A Lei Ficha Limpa “parece
ter sido feita por bêbados”. Ministro Gilmar Mendes
O princípio da “presunção da
inocência” ou princípio da “não culpabilidade”, segundo parte da doutrina
jurídica é um princípio jurídico de ordem constitucional. Quando aplicado no
direito penal estabelece o estado de inocência como regra em relação ao acusado
da prática de infração penal. Está previsto expressamente pelo artigo 5º,
inciso LVII, da Constituição Federal, que preceitua que “ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Isso significa dizer que somente após um processo concluído, compreendido como aquele
de cuja decisão condenatória não mais caiba recurso, em que se demonstre a culpabilidade
do réu é que o Estado poderá aplicar uma pena ou sanção ao indivíduo condenado.
Em termos jurídicos, esse princípio se desdobra em duas vertentes: como “regra
de tratamento”, no sentido de que o acusado deve ser tratado como inocente
durante todo o decorrer do processo, do início ao trânsito em julgado da
decisão final, e, como “regra probatória”, no sentido de que o encargo de
provar as acusações que pesarem sobre o acusado é inteiramente do acusador, não
se admitindo que recaia sobre o indivíduo acusado o ônus de “provar a sua
inocência”, pois essa é a regra. Trata-se de uma garantia individual
fundamental e inafastável, corolário de princípio lógico do Estado Democrático
de Direito.
“Ficha
Limpa” é a designação mais precisamente e que ficou vulgarizada no Brasil, na
mídia como “capital da notícia”, mas principalmente no meio policial é uma Lei
Complementar nº 135 de 2010 que foi emendada à “Lei das Condições de Inelegibilidade”
ou Lei Complementar nº 64 de 1990, originada de um projeto de lei de iniciativa
popular idealizado pelo juiz Márlon Reis, entre outros juristas, que reuniu
cerca de 1,6 milhão assinaturas com o objetivo de aumentar a idoneidade dos
candidatos. Márlon Jacinto Reis, é juiz de Direito, Titular da 58ª Zona
Eleitoral do Maranhão, conhecido pela defesa da lei “Ficha Limpa”, um dos mais
influentes segundo a revista Veja. Foi o primeiro juiz à impor aos candidatos a
prefeito e a vereador revelar os nomes dos financiadores de suas respectivas
campanhas antes da data da eleição. Marlon Reis é um dos fundadores do “Movimento
de Combate à Corrupção Eleitoral”. Conquistou o prêmio do Instituto Innovare (2004),
na categoria Juiz Individual, “em reconhecimento as suas práticas pela melhoria
da Legislação Eleitoral no Estado do Maranhão”. Publicou o livro: “O Nobre
Deputado - Relato chocante (e verdadeiro) de como nasce, cresce e se perpetua
um corrupto na política brasileira” (2014).
O
juiz Marlon Reis, membro do “Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral” e um
dos articuladores do projeto de autoria popular que resultou na “Lei da Ficha
Limpa”, relata práticas de corrupção em seu livro: "O Nobre Deputado -
Relato chocante (e verdadeiro) de como nasce, cresce e se perpetua um corrupto
na política brasileira". Um caso verídico, demonstrando os terríveis
efeitos da corrupção, é o de Benedito Leite (MA), um carente município de um
dos mais pobres estados brasileiros, um convênio no valor de R$ 970 mil foi
firmado em 2009 com a prefeitura local para a construção de uma pequena escola.
Quatro anos depois, a construção, inacabada, ruiu. O autor relata práticas do
deputado Cândido Peçanha, personagem que é fictício, mas as práticas descritas
por eles são reais. "O trabalho de pesquisa foi enriquecido com a análise
de provas colhidas em processos judiciais". Reis realizou entrevistas em
diversos Estados brasileiros e concluiu que há um padrão na adoção de certas
práticas em todas as regiões do País. Entre suas fontes, cujas identidades ele
preserva, há um senador. O livro apresenta duas partes: a corrupção na
arrecadação de dinheiro para as campanhas, feita por meio de doação não
declarada, desvio de dinheiro de emendas parlamentares e convênios, licitações
viciadas e agiotagem, e as artimanhas para converter os recursos arrecadados em
votos, pela compra de apoio e dos próprios votos.
A
lei tem como objetivo tornar inelegível por 8 (oito) anos: a) um candidato que
tiver o mandato cassado, b) ,renunciar para evitar a cassação, ou, c) for
condenado por decisão de órgão colegiado com mais de um juiz, mesmo que ainda
exista a possibilidade de recursos. O Projeto foi aprovado na Câmara dos
Deputados em maio de 2010 e também foi aprovado no Senado Federal em maio de
2010 por votação unânime. Foi sancionado pelo Presidente da República,
transformando-se na Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010. Esta lei
proíbe que políticos condenados em decisões colegiadas de “2ª Instância” possam
se candidatar. Em fevereiro de 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou
a lei constitucional válida para as eleições subsequentes que foram realizadas
em 2010, para a compreensão da posição política defendida pelo Tribunal
Superior Eleitoral (TSE).
Após
a decisão do TSE que confirmou a validade para as Eleições de 2010, por conta
de críticas feitas por integrantes do STF contrários à aplicação da lei, como o
Ministro Gilmar Mendes e Marco Aurélio, vários candidatos barrados pela lei da
Ficha Limpa entraram na justiça, rumo ao Supremo, para terem o direito de se
candidatar alegando que lei seria inconstitucional ou que ela não poderia valer
para aquele ano já que existe uma outra lei contrária a alterações no processo
eleitoral no mesmo ano das eleições. Os que estavam a favor da aplicação da lei
naquele mesmo ano alegaram, entre outros motivos, que a lei não alteraria o
processo eleitoral, mas apenas as regras para inscrição dos candidatos. No dia
22 de setembro, a menos de um mês das eleições, os ministros do STF começaram o
julgamento de Joaquim Roriz, ex-senador que renunciou ao seu mandato em 2007
para escapar de um processo por quebra de decoro parlamentar e tentava disputar
o governo do Distrito Federal pela quarta vez, teve seu registro impugnado por
tribunais inferiores. O resultado deste julgamento seria importante, pois iria
definir todos os outros casos naquela eleição.
Após
o ministro Carlos Ayres Britto, relator do caso, ter votado a favor da lei da
Ficha Limpa ser aplicada a Roriz, o presidente Cezar Peluso interrompeu o
processo para questionar um fato que não foi suscitado: a possível
inconstitucionalidade formal da lei. Isso causou surpresa nos outros
magistrados e, após um impasse, o ministro Dias Toffoli pediu vista do recurso.
O julgamento foi retomado já no dia seguinte, 23. E o resultado da votação dos
magistrados ficou empatado com cinco ministros votando a favor e cinco contra: A
favor: Carlos Ayres Britto, Carmem Lúcia, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski,
Ellen Gracie Northfleet. Contra: Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio
Mello, Celso de Mello, Cezar Peluso. O STF contava no momento do julgamento com
apenas dez ministros, pois o Ministro Eros Roberto Grau aposentou-se
voluntariamente em 2 de agosto de 2010 [13] e o cargo ainda não havia sido
preenchido. Estando o pleno do tribunal com um número par de ministros e tendo a
votação empatada em 5 a 5, surgiu a dúvida de qual resultado declarar.
Depois
de intensa argumentação dos ministros, Cezar Peluso, o presidente do STF, optou
por suspender o julgamento sem a proclamação do resultado. Não foi dada pelo
pleno do tribunal uma previsão para a retomada do julgamento, mas, segundo
especulação do jornal “O Globo”, a “expectativa é de que os ministros voltem à
questão na próxima quarta-feira, a quatro dias da eleição”. Segundo essa
reportagem, nota-se que as possíveis soluções para o julgamento estão alinhadas
ao próprio voto de cada ministro: Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia, Joaquim
Barbosa, Ellen Gracie e Carlos Ayres Britto (relator do caso) propõem que seja
mantida a decisão do TSE, que se aplique a Lei Ficha Limpa já neste ano,
Contudo, Antônio Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio sugerem que o
tribunal aguarde a nomeação de um novo ministro, para que então o tribunal
decida usando o voto do recém-nomeado como “voto de minerva”; ou que tal voto
seja dado pelo presidente do Supremo. Quanto a esta hipótese, o presidente Cezar Peluso, apesar de
ter integrado um dos cinco votos contra a aplicabilidade da lei, rechaça-a
argumentando não ter “vocação para déspota”.
