quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Musa do Veneno & Agricultura - Questão Tóxica do Produto no Brasil.

                                                                                                                       Ubiracy de Souza Braga

                       “Vocês que estão comendo aqui essa comida, essa alface, sabem que está tudo bem”. Luiz Nishimori


       
          Luiz Hiloshi Nishimori, nasceu em Marialva em 9 de abril de 1949, um município brasileiro do Estado do Paraná. Localiza-se na Região Norte-Central, à leste de Maringá reconhecido como a “capital da uva fina”. Sua população em 2014 era de 34.096 habitantes, conforme dados estatísticos do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística. É agricultor, comerciante e político filiado ao Partido Liberal (PL). Formado na Universidade Estadual de Maringá em Ciências Contábeis, foi candidato em 2002, pelo PP, a deputado estadual no Paraná, alcançando 28 779 votos e ficando como suplente e posteriormente assumindo a vaga. Reeleito deputado estadual na eleição de 2006, já pelo PSDB, com 45 247 votos. Foi candidato a deputado federal pelo Paraná em 2010, ficando como primeiro suplente da coligação, com 70 088 votos, assumindo o cargo em 8 de fevereiro de 2011 até o final da legislatura. Desligou-se do PSDB em 2013, alegando não ter espaço no partido e ingressou no PR. Na eleição de 2014, foi reeleito deputado federal com 106 852 votos. Em janeiro de 2015 foi eleito presidente do diretório do PR no estado do Paraná. Em 17 de abril de 2016, Luiz Nishimori votou pela abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff. Durante o governo do golpista de Michel Temer, votou a favor da PEC do Teto dos Gastos Públicos. Em abril de 2017 foi favorável à Reforma Trabalhista. Em 2 de agosto de 2017, na votação sobre a admissibilidade da denúncia de corrupção passiva em desfavor do presidente Michel Temer, assinada pela PGR, votou consciente pelo arquivamento. É Relator do Projeto de Lei 6299, que visa atualizar a legislação referente ao uso de agrotóxicos.

           Em festa pela aprovação na Comissão Especial da Câmara do projeto de lei que facilita o uso de agrotóxicos no país, deputados da bancada ruralista deram um novo apelido à presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FAP), Tereza Cristina (DEM-MS). A deputada ganhou o apelido, irônico, em um jantar num dos restaurantes preferidos dos congressistas em Brasília. A deputada chefiou a comissão que aprovou o projeto de lei, chamada pela oposição de “Projeto de Lei do Veneno”. Numa longa mesa em formato de “U”, em restaurante à beira do Lago Paranoá, os ruralistas comemoraram a vitória com vinho, bacalhau e discursos inflamados. - “Nós ganhamos a batalha, mas ainda temos uma guerra”, disse Tereza Cristina. A batalha começou em maio, quando o deputado Luiz Nishimori (PR-PR), sentado a duas cadeiras da parlamentar, apresentou seu Relatório favorável à mudança da legislação de agrotóxicos. O texto criticado por ambientalistas e entidades de saúde, no caso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), cria um rito sumaríssimo para o registro de agrotóxicos. Também prevê a mudança na nomenclatura do produto, que passa a se chamar pesticida. Além disso, o Ministério da Agricultura assume o processo de registro dos agrotóxicos. Ainda passa a existir um prazo máximo para que novos produtos sejam analisados pelo governo. Se isso não ocorrer em até dois anos, eles receberão um registro provisório.
                            

            Em clima festivo, o jantar dos ruralistas reuniu pelo menos 40 membros. Além de parlamentares ligados ao agronegócio, como Valdir Colatto (MDB-SC), Marcos Montes (PSD-MG), Osmar Serraglio (MDB-PR) e Nilson Leitão (PSDB-MT), estavam presentes representantes de entidades como a Associação Brasileira dos Produtores de Soja e Instituto Pensar Agropecuário. A maior parte dos presentes, como o deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), escolheu o bacalhau, especialidade da casa, acompanhado de arroz de brócolis. Os garçons serviam vinho à vontade. A conta ficou com um dos empresários presentes no encontro. Autor de uma das falas mais inflamadas, que incluíram frases como “tudo bem, pode ser natural, mas não precisa fazer propaganda” para se referir a casais gays na televisão, e críticas à “educação de gênero” nas escolas, Alceu Moreira (MDB-RS) afirmou que o agronegócio tem que trabalhar em sua própria imagem. - “Eles têm o maior público, e a gente sai como vilão. O agronegócio que coloca a comida na casa, no prato dos brasileiros, mas a gente não consegue fazer chegar a eles essa imagem”. O grande tema deste ano, as controversas eleições presidenciais, também apareceu nas conversas e nos discursos ruralistas.
