, prejudicando a compreensão de uma verdade geral. Essa visão é sempre provisória, nunca alcança uma etapa definitiva e acabada, caso contrário a dialética estaria negando a si própria. O método dialético nos incita a revermos no plano abstrato do passado, à luz do que está acontecendo no presente, ele questiona o presente em nome do futuro, o que está sendo em nome do que “ainda não é”. Para Hegel, o trabalho é o conceito chave para compreensão da superação da dialética na história, atribuindo o verbo suspender com três significados: negação de uma determinada realidade, conservação de algo essencial dessa realidade e elevação a um nível superior.

  

A filosofia descreve a realidade e a reflete, portanto, a dialética busca, não interpretar, mas refletir acerca da realidade. A dialética é a história das contradições. O reprimido permanece dentro da totalidade. Esta contradição não é apenas do pensamento, mas da realidade concreta. Então, tudo está em processo de constante devir. Esse padrão é nosso velho conhecido, visto que é algo do qual a filosofia durante séculos de elaboração utilizou para conhecer. E isto fica claro da seguinte maneira; se o saber é igual ao conceito e a essência corresponde o objeto, logo o conceito precisa corresponder ao objeto e vice-versa, basta para nós, portanto, verificar em nosso exame, diz Friedrich Hegel (2007) se o objeto corresponde ao conceito. Por isso, é necessário manter os dois momentos do exame; o conceito, quer dizer, “ser para outro e o objeto consequentemente ser em si mesmo”. Com isso verificamos que não é necessário um “padrão de medida”, no sentido funcionalista, um instrumento que capte o raio, mas de outro modo, é necessário investigar a partir do que é dado, embora, aquilo que é dado fique no limite da própria consciência. Dessa forma, a consciência é consciência do objeto e por identificar este objeto como um elemento extrínseco torna-se “consciência de si mesmo”. A consciência do que é verdadeiro é consciência do “seu saber da verdade”, que estabelece na relação entre tempo e espaço é a própria consciência.

Friedrich Hegel admite Marx, não enxerga o trabalho em toda a sua contraditória materialidade e por isso o idealiza e o interpreta de maneira unilateralmente positiva, minimizando a força da sua negatividade: a essência humana, o ser humano, equivale para Hegel à consciência de si, em vez de reconhecer na consciência de si a consciência de si do homem, quer dizer, “de um homem real, que vive num mundo real, objetivo, e é condicionado por ele”. Por isso, Hegel, na interpretação de Marx da Introdução de 1857, caiu na ilusão de conceber o real como resultado do pensamento, que se encontra em si mesmo, se aprofunda em si mesmo e se movimenta por si mesmo, enquanto o método que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto é para o pensamento precisamente a maneira de se apropriar do concreto, de reproduzi-lo como concreto espiritual. Portanto, ao assumir o conceito hegeliano de dialética, Marx foi levado a modificá-lo, mas a perspectiva de Marx implicava não só uma reavaliação do papel do trabalho material na autocriação da sociedade e na autotransformação do ser humano, como também exigia uma reavaliação dos trabalhadores e de sua concepção orgânica como força material de trabalho capaz de dar prosseguimento à autotransformação histórica da humanidade na modernidade. A definição histórica do sábado e do domingo como dias de descanso semanal remunerado é uma conquista relativamente recente dos trabalhadores. Foi resultado da luta operária surgida na Inglaterra historicamente depois da Revolução Industrial, no início do século XIX. Na Antiguidade, em termos de análise comparada, os romanos e os adeptos de religiões pagãs dedicavam o sábado ao deus Saturno, que regia a agricultura. Esse dia reservado para o descanso, numa forma de agradecimento ao deus por uma boa colheita. Em outras religiões, como no judaísmo, o sábado também já era consagrado como um dia de repouso semanal.

O domingo ganhou esse “status” um pouco mais tarde. Só na Era Cristã é que passou a ser considerado sagrado, “porque Jesus ressuscitou dos mortos neste dia”. Por conta disso, os cristãos consagraram o domingo ao Senhor e, para que os fiéis pudessem ir tranquilamente aos cultos, era natural que fosse reservado um dia sem trabalho. Porque pode fazer história e revolucionar a estrutura dessa sociedade, em sua transitoriedade assimilando assim as conquistas mais profundas da filosofia. Utilizando o conhecimento para superar/conservar a situação particular de classe que lhes é imposta. Em sua concepção dialética, a filosofia, “não pode se realizar sem a superação do proletariado; e o proletariado não pode se superar sem a realização da filosofia”.  O modo de pensar dialético atento à infinitude do real e a irredutibilidade do real ao saber distingue os planos de análise e de realidade de quem opera sociologicamente. Implica uma interpretação da consciência no sentido dela se abrir para o reconhecimento do novo, inédito, no âmbito das “mediações complexas” e das contradições sociais que irrompem no campo visual do sujeito e lhe revelam a existência de problemas que não estava enxergando. Hegel é o primeiro a ter visibilidade na Filosofia colocando a questão da consciência e autoconsciência vis-à-vis à consciência comum. É conspícuo a jornada de trabalho que evidência a interrupção do trabalho, fora das crenças religiosas, para que o homem possa gozar e reconstituir-se.   

  

Porque todas as mercadorias medem seus valores de troca pelo ouro, na proporção em que determinada quantidade de ouro e determinada quantidade de mercadoria contêm a mesma quantidade de tempo de trabalho, o ouro se torna medida de valor, e só se torna equivalente geral (ou dinheiro), unicamente através dessa determinação como medida de valores, medida que como tal mede seu próprio valor de imediato por todo o conjunto de equivalentes-mercadorias. Por outro lado, o valor de troca de todas as mercadorias expressa-se em ouro. Deve-se distinguir nessa expressão: um momento qualitativo e outro quantitativo. Primeiro, o valor de troca da mercadoria existe como encarnação do mesmo tempo de trabalho uniforme; segundo, sua grandeza de valor se apresenta na mesma proporção em que as mercadorias são igualadas ao ouro também igualadas entre si. De um lado, aparece o caráter geral do tempo de trabalho contido nelas; de outro, sua quantidade expressa em seu equivalente ouro. O valor de troca das mercadorias assim expresso como equivalência geral e ao mesmo tempo como grau dessa equivalência em relação a uma mercadoria específica, ou expresso ainda numa só equação ligando as mercadorias a uma mercadoria específica é o preço. Portanto, o preço é a forma transformada sob a qual aparece o valor de troca das mercadorias no interior do processo de circulação. Ipso facto, através do mesmo processo pelo qual as mercadorias apresentam seus valores em preços-ouro, apresentam também o outro como medida dos valores e, daí, como dinheiro. O ouro só se torna medida dos valores porque é por ele que todas as mercadorias avaliam seu valor de troca.