No
dia 23 de março de 2011, a validade da lei nas eleições 2010 foi derrubada por
6 votos a 5 no Supremo Tribunal Federal. O voto do ministro Luiz Fux — que
havia chegado à corte há um mês, após a aposentadoria de Eros Grau — decidiu
pela invalidade da lei. A Constituição a esse respeito diz textualmente que
qualquer lei que altere o processo eleitoral “não valerá para as eleições até
um ano da data de sua vigência”. A decisão da não-aplicação da lei beneficiou
diretamente vários candidatos cuja elegibilidade havia sido barrada por causa
de processos na Justiça, como Jader Barbalho, Joaquim Roriz e João Capiberibe.
A Lei da Ficha Limpa passa a valer apenas a partir das eleições municipais de
2012, e será de fato aplicada apenas se passar em uma nova votação para decidir
sobre sua constitucionalidade. Apesar do fundamento constitucional para a
aplicação da lei, houve protestos por parte da sociedade e de alguns políticos,
como as senadoras Marinor Brito e Heloísa Helena e o senador Pedro Simon, que se
lembrou da mobilização popular e das entidades da sociedade civil para a
construção da democracia no Brasil, e que a “Lei da Ficha Limpa” foi de
iniciativa popular e contou estatisticamente com mais de 1,6 milhões de
assinaturas.
No
dia 16 de fevereiro de 2012, o STF decidiu que a lei da “Ficha Limpa” não
desrespeitava a Constituição e que, portanto, é válida para as eleições de 2012
e para os próximos pleitos eleitorais que estão por vir. Dos ministros do STF,
sete votaram a favor da lei e quatro foram contrários. Os votos favoráveis
basearam-se no “princípio da moralidade”, que consta no parágrafo nono do
artigo 14 da Constituição Federal do Brasil e diz que “lei complementar
estabelecerá casos de inelegibilidade a fim de proteger a probidade
administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida
pregressa do candidato”. Os quatro votos contrários foram argumentados com base
no chamado princípio de “presunção da inocência”, previsto no inciso 57 do
artigo 5º (cláusula pétrea) da Constituição, que diz que ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Como a Lei da Ficha Limpa diz que quem for condenado por órgão colegiado, mesmo
que ainda haja possibilidade de recursos, irá se tornar inelegível, os
ministros contrários à constitucionalidade da lei julgaram esse trecho da
legislação como inconstitucional. O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a
presunção da inocência é válida para casos penais, não sendo amplo o suficiente
para atingir o texto da Ficha Limpa.
A
lei prevê a inegibilidade de candidatos que tenham sido julgados culpados por
tribunais de conta, entidades de classe entre outras, sem que, no entanto, a
condenação ter sido transitada em julgado. Com isso, argui-se que a lei vai de
encontro com o inciso LVII do artigo 5º da Constituição brasileira, o inciso
que diz respeito a presunção de inocência. E, além disso, como esses tribunais
e entidades não detém a última palavra na justiça brasileira, o ministro Gilmar
Mendes e o colunista Reinaldo Azevedo acreditam que uma condenação “viciada”
barraria candidatos que não seriam necessariamente condenados na justiça. Assim
poderiam criar-se diversos tribunais com amplo poder de decisão fora da
estrutura jurídica. Por exemplo, tribunais de contas que podem não aprovar a
conta de prefeitos, que ficariam assim inelegíveis. Como a nomeação de juízes
dos tribunais de conta é feita pelos governadores estaduais, teme-se o uso
político dos tribunais de conta estaduais, tornando inelegíveis prefeitos opositores
ao governo estadual. Teme-se que a legislação fira o princípio de “presunção da
inocência”, tornando inelegíveis as candidaturas de pessoas inocentes.
Na
primeira vez que a regra foi aplicada na disputa para prefeito e vereador, em
2012, o TSE recebeu quase oito (8) mil recursos referentes a impugnação de
candidatura, sendo que aproximadamente três mil foram baseadas na Lei da Ficha
Limpa. Os quase cinco (5) mil casos neste ano foram identificados após
cruzamento do CPF dos candidatos registrados com bases de dados de tribunais de
Justiça, tribunais de contas e outros órgãos de controle. Um sistema do
Ministério Público Federal (MPF) fez o cruzamento e os dados foram enviados aos
cerca de três mil promotores eleitorais, que devem verificar se a ocorrência
apontada vai ou não barrar o candidato. O sistema pode encontrar, por exemplo,
uma decisão judicial desfavorável ao político, mas que já está suspensa por uma
liminar. No STF, Gilmar Mendes causou polêmica em julgamento de um caso
envolvendo a rejeição das contas de candidatos. O número detectado até agora
pode estar subestimado, acredita o Ministério Público Eleitoral. Além do TSE
não ter validado todos os registros de candidaturas até o momento, há diversos
casos de “falso negativo” – quando o sistema não verifica pendências do
político pelo CPF, mas ele é inelegível. Ana Paula Mantovani, procuradora da
República e coordenadora nacional do Grupo Executivo Nacional da Função
Eleitoral estima que ao menos 10 mil recursos questionando registros de candidatura
cheguem ao TSE. Mesmo com prazos curtos para impugnação de registro, segundo
previsão, nem todos os casos sejam solucionados antes do primeiro turno, que
ocorre no dia 2 de outubro. – “Podemos ter muitos candidatos concorrendo sem a
definição com relação ao registro. Se ao final a decisão (do TSE) for pela
improcedência do recurso todos os votos são anulados”, afirmou a procuradora da
República.
Bibliografia
geral consultada:
Artigo: “Eleições 2014: Brasil precisa
se livrar do PMDB, diz Cid Gomes”. Disponível em: http: diariodonordeste.verdesmares.com.br/27.10.2014;
Artigo: “TRE julga improcedente ação de abuso de poder contra Cid e Camilo”. In:
http://g1.globo.com/ceara/2016/02/15;
FAORO, Raymundo, Os Donos do Poder -
formação do patronato político brasileiro. Porto Alegre: Editor Globo,
1958; Idem, Machado de Assis - a pirâmide
e o trapézio. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1974; Idem, Assembleia Constituinte - A Legitimidade
Recuperada. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981; Idem, Existe um pensamento políticobrasileiro? São Paulo: Editora Ática,
1994; Idem, “A aventura liberal numa ordem patrimonialista”. In: Revista USP. São Paulo, n°17, 1998, pp.
14-29; SOUZA, Jessé, “A Terapia Weberiana da Modernidade”. In: Sociedade e Estado, v. 5, n°1, pp.
93-104, 1990; Idem, “Homem, Cidadão: Ética e Modernidade em Weber”. In: Lua Nova. Revista de Cultura e Política, v. 33, n° 32, pp. 135-143, 1994;
Idem (org.), O malandro e o protestante:
a tese weberiana e a singularidade cultural brasileira. Brasília: Editora
UnB, 1999; BERRIEL, Carlos E. O, “Utopie, distopie et histoire”. In: Morus – Utopia Renascimento, n°
3, 2006; CARROL, Lewis, Aventuras de
Alice no País das Maravilhas; Através do Espelho e o que Alice encontrou por
lá. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009; entre outros.