Inflamado, Moreira afirmou que o país precisa “de um árbitro, alguém para dizer quem fala e quem cala a boca, quem prende e quem solta”. De acordo com o referido parlamentar, isso não foi encontrado nos presidenciáveis atuais. - “A solução poderia vir desta frente”. A atual representação política do agronegócio chega a 210 deputados e 26 senadores, num total de 236 políticos em exercício, ou seja, 39,7% dos congressistas, em 18 partidos. Destes, 119 deputados e seis senadores (21%) assumem a ligação. Essa articulação setorial opera na Frente Parlamentar Mista da Agropecuária (FPA), criada em 2015 com assinaturas de 198 deputados e 27 senadores (38% dos 594 congressistas), e que pode alcançar 260 votos, superando os 257 votos (maioria absoluta) exigidos para determinadas matérias. Entre os deputados, 42 vivem do agro e 80 só admitem ligações. Dados estatísticos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional demonstram que 4.013 pessoas físicas e jurídicas detentoras da posse de terra no Brasil devem 906 bilhões de reais, uma dívida maior que o Produto Interno Brasileiro de 26 estados.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define pesticida ou praguicida como toda substância capaz de controlar uma praga que possa oferecer risco ou incômodo às populações e ao ambiente. Objetivamente o Decreto nº 4.074, de 4 de janeiro de 2002, define no Artigo 1º, inciso IV – “Agrotóxicos e afins - produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou plantadas, e de outros ecossistemas e de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, bem como as substâncias e produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento”. A utilização dos agrotóxicos no trabalho agrícola provocam três tipos de intoxicação: aguda, subaguda e crônica. Na aguda, os sintomas surgem rapidamente. Na intoxicação subaguda, os sintomas aparecem gradativamente como dor de cabeça, dor de estômago e sonolência. Já a intoxicação crônica pode surgir meses ou anos após a exposição e pode levar a paralisias e doenças graves como o câncer.
No Brasil, o agrotóxico passou a ser utilizado para denominar a utilização de venenos agrícolas, colocando em evidência crítica a toxicidade desses produtos ao ambiente e à saúde humana e familiar. Essa definição exclui fertilizantes e produtos químicos administrados em animais para estimular crescimento ou modificar comportamento genético reprodutivo. A aplicação de agrotóxicos pode se dar durante a produção, armazenamento, transporte, distribuição e transformação de produtos agrícolas e seus derivados. Entre os agrotóxicos, também se incluem os desfolhantes, dessecantes e substâncias reguladoras do crescimento vegetal ou fitorreguladores.  A produção, o armazenamento e uso de agrotóxicos podem representar significativos riscos ambientais e à saúde humana. A legislação define e previne os procedimentos obrigatórios para fabricação, compra e uso de agrotóxicos. No Brasil e em diversos países do mundo globalizado, cada vez mais numeroso os pequenos agricultores vêm produzindo alimentos sem uso de agrotóxicos, através da produção agroecológica e da orgânica. O acesso à terra tem sido até hoje empregado mais para atender às pressões sociais e políticas, frequentemente explosivas, do que para se obter um desenvolvimento rural duradouro, visando a sustentabilidade em seus aspectos econômicos, sociais e ecológicos, os quais resultariam em melhores condições de qualidade de vida da população em geral e para a massa de trabalhadores rurais assentada.
Dados recentes sobre análise sociológica e afiliação ideológica dos membros da bancada ruralista são inconclusivos, mas ela tende a ser de direita e centro-direita. Ao menos um estudo identificou que sua composição inclui membros de 12 (doze) partidos com representação na Câmara e 6 (seis) no Senado. Segundo esse levantamento, 19% desses parlamentares eram oriundos de partidos de centro-esquerda, outros 19% eram filiados ao PMDB e 62% deles eram filiados a partidos da direita e centro-direita. A bancada ruralista é responsável pela aprovação de benefícios financeiros e perdões a grandes proprietários rurais que desmatam. Historicamente opõe-se aos movimentos que reivindicam a realização de Reforma Agrária no Brasil, dentre eles o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MTRST). Dentre as atividades da bancada, segundo seus críticos analíticos, destacam-se sua atuação para impedir o efetivo combate ao secular trabalho escravo nas fazendas, e sua feroz oposição a quaisquer medidas voltadas ao ambiente e à conservação da natureza, incluindo o patrocínio de projetos de lei em tramitação no Congresso que aumentam os limites legais para desmatamentos e anistiam fazendeiros que já desmataram ilegalmente suas propriedades.
