“O coração do homem é como um moinho que trabalha sem parar”. Martin Lutero
O cinema dinamarquês na década de 1990 foi dominado pelo cineasta Lars von Trier. Seus filmes Europa (1991), Breaking the Waves (1996), The Idiots (1998) e Dancer in the Dark (2000) receberam grande atenção internacional e foram indicados a vários prêmios. O Dogme 95 Collective, representou um movimento social cinematográfico internacional lançado a partir de um manifesto publicado em 13 de março de 1995 em Copenhague, na Dinamarca. Os autores foram os cineastas dinamarqueses Thomas Vinterberg e Lars von Trier. Chamou a atenção do mundo ocidental do cinema internacional com seus estritos “votos de castidade” ou regras para cineastas que forçam os cineastas a se concentrarem na pureza da história e nas performances dos atores, em vez de efeitos especiais e outros dispositivos cinematográficos. O primeiro filme Dogme 95, The Celebration (Festen, 1998), dirigido por Thomas Vinterberg, recebeu muitos prêmios no circuito internacional de festivais de cinema e foi nomeado pela Los Angeles Film Critics Association e pelo New York Film Critics Circle como “o melhor filme de língua estrangeira filme do ano”. Os membros do Dogme 95 Collective eram von Trier, Vinterberg, Kristian Levring e Søren Kragh-Jacobsen. Embora o movimento Dogme 95 tenha se originado na Dinamarca, cineastas de todo o mundo logo experimentaram as diretrizes rígidas e buscaram a certificação para seus filmes como Dogme. Além disso, o próprio filme Dogma (1995)de Lars von Trier, Idioterne (1998), iniciou uma onda separada de filmes mainstream de arte com sexo não simulado. Lars von Trier também fez história cinematográfica ao ter sua empresa Zentropa sendo a primeira empresa de cinema mainstream do mundo “a produzir filmes pornográficos hardcore”.
Três desses filmes: Constance (1998), Pink Prison (1999) e o crossover adulto/mainstream All About Anna (2005), foram realizados principalmente para um público feminino e foram extremamente bem sucedidos na Europa, com os dois primeiros sendo diretamente responsáveis pela “legalização da pornografia em março de 2006 na Noruega”. O cinema dinamarquês continua a ser influenciado positivamente pelo Estado através do bem-sucedido Danish Film Institute (DFI), fundado em 1972. É a agência nacional de cinema e cultura cinematográfica do Ministério da Cultura. DFI apoia o desenvolvimento, produção e distribuição de filmes e administra os arquivos nacionais. Os programas de apoio também se estendem à educação cinematográfica de coproduções internacionais e à promoção internacional em festivais de cinema. Apenas uma semana antes de vencer em Göteborg, A House Made of Splinters (2022) recebeu o World Cinema Documentary Directing Award em seu lançamento mundial em Sundance. – “As in Heaven” estreou no Festival de Cinema de Toronto (2021) e ganhou duas Conchas de Prata em San Sebastian de Melhor Diretor para Tea Lindeburg, o primeiro dinamarquês a ganhar este prêmio, e de melhor desempenho para Flora Ofelia Hofmann Lindahl, mais reconhecida como Flora Ofelia, cantora e atriz dinamarquesa que venceu o concurso de canto do Festival Eurovisão da Canção (2015), com sua canção “Du Du Du Du” e desde então apareceu na série de televisão Cry Wolf e no longa-metragem As in Heaven, dividindo o prêmio com Jessica Chastain. São reconhecidos os vencedores do Festival de San Sebastián, que penetraram na sua 58ª edição. O Festival Internacional de Cinema de San Sebastián decorreu de 17 a 25 de setembro, no País Basco espanhol, em San Sebastián.