_________________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
“Se os
pensamentos não são entes, então o ente não é pensado”. Górgias
A Livre-docência
é um título concedido no Brasil por uma IES - Instituição de EnsinoSuperior,
mediante concurso público aberto, desde setembro de 1976, exclusivamente para
portadores do título de doutor, e que atesta uma qualidade docente e de
pesquisa. O concurso de livre-docência é aberto por edital e o candidato
inscrito deverá, além de submeter-se a uma prova escrita e a uma prova
didática, desenvolver também uma tese monográfica ou cumulativa sobre um tema acadêmico e defendê-la perante uma banca
examinadora. Dependendo da área, como por exemplo, a música, uma prova prática
pode também ser exigida no concurso. A categoria Livre-Docência é regulada pela
Lei nº. 5.802/72 e nº. 6.096/74 e pelo Decreto 76.119/75 e pelo Parecer 826/78
do extinto Conselho Federal de Educação. Diferente da livre-docência é o título
de Notório Saber, que é concedido com base no parágrafo único do art. 66 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional. Ela define e regulariza a organização da educação brasileira com base nos princípios presentes na Constituição. Foi citada pela primeira vez na Constituição de 1934. A primeira LDB foi criada em 1961, seguida por uma versão em 1971, que vigorou até a promulgação da mais recente em 1996.
Anteriormente,
a Livre-Docência era aberta a qualquer professor da IES, mas desde 11 de
setembro de 1976 só podem candidatar-se professores já portadores do título de
doutor. Na Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP) e Universidade Estadual Paulista (UNESP), a livre-docência é
requisito para a candidatura ao cargo de professor Titular e o Livre-Docente
recebe o título de professor-associado, quando já pertence ao quadro docente da
universidade, mas o título pode ser obtido também por doutores externos à
universidade. Nas universidades federais, a Livre-Docência praticamente
desapareceu, dado que o doutor já é professor-adjunto e pode, havendo vaga,
prestar concurso para professor Titular. Aparentemente, a Livre-Docência perdeu
seu sentido nas universidades federais e estaduais. Honrosas exceções são a
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) que, a exemplo das suas congêneres
paulistas, mantém os concursos de Livre-Docência e a Universidade Estadual do
Ceará (UECE) que provê o concurso público de provas e títulos através da
Resolução n° 788/2011 – CONSU, de 21 de fevereiro de 2011. A Livre-Docência é o
estágio mais elevado da carreira universitária e pode ser atingido apenas
por concurso público de provas e
títulos por competência, e o que é importante no âmbito da carreira é que constitui-se de forma independente
da disponibilidade de vagas na carreira funcional.
Existe uma diferença entre o Privatdozent
alemão e o norte-americano, posto que em geral o alemão deve se preocupar menos
com a docência. Na América do Norte, afirma o sociólogo Max Weber, a carreira
começa normalmente, de forma muito diferente, a saber, com a nomeação de
Assistant. De modo análogo ao que costuma acontecer entre nós nos grandes
institutos das faculdades de ciências e de medicina, em que só uma pequena
parte dos assistentes e, muitas vezes, já tarde, aspira à habilitação formal
como “Privatdozent”. O contraste significa, na prática, a carreira que um homem
de ciência se constrói, em última análise, totalmente em pressupostos
plutocráticos. Pois é um risco extraordinário para um cientista jovem, sem bens
materiais de fortuna, expor-se às condições da carreira acadêmica. Deve, pelo
menos durante alguns anos, poder sustentar-se com os seus próprios meios, e
mais tarde, terá a possibilidade de obter um lugar ao sol que lhe permita
viver.
Nos
Estados Unidos da América (EUA) vigora o sistema burocrático como ordenamento dos sistemas sociais e políticos. Na educação o jovem é
remunerado, desde o início. Com moderação, sem dúvida. O salário, na maioria
dos casos, dificilmente corresponde ao nível da remuneração de um operário
medianamente qualificado. De qualquer modo, ele começa com uma posição
aparentemente segura, pois recebe um salário fixo. A regra, porém, tal como
acontece com os nossos Assistentes, é ele poder ser despedido, e deve contar
com isso de um modo bastante impiedoso, se não corresponder às expectativas.
Consistem estas em ele serem capaz de “encher a sala”. Eis algo que não pode
acontecer a um “Privatdozent” alemão. Uma vez nomeado, já não pode ser destituído.
Não têm “direitos, é certo; mas dispõe da convicção natural de, após vários
anos de atividade, ter uma espécie de direito moral a alguma consideração por
ele. Inclusive - isto é, muitas vezes, importante - quando se trata da eventual
habilitação de outros trabalhadores Privatdozent”.
Na Universidade Estadual do
Ceará (UECE) é o Reitor que no uso de suas atribuições legais e estatutárias, tendo em
vista o que consta do Processo SPU Nº 10129261-9 e da deliberação unânime dos
membros do Conselho Universitário - CONSU, em sua reunião de 21 de fevereiro de
2011, Resolve: Art. 1º - Estabelecer os procedimentos para a Habilitação à
Livre Docência, que levam ao Título de Professor Livre Docente, observados o
que dispõe a presente Resolução. Parágrafo Único - O título de Professor Livre
Docente é de natureza meritória, pontuando para ascensão funcional por
progressão, visto que o mesmo resulta de processo seletivo interno, não gerando
direito a gratificação de incentivo ou promoção por titulação, não gerando
direito a gratificação de incentivo ou promoção por titulação. Art. 2° - Para
inscrição no processo seletivo, o interessado deverá: I - ser professor classe Titular,
Associado ou Adjunto; Art. 3º - Poderão inscrever-se os prof. doutores da
UECE que desejem agregar valor ao curriculum
vitae ou se submeter a Concurso de Professor Classe Titular. Esse grau acadêmico é considerado o estágio mais elevado da carreira universitária que se pode chegar e atesta uma condição acadêmica qualitativa para/na docência e para/na pesquisa. Normalmente os concursos exigem que o livre-docente possua uma carreira universitária com experiência em ensino e em pesquisa, e título de doutorado, há pelo menos cinco anos, pois consideram que esse período é necessário para o amadurecimento da tese. Também é exigido ao livre-docente, que demonstre capacidade de produzir linha de pesquisa própria, coerente e continuada, bem como, o exercício da docência nas áreas de graduação e pós-graduação, principalmente, orientando dissertações de mestrado e/ou tese de doutorado, orientando assim novos pesquisadores. Também é exigido ao livre-docente, que demonstre capacidade de desenvolver linha de pesquisa própria, em tempo contínuo no mundo contemporâneo, bem como, o exercício da docência nas áreas de graduação e pós-graduação, principalmente, orientando dissertações e/ou tese de doutorado, orientando pesquisadores. A partir da teoria formulada por Immanuel Kant, tendo como escopo a defesa do princípio da incognoscibilidade, e, portanto, acepção que diz a respeito da teoria do conhecimento, quando se trata do estudo da essência perceptiva das coisas. A verdadeira percepção da natureza de qualquer fundamento. A natureza
do conhecimento refere-se a dois aspectos básicos: quando se trata dos
fundamentos indispensáveis ao saber, em referencia a tais sentidos, quando Kant
formulou seu procedimento gnosiológico, resguardando por um lado, o espírito do
idealismo, por outro, o subjetivismo. A importância de entender tais fundamentos,
a essência das coisas materiais ou espirituais, que existem fora independente de nossa consciência, em que o
sujeito de algum modo tem necessidade do entendimento. Só podemos conhecer o
fenômeno a coisa para nós, a manifestação exterior da coisa em si, tal como ela
apresenta a nossa percepção, do modo que chega até ao sujeito, o conhecimento
não determina a essencialidade de um fato, não sintoniza a complexidade da
referência, a dificuldade epistemológica do saber. O que significa que a
matéria do conhecimento vem tão somente do objeto, dada pela experiência, a
forma do conhecimento procede também do
sujeito não anterior a experiência pelo
menos em parte, a defesa da
valorização do campo empírico aplicado a lógica do entendimento, na
perspectiva indutiva. Apresentando as formas do conhecimento e suas relações
com a subjetividade e objetividade, o conhecimento torna se por meio da
posterioridade, ao que se refere ao campo empírico, sendo que o propósito a
priori, as lógicas da convencionalidade servem apenas as deduções construtivas,
a finalidade aplicada ao fundamento da formalidade.