O pecuarista Antônio Ramos Caiado Filho, tio do deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO), está entre os 91 incluídos pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) na atualização semestral da relação de empregadores flagrados com trabalho escravo, a chamada lista suja. Ele foi considerado responsável por submeter quatro pessoas a condições degradantes e a jornadas exaustivas na produção de carvão em sua fazenda em Nova Crixás, cidade localizada a 400 km de Goiânia e um dos redutos eleitorais da família. Os resgatados afirmaram que foram obrigados a cumprir jornadas de até 19 horas seguidas, “das 2h às 21h”, nas palavras de um dos trabalhadores. Os carvoeiros trabalhavam no local há cerca de um ano quando equipes de fiscais do MTE, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) e agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) chegaram ao local denunciado, em abril de 2013. Os trabalhadores produziam carvão vegetal em 12 fornos, sem qualquer equipamento de proteção individual como máscaras ou luvas. Eles trabalhavam de chinelos e bermudas, sujeitos a contato direto com o pó e a fumaça resultante da queima do carvão. O grupo mantinha 12 fornos acesos para queimar madeira de floresta devastada dentro da propriedade.
Os trabalhadores também moravam no local, mas seus alojamentos estavam em condições precárias. A fiscalização apurou que eram barracos construídos “com placas de cimento e telha de amianto” próximos às carvoarias, “situação que somada ao forte calor da região (36º C) e à falta de ventilação dos locais, deixava quase insuportável a permanência dos trabalhadores”, de acordo com o Relatório produzido. Além disso, as camas eram improvisadas e os colchões fornecidos estavam “imundos”. Os auditores fiscais também verificaram que as jornadas de trabalho iam muito além do regular. Uma das vítimas afirmou que trabalhava “das 2h às 21h e ainda acordava algumas vezes durante a noite para ‘corrigir os fornos’”. Na fazenda em que os trabalhadores foram resgatados são criadas 2.500 cabeças de boi ao longo de 6.400 hectares – o equivalente, comparativamente, a 15 mil campos de futebol. O pecuarista nega ter responsabilidade trabalhista sobre as condições de escravidão em que os carvoeiros foram submetidos. Ele afirma que a área havia sido cedida “em regime de comodato a um terceiro, e que nunca sequer foi ao local em que a produção de carvão acontecia”. Afirma ainda que a madeira “é resultante de árvores que pegaram fogo na fazenda e que foram vendidas por R$ 10 mil para o carvoeiro, que escravizou o grupo para processar o material”. 
É o segundo caso de trabalho escravo envolvendo a família do parlamentar. Em 2010, 26 trabalhadores foram resgatados em fazenda de propriedade de Emival Ramos Caiado, primo do deputado e irmão de Antônio. O parlamentar, que cumpre sua quinta legislatura, foi um dos 29 deputados que votaram contra a PEC do Trabalho Escravo em 2012, e tem se pronunciado em favor da mudança da definição de escravidão contemporânea na lei brasileira. Hoje, este crime está previsto no Artigo 149 do Código Penal, que inclui a caracterização de escravidão por condições degradantes e jornadas exaustivas. Deputados e senadores da Frente Parlamentar da Agropecuária, a chamada Bancada Ruralista, da qual Ronaldo Caiado faz parte, têm defendido uma nova definição mais restrita, que contemple apenas ameaças físicas e medidas diretas de cerceamento de liberdade. A pressão por mudanças na definição levou a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a se posicionar, em novembro de 2013, a favor do conceito atual. A aprovação da PEC do Trabalho Escravo, promulgada como Emenda Constitucional 81, é considerada uma ameaça pelos ruralistas porque a medida prevê a expropriação de propriedades onde for flagrado o trabalho escravo. Ronaldo Caiado, além de integrante da Bancada Ruralista, é um dos fundadores e ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR), criada com o objetivo de garantir e proteger a propriedade privada no campo. Procurado pela Repórter Brasil, informou, por meio de sua assessoria, que não tem relação com o caso e não iria se posicionar sobre o assunto.   