Não é senão pura aparência do processo de circulação a impressão de que o dinheiro faz as mercadorias comensuráveis, pois a medida entre ouro e mercadoria é o tempo de trabalho, e o ouro só se torna medida dos valores pelo fato de que as mercadorias se meçam com ele. Ao contrário, não é senão a comensurabilidade das mercadorias como tempo de trabalho objetivado que permite ao ouro transformar-se em dinheiro. Ao entrar para o processo de troca, as mercadorias assumem a figura real de valores de uso. Somente través da sua alienação é que se tornam equivalente geral. A determinação de seu preço é a sua transformação ideal em equivalente geral, é equação com o ouro que ainda está por se realizar. As mercadorias estão transformadas em ouro apenas idealmente, ou em ouro representado, seu ser dinheiro não está ainda efetivamente separado de seu ser real, o ouro; está transformado apenas em dinheiro ideal, em medida dos valores, e, de fato, determinadas quantias de ouro funcionam por enquanto apenas como nomes para determinadas quantias de tempo de trabalho. A determinidade formal em que o ouro se cristaliza como dinheiro depende em cada caso do modo determinado em que as mercadorias apresentam, umas às outras, seu próprio valor de troca. Nessa diferença entre valor de troca e preço, observa-se o seguinte: o trabalho individual particular contido na mercadoria precisa primeiro ser apresentado, pelo processo de alienação, em seu contrário, em seu trabalho sem individualidade, abstratamente geral e, somente dessa forma, em trabalho social, em dinheiro. O mal dinheiro põe-se de emboscada na invisível capa da medida de valor.             

O ouro é medida de valor como tempo de trabalho objetivado. Padrão de preços ele o é como determinado peso de metal. Torna-se medida de valor ao relacionar-se como valor de troca com as mercadorias (trabalho) enquanto valores de troca; uma determinada quantia de ouro, como padrão de preços, serve a outras quantias de ouro como unidade. O ouro é medida de valor porque seu valor é variável, e é padrão de preços porque é fixado como unidade de peso invariável. Aqui, como em todas as determinações de grandezas nominalmente iguais, solidez e determinidade das relações de medidas são decisivas. A necessidade de se fixar uma quantia de ouro como unidade de medida e partes alíquotas como subdivisões dessa unidade produziu a representação de que uma determinada quantia de ouro, que naturalmente tem um valor variável, se colocasse numa relação de valor fixa com os valores de troca das mercadorias, no que se perdeu de vista que os valores de troca das mercadorias estão transformados em preços, em quantias de ouro antes mesmo que o ouro se desenvolva como padrão dos preços. Assim como o valor do ouro varia, diferentes quantias de ouro apresentam entre si permanente a mesma proporção de valor. O preço de uma mercadoria ou a quantia de ouro, na qual se transforma idealmente, se expressa agora, portanto, nos nomes monetários do padrão-ouro. A forma própria com que essas mercadorias dão os seus valores de troca está transformada em nomes monetários, pelo quais expressam mutuamente o que elas valem. O dinheiro torna-se moeda de cálculo e, compreendido como moeda de cálculo, pode existir apenas idealmente (teoria), enquanto o dinheiro que circula efetivamente (prática) é cunhado em um outro padrão totalmente diferente.

Em muitas colônias inglesas da América do Norte, a moeda circulante, até boa parte do século XVIII, consistia em moedas portuguesas e espanholas, enquanto, por toda parte, a moeda de cálculo era a mesma da Inglaterra. O mais famoso agiota da literatura viveu em Veneza e se chamava: Shylock, personagem de William Shakespeare, do “Mercador de Veneza”. O assunto empréstimo foi central neste romance, o agiota se dispõe a emprestar o dinheiro em troca de uma garantia da parte do amigo de Barsanio, o comerciante Antônio. Em qualquer empréstimo o risco das coisas dar errado é grande, e talvez seja por isso, que as pessoas que emprestam dinheiro precisam economicamente ser compensadas, com um valor pago pelo que emprestou além do montante emprestado que é chamado de juros. Mas porque se tornou o grande vilão do valor de troca entre pessoas? Naquela época, ele era um dos muitos judeus agiotas que viviam nos guetos de Veneza. Durante a vida de Shakespeare, a agiotagem era uma ocupação comum entre os judeus, devido à crença entre os cristãos nesse período de que a usura era um pecado, e por ser uma das poucas profissões que era permitido aos judeus exercerem na Europa medieval, já que as leis mercantilistas proibiam qualquer outro tipo de ocupação. A cidade os tolerava, pois eram os únicos que poderiam fornecer o serviço comercial que os mercadores cristãos eram proibidos de fazer, e poderiam cobrar juros pelos seus empréstimos. Por isso que os maiores banqueiros foram judeus.

Os judeus se sentavam em suas mesas, as suas “tavule” em seus bancos, os “banci”, raiz da palavra italiana para “bancos”, num local conhecido por Banco Rosso. Pinturas de Giorgio Vasari, Frederico Zuccari e Domenico di Michelino retratam bem a crença de um inferno para os agiotas. No final da história Shylok é proibido de cobrar o meio quilo de carne de Antônio exigido no empréstimo em caso de inadimplência. O tribunal o proíbe de derramar sangue de um veneziano, por ele ser judeu a lei determina ainda a perda de seus bens por planejar a morte de um cristão. Então porque ele confiou o empréstimo, como grande vilão do romance de William Shakespeare – “Mercador de Veneza”? Os bancos desfrutam, portanto, do poder de multiplicação monetária através do crédito sem lastro.  Mas nem sempre foi assim, como demonstra Murray Rothbard. O esquema de reservas fracionárias não passa de uma fraude, segundo o economista.  A produção de mercadorias e a circulação de mercadorias, o comércio, constituem os pressupostos históricos em que aquele surge o mercado mundial e abrem no século XVI a moderna biografia do capital. Se abstrairmos do conteúdo material da circulação de mercadorias, da troca dos diversos valores de uso, e considerarmos apenas as formas econômicas que este processo gera, encontraremos então como seu último produto o dinheiro. Este último produto da circulação de mercadorias é a primeira forma fenomênica do capital. O capital contrapõe-se à propriedade fundiária e em primeiro lugar, sob a forma de dinheiro, como fortuna em dinheiro, capital mercantil e capital usurário. E necessário voltarmos à gênese do capital para reconhecermos o dinheiro como a sua primeira forma fenomênica.