As determinações das
consciências são exatamente duas: a posterior e a priori, significando, portanto, que não existe realidade
objetiva. Para
Kant existe tão somente o nosso espírito, antes e independente de qualquer
experiência, mas o saber relativamente possível verifica-se apenas na aplicação
do método empírico, não por caminhos da metafísica. Assim, existem duas formas
principais de representação do saber epistemológico: da sensibilidade e do
entendimento. As formas das sensibilidades correspondem com o espaço e tempo,
que dão ordem nas sensações caóticas numa justaposição no espaço, na sucessão
do objeto no tempo, tal perspectiva meramente histórica e sucessiva ao campo
das mentalidades. As formas do entendimento denominadas de conceitos puros ou
categorias sintetizam formando o entendimento do mundo exterior nas suas sensibilidades,
idealizado pela lógica do sujeito enquanto consciência formulada a priori. O
princípio do apriorismo kantiano é o da sensibilidade que os objetos são
dados. A sensibilidade nos oferecem intuições empíricas, mas é em ultima
análise o entendimento humano que se reflete de forma objetiva a respeito dos objetos em operação desse conceito aparecem
às formulações teoréticas.
Esse padrão é nosso velho conhecido na
fenomenologia, visto que a filosofia
durante séculos de elaboração utilizou para conhecer. Isto fica claro da
seguinte maneira; se o saber é igual ao conceito e a essência corresponde o
objeto, logo o conceito precisa corresponder ao objeto e vice-versa, basta para
nós, portanto, verificar em nosso exame – diz Hegel – se o objeto corresponde
ao conceito. Por isso, é necessário manter os dois momentos do exame; o
conceito, quer dizer, ser para outro e o objeto consequentemente ser em si
mesmo. Com isso verificamos que não é necessário um “padrão de medida”, um
instrumento que capte o raio, mas, é necessário investigar a
partir do que é dado, embora, aquilo que é dado fique no limite da própria
consciência do que é verdadeiro é consciência do “seu saber da verdade”, pois o
que estabelece a comparação é a própria consciência.
No
que inferimos desta relação entre limitações do discernimento, da consciência
de si e da razão, Hegel se empenhou em apreender e expressar o verdadeiro não
como substância, mas também, na mesma medida, como sujeito. Para Marx, o autor
da “Fenomenologia do Espírito”, não se deu plenamente conta do quanto era
concreta a atividade desse sujeito. “O único trabalho que Hegel conhece e
reconhece” – escreve Marx – “é o trabalho espiritual abstrato”. Não enxerga o
trabalho em toda a sua contraditória materialidade e por isso o idealiza e o vê
de maneira unilateralmente positiva, minimizando a força da sua negatividade: a
essência humana equivale para Hegel à consciência de si, em vez de reconhecer
na consciência de si a consciência de si do homem, quer dizer, “de um homem
real, que vive num mundo real, objetivo, e é condicionado por ele”. Por isso,
Hegel, na leitura Marx, caiu na ilusão de conceber o real como resultado do pensamento, que se encontra em si mesmo, se
aprofunda em si mesmo e se movimenta por si mesmo, enquanto o método que consiste em elevar-se do
abstrato ao concreto é para o pensamento precisamente a maneira de se apropriar
do concreto, de reproduzi-lo como concreto espiritual (cf. Marx, 2011: 248).
Tese de Livre Docência (2016).
Lembramos que
Hegel não é um idealista platônico para quem as Ideias constituem um campo
ontológico superior à realidade material: elas formam um campo pré-ontológico
das sombras. Esta é a tese defendida com sabedoria no ensaio de Slavoj Žižek:
“Less Than Nothing”. Para ele, o espírito tem a
natureza como seu pressuposto e é simultaneamente a verdade da natureza e, como
tal, o “absolutamente primeiro”; a natureza, portanto, “desvanece” em sua
verdade, é “suprassumida” (aufgehoben) na identidade-de-si do espírito: Essa
identidade, afirma Hegel na Lógica: “é
a negatividade absoluta, porque o conceito tem na natureza sua objetividade
externa consumada, porém essa sua extrusão é suprassumida, e o conceito
tornou-se nela idêntico a si mesmo. Por isso só é essa identidade enquanto é
retomar da natureza”. Note-se a estrutura triádica precisa dessa passagem, ao
modo hegeliano mais ortodoxo em sua concepção dialética, todavia exemplar do
ponto de vista da irrefutabilidade do conhecimento de apropriação do real:
tese, o conceito tem na natureza sua objetividade externa consumada; antítese
(“Porém”), essa sua extrusão é suprassumida e, por meio dessa suprassunção, o
conceito atinge a identidade-de-si; síntese (“por isso”), ele só é essa
identidade enquanto é retomar da natureza.
É
nessa maneira que devemos entender a identidade como negatividade absoluta: a
identidade-de-si do espírito surge por sua “relação negativa” (suprassunção)
com esses pressupostos naturais, e essa negatividade é “absoluta” não no
sentido que nega a natureza “absolutamente”, de que a natureza desaparece
“absolutamente” (totalmente) nele, mas no sentido de que a negatividade da
suprassunção (Aufhebung) é autorrelativa; em outras palavras, o resultado
desse trabalho da negatividade é a identidade-de-si positiva do espírito. As
palavras principais dessa passagem são: consumada e só. O conceito “tem na
natureza sua objetividade externa consumada”: não há “outra” realidade
objetiva, tudo o que “realmente existe” enquanto realidade é a natureza, o
espírito não é outra coisa que se acrescenta às coisas naturais. É por isso que
“só é essa [sua] identidade enquanto é retomar da natureza”: não há um espírito
preexistente à natureza que, de alguma maneira, “exterioriza-se” na natureza e
depois se reapropria dessa realidade natural “alienada” – a natureza
completamente “processual” do espírito (o espírito é seu próprio devir, é
resultado de sua própria atividade) significa que o espírito é somente (ou
seja, nada mais que) seu “retorno-a-si-mesmo” a partir da natureza. Em outras
palavras, o “retorno a” é plenamente performativo, o movimento do retorno cria
aquilo para que ele retorne.
Portanto,
ao assumir o conceito hegeliano de dialética, Marx foi levado a modificá-lo,
mas a perspectiva de Marx implicava não só uma reavaliação do papel do trabalho
material na autocriação e na autotransformação do ser humano, como também
exigia uma reavaliação dos trabalhadores como força material de trabalho capaz
de dar prosseguimento à autotransformação histórica da humanidade. Porque pode
fazer história na prática e revolucionar a estrutura dessa sociedade, em sua
transitoriedade assimilando assim as conquistas mais profundas da filosofia.
Utilizando o conhecimento para “superar/conservar” a situação particular de
classe que lhes é imposta. Em sua concepção dialética da história, a filosofia,
assegura Marx, “não pode se realizar sem a superação do proletariado; e o
proletariado não pode se superar sem a realização da filosofia”. O modo de pensar dialético atento à
infinitude do real e a irredutibilidade do real ao saber distingue os planos de
análise e de realidade de quem opera. Implica uma interpretação constante da
consciência no sentido dela se abrir para o reconhecimento do novo, inédito, no
âmbito das “mediações complexas” e das contradições que irrompem no campo
visual do sujeito e lhe revelam a existência de problemas que não estava
enxergando. Hegel é o primeiro a ter visibilidade na Filosofia relevando a
tópica da consciência e da autoconsciência vis-à-vis
à consciência comum.