A bancada ruralista é reativa na hora de contrapor-se a projetos de lei com o objetivo de promover a Reforma Agrária. Foi para barrar as normas constitucionais nesse sentido que ela se constituiu na Assembleia Nacional Constituinte, sob a inspiração da União Democrática Ruralista (UDR). Em 2005, na Comissão Parlamentar de Inquérito da Terra, conseguiu derrotar o Relatório Final apresentado pelo relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e aprovar outro de acordo com os seus interesses. Em 2017, na CPI da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), os deputados federais conseguiram, para além da instituição da Comissão, aprovar Relatório com distinção de crimes cometidos por 67 pessoas em processos demarcatórios, incluindo indígenas, antropólogos, servidores e membros de organizações não governamentais (ONG). A bancada ruralista, por pressões junto ao Poder Executivo, vêm conseguindo sucessivas concessões creditícias para o pagamento das dívidas rurais, com alongamento de prazos, redução ou dispensa de juros e linhas de crédito favorecidas nos bancos oficiais.
Durante a Assembleia Nacional Constituinte, entre 1987 e 1988, um grupo de parlamentares ligados à agropecuária deu os primeiros passos na defesa dos interesses estratégicos do setor. A Frente Ampla Ruralista (FAR) mobilizou-se na busca de uma legislação que assegurasse, principalmente, os direitos de propriedade. O resultado deste trabalho garantiu no texto Constitucional a preservação dos direitos de propriedade rural em terras produtivas. Até 1994, a bancada ruralista continuou a existir informalmente. Em 1995 foi fundada, com ata assinada por deputados e senadores, a Frente Parlamentar da Agricultura. Em 2002, foi lançada a Frente Parlamentar de Apoio à Agropecuária (FPAA), que em 2008 passou a ser denominada Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), para se adequar às regras de regulamentação da Câmara dos Deputados. O objetivo é estimular a ampliação de políticas públicas no desenvolvimento social do agronegócio nacional. Dentre as prioridades estão a modernização da legislação trabalhista, fundiária e tributária, além da regulamentação da questão de terras indígenas e quilombolas, a fim de garantir a segurança jurídica à competitividade do setor.
Em 2008, “o Brasil se tornou o maior consumidor de agrotóxicos do mundo”, segundo o Sindicato Nacional de Empresas de Aviação Agrícola. Seis empresas dominam o mercado de agrotóxicos no Brasil: Monsanto, Syngenta, BASF, Bayer CropScience, Dow AgroSciences e DuPont. Coincidentemente, as seis possuem patentes de sementes transgênicas autorizadas no Brasil. A modificação, em grande parte, torna as plantas de soja, milho e algodão resistentes aos agrotóxicos, permitindo, assim, aplicações mais intensas de veneno para inibir mais o crescimento de outras plantas concorrentes. Em 2012, foram comercializadas 823 226 toneladas de agrotóxicos no Brasil, num crescimento de 162,32 % em relação ao ano de 2000. Este volume representou um faturamento de US$ 9,71 bilhões de dólares estadunidenses. Considerando um estudo da Fundação Oswaldo Cruz que relaciona um gasto de 1,26 dólar estadunidense no Sistema Único de Saúde (SUS) para cada dólar estadunidense gasto com agrotóxicos, em 2012 o uso de agrotóxicos impactou o SUS em 12,2 bilhões de dólares estadunidenses. Os estados brasileiros campeões de uso de agrotóxicos são: Mato Grosso, São Paulo, Paraná, Goiás, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Os cultivos que mais utilizam de forma absoluta os agrotóxicos são: soja, milho, algodão e café.