Murray Rothbard combinou a economia laissez-faire de seu professor Ludwig von Mises com os pontos de vista absolutistas dos direitos do homem e a rejeição do Estado que ele tinha absorvido a partir do estudo dos anarquistas individualistas norte-americanos do século XIX, como Lysander Spooner e Benjamin Tucker. Rothbard foi um ardente crítico do influente economista John Maynard Keynes (1883-1946) e do pensamento econômico keynesiano. Seu ensaio “Keynes, o homem”, é um ataque as ideias econômicas e ao personagem Keynes. Rothbard foi também um crítico severo do utilitarista Jeremy Bentham (1748-1832) em seu ensaio: Jeremy Bentham: The Utilitarian as Big Brother. Rothbard enunciou a ideia segundo a qual “os acadêmicos tenderiam a se especializar no que eles são piores”. Henry George foi grande em tudo, exceto no que diz respeito a terra, sendo assim, ele escreveu sobre terra, 90% do tempo. Milton Friedman foi excelente, exceto em teoria monetária, então foi nisso que ele se concentrou. Murray Rothbard dedica um capítulo em “Power and Market” para o papel tradicional do economista. Rothbard nota que as funções do economista no livre mercado, diferem das do economista em um mercado obstruído. – “O que pode fazer um economista no livre mercado puro?”. No campo da ideologia econômica Rothbard infere. – “Ele pode explicar o funcionamento da economia de mercado (uma tarefa vital, especialmente porque a pessoa ignorante tende a considerar a economia de mercado como mero caos desordenado), mas ele não pode fazer muito mais”.

Bibliografia Geral Consultada.

BEAUVOIR, Simone de, La Vieillesse. Paris: Éditions Gallimard, 1970; NAPOLEONI, Claudio, Smith, Ricardo, Marx. Considerazioni sulla storia del pensiero econômico. Torino: Boringhieri Editore, 1970; BACHELARD, Gaston, La Poétique de L`Espace. 3ª édition. Paris: Les Presses Universitaires de France, 1961; Idem, La Intuición del Instante. México: Fondo de Cultura Económica, 1985; JUNG, Carl Gustav, Sincronicidade. 5ª edição. Petrópolis (Rio de Janeiro): Editoras Vozes, 1991; ELIAS, Norbert, O Processo Civilizador. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1993, parte II: sinopse: “Sugestões para uma Teoria de Processos Civilizadores”, pp. 193-274; HUIZINGA, Johann, Homo Ludens: O Jogo como Elemento da Cultura. São Paulo: Editora Perspectiva, 1999; CERTEAU, Michel de, L`Invenzione del Quotidiano. Roma: Edizionne Lavoro, 2000; MAFFESOLI, Michel, El Instante Eterno. El Retorno de lo Trágico en las Sociedades Posmodernas. Buenos Aires: Ediciones Paidós, 2001; LE GOFF, Jacques, Por Amor às Cidades: Conversações com Jean Lebrum. 1ª edição. São Paulo: Editora Unesp, 2002; DAMIÃO, Carla Milani, Sobre o Declínio da Sinceridade. São Paulo: Editora Loyola, 2004; CASTARÈDE, Jean, O Luxo: Os Segredos dos Produtos mais Desejados do Mundo. São Paulo: Editora Barcarolla, 2005; HEGEL, Friedrich, Fenomenologia do Espírito. 4ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2007; ZELIZER, Viviana, El Significado Social del Dinero. Buenos Aires: Fondo de Cultura Econômica, 2011; PIKETTY, Thomas, Le Capital au XXIe Siècle. Colecção Les Livres du Nouveau Monde. Paris: Editions Du Seuil; 2013; DODD, Nigel, The Social Life of Money. Princeton: Princeton University Press, 2014; JONES, Gareth Stedman, Karl Marx: Grandeza e Ilusão. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2017; RODRIGUES, Alexandre Amaral, Ambição e Prudência: Os Sistemas Econômicos de Adam smith. Tese de doutorado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humans. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017; LIMA, Eliana Fereira de, Quando se Fala em Anarquia, Fala-se em Quê? Dissertação de Mestrado em Filosofia - Política. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, 2019; OLIVEIRA, Carla Pinto de, Roubo em Residências com Recurso a Arma de Fogo. Dissertação de Mestrado em Ciências Forenses. Porto: Universidade do Porto, 2020; entre outros. 

segunda-feira, 13 de julho de 2020

Evangelismo & Autoridade - A Estultícia do Sr. Ministro da Educação.


Ubiracy de Souza Braga

 “Que ninguém se engane, só se consegue a simplicidade através de muito trabalho”. Clarice Lispector


            Clarice Lispector foi uma escritora nascida na Ucrânia e naturalizada brasileira, mas declarava, quanto a sua brasilidade, ser pernambucana, sendo considerada uma das escritoras mais importantes do século XX e a maior escritora judia desde Franz Kafka. A escritora dizia não ter aparentemente nenhuma ligação com a Ucrânia e que sua “verdadeira” pátria era o Brasil. Pouca gente se dá conta de que uma das escritoras mais talentosas da literatura brasileira viveu em Maceió. Trata-se de Clarice Lispector, que passou alguns anos de sua infância na capital alagoana. Inicialmente, a família passou um breve período em Maceió, até se mudar para o Recife, onde Clarice cresceu e onde, aos oito anos, perderia a mãe. Aos quatorze anos de idade, transfere-se com o pai e as irmãs para o Rio de Janeiro, onde a família estabilizou-se, e onde o seu pai viria a falecer, em 1940. Sua obra literária representa cenas cotidianas e enredos psicológicos, considerada uma de suas principais características a epifania de personagens comuns em momentos do cotidiano. Predomina em suas obras o nível de análise psicológico, visto que o narrador segue o fluxo do pensamento e o monólogo interior das personagens.

As ações sociais, quando ocorrem, destinam-se a ilustrar características psicológicas das personagens. São comuns enredarem-se histórias sem começo, meio ou fim. Por isso, ela se dizia, do ponto de vista da criação, ser mais que uma escritora, irradiando uma ideia afetiva nas palavras, porque registrava em palavras aquilo que sentia. Mais que histórias, seus livros apresentam impressões. Logo, o enredo pode fragmentar-se. O espaço exterior também tem importância secundária, uma vez que a narrativa se concentra no espaço mental das personagens. Características físicas das personagens ficam em segundo plano. Muitas personagens não apresentam sequer nome. As personagens criadas por Clarice Lispector descobrem-se num mundo absurdo; esta descoberta dá-se normalmente diante de um fato inusitado, pelo menos inusitado para a personagem. Esse fato provoca um desequilíbrio interior que mudará a vida da personagem para sempre. O espaço exterior também tem importância secundária, uma vez que a narrativa se concentra no espaço mental das personagens.