A DFI Film House é aberta ao público e abriga a Cinemateca nacional. Inclui uma biblioteca, um arquivo de fotos e pôsteres e um arquivo de filmes. A DFI apoia a produção de 20-25 longas-metragens e 25-30 documentários e curtas-metragens todos os anos. Existem três tipos de apoio: o esquema do comissário de cinema, o esquema de mercado e o de desenvolvimento de talentos na New Danish Screen. A DFI incentiva parcerias internacionais e permite 5-9 coproduções menores em longas-metragens e 4-6 coproduções menores em documentários por ano. Uma pedra angular da política cinematográfica dinamarquesa é financiar filmes infantis e juvenis para os quais 25% de todos os subsídios são alocados. DFI recebeu críticas por falta de inovação - notavelmente, Dogme 95 aconteceu apesar do financiamento do Film Institute - e às vezes é acusado de nepotismo e compadrio, por exemplo, quando o comissário de cinema Mikael Olsen de 1998 a 1999 deu luz verde a 28 milhões de coroas de dinheiro de subsídio para seu amigo de infância Peter Aalbæk Jensen, é um produtor cinematográfico dinamarquês que em 1992, com Lars von Trier, fundou a produtora cinematográfica dinamarquesa Zentropa e mais tarde um enorme complexo de estúdios Filmbyen. Seu pai era o escritor Erik Aalbæk Jensen (1923-1997), depois passou a trabalhar para ele “em uma posição de alto escalão”. O Danish Film Institute, no entanto, também alcançou alto nível de profissionalismo, policompetente, para lembrarmos de Edgar Morin, mesmo que mais ou menos reservado para alguns gêneros e empresas de produção selecionados, principalmente Nordisk Film, Zentropa e Nimbus Film. Em fevereiro de 2008, a Nordisk Film comprou metade da Zentropa, que coproduz com a Nimbus Film, mas esses monopólios financiados (cf. Hilferding, 2011) por impostos e sancionados pelo Estado muito raramente são desaprovados na Dinamarca.
Gothersgade
corre ao longo do antigo curso original da Muralha Oriental do antigo Anel de
Fortificação de Copenhague. Originalmente Ny Kongensgade, literalmente “Rua do
Novo Rei”, foi estabelecido por volta de 1647 depois que a Muralha Oriental foi
tomada em uma direção mais ao norte para expandir a cidade fortificada com uma
grande área nova reconhecida como Nova Copenhague. Nesse ponto, a rua só ia até
o local da atual Estação Nørreport, onde se encontrava como fortificações a Nordeste do North City Gate. Em 1870, após o desmantelamento das fortificações
e o nivelamento dos seus terrenos, a rua foi alargada em seu comprimento atual.
Em 1892, a primeira usina pública de eletricidade de Copenhague, a Gothersgade
elektriske Centralstation, foi inaugurada na esquina de Gothergade e Adelsgade.
Foi instalado atrás das fachadas das casas em direção a Gothergade e era
incomum por sua localização central. Foi ampliado e modernizado diversas vezes.
Contudo, desde 1994 ela funciona apenas como subestação de distribuição de
eletricidade e aquecimento central. Em 1920-1930, uma seção de Gothersgade dos extraordinários Jardins do Castelo de Rosenborg ao Lago Sortedam foi ampliada.
O
filme Um Homem de Sorte (2018) baseado no livro “Lykke-Per”
(1898-1904), de Henrik Pontoppidan, nascido em Fredericia, em
24 de julho de 1857 e morto em Copenhagen, em 21 de agosto de 1943, foi um
escritor galardoado com o Nobel de Literatura de 1917. Os
três romances que considerados como as principais obras de
Pontoppidan foram escritos de 1890 a 1920. Nestas obras estabeleceu, segundo
ele próprio, uma versão dinamarquesa do romance como “ampla descrição da
sociedade”, na tradição de Honoré de Balzac (1799-1850) e Émile Zola (1840-1902). Centrada num herói,
ele apresenta um quadro da Dinamarca de seu tempo da luta constitucional entre
Conservadores e Liberais, da industrialização in statu nascendi, dos
conflitos culturais e do despertar dos movimentos sociais revolucionários. Dirigido
por Bille August, o longa-metragem narra a história social de Peter Andreas
Sidenius (Esben Smed), um talentoso estudante de engenharia que cresceu ambientado
com uma família religiosa na cidade de Jutland, na Dinamarca. Ao ser admitido na
faculdade, o jovem abandona raízes religiosas do Luterano pai para tentar a
sorte em Copenhague. Com carta de
aceitação, o jovem se sente encorajado a romper com os pais religiosos, e parte
para onde deverá viver pelos próprios meios, sem auxílios nem privilégios. Em Copenhague, conhece figurações que irão desempenhar papéis
fundamentais em sua psicologia, revelando vícios e virtudes. Um Homem de Sorte revela um protagonista multifacetado e movido
por sentimentos contraditórios.