A
exigência do reconhecimento das contradições pode entrar em choque e, de fato
com frequência entra, com exigências de outro tipo que são exigências ligadas
às tarefas revolucionárias urgentes que a política representa, assim, aos
homens e mulheres que compreendem ou sabem que a vida vive mudando e a sua
consciência participa deste movimento. Em determinadas circunstâncias, o
reconhecimento da complexidade e da contraditoriedade que legitima do quadro de
ação pode paralisar, ou ao menos “entorpecer”, talvez como na religião, ou, “no mito
religioso da leitura” a intervenção eficaz da visão em tais circunstâncias. Os
dirigentes políticos das forças pragmaticamente comprometidas com a mudança
radical tendem a mobilizá-las através de fórmulas nem sempre dialéticas, com
exceção de V. I. Lenin - cujo efeito político específico lhes parece ser mais direto,
imediato, objetivo e eficaz para a transformação social. Daí é que parte essa investida
exemplar de Hegel, o grande tema hegeliano do caminho para a verdade como arte
da verdade – para se chegar à escolha certa, é preciso começar com a escolha
errada – reafirma a si mesmo. A questão atual não é a de que não deveríamos ignorar
Hegel, afirma Žižek, mas sim que só podemos nos permitir ignorá-lo depois de um
longo e árduo estudo de Hegel. A hora é exatamente a de repetir Hegel.
O enunciado de Marx (1973: 800) é conclusivo de sua obra O Capital: - “Toda ciência seria
supérflua se a forma de manifestação e a essência das coisas coincidissem
imediatamente”. Em si e para si a proposição vale em sentido ontológico geral,
ou seja, refere-se tanto à natureza quanto à sociedade. Todavia, a relação
entre essência e fenômeno ser social, por causa de sua indissolúvel ligação com
a práxis, revela traços novos, novas determinações, no que é residual. Por
isso, não é casual que a frase sobre a ciência e a relação “fenômeno-essência”
seja descrita por Marx no quadro de uma crítica aos economistas vulgares, em
polêmica com concepções e interpretações absurdas do ponto de vista do ser, que
se fecham nas formas fenomênicas e deixam inteiramente de lado as conexões
reais. A constatação filosófica de Marx é de uma atualidade imprescindível e tem
a função propedêutica de crítica analítica, e política, a algumas falsas representações
para a questão da forma histórica de representação social da consciência e restaurar no pensamento individual (o desejo) e coletivo (o sonho, a utopia, o amor) a
realidade autêntica, existente para si.
De fato a transformação social da mercadoria em signo representou o destino da globalização do capitalismo no século XX. Nesta direção, condenou o processo de estetização de todas as coisas que ocorre na atual fase do capitalismo, pois como dizia, “até o mais marginal, o mais banal, o mais obscuro estetiza-se”. Deixou transparecer que entendia a publicidade como a arte oficial do capitalismo, uma vez que todas as formas atuais de atividade voltam-se e esgotam-se nela. Por isto a forma ideológica da publicidade com apoio de relações técnicas de trabalho impôs-se e desenvolveu-se à custa de todas as outras linguagens contemporâneas. Portanto, reiterou que os códigos e modelos de marketing e lógicas tem o papel de formalizar e deixar mais simples os semelhantes, geraram uma produção infinita e instável de estilos de vida, dissolvendo-se o objeto reconhecido como sociedade. A estetização que fascina, manipula desejos e gostos e impulsiona na direção da produção-consumo além dos princípios da economia política. Apresenta a falsa ideia de que nas práticas consumistas está a resolução dos problemas sociológicos da vida no plano individual, bem como a transformação da insignificância do mundo.
Reportamo-nos aqui a um libelo expresso no depoimento de Augusto Sampaio, então Vice-Reitor comunitário da PUC-Rio, ex-aluno e amigo do professor Isaac Kerstenetzky (1926-1991):- Muitos professores dos dias de hoje são, apenas, empregados de empresas que vendem cursos e diplomas - cumprem tarefas segundo esquemas e horários pré-estabelecidos pelos seus empregadores. Isaac Kertenetzky, não. Homem de saber enciclopédico, inteligência rápida, humor cáustico, paciência infinita, era antes de mais nada, amigo de seus alunos. Preocupava-se com cada um, angustiava-se com os dramas juvenis que lhe eram narrados. Alegrava-se com as pequenas conquistas dos seus discípulos - uma dissertação, uma conversa proveitosa, uma tese defendida com sucesso, um livro ou artigo publicado. Nasceu no Rio de Janeiro em agosto de 1926. Orgulhava-se de ter crescido em Vila Isabel, a terra de Noel Rosa e atribuía a este fato a sua sensibilidade musical. Estudou no Colégio Pedro II e formou-se pela antiga Universidade do Brasil, hoje a Federal do Rio de Janeiro, com 20 anos de idade. Foi aluno de Octávio Bulhões e Eugênio Gudin, que o conduziram para um mestrado na Universidade de McGuill, no Canadá, e logo em seguida para o Centro de Estudo Sociais de Haia. Voltando ao Brasil foi para a Fundação Getulio Vargas (FGV), para trabalhar no Centro de Contas Nacionais e lecionar na Escola de Pós-Graduação daquela Instituição.
Nestes mesmos anos, final dos anos de 1950, na PUC-RIO, o Pe. Fernando Bastos e Ávila S.J., fundava a Escola de Sociologia e Política que tinha, na sua estrutura, um Departamento de Economia. O Vice-Diretor era outro notável professor, Arthur Hehl Neiva, que convidou o Isaac para colaborar com a nova Escola que, pioneiramente, insistia, na sua proposta pedagógica, na necessidade de se tratar as ciências sociais de forma integrada - só assim o fenômeno social poderia ser melhor entendido. Era o que Isaac sonhara toda sua vida - aceitou na hora. Contava, rindo, que a única pergunta que lhe fora feita, pelo Professor Neiva, além do convite, era se vivia uma casamento estável... pois, na época, era um valor importante para uma Universidade Católica. Foi Professor, Diretor do Departamento de Economia, colaborou com o professor Neiva na organização do sistema de créditos na escola de Sociologia, introduziu a idéia do ciclo básico, trouxe vários outros professores da FGV e do antigo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) para lecionarem economia, estatística, história econômica. Em 1965, já seu aluno - uma turma
de sete alunos - tínhamos aula na sua sala na Fundação, na verdade um pedaço de
mesa de reuniões, antiga, perdida no meio de pilhas de revistas, livros,
relatórios, todos lidos e anotados, muitas vezes fora do horário habitual, aos
sábados pela manhã e à noite nos dias de semana. Foram momentos inesquecíveis
de convivência e de aprendizado. Suas provas eram novidades - podíamos fazê-las
com consulta a livros, ou ir até a biblioteca para uma pesquisa de última hora.
Seus comentários, nas provas, eram verdadeiras cartas aconselhadoras, onde com
extrema elegância e delicadeza apontava as barbaridades que muitas vezes eram
escritas. Estava sempre disponível para conversar sobre tudo, inclusive sobre a
sua matéria principal - Planejamento e
Desenvolvimento Econômico. Até o final da sua vida, já adoentado, sua maior
preocupação era não faltar a uma aula, chegar no horário, atender aos alunos,
conversar. Por sonhar com a possibilidade de forjar um Centro de Ciências
Sociais, com real perspectiva interdisciplinar e nem sempre encontrar apoio
para esta sua idéia, pelo desejo de radicalizar a convivência de especialistas
dos vários ramos do estudo do homem vivendo em sociedade, acabou seus dias no
Departamento de História, o grupo da PUC-RIO que mais estimulava a idéia da
interdependência e a complementaridade das especialidades do saber social.
Escreveu pouco, muito pouco. Cada vez que pedíamos que colocasse aquelas
conversas em forma de artigos, ou uma coletânea de artigos que pudesse se
transformar em um livro dizia: “ah, outros já escreveram sobre isso, vocês é
que não leram, eu já li isto, que acabei de falar, em algum lugar que não me
lembro mais...”. Está cada vez mais difícil encontrar, nos campi professores reais como o Isaac. As estruturas sociais de classe, gênero e etnia são reduzidos às imagens do social e vividos através do meio de reprodução das imagens e de estilo de vida. Observou que os “meios realizadores” estão em coisas muito diferentes às expectativas geradas, e, ainda segundo ele, que atendam satisfações mais superficiais, mas jamais aspectos profundos da vida humana como geralmente propõem. Sob este aspecto radicalizou ao desenvolver a ideia que os indivíduos imersos nas práticas e relações de consumo, não combatem nem condenam, mas exploram ao máximo as tendências figuradas. As sensações imediatas, as experiências ardentes e isoladas, tanto quanto as intensidades da sociedade-cultura de consumo. Sem procurar significados obtém prazer estético de intensidades superficiais. Na ordem da produção, o objeto carece de unicidade e singularidade, pois, objetos tornam-se simulacros indefinidos uns dos outros como objetos, os homens que os produzem. A pretensa objetividade do mundo erigido pela racionalização técnica corresponde à universalização de um modelo arbitrário advindo da generalização da economia política na forma da lei do valor. A partir do código, considerado como sistema de signos generalizados, a simulação opera a inversão das relações sociais entre pessoas, identificada entre o real e sua representação, estabelecendo simples oposições binárias que permitem a objetividade do discurso e o controle dos objetos.