Características físicas das personagens ficam em segundo plano. Muitas personagens não apresentam sequer nome. As personagens criadas por Clarice Lispector descobrem-se num mundo absurdo; esta descoberta dá-se normalmente diante de um fato inusitado, pelo menos inusitado para a personagem. Esse fato provoca um desequilíbrio interior que mudará a vida da personagem para sempre. Logo, o enredo pode fragmentar-se. O espaço exterior também tem importância secundária, uma vez que a narrativa se concentra no espaço mental das personagens. Características físicas das personagens ficam em segundo plano. Muitas personagens não apresentam sequer nome. As personagens criadas por Clarice Lispector descobrem-se num mundo absurdo. Mas esta descoberta dá-se normalmente diante de um fato inusitado - pelo menos inusitado para a personagem. Ocorre a “epifania” como a representação do momento em que a personagem sente uma “luz iluminadora” de sua consciência, contraditória, no sentido hegeliano, que a fará despertar para a vida contradições, perplexidades que noutra instância nela não fariam a menor diferença. Milton Ribeiro ao lado de Sikêra Júnior e Jair Bolsonaro que posaram para foto exibindo placa de “CPF cancelado”, expressão utilizada para se referir a mortos em confronto com policiais no Brasil.

           Autoridade é uma prática social que um indivíduo tem por possuir determinado conhecimento, que está ligado à liderança, compostura e comando. Representa a base social de certos tipos de organização hierarquizada. Refere-se à prática social que tem como objetivo levar as pessoas a perceberem e respeitarem as normas, julgando sua legitimidade e avançando no desempenho concreto da democracia, no estabelecimento do bem maior. Na esfera da vida social a luta política é uma das questões que sempre marcaram a dialética capital versus trabalho. Mas a esfera social onde a ideologia manifesta mais explicitamente seu poder de enviesamento é, com certeza, o campo da atividade intelectual. O autoritarismo, ao contrário, está ligado às práticas e saberes antidemocráticas e antissociais. Representa a imposição condicionada “pelo uso da força bruta da política”, como acentuava Marx, e geralmente as decisões se restringem às vontades do próprio indivíduo ou estritamente ligadas a ele, decerto no âmbito pessoal, profissional, governamental. Quando existe autoridade, as pessoas agem motivadas afetivamente por quem a detém, diante do alcance conspícuo do que objetiva. 
            No senso comum em torno dos hábitos o termo ideologia é sinônimo ao termo ideário, contendo o sentido neutro de conjunto de ideias, de pensamentos, de doutrinas ou de visões de mundo de um indivíduo ou de um grupo, orientado para suas ações sociais e, principalmente, políticas. Quando é o autoritarismo que prevalece, de mil formas, as pessoas também agem, porém não existe motivação pessoal; existe sim, medo, censura e ameaças constantes. O sujeito da ação política é alguém que quer reconhecer o quadro em que age; que quer poder avaliar o que pode e o que não pode fazer. Mas, ao mesmo tempo, é um sujeito que depende, em altíssimo grau, de motivações particulares, sua e dos outros para agir. A política é levada a lidar com duas referências contrapostas, legitimando-se através da universalidade dos princípios e viabilizando-se por meio das motivações particulares. Mas vale lembrar que os caminhos trilhados na política e na universidade em geral evitam a opção nítida por uma dessas linhas extremadas: o doutrinarismo, o oportunismo crasso, o cinismo ostensivo ou a completa e absurda indiferença. São frequentes as combinações de elementos de tais direções, porém combinados em graus e dimensões diversas. E é nessa combinação hábil que se enraíza a ideologia política. Sua atividade interpretativa também pode ser criativa, de modo que ao interpretar um caso, determinado ator social aplicaria e criaria um direito novo, praticamente legislando.



            A aglutinação dos ministérios tem um papel simbólico negativo. Os Ministros de Estado não são meros auxiliares do presidente da República no exercício do Poder Executivo e na direção superior da Administração Federal, pois representam uma dimensão econômica ou política de governo e da nação propriamente dita. Os Ministros de Estado são responsáveis pelos Ministérios e são escolhidos pelo presidente da República através de nomeação. Por ser um cargo de confiança do presidente, esses Ministros podem ser exonerados a qualquer tempo, não tendo qualquer estabilidade (art. 84, I). Os requisitos para que um indivíduo assuma o cargo de Ministro de Estado, cargo de provimento em comissão (de confiança), devem estar em conformidade com o art. 87, caput: - ter mais de 21 anos de idade; se encontrar em pleno gozo de direitos políticos; ser brasileiro ou naturalizado, exceto o Ministro de Estado da Defesa, que deverá ser preenchido por brasileiro nato, desde a Constituição Federal.
Formalmente competem aos Ministros, além de outras atribuições estabelecidas na Constituição e na lei, as dispostas no parágrafo único do art. 87 da CF/88: exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República. Em conformidade com o artigo 88 da Constituição Federal (CF), foi criada a Lei n° 9.649, de 27 de maio de 1988, para disciplinar, conforme a Lei Maior, sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios. A ideia maquiavélica de criar um superministério da Economia, fundindo Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio, ameaça diretamente a autonomia da Zona Franca de Manaus (ZFM) e pode resultar no fechamento da Suframa. Além do Ministério da Indústria, Comércio e Serviços ser extinto na fusão. Politicamente a pasta do governo federal é a responsável pelo funcionamento da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa).
            O título de ministro de Estado é usado com significados que variam entre países. Pode ser usado como o título de um membro do governo de estatuto superior ao dos restantes ministros, como o título de todos os ministros do governo ou como o título de membros do governo de estatuto inferior ao dos ministros do gabinete. O titular de Ministério, de livre escolha do presidente da República, responsável pela supervisão dos órgãos da administração federal enquadrados em sua área de competência econômica, social ou política. É julgado pelo Senado Federal nos crimes de responsabilidade conexos com o do presidente da República. São Ministros de Estado os titulares dos Ministérios, bem assim o Chefe do Gabinete Civil, o Chefe do Gabinete Militar, o Chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) e o Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. O Ministro de Estado do Planejamento chefia a Secretaria de Planejamento e Coordenação. As atribuições administrativas e legislativas do Ministro de Estado competem em expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; apresentar ao Presidente Relatório Anual de sua gestão no Ministério; praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República. Os ministros da Educação no Brasil, desde 1979, tiveram um curto período de gestão, alcançando em média somente dois (2) anos no cargo, devido à instabilidade provocada por crises políticas e econômicas governamentais.