A composição da bancada ruralista no Congresso Nacional caracteriza-se por grupos de poder com diferentes motivações ideológicas e níveis de adesão. Na 51ª legislatura (1999-2003), por exemplo, 89 deputados se declaravam ruralistas nos seus currículos publicados no sítio da Câmara dos Deputados. Outros membros, embora de fato tenham aderência à pauta ruralista, preferem se identificar por outras pautas, pela profissão ou pelo título que lhes confere seu diploma universitário. Esses incluem principalmente parlamentares que têm interesses familiares na agricultura e na pecuária, ou que são patrocinados por grupos econômicos ligados a essas atividades. Devido às diferentes espécies de vínculos afetivos e políticos dos membros com a pauta ruralista, o número de votos dessa bancada dispõe no Congresso Nacional é relativo, variando em função da casa do Congresso Nacional (Senado e Câmara dos Deputados), da legislatura e de pautas específicas que são votadas. Por essa razão, as estimativas quanto ao poder desta bancada variam entre 120 e 200 votos. Dificulta a contagem os ruralistas usarem como estratégia apenas votar em bloco quando a matéria é de seu específico interesse.
A deputada eleita Tereza Cristina (DEM-MS) que preside atualmente a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), reconhecida como “bancada ruralista” foi indicada ministra da Agricultura do governo de Jair Bolsonaro (PSL) político de extrema direita sem grandes surpresas. Aliada oficial do líder do PSL durante a campanha presidencial, a engenheira agrônoma e deputada federal (DEM-MS) preside a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA). O grupo congrega mais de 200 parlamentares da Câmara e do Senado ligados ao agronegócio. Criticada pelos posicionamentos em defesa das práticas do ruralismo, a deputada é apelidada, nos meios de comunicação de massa como “Musa do Veneno”, ou “Menina Veneno”. E já chegou demostrando a que veio politicamente na condução do ministério em sua primeira entrevista após a notícia da escolha para ministra, quando afirmou à imprensa mundial que a pauta sobre alteração das regras sociais para utilização dos agrotóxicos no Brasil terá “muito espaço” em sua gestão no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Assim como no caso de outras bancadas temáticas existentes no Congresso Nacional, a bancada ruralista caracteriza-se como uma “estrutura transversal” à organização dos partidos políticos, e representa o interesse de um setor específico da sociedade, no caso os produtores rurais brasileiros. Trata-se de estruturas que são organizadas para a disputa pela hegemonia sobre as políticas do Estado. Embora as raízes da bancada ruralista brasileira remontem ao período colonial, seu surgimento é resultado do advento do Parlamento, instituição responsável por legislar, e, portanto,  determinante na ação do Estado. Nesse novo contexto político, sua apropriação constitui elemento preponderante para a permanência e a reprodução das frações das classes dominantes no poder, além de ilustrar como o espaço do Estado pode ser praticado por grupos elitistas engajados com o objetivo conservador de perpetuarem-se no poder. As reformulações da política do século XX tiveram grande impacto sobre a composição e a organização de grupos de interesse. A bancada ruralista contemporaneamente presente no Congresso Nacional tem suas origens mais especificamente na atuação da União Democrática Ruralista (UDR) durante a Assembleia Nacional Constituinte de 1987, com vistas a barrar a realização de uma urgentíssima reforma agrária no Brasil.
A origem do ministério está na criação pelo imperador Dom Pedro II, em 28 de julho de 1860, decreto nº 1.067 da Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Após a Proclamação da República, em 1892, a Secretaria foi transformada em Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, pelo decreto nº 1.142, ficando os assuntos de agricultura responsabilidade da segunda seção da terceira diretoria do ministério. Em 1909, recriada a pasta da agricultura, pelo decreto nº 7.501, em um ministério que incorporou as atividades ligadas à indústria e ao comércio, sendo designado de Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Em 1930, absorve nova alteração, com a criação do Ministério da Agricultura. Em 1992, é novamente alterada a denominação para Ministério da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária, e, em 1996, excluída a Reforma Agrária, para Ministério da Agricultura e do Abastecimento.
Em 2001 burocraticamente recebe a denominação atual correspondente ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Em 5 de março de 2018 o Diário Oficial da União (DOU) publicou a portaria nº 249, de 22 de fevereiro de 2018 que inclui a necessidade de aprovação do Código de Conduta Ética dos Agentes Públicos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento estabelece princípios e normas de conduta ética aplicáveis aos agentes públicos do MAPA, prevendo, portanto, de forma complementar, e sem prejuízo, aos contidos no Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal instituído pelo Decreto n° 1.171, de 22 de junho de 1994, e no Código de Conduta da Alta Administração Federal. É responsável pela gestão das políticas públicas de estímulo à agropecuária, pelo fomento do agronegócio e pela regulação e normatização de serviços vinculados ao setor.