Bibliografia geral consultada.
HEGEL, Georg
Wilhelm Friedrich, Fenomenologia dello Spirito. Florença: La Nuova
Itália, 1973; MITZMAN, Arthur, La Jaula de Hierro. Una Interpretación
Histórica de Max Weber. Madrid: Alianza Universidad, 1976; MARX, Carlos, El
Capital. Crítica de la Economía Política. Libro Primero. Buenos Aires:
Editorial Cartago, 1973; GÓRGIAS, “Tratado do Não-Ente. Elogio de Helena”.
Tradução, Introdução e comentários de Maria Cecília de Miranda Nogueira Coelho.
Disponível em: Cadernos de Tradução, nº 4. São Paulo: Universidade de São
Paulo, 1999; KERSTENETZY, Isaac, Legado e Perfil. Rio de Janeiro: IBGE:
Centro de Documentação e Disseminação de Informações, 2006; LIBÂNEO, José
Carlos, Pedagogia e Pedagogos Para Quê? 12ª edição. São Paulo: Cortez
Editores, 2010; COELHO, Humberto
Schubert, Livre-Arbítrio e Sistema: Conflitos e Conciliações em Böhme e
Goethe. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Religião. Juiz de Fora: Universidade de Juiz de Fora, 2012; ŽIŽEK, Slavoj, Menos
Que Nada: Hegel e a Sombra do Materialismo Dialético. São Paulo: Editorial
Boitempo, 2013; MEDEIROS, Stanley Kreites Bezerra, Um Estudo Lógico e
Epistemológico do Fecho Epistêmico. Tese de Doutorado. Programa Integrado
de Doutorado em Filosofia, UFRN-UFPB-UFPE, CCHLA. João Pessoa: Universidade
Federal da Paraíba, 2013; BRAGA, Ubiracy de Souza, Oligarquia
Revigorada: Consciência, Autoconsciência & Consciência Comum no Brasil.
Tese de Livre Docência em Sociologia. Coordenação de Ciências Sociais.
Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará, 2016; PERES, Elisandra de Souza, Currículo
e Emancipação: Uma Articulação Possível? Tese de Doutorado. Programa de
Pós-Graduação em Educação. Florianópolis: Universidade Federal de Santa
Catarina, 2016; MENEZES, Eunice Andrade Oliveira, A Pesquisa
Potencializadora da Reflexão Crítica sobre a Formação e a Prática Docente: Um
Olhar sobre a Experiência Formativa do PIBID-UECE. Tese de Doutorado.
Programa de Pós-Graduação em Educação. Fortaleza: Universidade Estadual do
Ceará, 2017; GONÇALVES, Gláucia
Signorelli de Queiroz, Inserção Profissional de Egressos do PIBID: Desafios
e Aprendizagens no Início da Carreira. Tese de Doutorado. Programa de
Pós-Graduação em Educação. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, 2017; entre outros.
_____________
* Sociólogo
(UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de
Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de
Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará
(UECE).
“Para mim, isso foi um golpe de Estado
institucional”. Laurence
Cohen,do PCF de Val-de-Marne.
O Senado Federal possui 81 senadores, que
através do voto majoritário, são eleitos e exercem seus cargos para mandatos de
oito anos, sendo que são renovados em uma eleição um terço das cadeiras e na
eleição subsequente dois terços delas. As eleições para senador são feitas
junto com as eleições para Presidente da República, Governador estadual,
Deputado Federal, Estadual e/ou Distrital, dois anos após as eleições
municipais. Todas as 27 unidades da Federação (26 estados e o Distrito Federal)
possuem a mesma representatividade,
com três senadores cada. Os senadores representam os estados e não a população,
daí portanto a não proporcionalidade em relação ao número de habitantes de cada
estado. O presidente do Senado Federal é
o senador Renan Calheiros, filiado ao do Partido
Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de Alagoas. Além das lideranças do
governo e de cada partido, o Senado possui também lideranças do bloco
parlamentar da maioria, da minoria e de apoio ao governo.
O
Senado conta com 2.819 funcionários “terceirizados”, pertencentes a 34 empresas
cujos contratos trabalhistas custam anualmente R$ 155 milhões de reais e
aproximadamente 2.500 servidores de carreira, a um custo anual de 1,4 bilhão de
reais. Em termos de transparência de sua atuação e gastos, o Senado publica
dados sobre os projetos de lei e outras matérias e o uso de verbas “indenizatórias”.
Seu ponto crítico é que publica de forma precária os dados sobre a assiduidade
dos senadores no plenário e nas comissões, além de não publicar dados sobre as
viagens parlamentares. As principais estruturas internas do Senado Federal são
a Secretaria-Geral da Mesa, responsável pela coordenação de todo o processo
legislativo nas comissões e no Plenário, e a Diretoria-Geral, responsável pela
gestão administrativa, em particular contratações, manutenção, gestão
de recursos humanos e orçamentários.
O
Senado Federal possui 81 senadores, eleitos para mandatos de oito anos, sendo
que são renovados em uma eleição um terço e na eleição subsequente dois terços
das cadeiras. As eleições para senador são feitas junto com as eleições para
Presidente da República, Governador de Estado, Deputados Federal, Estadual e Distrital,
dois anos após as eleições municipais. Todas as 27 unidades da Federação
somados os 26 estados e o Distrito Federal possuem a mesma representatividade,
com três (03) senadores cada. Os senadores representam os Estados e não a
população, daí, portanto a não proporcionalidade em relação ao número de
habitantes de cada Estado por região. A 55ª legislatura teve início em 1° de
fevereiro de 2015, com encerramento previsto para ocorrer em 31 de janeiro de
2019, caso não haja um “golpe branco”. O Senado é tido como a Casa revisora
do Legislativo.
A categoria “golpe branco” ou “golpe
brando” é uma expressão usada na historiografia e na ciência política para se
referir a uma conspiração ou trama que tem por objetivo a mudança da liderança
política ou, em alguns casos, da ordem vigente de um país por meios parcial ou
integralmente legais. Também chamado “golpe suave” ou “golpe encoberto”,
utiliza um conjunto de técnicas de conspiração não frontais e principalmente
não violentas, com o fim de desestabilizar um governo eleito legitimamente até
provocar sua queda, sem que esta pareça que ter sido consequência da ação de
outro poder. A expressão é atribuída ao politólogo estadunidense Gene Sharp, relacionado
com a Central Intelligence Agency. Um golpe de Estado é um ato realizado por
órgãos oficiais, mas muitas vezes pelas forças armadas, com base em alguma
forma de violência como intimidação ou ataque, visando a substituição de um
líder político por outro. No século XX, a ideia de que golpes de Estado violam
a ordem constitucional vigente foi incorporada ao conceito de golpe de Estado. O
“golpe branco” se diferenciaria do golpe de Estado tradicional apenas na medida
em que pode assumir aparência legal, ainda que seja fundamentado em interesses
ilegítimos e conspirações políticas. Assim, o golpe de Estado branco passou a
ser empregado como alternativa ao golpe de Estado militar, que foi muito
utilizado até a década de 1990 e se repete no Brasil. José Eduardo Cardozo entregando a defesa final de presidenta Dilma Rousseff no processo de impeachment.