            Um estudo de ideologias da administração não está preocupado com as origens do “espírito capitalista”, mas sim com as “armas ideológicas” empregadas na luta pela ou contra a industrialização. E quando ideologias são formuladas para defender um conjunto de interesses econômicos, é mais esclarecedor examinar a estratégia de argumentação do que insistir em que o argumento é autointeressado. Afinal, o país atravessou nessas quatro décadas períodos  de graves crises econômicas e de instabilidade política, como o impeachment casuístico de dois presidentes da República. O ex-ministro de Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), cuja gestão durou 12 meses de trabalho, destaca que tentou encarar como “prioritária a diminuição do analfabetismo no país”. Segundo a  Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), com dados referentes ao ano de 2016, o Brasil ainda tem cerca de 11,8 milhões de analfabetos. A pesquisa realizada pelo estatal IBGE “indica dados reais que 7,2% das pessoas maiores de 15 anos não sabem ler, comparativamente entre os negros, o percentual chega a 9,9%”. 
          Ao que parece a educação vem sendo num continuun ad infinitum o calcanhar de Aquiles do governo autoritário peselista eleito de forma turva pouco mais de um ano. O professor colombiano Ricardo Vélez Rodríguez caiu como fruta madura no ministério da Educação. Crítico do Enem escreveu no início da posse que o órgão responsável pela  aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) entende as provas “mais como instrumentos de ideologização do que como meios sensatos para auferir a capacitação dos jovens no sistema de ensino” (cf. O Globo, 23/11/2018) e com afinidade ao dístico “Escola sem Partido”, ele é professor-colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, um município no interior do estado de Minas Gerais. Localiza-se na Zona da Mata mineira, a sudeste da capital do estado. - “Gostaria de comunicar a todos a indicação de Ricardo Vélez Rodríguez, filósofo, autor de mais de 30 obras, atualmente professor Emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, para o cargo de Ministro da Educação”. O professor é um (des) conhecido na comunidade científica fora do métier militar.

Ele admitiu que fosse indicado pelo didata e polemista reacionário Olavo de Carvalho para comandar a Pasta. A indicação do professor ocorreu um dia depois da bancada evangélica vetar o educador Mozart Neves, diretor do Instituto Ayrton Senna. Ele era crítico do projeto Escola sem Partido, uma das principais armas do ex-militar eleito. O procurador regional do Distrito Federal, Guilherme Schelb era cotado para o ministério da educação. Schelb admitiu ter apoio “muito significativo” da bancada evangélica e reafirmou ser a favor do movimento Escola Sem Partido. Depois que saiu o anúncio de Vélez Rodríguez, Schelb “parabenizou” o presidente pela indicação. No texto, diz que é preciso “refundar” o Ministério da Educação (MEC)  no “contexto da valorização da educação para a vida e a cidadania a partir dos municípios” e que será o ministro da Educação para tornar realidade a proposta externada Jair Bolsonaro (PSL), de “Mais Brasil e Menos Brasília”. É critico de nomes que foram pensados para o MEC, como a da presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Maria Inês Fini. Para ela o Exame Nacional do Ensino Médio, prova que ela é responsável atualmente, é um “instrumento de ideologização”. Existe neutralidade  axiológica na educação, na religião, na medicina, nos desportos, na ciência em geral?
O inexperiente ministro da Educação assume o cargo envolvido em polêmicas e com um ministério que sofreu demissões desde o início do governo. O MEC já teve ao menos 14 demissões, sendo que dois cargos estratégicos ainda estão vagos: a secretaria da Educação Básica e a presidência do INEP. Além da preocupante falta de experiência em educação e gestão pública, Abraham Weintraub é seguidor do astrólogo Olavo de Carvalho. Demonstra um estranho alinhamento ideológico pari passu às pautas neoliberais e de extrema-direita afirmando que irá combater o chamado “marxismo cultural”. Ideologicamente a uma suposta forma de marxismo, alegadamente adaptada a termos culturais pela extraordinária Escola de Frankfurt, que teria se infiltrado nas sociedades com o objetivo de destruir suas instituições e valores tradicionais através do estabelecimento de uma “sociedade global, igualitária e multicultural”. A Escola de Frankfurt constituiu-se em um grupo pluralista de intelectuais que na primeira metade do século passado produzira um pensamento reconhecido como Teoria Crítica. Dentre eles temos Theodor Adorno, Max Horkheimer, Herbert Marcuse, Walter Benjamim, e outros, que desenvolveram teses sobre estruturas de poder e dominação econômica, política, cultural e psicológica da civilização industrial avançada.
Abraham Weintraub é professor universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 2014. Sua produção acadêmica não traz menção à educação, mas à economia financeira, principalmente ao nebuloso tema da Previdência Social. Especializados em Previdência, os irmãos Weintraub têm tratado, na transição, da proposta de reforma da área, mas também de outros temas, como a independência do Banco Central. Em 2015, o ministro fundou o Centro de Estudos em Seguridade (CES), que se apresenta como uma associação civil sem fins lucrativos fundados por professores dos cursos de Atuária e Contabilidade da Universidade Federal do Estado de São Paulo. O CES, segundo publicação no jornal Estadão em 2018 poderia ser o alvo que desencadeou uma sindicância em curso contra os irmãos Weintraub. Isto porque o Centro de Estudos de Seguridade foi a única instituição a apoiar a realização da Cúpula Conservadora das Américas, evento idealizado pelo filho do presidente da República. Abraham e Arthur falaram sobre economia no evento. Dois de seus colegas consultados pela reportagem do jornal Estadão disseram que ele teve uma passagem discreta pela universidade porque parecia se dedicar mais aos seus projetos do que à Academia.
Em 2014, apoiou a campanha presidencial de Marina Silva (Rede), em 1994,  eleita senadora da República, pelo estado do Acre, com a maior votação, sendo a pessoa mais jovem a ocupar o cargo de senador no Brasil. Antes de enveredar na carreira acadêmica, Abraham Weintraub atuou no Banco Votorantim e na Quest Corretora. A aproximação dos irmãos Weintraub com presidente se iniciou há quase dois anos, por intermédio de Onyx Dornelles Lorenzoni (DEM), o ministro da Casa Civil. Ao mesmo tempo ganhou a confiança do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o filho mais engajado com as estratégias de violência das milícias do presidente como é sabido e noticiado de domínio público. Em princípio, Abraham atuaria no ministério da Economia como um dos principais responsáveis por elaborar a (demagógica) reforma da Previdência. Mas o ministro Paulo Guedes preferiu nomear alguém com experiência legislativa para a função de secretário especial de Previdência e Trabalho. Era necessário convencer parlamentares sobre a necessidade de se aprovar a reforma. Assim, a vaga ficou com o ex-deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN). Abraham Weintraub acabou sendo remanejado na secretaria executiva da Casa Civil. Seu irmão Arthur Weintraub, tornou-se chefe da assessoria especial da Presidência. Vale lembrar que a capacidade de crer parece estar em recessão no campo político. A tática é a arte do fraco. O poder se acha amarrado à sua visibilidade.