A agricultura familiar, do ponto de vista do produtor rural, ao contrário do que muitos economistas tentam classificar como inviável por sua economia de escala e inserção dentro do processo de agronegócios e globalização, apresenta uma série de vantagens que a torna viável. As seguintes constatações são indicativas da viabilidade da agricultura familiar: 1. Em primeiro lugar seu papel amortizador nos períodos de crises (cíclicas) econômicas, devido à capacidade de absorção de mão-de-obra; 2. Em segundo lugar constitui uma garantia de estabilidade de produção e oferta de certos produtos básicos da alimentação, pouco ou não contemplados pela agricultura patronal; 3. Sua possibilidade dentre muitos casos, gerar produtos de melhor qualidade e a custos menores; 4. Finalmente, quando há segurança de posse da terra, favorecer a preservação do ambiente e à gestão ordenada do espaço. A adaptabilidade da agricultura familiar é facilmente comprovada pelo fato desta força de trabalho ter predominado histórica e politicamente sobre a forma patronal de produção em todos os países capitalistas.
A luta pela posse da terra contraria a exclusão social no Brasil. É histórica e condicionada em última instância pelas formas de trabalho pré-capitalistas de produção, começando pelos negros fugitivos que formaram os quilombos, os quais lutavam pela liberdade e direito à terra, passando por rebeliões como Canudos, Caldeirão do Crato no Nordeste e vários outros movimentos sociais no sul do país. A problemática da reforma agrária, a qual vinha se mantendo latente nos finais dos anos 1950 e início dos anos 1960, teve várias propostas formuladas e, no interior de sua diversidade, contava com o apoio de um amplo espectro de instituições, grupos e partidos políticos. Durante o período militarista de 1964-84 foi promulgado o Estatuto da Terra que, como legislação, contraditoriamente coincidiu com um regime de exceção. Uma das marcas notáveis nos últimos 40 anos foi a emergência dos trabalhadores rurais na cena política, constituindo-se hic et nunc como sujeitos sociais. As Ligas Camponesas foram organizações que ficaram identificadas com as mobilizações no campo ocorridas anteriormente ao golpe de 1° de abril de 1964. A primeira delas foi criada em 1955, no Engenho Galileia (PE).
Durante esses quinze anos, Julião peregrinou pelos canaviais da Zona da Mata de Pernambuco, conquistando a confiança dos camponeses como advogado. Tinha feito uma escolha. Não queria defender os poderosos. Transformado em líder das Ligas Camponesas, Julião foi considerado um santo entre os sem-terra. Aos olhos de quem os combatia era chamado de agitador, incendiário, comunista. Julião agradecia o título de agitador, dizendo que sempre fora, “mas dentro da lei”. Deste polo tendo à frente o advogado e deputado Francisco Julião (PSB), elas rapidamente se expandiram por vários municípios pernambucanos, chegando mesmo a estabelecer núcleos em outros estados do Nordeste e a alcançar projeção nacional no início da década de 1960. Estes movimentos ressurgiram vigorosamente nas décadas 1980-90, através dos movimentos associativos dos trabalhadores rurais sindicalizados, como o mais importante movimento social do país, fora do perímetro das cidades e responsável pela mobilização do maior contingente de trabalhadores rurais da história brasileira. Como resultado parcial das pressões deste movimento inicia-se um processo politico de assentamentos rurais.

A legislação brasileira vigente é suficiente para a regulamentação da reforma agrária. Não é por falta de lei que não se distribuem terras. Com a Lei Agrária nº 8.254/1993, que determina a desapropriação das grandes propriedades improdutivas, o governo poderia dispor de 115 milhões de hectares que se enquadram nessa classificação. Seriam atingidos por essa lei 57.188 proprietários, correspondendo a 2,8% do total. Com a disponibilidade de 115 milhões de hectares, tomando-se por base um módulo médio de 15 hectares, mais de 5 milhões de famílias de trabalhadores, ou seja, o total dos sem-terra existentes, poderiam ser beneficiadas sem que fossem afetados nenhum hectare de terra produtiva. Quando se traça o perfil do assentado nota-se que a grande maioria estava ligada às atividades agropecuárias, totalizando em torno de 70% deste total. E de 54 % eram anteriormente agricultores ou camponeses, as outras ocupações anteriores são de natureza urbana, o que indica a capacidade de atração combinada com prováveis efeitos da fragilidade das estruturas de emprego urbano da atual conjuntura do país (cf. Censo Reforma Agrária, 1997). O modelo de exploração agropecuário adotado pelos assentados tende a reproduzir o modelo agrícola da chamada Revolução Verde,  dependente de insumos externos e degradantes para o ambiente.