A
única oportunidade na vida em que os indivíduos têm de buscar sozinhos a
realização dos anseios pessoais, predominantemente com base em suas próprias
decisões, envolve um tipo especial de risco. O conceito de figuração, segundo
Elias (2006) distingue-se de outros conceitos teóricos da sociologia por
incluir expressamente os seres humanos em sua formação social. Contrasta com um
tipo dominante de formação de conceitos que se desenvolve sobretudo na
investigação de objetos sem vida, portanto no campo da física e da filosofia
para ela orientada. Há figurações de estrelas, per se como as de plantas e de
animais. Mas apenas os seres humanos formam figurações uns com os outros. O
modo de sua vida conjunta em grupos grandes e pequenos é, de certa maneira,
singular e sempre co-determinado pela transmissão de conhecimento de uma
geração a outra, por tanto por meio do ingresso singular do mundo simbólico
específico de uma figuração sociológica já existente de seres humanos. Às
quatro dimensões espaço-temporais indissoluvelmente ligadas se soma, no caso
dos seres humanos, uma quinta, a dos símbolos socialmente apreendidos. Sem sua
apropriação, sem, por exemplo, o aprendizado de uma determinada língua
especificamente social, culturalmente os seres humanos não seriam capazes de se orientar no
seu mundo nem de se comunicar uns com os outros. Um ser humano adulto, que não
teve acesso aos símbolos da língua e conhecimento de grupo permanece fora das
figurações humanas, pois não é um humano; é um ser a-social.
As
diversas definições funcionalistas de controle social, por exemplo, são
demasiado amplas e vagas, e, portanto, seria legítimo indagar, escolhendo-as
mais ou menos ao acaso, para inferir que resultam em termos de um controle,
isto é, qualquer estímulo ou complexo de estímulos que provoca uma determinada
reação. Assim, pois, todos os estímulos são controles, pois representam a
direção do comportamento por influências grupais, estimulando ou inibindo a
ação individual ou grupal. O controle social pode ser definido, portanto, como
a soma total ou, antes, o conjunto de padrões culturais, símbolos sociais,
signos coletivos, valores culturais, ideias e idealidades, comparativamente
tanto como atos quanto como processos diretamente ligados a eles, pelo qual a
sociedade inclusiva, cada grupo particular, e cada membro individual participante
superam as tensões e os conflitos entre si, através do equilíbrio temporário, e
se dispõem a novos esforços criativos. Ipso facto, em toda a dimensão da vida
associativa deverá haver algum ajustamento de relações sociais tendentes a
prevenir a interferência de direitos e privilégios entre os indivíduos. De
maneira mais específica, são três as funções do que podem ser estabelecidas
pelo meio de trabalho e de controle social: a obtenção e a manutenção da ordem,
da proteção social e da eficiência social.
O
seu emprego na sociologia contribuiu consideravelmente para produzir uma
simplificação do ponto de vista técnico-metodológica ou redução sociológica na
análise dos problemas sociais, conseguida proporcionalmente, graças à
compreensão positiva da integração das contradições correspondentes no sistema
de organização das sociedades e da importância relativa de cada um deles, como
e enquanto expressão do jogo social. Embora obscuro e equívoco, em seu
significado corrente, o conceito de controle social é necessário à sociológica
na modernidade, encontraram um sistema de referências propício à sua crítica
analítica científica, seleção lógica e coordenação metódica. O crescimento de
um jovem convivendo e habitando comum em figurações humanas, como processo
social e experiência, assim como o conjunto do aprendizado de um determinado
esquema de autorregulação na relação social com os seres humanos, é condição
indispensável ao desenvolvimento rumo à humanidade. Neste sentido, não queremos
perder de vista que “socialização” e “individualização” de um ser humano, são
nomes diferentes para o processo. Cada ser humano assemelha-se aos
outros, e é, ao mesmo tempo, diferente de todos os outros. Por vezes teorias sociológicas ou filosóficas deixam sem resolver o essencial da relação dialética entre indivíduo e sociedade.