Mas a vontade de “fazer crer”, de que vive a instituição, fornecia nos dois casos um fiador à busca de amor e/ou de identidade. Importa então interrogar-se sobre os avatares do crer em nossas sociedades e sobre as práticas originadas a partir desses deslocamentos. Durante séculos, supunha-se que fossem indefinidas as reservas de crença. Aos poucos a crença se poluiu, como o ar e a água. Percebe-se ao mesmo tempo não se saber o que ela é. Tantas polêmicas e reflexões sobre os conteúdos ideológicos em torno valor do voto e os enquadramentos institucionais para lhe fornecer não foram acompanhadas de uma elucidação acerca da natureza do ato de crer. Os poderes antigos geriam habilmente a autoridade. Hoje são os sistemas administrativos, sem autoridade, que dispõem de mais força em seus “aparelhos” e menos de autoridade legislativa. A 1ª mulher que se tornou presidenta da República no Brasil foi Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), que foi reeleita com mais de 54 milhões de votos. A candidata petista venceu o segundo turno com 51,64% dos votos válidos, fazendo com que esta fosse considerada a eleição mais acirrada no Brasil após a redemocratização da República federativa ocorrida em 1985.
Ipso facto o presidente da República anunciou seu novo ministro da Educação: Carlos Decotelli, oficial de reserva da Marinha, o terceiro ocupante do comando do Ministério da Educação e Cultura (MEC) no atual governo, depois da demissão de  Weintraub e de Vélez. A nomeação de Decotelli foi vista como mais um aumento de protagonismo militar no governo Bolsonaro, neste caso, particularmente, da Marinha. De perfil mais moderado que seu antecessor, Decotelli é um acadêmico e também o primeiro ministro negro de Bolsonaro. Durante alguns meses no ano passado, entre fevereiro e agosto, ele comandou o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), autarquia ligada ao MEC que costuma ser alvo de disputas em qualquer governo, por gerir um orçamento bilionário (de R$ 55 bilhões em 2019) e ser responsável por financiar alguns dos principais programas da educação básica pública nos municípios, como transporte e infraestrutura escolar. Um dos programas priorizados no período pelo fundo, o Educação Conectada, ganhou as manchetes meses depois, quando a Controladoria-Geral da União encontrou inconsistências em um edital de R$ 3 bilhões de um pregão para a compra de equipamentos de tecnologia educacional.
Foi nomeado ministro da Educação em 25 de junho de 2020, mas cinco dias depois renunciou antes de assumir o cargo, em virtude de uma série de controvérsias em relação à titulação acadêmica informada em seu currículo, não chegando a tomar posse. Em 2008, Decotelli defendeu dissertação de mestrado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), apresentando uma dissertação com o tema Banrisul: do PROES ao IPO com Governança Corporativa. Em junho de 2020, logo após a nomeação como Ministro da Educação, Decotelli foi acusado literalmente por Thomas Conti, professor do Insper, “de ter plagiado pelo menos 10% da sua dissertação de mestrado, concluída em 2008, a partir de um relatório da Comissão de Valores Mobiliários publicado em fevereiro do mesmo ano. Segundo Conti, 4.200 palavras foram copiadas diretamente desse relatório para a dissertação”.  Em 2009, cursou um doutorado em Administração na Universidade Nacional de Rosário, na Argentina. Apesar de nunca o ter finalizado, apresentava-se no currículo vitae na Plataforma Lattes como tendo concluído o doutorado, com a tese: Gestão de Riscos na Modelagem dos Preços da Soja, orientada por Antônio de Araújo Freitas Jr. No ato presidencial da nomeação como Ministro da Educação brasileira, Decotelli foi apresentado por Jair Messias Bolsonaro como doutorado por aquela universidade.
O Conselho da Igreja Presbiteriana Jardim de Oração, da qual o pastor Milton Ribeiro, novo ministro da Educação, é reverendo, parabenizou a escolha do presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL) para a pasta da Educação. Em nota, o conselho da igreja, sediada em Santos (SP), afirmou que a nomeação do pastor para o Ministério da Educação (MEC) é “o triunfo da integridade, da sólida confiança em Deus e da convicção de que a família é projeto de Deus”. - Um homem não pode receber coisa alguma, se do céu não lhe for dada (João 3, 27), declarou João Batista. “É assim que recebemos a nomeação de nosso pastor: como obra de Deus e não de homem”, escreveu o conselho pastoral. O novo titular da Educação, pastor Milton Ribeiro, disse, em vídeo publicado após o 2° turno das eleições de 2018, que o existencialismo – filosofia que coloca o indivíduo como centro do pensamento – é algo que estão ensinando “para os nossos filhos na universidade” para incentivar uma “prática totalmente sem limites do sexo”, o que demonstra ignorância simbólica sobre sexualidade de um ultraconservador.
Atualmente, o pastor Milton Ribeiro é reverendo da Igreja Presbiteriana Jardim de Oração, em Santos. Ao anunciá-lo como ministro da Educação, o presidente frisou seu doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (2006). A universidade já confirmou a autenticidade do título acadêmico, mas a tese não discutiu políticas públicas. O trabalho dissertou sobre a educação escolar como “pressuposto da organização institucional calvinista e não apenas seu resultado”. O novo ministro é especializado também no estudo do Velho Testamento. Quem o reconhece diz que não há nele uma postura ideológica, de acreditar que os professores de história são comunistas - e que é um homem educado e discreto. Sua indicação está sendo atribuída ao Ministro-chefe da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, e ao ministro da Justiça, André Mendonça, também presbiteriano. Ele não teria agradado necessariamente a ala evangélica que apoia o presidente. O grupo havia indicado o atual reitor do Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA), Anderson Correa. – “Milton é indicação do ministro da Justiça, que é presbiteriano como ele. Não posso falar nada contra o novo ministro porque seria uma injustiça, eu não o conheço. Mas não venha dizer que ele é apoiado por evangélicos, que nós não temos nada com isso. É uma escolha do presidente junto com o ministro da Justiça”, disse Silas Malafaia (cf. Cafardo e Soares, 2020).
O tema da diferença e da identidade cultural assim como o reconhecimento da diversidade e da diferença apresenta-se como irredutível a esquemas explicativos gerais eficazes. É justamente isso que torna o debate profícuo e particularmente criativo e aberto. A sua riqueza consiste justamente na multiplicidade de perspectivas que interagem. Que não podem ser reduzidas a um único código e/ou a um único esquema proposto como modelo transferível universalmente. Tal debate polissêmico e polifônico é motivado, contudo, por uma necessidade teórica, histórica e ideológica que se manifesta nas mais diferentes práticas sociais. Na governabilidade o estereótipo resulta  um instrumento que justifica a incoerência de atitudes, assim como comportamentos pessoais e perversos individual (o sonho) ou coletivamente (os mitos) no âmbito dos conflitos sociais e políticos gerados nas sociedades. O poder é legitimado através da mediação da autoridade. Enquanto legitimidade pressupõe consenso mais ou menos explícito e generalizado, onde a legitimação refere-se ao modo de obtenção desse consenso entre os membros de uma coletividade. Da natureza da legitimação derivam os tipos de obediência, bem como o caráter e os efeitos sociais do seu exercício.
As declarações do novo ministro da educação contrariam a lei. No Brasil, vigora  desde 2015 a Lei da Palmada de nº 13.010 que mudou o Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90) e o Código Civil Brasileiro (lei 10.406/02) “para estabelecer o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante”. Para o ministro da Educação, a correção dos filhos “não ocorrerá por meios justos e métodos suaves”. Para ele, esse tipo de abordagem surtiria efeito específico apenas em crianças mais desenvolvidas, ou superdotadas. - “A correção necessária para a cura não vai ser obtida por meios justos e métodos suaves. Talvez uma porcentagem muito pequena de crianças precoces, superdotadas é que vai entender o seu argumento. Deve haver rigor, desculpe, severidade”. Filhos ‘devem sentir dor’ para aprender. É o que diz o novo ministro da Educação o Pastor Milton Ribeiro, como consta em um vídeo de uma de suas pregações. Nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido político) para assumir o comando do Ministério da Educação (MEC), o pastor evangélico defende que os pais apliquem castigos físicos como forma de educar e obter a “correção necessária para a cura”.