Enfim, a proposta de Reforma Agrária no Brasil desenvolve-se a partir da premissa ideológica de que o país possui um potencial de recursos naturais, uma economia diversificada e de grande porte, que podem perfeitamente gerar poupança suficiente para sustentar um processo estável e contínuo de desenvolvimento. A demanda por terra e a sua ocupação efetiva exigem uma política agrária mais criativa e efetiva, que dê condições de manutenção na atividade agrícola para o trabalhador rural existente e permita uma partilha justa da terra de maneira sustentável com o fim do trabalho escravo. Ao promover a Reforma Agrária com o estabelecimento da agricultura familiar, o Estado contribuirá para reduzir o ritmo da migração campo-cidade. Isto porque ocorre um fluxo de pessoas migrando entre as culturas de diferentes cidades em um mesmo território. Pois elas obedecem a algumas razões econômicas, sociais e naturais, evidenciando a existência de inúmeros outros fenômenos. Pretendem diminuir a desigualdade social de distribuição das terras e absorver parte da mão-de-obra que vem perdendo postos de trabalho nas últimas décadas, e assim tornar-se cidadã de fato e de direito da parcela que não encontra mais espaço nem na cidade e nem no campo.
Bibliografia geral consultada.
SZNELWAR, Laerte Idal, Analyse Ergonomique de l’exposition de Travailleurs Agricoles aux Pesticides. Essai d’ergotoxicologie. Thèse Doctorat en Ergonomie. Paris: CNAM, 1992; LOBATO, Sandra Maria Rickmann, O Silêncio como Metáfora: O Uso de Agrotóxicos e a Saúde de Agricultores no Município de Igarapé-Açú/Pará. Tese de Doutorado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido. Belém: Universidade Federal do Pará, 2003; CHRISTOFFOLI, Pedro Ivan, O Processo Produtivo Capitalista na Agricultura e a Introdução dos Organismos Geneticamente Modificados: O Caso da Cultura da Soja Roundup Ready (RR) no Brasil. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Sustentável. Brasília: Universidade de Brasília, 2009; FIGUEIREDO, Marcos Antonio Bezerra, Una Estrategia de Desarrollo local desde Experiencias Agroecológicas de la Región Cañera Pernambucana, Brasil. Tesis de Doctorado. Programa de Doctorado en Agroecologia. Departamento de Ciencias Sociales y Humanidades. Universidad de Córdoba, 2010; SILVA, Gina Caécia da, Uso de Agrotóxico e Impactos no Espaço Agrário de Brejo da Madre de Deus (PE), Recife. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2012; GARAGE, Jacqueline Mary, Exposição aos Resíduos de Agrotóxicos por Meio do Consumo Alimentar da População Brasileira. Dissertação de Mestrado. Piracicaba: Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2016; CASAGRANDE, Alessandro, Índice Agroambiental para Avaliar o Uso de Agrotóxicos (IAA) no Estado do Paraná. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Tecnologia e Sociedade. Curitiba: Universidade Tecnológica Federal do Paraná, 2018; MAULE FILHO, Tito Lívio, Fábulas Tóxicas: Os Agrotóxicos no Brasil da Agricultura Mundializada. Tese de Doutorado. Departamento de Geografia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2018;  BARBOSA, Mariana de Oliveira Lopes, História da União Democrática Ruralista (UDR) em Goiás: O Epicentro da Ação Ruralista na Constituinte de 1988. Tese de Doutorado em História. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2018; MEIRA, Mary Luce Melquiades, Impactos dos Agrotóxicos à Saúde do Trabalhador. Dissertação de Mestrado Profissional. Programa de Pós-Graduação em Sistemas Agroindustriais. Centro de Ciências e Tecnologia Agroalimentar. Paraíba: Universidade Federal de Campina Grande, 2018;  entre outros.

2 comentários:

  1. Ótimo artigo. Bem completo e referências consustentes. Parabéns por nos informar.

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  2. Prezado leitor (a). A ideia do blog No Pasarán!, além de estimular o debate público, sem máscaras sociais, sugere também trabalhos de crítica analítica nesta direção, dentro ou fora da academia. Grato.

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