Ex-ministro dos governos José Sarney
e Fernando Henrique Cardoso, o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira considera
o processo de “impeachment” da presidenta da República Dilma Rousseff um “golpe
branco”. Segundo ele, a crise atual repete as que antecederam as quedas dos
ex-presidentes Getúlio Vargas e de João Goulart. - Essa crise é muito estranha
porque é uma crise em uma democracia que eu entendo consolidada. É uma crise
que repete crises passadas, é uma crise em que liberais derrotados nas eleições
resolvem tentar dar o golpe de Estado. Isso aconteceu no Brasil inúmeras
vezes”, disse Bresser-Pereira em entrevista ao programa “Espaço Público”, da TV
Brasil. - “Em 1954, o Getúlio Vargas foi derrubado nessas condições. Em 1964,
João Goulart foi assim. Sempre a UDN, que era o partido liberal. Agora é a
mesma coisa, mas é o PSDB, meu ex-partido, que virou partido liberal. Tudo é
sempre feito em nome da moralidade pública. Como se, de repente, a moralidade
pública estivesse encarnada nesses liberais e jamais existisse do outro lado”.
TV Brasil é uma rede de televisão
pública brasileira pertencente à Empresa Brasil de Comunicação, com programação
de abrangência nacional. Está presente em Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ),
São Paulo (SP), São Luís (MA) e em mais 21 estados por meio das emissoras de
televisões parceiras da Rede Pública de Televisão. O canal estreou sua
programação no dia 2 de dezembro de 2007, ao meio-dia, mesma data que se
iniciaram as transmissões de TV digital no território brasileiro. A emissora
tem como finalidade complementar e ampliar a oferta de conteúdo audiovisual, e
oferecer uma programação com abordagem informativa, cultural, artística,
científica e cidadã. A TV Brasil é hoje uma das maiores janelas de exibição de
produção audiovisual ditas independente no País, destinando 20% das horas da sua programação. Em cinco anos, participou como coprodutora de cerca de 140 produções, entre
documentários, séries, longas e curtas metragens.
No
entanto, de acordo com o ex-ministro, na crise atual, diferentemente das
anteriores, um setor da classe média radicalizou o discurso, e começou a agir
com “ódio” contra o governo. “Em nenhuma das outras vi tanto ódio. Isso me
surpreendeu muito já em 2014. Havia um setor da classe média que radicalizou e
começou a agir com um ódio em relação ao PT e em relação à Dilma e Lula que eu
nunca vi na minha vida”. - “No tempo do golpe militar, por exemplo, havia uma
preocupação da direita com um possível golpe socialista, o que era bobagem, mas
enfim, era razoável o medo, e havia medo. Mas não havia ódio. Agora tem ódio.
E, em minha opinião, quando isso acontece, quando aparece o ódio, é porque não
há razão”. Bresser Pereira diz que não
acreditava que Dilma sofreria impeachment
porque o Brasil tem uma democracia consolidada. - “O impeachment só se justifica nos momentos
em que o presidente cometeu algum crime. Não há crime, desde o começo não há.
Acho que nós estamos em uma democracia consolidada e isso seria um golpe muito
sério na democracia”.
Desnecessário
dizer que um dos campos de observação mais ricos para o analista social
refere-se à relação entre ideologia e linguagem, tendo em vista que as
pesquisas desenvolvidas acerca da atividade legislativa brasileira têm
questionado o conteúdo das leis apresentadas e aprovadas no âmbito do Congresso
Nacional. A principal preocupação compartilhada pela maioria desses estudos é
se as leis concentram ou difundem benefícios, caracterizada pela apresentação
de matérias que difundem benefícios a toda a sociedade (leis nacionais) ou pela
apresentação de proposições com benefícios territorialmente concentrados. As
palavras, as inflexões, o modo de construir as frases, cada uma dessas coisas
tem sua própria história. Tanto em sua gênese como em seu emprego, seus desejos
subterrâneos, os termos da linguagem põem a nu os valores das sociedades que os
criaram e os mantêm vivos. Não são necessárias as formas mais abstratas da
teoria e as construções filosóficas para compreendermos as distorções
ideológicas em suas manifestações individuais e coletivas. No
Senado, maioria de 65% dos servidores acredita que homens e mulheres têm as
mesmas oportunidades de crescimento profissional. É o que revela pesquisa de
opinião feita pelo “DataSenado”, dos dias 25 de fevereiro a 14 de março de
2014, com 387 servidores da Casa. Por outro lado, 22% consideram não existir
essa igualdade de oportunidades entre gêneros. Desses, 93% são taxativos: no
Senado, homens têm mais chances de crescer profissionalmente do que mulheres. Apesar
desse indicativo, cumpre destacar que, entre os próprios entrevistados,
verifica-se que os homens ocupam mais postos de chefia do que as mulheres: 35%
deles contra 22% delas. Para 82% dos entrevistados, a probabilidade de receber
um convite para assumir uma chefia é a mesma, independente do sexo do servidor.
Em contrapartida, na opinião de 11%, o sexo é sim um fator que influencia na
hora de se fazer esse tipo de proposta. Neste contexto, registrou-se uma
diferença de 10 pontos percentuais na análise por perfil: enquanto 87% dos
homens negam a existência de qualquer tipo de discriminação com relação à
escolha de mulheres para cargos de chefia, são 77% as servidoras que têm a mesma
opinião. Ao
investigar as questões de gênero vividas pelos servidores do Senado, a pesquisa
registrou ainda diferenças importantes: entre as entrevistadas, 39% avaliam que
mulheres com filhos pequenos não estão em condições de igualdade com os homens
de serem convidadas para assumir uma chefia. Entre os homens, apenas 16%
consideram que existe tal disparidade. As
mulheres também são maioria (66%) a apontar que elas seriam capazes de abrir
mão de uma chefia para passar mais tempo com os filhos; 52% dos homens têm a
mesma percepção. Do
total de entrevistadas, 45% já receberam convite para assumir cargo
de chefia, sendo que 72% delas aceitaram o desafio. Das 25% que recusaram a proposta, 40% alegam que o principal motivo reside no fato de
querer cuidar dos filhos.
Entre
todos os respondentes, 56% avaliam que aceitariam postos de comando mesmo que
fosse necessário reduzir o tempo dedicado à família; 35% não estariam dispostos
a assumir esse compromisso, enquanto 10% não têm opinião formada sobre o
assunto ou preferiram não se manifestar. Por fim, caso fosse possível decidir
livremente entre assumir uma chefia ou dedicar-se à maternidade, 32% das
entrevistadas disseram que optariam pela maternidade, 26% privilegiariam a
carreira, e 15% indicaram não ter interesse em nenhuma das duas opções.
Surpreendentemente, 26% não souberam ou preferiram não responder a essa
questão. A pesquisa registrou ainda que, entre as 175 servidoras que foram
entrevistadas, 65% têm filhos. Dessas, 32% têm apenas um, 48%, dois, e 19%
indicaram ter três ou mais filhos. Também 65% delas disseram ter filhos menores
de 18 anos. (Cf. Secretaria de Transparência - Senado. Pesquisa
sobre Equidade de Gênero, 27/03/2014).
Em
votação o Senado marcha à ré na história social e política brasileira: aprovou
por 59 votos a 21 na madrugada da quarta-feira (10/08/2016), após quase 15
horas de sessão, o relatório da “Comissão Especial do Impeachment” que
recomenda que a presidente “afastada” Dilma Rousseff seja levada a julgamento. Com
isso, ela passa à condição de ré no processo político, segundo a assessoria do
Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento final da presidente “afastada”
está previsto para o fim do mês no plenário do Senado. Antes da votação do
texto principal, os senadores já tinham rejeitado, também por 59 votos a 21, as
chamadas “preliminares” que questionavam o mérito da denúncia contra a
presidente Dilma Rousseff. Depois do texto principal, houve a votação de três
destaques de alteração do texto principal, apresentados por senadores
defensores de Dilma com o objetivo de restringir os supostos delitos atribuídos
a ela. Todos os destaques foram rejeitados. Curiosamente o único dos 81
senadores que não votou foi o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL).