Em 2018, em suas declarações Ribeiro afirmou que o existencialismo estava sendo ensinado nas universidades, e que estava incentivando os alunos a terem relações sexuais desconsiderando quem é o parceiro: - Para contribuir ainda mais em termos negativos para uma prática totalmente sem limites do sexo veio a questão filosófica do existencialismo, em que o momento é que importa. Não importa se é A, B, se é homem ou se é mulher, se é esse, se é aquele, se é velho, se é novo. Não interessa. O que interessa é aquele momento. […]. É isso que eles estão ensinando para os nossos filhos na universidade. Ribeiro também culpou os métodos anticoncepcionais, como a pílula do dia seguinte, pela má conduta sexual: - O mundo foi perdendo a referência do que é certo e do que é errado em termos de conduta sexual. E isso foi trazendo muitas dificuldades porque agora a gravidez indesejada não é mais um risco.

Durante uma pregação intitulada “A vara da disciplina”, proferida por Ribeiro em uma igreja presbiteriana em abril de 2016, Ribeiro defende o castigo físico para a educação de uma criança. Segundo ele, “essa ideia que muitos têm de que a criança é inocente é relativa”, que um bom resultado “não vai ser obtido por meios justos e métodos suaves” e que as crianças “devem sentir dor”. Em 11 de julho de 2020 – um dia após a nomeação de Ribeiro para o Ministério da Educação –, devido ao clamor público a respeito de sua posição, Ribeiro apagou a gravação em vídeo da pregação de seu canal no YouTube. Em 16 de julho de 2020, durante seu discurso de posse, afirmou: “Jamais falei em violência física na educação escolar e nunca defenderei tais práticas, que fazem parte de um passado a que não queremos voltar”. Em setembro de 2020, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro Milton Ribeiro relacionou a homossexualidade a “famílias desajustadas”, tendo afirmado: - “Acho que o adolescente, que muitas vezes, opta por andar no caminho do homossexualismo, tem um contexto familiar muito próximo, basta fazer uma pesquisa. São famílias desajustadas, algumas. Falta atenção do  pai, falta atenção da mãe”.

Na visão do ministro, os alunos com deficiência na mesma sala que os alunos sem deficiências “atrapalhava o aprendizado dos outros, porque a professora não tinha equipe, não tinha conhecimento para dar a ela, atenção especial”. Ainda segundo o ministro, existem crianças com “um grau de deficiência que é impossível a convivência”. Em uma tentativa de se explicar, ministro afirmou que “atrapalham, deixa eu explicar para vocês. Nós temos, hoje, 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam nas escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência que é impossível a convivência” e explicou a ação do governo, ao dizer que “em vez de simplesmente jogá-los dentro de uma sala de aula, pelo ´inclusivismo`, nós estamos criando salas especiais para que essas crianças possam receber o tratamento que merecem e precisam”. Para o ministro, os reitores das universidades federais não podem ser 'esquerdistas, nem lulistas'. Segundo ele, os reitores: - “Não precisa ser bolsonarista. Mas não pode ser esquerdista, nem lulista. Reitor tem que cuidar da educação e ponto final. E respeitar todos que pensam diferente”.