O
convívio dos seres humanos tem sempre, mesmo no caos, na
desintegração, na maior desordem social, uma forma absolutamente determinada. É
isso que o conceito de figuração exprime. O processo de concentração física de
força pública se acompanha de uma desmobilização da violência ordinária. A
violência física só pode ser aplicada por um agrupamento especializado,
especialmente mandatado para esse fim, claramente identificado no seio da
sociedade pelo uniforme, portanto um agrupamento simbólico, centralizado e
disciplinado. A noção de disciplina, sobre a qual Max Weber escreveu páginas
magníficas, é capital: não se pode concentrar a força física sem, ao mesmo
tempo, controla-la, do contrário é o desvio da violência física, e o desvio da
violência física está para a violência física assim como o desvio de capitais
está para a dimensão econômica: ou seja, é o equivalente da concussão. A
violência física pode ser concentrada num corpo formado para esse fim,
claramente identificado em nome da sociedade em si pelo uniforme simbólico,
especializado e disciplinado, isto é, capaz de obedecer como um só homem a uma
ordem central que, em si mesma, não é geradora de nenhuma ordem. O conjunto das
instituições mandatadas para garantir a ordem, a saber, as forças públicas e de
justiça, são separadas pouco a pouco do mundo social corrente. Essa
concentração do capital físico se realiza num duplo aspecto e contexto.
Para uns, o desenvolvimento do exército profissional está ligado à guerra,
assim como o imposto sobre o trabalho humano e renda econômica e social; mas
há também a guerra interior, a guerra civil, a arrecadação do imposto como uma
espécie de guerra civil.
Na
cidade grande, o rapaz tenta divulgar um projeto acadêmico com potencial
revolucionário no controle de fornecimento de energia e iluminação pública na
cidade. Em pleno final do século XIX, ao invés de usar o carvão, como
matéria-prima, que é finito, a energia “seria captada das forças da
natureza, como o vento e as ondas do mar. Neste sentido para atrair atenção ao
seu trabalho, Peter passa a frequentar a casa da família Solomon e logo se
interessa por Jakobe (Katrine Greis-Rosenthal), a filha mais velha, que é noiva
de Eybert (Rasmus Bjerg). O bom trabalho
de Esben Smed é essencial para o andamento do filme. O drama do século XIX
apresenta três histórias sociais sobre o seu protagonista. sua relação com a
religião após uma infância complicada, seu interesse por diversas mulheres e
sua batalha contra os seus “monstros interiores” enquanto convive em sociedade.
O mérito da obra de Bille August é apresentar que o mesmo orgulho que motiva
Peter pode representar seu fim, o que pragmaticamente quer dizer, segundo Max
Weber: “fim é a representação de um resultado que se converte em causa de uma
ação”.
Entretanto
se o protestantismo Luterano é a religião oficial, sua influência na sociedade
dinamarquesa não se assemelha nem um pouco à influência religiosa de formação
nem um pouco exercido no restante do continente europeu. O protagonista demonstra que tem o controle
da situação quando o assunto é seu emprego, mas se perde para a arrogância
quando precisa demonstrar gentileza. Sem conseguir resolver seus problemas com
os pais, Peter prefere ter uma angústia permanente. E essa angústia transforma
a vida de diversas pessoas, seja para o lado positivo ou negativo. O diretor
não se apressa para o desenvolvimento ficcional – são 2 horas e 47 minutos sem o
menor receio de alongar as cenas. Apesar de ser a proposta do filme, sua
duração também joga contra seu próprio enredo. Quer dizer, não existe uma
grande cena, um ápice na história de Peter. As cenas são direcionadas para
servir aos sentimentos do personagem de Smed. O roteiro, que o diretor
divide a coautoria com Anders Frithiof August, retomando o questionamento relevante na história de Peter: os valores enraizados na infância podem influenciar
através da memória na criação e desenvolvimento de ideias de um adulto.
O
filme Um Homem de Sorte é um extraordinário exemplo de penetração da revolucionária
modernidade da arte, sem distanciar-se da proximidade com a humildade e o
altruísmo, que são pródigos benefícios que deveriam aparecer naturalmente nas
pessoas, independente da vocação religiosa. A obra reforça também a importância
de cada pessoa lutar contra seus próprios preconceitos para permitir-se um desaguar
com a felicidade. A busca pelo revolucionário é plausível desde que o egoísmo
abra espaço para a humildade. Filho de um vigário da Jutlândia e pertencente a
uma antiga família de vigários de carreira e per se de notáveis escritores,
Pontoppidan não desistiu aparentemente da formação técnico-metodológica como
engenheiro, mas trabalhou como professor primário, tendo-se dedicado ao
jornalismo independente e à escrita a “tempo inteiro” (tout court)
fazendo a sua estreia literária em 1881. Quanto ao estilo, Pontoppidan tem sido
descrito como “naturalista inato”. A sua linguagem parece pura, simples e facilmente,
mas muitas vezes está carregada de símbolos e sugestões claras secretas, ironia
disfarçada e descrições objetivas. Ele revia com frequência os trabalhos
anteriores, simplificando-os, mas mudando a sua trama ou aguçando a sua
atitude.