- “Procurei conduzir com isenção. Desconstruir essa isenção agora
não é coerente”.
Sustentamos
a tese segundo a qual há um golpe de Estado em curso no ano de 2016. O libelo
acusatório entregue é uma consolidação das acusações e provas produzidas
durante o processo
político de “afastamento”. No documento, os juristas Miguel Reale Júnior, Hélio
Bicudo e Janaína Paschoal – autores da denúncia de crime de responsabilidade
contra Dilma Rousseff – dizem que a petista cometeu “fraudes em torno das
contas públicas, perpetradas aos bilhões, justamente em ano eleitoral, com o
fim de iludir a população”. Eles voltam a afirmar que a edição de decretos de
créditos suplementares sem a autorização do Congresso Nacional e a pratica das
chamadas “pedaladas fiscais” – atraso de pagamentos da União a bancos públicos
para execução de despesas – configura crime de responsabilidade. A defesa nega
que os atos imputados a Dilma Rousseff sejam “crime de responsabilidade” e
que o processo de “impeachment” foi aberto em um ato político
de vingança.
Ao apresentar a defesa da presidente
Dilma Rousseff na comissão do “impeachment”
na Câmara afirmou que o procedimento que pede o impedimento da presidente é
inválido e alegou que não há “crime de responsabilidade” que o justifique. Fez
referência clara no início de sua exposição, rememorando aos integrantes da
comissão especial que no regime presidencialista adotado pela Constituição de
1988 que a condição do “impeachment” é “uma situação de absoluta
excepcionalidade” e que o impedimento é ato jurídico e, portanto, a
presidente não pode ser afastada por questões políticas. Portanto, segundo o advogado Geral da União “(exige) que seja um atentado à
Constituição, uma violência excepcional, capaz de abalar os alicerces do Estado
e que tenha tipificação legal. Portanto, todo um conjunto de ingredientes
necessários para a configuração desse processo. Fora desses pressupostos,
qualquer processo de impeachment é inconstitucional, é ilegal”.
O
advogado-geral da União discursou por quase duas horas na tarde de 05/04/2016,
na Comissão Especial do Impeachment, na
primeira parte da apresentação da defesa da presidenta Dilma Rousseff: a que
ele expôs os pontos básicos da defesa, sem poder ser interrompido pelos
parlamentares. Num dos momentos mais impactantes da peça jurídica apresentada
por ele, Cardozo disse que se não houver todos os requisitos básicos apontados
como primordiais pela Constituição o “impeachment” é, sim, um golpe. - “É a
ruptura da Constituição Federal, a negação de um Estado de direito. Não importa
se feito por meio de canhões e baionetas ou por meio do rasgar da lei. É golpe
se ofende o Estado democrático de direito. É algo que jamais será perdoado em
nossa história, será mal visto internacionalmente”. Para a lisura de um
processo a defesa deve ser intimada em todos os atos e a presidenta Dilma não
foi intimada para que comparecesse à comissão especial do impeachment até
agora, o que ele considera ilegal. Ressaltou, ainda, que há, portanto, “uma
clara e indiscutível ofensa ao direito constitucional da defesa”.
O
uso da palavra “golpe” para classificar o processo de “impeachment” da
presidente Dilma Rousseff erroneamente motivou o ódio do senador ruralista
Ronaldo Caiado (DEM-GO) ao advogado-geral da União, ministro José Eduardo
Cardozo, durante a fase de perguntas na “Comissão Especial do Impeachment”. É
membro de uma família de produtores rurais e políticos de Goiás. É neto de
Antônio Ramos Caiado. Notabilizou-se por presidir a União Democrática Ruralista
de 1986 a 1989, entidade que visa defender a interesses dos produtores
agrícolas, destacando a defesa da propriedade privada. Para o senador
ruralista, não cai bem a tese por quem, como Cardozo, tem amplo conhecimento do
Direito, além da obrigação constitucional de fazer a defesa jurídica de todos
os Poderes. - “Vossa Excelência está impedida de usar essa palavra, interditada
de usar essa palavra, porque lhe cabe a função de defender a União, ou seja, o
Poder Executivo, o Poder Judiciário e o Poder Legislativo”. O pecuarista
Antônio Ramos Caiado Filho, tio do deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO),
está entre os 91 incluídos pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) na
atualização semestral da relação de empregadores flagrados com trabalho escravo, na “lista suja”.
Entre
as preliminares da defesa apresentadas por José Eduardo Martins Cardozo, o
ministro citou como primeiro ponto que só existe crime de responsabilidade se
houver um atentado à lei maior, que é a Constituição Federal. - “E a Constituição
não fala em violação e sim, atentado, ou ato extremo, no caso, um ato de
ruptura constitucional. Não é, portanto, qualquer situação de desrespeito à lei
que apontará crime de excepcionalidade”. Cardozo destacou ainda que a
Constituição deixa claro que os atos apontados como “crime de
responsabilidade” devem ser praticados diretamente pelo Presidente da República
e atos que não sejam atribuídos a ele, que não decorram da sua competência
direta “não qualificam o impeachment”. Num terceiro ponto, acentuou que “para
que exista o crime de responsabilidade é necessária a tipificação legal, o que
não existe no caso em questão”.
O
advogado-geral também afirmou que não podem qualificar para o “impeachment”
atos praticados fora do exercício das funções do Presidente da República. E que
a configuração do crime exige a ação dolosa do detentor do cargo. A peça
jurídica apresentada por José Eduardo Cardozo terminou tendo o dobro do tamanho
inicialmente especulado: são 200 páginas com fundamentação técnica rigorosa e
explicações de ordem jurídica e política. Portanto, para ele, há “indiscutível,
notório e clamoroso desvio de poder” no recebimento do pedido do impeachment. - “Conforme fartamente
noticiado pela imprensa, a decisão do presidente da Câmara Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) não visou à abertura do impeachment,
não era essa sua intenção, não era essa a finalidade. Sua Excelência, Eduardo
Cunha, usou da competência para fazer uma vingança e uma retaliação à chefe do
Executivo porque esta se recusara a dar garantia dos votos do PT no Conselho de
Ética a favor dele”. Eduardo Cunha enfrenta processo por quebra de decoro
no Conselho de Ética da Casa. De acordo com o ministro, a análise
da denúncia mostra que se trata de uma manifestação improcedente.
Bibliografia
geral consultada.
SOMBART, Werner,
Le Bourgeois. Paris: Editions Payot, 1926; MALAPARTE, Curzio,
“Technique du Coup d’État” (1931). In: Coup
D’état: The Technique of revolution, E. P. Dutton & Co., Inc., 1932;
ROSENSTOCK, Eugen-Huessy, DieEuropäischenRevolutionen und der Charakter der Nationen. Stuttgart; W.
Kohlhammer Verlag, 1961; ARON, Raymond, Dimensionde la Conscience Historique. Paris: Union
Générale d'Édition, 1961; ALTHUSSER, Louis, “Freud et Lacan”. In: LaNouvelleCritique, n° 161-162, Paris, 1965;
Idem, “Idéologie et Appareils Idéologiques d` Etat”. In: Pensée. Paris, jun. 1970; Idem, Montesquieu
la Politique et L` Histoire. Paris: PUF, 1972; FOUCAULT, Michel, El Orden delDiscurso. Barcelona: Ediciones Tusquets, 1973; HALL, Stuart, “et
al”, Da Ideologia. Rio de Janeiro:
Zahar Editores, 1980; KONDER, Leandro, A
Questão da Ideologia. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2002; FREUD,
Sigmund, “Pulsão e os Destinos da Pulsão”. In: ObrasPsicológicas. Vol.
I. São Paulo: Editora Imago, 2004; HABERMAS, Jürgen, Teoria do Agir Comunicativo. 1. Racionalidade da Ação e
Racionalização Social. São Paulo: Editora VM/Martins Fontes, 2012; Artigo: “Dilma
se torna ré no Senado; votação final pode ser dia 23”. In: Diário do Nordeste, 10 de agosto de 2016; entre outros.
_________________
* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará (UECE).