Palmatória ou férula é um instrumento de poder, geralmente de madeira, usado para castigar alguém com golpes na palma da mão. No contexto da monarquia, surgem os infantes: o termo vem do latim, como “o que não fala”, e começa a ser utilizado a partir de 1205, em Portugal, para falar dos príncipes: o infante é o que ainda está sendo criado, por isso ainda não fala, por razões da idade. Diferente das outras crianças, as plebeias, o príncipe infante é aquele que um dia estará autorizado a falar o direito, ditando-o para a sociedade. Para alcançar a categoria de adulto no âmbito da história social da infância e ser criado, virtudes cristãs precisariam ser normalizadas, para assim, governar bem. Baseada em racionalidade teológico-cristã e uma educação como modelo de progresso da razão, ocorre a ratio de uma criatura frágil e maleável, que será dominada pelas deformações morais decorrentes do pecado original se for deixada à própria sorte.  A alma infantil é dominada pela anarquia que poderá ser contida, no entanto, por meio do exemplo e da correção da família cristã e dos mestres qualificados.
O castigo representou o principal meio disciplinar encontrado para doutrinar essas criaturas indomáveis: o mestre modela os hábitos infantis, visando resfriar e canalizar a natural abundância de calor do caráter inquieto da infância para o fim superior do autocontrole. Historicamente o uso da palmatória foi introduzido pelos jesuítas, como forma de disciplinar os indígenas resistentes ao processo de aculturação seletiva. O papel decisivo em sua formação foi representado pela escravidão que, operando como força distribalizadora, desgarrava as novas criaturas das tradições ancestrais. São produto tanto da deculturação redutora de seus patrimônios tribais indígenas e africanos, quanto da aculturação seletiva desses patrimônios e criatividade face ao novo meio de reprodução da vida. A prática foi perpetuada pelo monopólio da escravidão africana. Os senhores a utilizavam em inúmeros castigos aplicados aos negros desobedientes. No século XIX, quando a educação dava seus primeiros passos de caracol, a palmatória disseminou do controle social da senzala para a escola.
Ele se insere com a Lei Imperial de 15 de outubro de 1827, que, entre diversas prescrições, incide sobre a proibição dos castigos físicos nas escolas, substituindo-os pelo de cunho moral. Contudo, os resultados frustrados levaram ao regresso da palmatória, a qual passa a obter conteúdo de sentido nos corredores e no interior das salas de aula. O processo social de comunicação, ensino, aprendizagem e controle do tempo em seu ersatz estão intimamente vinculados à divisão social do trabalho, a construção das idades sociais, decorrente da formação em especial, das crianças e adolescentes. As representações sociais sobre o trabalho e as práticas dos jovens que se desenvolve, que se expressa na justificação e legitimidade da vigilância e na supervisão dos tempos e dos movimentos. As minúcias com que são elaborados os calendários escolares, os programas, os horários e as atividades são exemplos evidentes de que um dos papéis sociais centrais desempenhados pelas instituições escolares é a normalização da educação. Com base nisso, se estabeleciam os ritmos disciplinares.
Essas instituições representam uma relação de poder permeada pelo controle, distribuição do tempo e usos dos espaços escolares, onde se executam as atividades com regularidade e em etapas bem delimitadas. Por exemplo: horário para ingresso, horário para saída, tempo de cada aula, intervalos regulados entre uma aula e outra, tempo para recreio. As instituições educativas prescrevem minuciosamente cada uma das atividades que devem ser executadas num determinado tempo, um tempo medido, controlado, disciplinado. O espaço por excelência de vivência e controle do corpo discente é na prática a sala de aula, isso não implica dizer que não existam outros espaços ocupados pelos alunos: o pátio, os corredores, os banheiros, a biblioteca, a sala do diretor, etc. Diversos são os espaços de circulação, contudo nenhum se equipara ao espaço da sala de aula. Do ponto de vista pedagógico, as carteiras individuais são consideradas as mais aptas para as escolas. Elas possibilitavam uma maior distância entre os alunos, coibindo, dessa forma, bagunças e desordens. Isolava securitariamente os corpos, em razão de normas, garantindo a disciplina, o estudo, e a melhor vigilância por parte do professor. A base para esse nexo causal em que se dá a relação social da vivência é a categoria do significado. Tal categoria social corresponde a um apoio sólido que aparece como uma unidade de conjunto onde age o pensamento, os sentimentos e a vontade. Considerando que há um balanço parte e todo no nexo da vivência, o que garante o equilíbrio para esse balanço. 

 É a categoria do significado que para Wilhelm Dilthey, nada mais é do que a integração num todo que nós encontramos junto e nos remete ao significado e sentido contido na relação parte-todo que encontra na vivência e é seu fundamento. É neste sentido que consideramos que vida e as mudanças sociais de seus principais momentos estruturais fazem que a concepção do mundo sempre e em toda a parte se expresse em oposições, embora sobre um fundo comum. Portanto é  na arte, na religião e no pensamento que encarnam os ideais que atuam na existência de um povo. Por conseguinte, toda a mundividência é produto da história. A historicidade revela-se como uma propriedade fundamental da consciência humana. Os sistemas filosóficos não constituem uma exceção. Como as religiões e as obras de arte, contêm uma visão da vida particular e do mundo, inserida na vitalidade das pessoas que os produziram e em consonância com as épocas em que vieram à luz do dia; traduzem uma determinada atitude afetiva, caracterizam-se pela imprescindível energia lógica, porque o filósofo procura trazer a imagem do mundo à clara consciência e ao mais estrito urdimento cognitivo. Neste esforço de reflexão teórica e de trabalho dos conceitos, que gera uma circunspecção potenciada, é que reside o valor prático da atitude filosófica.
Como o centro da compreensão está na vida como um todo estruturado, mas sempre resultando da relação entre individualidades, é possível perceber a conexão entre a ética e a teoria compreensiva. Em verdade uma concepção da teoria, ao longo de quase meio século, permeada lado a lado por um motivo básico: uma unidade cuja garantia de existência é a presença do sentido. Há uma démarche que atravessa o homem, e nesta noção de sentido está a marca de uma concessão fatal a uma metafísica.  Ele desejava evitar tanto quanto o empirismo dos positivistas, desde que fique clara a dimensão de ser criador de significados, que não é simplesmente a noção ampla de vida, mas sua unidade constitutiva, a vivência, representada em toda experiência humana. Ipso facto, a história é suscetível de conhecimento porque é obra humana; nela o sujeito e objeto do conhecimento formam uma unidade. Nessa direção chega-se à formulação final da concepção de Dilthey. Seus elementos são: vivência, expressão e compreensão. A vivência surge nesse ponto, como algo especificamente social – pela sua dimensão intersubjetiva, e cultural – pela sua dimensão significativa -, para além do seu nível psicológico ou mesmo biológico porque guarda na memória. Trata-se de um ato reflexivo de consciência, que propõe e persegue fins num contexto intersubjetivo.
O Ministério da Educação representa o calcanhar de Aquiles dos programas governamentais desde a redemocratização retomada em 1985. Há uma disputa interna historicamente constituída na área da educação sobre qual projeto de governo deve ser institucionalizado. Os grupos de burocratas em conflito poderiam ser chamados de “pragmáticos” e “ideológicos”. Os primeiros tem como representação a ideologia de segurança nacional desenvolvida entre os militares, que foram os primeiros a serem envolvidos na campanha de Jair Bolsonaro (PSL). Este grupo social inclui ao menos um coronel que tem afinidades eletivas com o atual ministro. Os segundos são extremistas seguidores declarados do escritor fascista Olavo de Carvalho, e também ex-alunos do ministro demissionário Ricardo Vélez. Parte da elite militar no Ministério de Educação e Cultura pode ser considerada pragmática e compõe o grupo que ajudou na elaboração das propostas messiânicas de Bolsonaro. Dentre as propostas, estava a defesa da educação a distância, a criação de colégios militares em capitais e a modernização da gestão na pasta. Os seguidores do falso filósofo Olavo de Carvalho se incorporaram  depois da controversa vitória de Bolsonaro, articulada pelas estratégias de força em torno da demanda securitária, a moralidade dos costumes, a previsível desqualificação do Estado (corrupto e paternalista) e a na explosão do debate, a rica temática da intolerância interpessoal, facilitada pela mídia tiveram atritos com os que já participavam das discussões sobre educação desde iniciada campanha. 
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