As
motivações que ordenam os símbolos não apenas já não formam longas cadeias de
razões, mas nem sequer cadeias. A explicação linear tipicamente de dedução
lógica ou narrativa introspectiva não basta para o estudo das motivações
simbólicas. A classificação dos grandes símbolos da imaginação em categorias
motivacionais distintas apresenta, com efeito, pelo próprio fato da não
linearidade e do semantismo das imagens, grandes dificuldades. Metodologicamente,
se se parte dos objetos bem definidos pelos quadros da lógica dos utensílios,
como faziam as clássicas “chaves dos sonhos”, segundo as estruturas
antropológicas do imaginário, cai-se rapidamente, pela massificação das
motivações, numa inextricável confusão. Parecem-nos mais sérias as tentativas
para repartir os símbolos segundo os grandes centros de interesse de um
pensamento social, certamente perceptivo, mas ainda completamente impregnado de
atitudes assimiladoras nas quais os acontecimentos perceptivos não passam de
pretextos para os devaneios imaginários. Tais são algumas questões, as
classificações profundas das motivações do simbolismo
religioso ou da imaginação de modo geral literária.
No
prolongamento dos esquemas explicativos, arquétipos e simples símbolos modernos
podem-se considerar o mito. Lembramos, todavia, que não estamos tomando este
termo na concepção restrita que lhe dão os etnólogos, que fazem dele apenas o
reverso representativo de um ato ritual. Entendemos por mito, “um sistema
dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico que, sob o
impulso de um esquema, tende a compor-se na narrativa”. O mito é já um esboço
de racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se
resolvem em palavras e os arquétipos em ideias. O mito explicita um esquema ou
um grupo de esquemas. Do mesmo modo que o arquétipo promovia a ideia e que o
símbolo engendrava o nome, podemos dizer que o mito promove a doutrina
religiosa, o sistema filosófico ou, como bem observou Émile Bréhier (1876-1952),
a narrativa histórica e lendária. O método de convergência evidencia o mesmo
isomorfismo na constelação e no mito. Enfim, para sermos breves, este
isomorfismo dos esquemas, arquétipos e símbolos no seio dos sistemas míticos ou
de constelações estáticas pode levar-nos a verificar a existência de protocolos
normativos das representações imaginárias, bem definidos e relativamente
estáveis, agrupados nos esquemas originais e que vis-à-vis a
literatura refere-se como estruturas.
A
atividade dialética surge esboçada em princípio como atividade e a
partir da análise da noção de “corpúsculo”. Tendo como certo que o filósofo
deve tentar compreender a novidade da linguagem e ao mesmo tempo aprender a
formar noções e conceitos novos para resistir aos conhecimentos comuns e à
memória cultural, Bachelard, tentando precisar a noção de “corpúsculo”,
rememora uma sequência de teses: o corpúsculo não é um pequeno corpo. Não é
fragmento de substância. O corpúsculo não tem dimensões absolutas definidas. Só
existe nos limites do espaço em que atua.
Correlativamente, se o corpúsculo não tem dimensões definidas, não tem,
portanto, forma reconhecida. Melhor dizendo, o elemento não tem geometria. E, ipso
facto, não se lhe pode atribuir um lugar muito preciso em virtude do
princípio da indeterminação na Física de Werner Heisenberg (1927), a sua
localização é submetida a tais restrições que a função de existência situada
não tem mais valor absoluto. Em várias circunstâncias, a microfísica põe como
um verdadeiro princípio a perda da individualidade do corpúsculo. Enfim, trata-se de comprender e assinalar uma
última tese que contradiz o axioma fundamental do chamado atomismo filosófico.
Complementarmente com as suas reflexões acerca da imaginação criadora e da poética, Bachelard infere que os corpúsculos, não sendo dados dos sentidos, “nem de perto nem de longe”, também não são dados escondidos. No entanto, apenas é possível conhecê-los, descobrindo-os, ou melhor, inventando-os, porque eles são a prova de que algo está no limite da invenção e da descoberta. Admirável é, então, a referência que Bachelard faz à noção de intuição trabalhada. Em Études, no ensaio “Idealismo discursivo” ele sublinha que tem alguma confiança e garantia na intuição para descrever positivamente o seu ser íntimo. Diz mesmo que o fato de exercermos uma preparação discursiva dá à intuição uma nova Jeunesse. De maneira que aconselha a fecharmos os olhos como uma forma de nos prepararmos para termos uma visão do nosso ser. A intuição será a via refletida de renunciar aos acidentes na história e significa um recurso metafísico de compreensão “de si”. Interessa, então, a intuição trabalhada e não a intuição imediata, a intuição que permite uma espécie de “repouso”, mesmo sabendo que na ciência, esse “repouso” na intuição pode ser “quebrado” por uma nova necessidade de rigor metafísico e pela necessidade de encadear mais forte as teorias sociais. Esta valorização da intuição intelectual em detrimento da intuição sensível torna-se nítida quando o realismo das primeiras deve pôr-se entre parêntesis, uma vez que a apreensão do real não se satisfaz com imagens primeiras, isto, já presente na alegoria da caverna.
As imagens podem ser então, se quisermos ser “boas” e “más”, indispensáveis e perigosas, dependendo da moderação no seu uso e da instância da redução em que as imagens devem permanecer quando as queremos usar para descrever um mundo que não se vê, ou fenômenos que não aparecem. Na ciência é preciso ir das imagens às ideias e este caminho é de análise, de discussão e de ordenação. Com certeza, também de polêmica, uma razão polêmica pode pensar-se como uma razão que tanto sabe afirmar, em reação às negações oficiais antecedentes, como negar afirmações anteriores a partir dos valores da verificação e da descoberta; uma razão polêmica crítica e introduz “nãos” que passam a desempenhar um papel pedagógico decisivo na produção de conhecimento por darem a compreender que na interpretação toda a afirmação não é sinônimo de conhecimento e que aquilo que é dado como verdadeiro aparece, muitas vezes, sob um fundo de erros e de ignorâncias tomadas como antecedentes. O espírito, exigindo aproximações sucessivas da experiência deve afastar-se daquelas teses cartesianas da razão. O novo espírito sabe-se que todo o problema da intuição se encontra subvertido, trabalhado. Enfim, a reflexão teórica não escolhe manter as práticas à distância de seu lugar, de maneira que tenha de sair para analisá-las, mas basta-lhe invertê-las para se encontrar em casa. Ela repete o corte que efetua. Este lhe é imposto através e pelo condiconamento em si da própria história.
Os
procedimentos sem discurso são coligidos e fixados em uma região que o passado
organizou e que lhes dá o papel, determinante para a teoria, de ser
constituídos em “reservas” selvagens para o saber esclarecido. Esses
procedimentos foram aos poucos adquirindo um valor fronteiriço, à medida que a
razão que surgiu da Aufklärung ia determinando suas disciplinas, suas
coerências e seus poderes. Aparecem então como alteridades e “resistências”,
relativas às escrituras científicas cujo rigor e operatividade se vão
precisando a partir do século XVIII. Em nome do mesmo progresso, vê-se ocorrer
o diferenciamento, de um lado, das artes (ou maneiras) de fazer, cujos títulos
se multiplicam na literatura popular, objetos de crescente curiosidade dos
“observadores do homem” e, de outro lado, as ciências esboçadas por uma nova
configuração do saber. A distinção não
se refere mais essencialmente ao binômio tradicional da “teoria” e da
“prática”, especificado pela separação entre a “especulação” que decifra o
livro do cosmos, e as “aplicações” concretas, mas visa duas operações
diferentes, uma discursiva (na e pela linguagem) e a não discursiva.
Desnecessário dizer que, desde o século XVI, a ideia de método abala progressivamente
a relação entre o conhecer e o fazer, a partir das práticas do
direito, da retórica, mudadas pouco a pouco em “ações” discursivas que se
exercem em terrenos diversificados e, portanto, em técnicas de transformação de
um ambiente, impõe-se o esquema fundamental de um discurso que organiza a
maneira de pensar em maneira de fazer, em gestão racional de uma produção em
operação regulada sobre campos apropriados. Eis o “método”, semente da
cientificidade moderna.
No fundo, o método sistematiza a arte que Platão já colocava sob o signo da atividade. Mas é por um discurso que ele ordena um saber-fazer. Portanto, a fronteira não separa mais dois saberes hierarquizados, um especulativo, o outro ligado às particularidades, um ocupado em ler a ordem cósmica e o outro às voltas com os pormenores das coisas no quadro que lhe é fixado pelo primeiro, mas ela opõe as práticas articuladas pelo discurso às que (ainda) não o são. Trocando em miúdos, admitimos que do “saber-fazer” não discursivo, per se sem escritura, não é o discurso do método do que é ao mesmo tempo escritura e ciência, assim pensando qual será o estatuto? É refeito de operatividades múltiplas, mas selvagens. Essa proliferação não obedece à lei do discurso, mas obedece já à lei da produção, valor último da economia fisiocrata e depois capitalista. Ela contesta, portanto, à escritura científica o seu privilégio de organizar a produção. Ela irrita e estimula volta e meia os técnicos da linguagem. Pede uma conquista, não como de práticas desprezíveis, mas ao contrário de saberes “engenhosos”, “complexos” e “operativos”. De Francis Bacon e Christian Wolff ou Jean Beckmann, faz-se gigantesco esforço para colonizar essa imensa reserva comparativamente de “artes” e “ofícios” que, por não conseguirem ainda articular-se em torno de uma ciência, podem ser já introduzidos na linguagem pela “descrição” etnográfica e, deste modo, levados a uma maior idealização da “perfeição”.
Mediante esses dois termos e com a “descrição” que depende da narratividade e a “perfeição” que tem em mira uma otimização técnica, compreendemos que a posição das “artes” é fixada perto, mas fora da ciência. A arte é, portanto, um saber que opera fora do discurso esclarecido e que provavelmente lhe falta. Mais ainda, esse saber-fazer precede, por sua complexidade, a ciência esclarecida. O princípio de uma operação etnológica sobre essas práticas já se acha então posto: o seu isolamento social pede uma espécie de “educação” que, graças a uma inversão linguística, vai introduzi-las no campo da escritura científica. Fato notável, desde o século XVIII ao XX, os etnólogos ou os historiadores e depois sociólogos consideram as técnicas respeitáveis em si mesmas. Destacam aquilo que fazem. Não sentem a necessidade de interpretar. Basta descrever. Ao contrário, consideram como “lendas” que significam outra coisa diferente do que dizem as histórias pelas quais um grupo social situa ou simboliza suas atividades. Estranha disparidade entre o tratamento dado às práticas sociais e dado aos discursos. Onde o primeiro registra uma “verdade” do fazer, o outro decodifica as “mentiras” do dizer. As breves descrições do primeiro tipo contrastam, aliás, com as interpretações prolixas que fizeram dos mitos ou das lendas um objeto privilegiado pelos profissionais da linguagem, “clérigos” com longa experiência, com procedimentos hermenêuticos transmitidos dos juristas aos professores e/ou etnólogos para glosar e “traduzir” em textos científicos ou documentos referenciais.
Para
sermos breves, a pergunta é: existiria então uma ciência onde “tudo seja fruto
da reflexão”? Seja como for, usando um vocabulário bem próximo da Enciclopédia
(que mencionava o contemplar), cabe à teoria “refletir” esse “todo”. De modo
ainda mais geral, para Émile Durkheim a sociedade é uma escritura que só se faz
legível por ele. Aqui existe um saber já escrito nas práticas, mas ainda não
esclarecido. A ciência fornecerá o espelho para torná-lo legível, com o
discurso “refletindo” uma operatividade imediata e precisa, mas privada da
linguagem e consciência, já sábia, mas paradoxalmente inculta. A arte constitui
em relação à ciência um saber em si mesmo, desde Friedrich Hegel (1770-1831), essencial. Posição
perigosa para a ciência, pois só lhe resta poder dizer o saber que lhe falta.
Entre a ciência e a arte, considera-se não uma alternativa, mas a
complementaridade e, se possível, a articulação. A literatura se muda em
repertório dessas práticas desprovidas de copyright tecnológico. São elas ainda
que logo vão ocupar um lugar privilegiado nos relatos dos clientes nas salas
das instituições psiquiátricas ou nos consultórios dos psicanalistas. Noutras
palavras há quem forneça às práticas genuinamente o escrínio de liberdade.
No
tempo, diz-se, tudo surge e tudo passa e perece, se se abstrai de tudo,
do recheio do tempo e do recheio do espaço, fica de resto o tempo vazio
comparativamente como o espaço vazio – isto é, são então postas e representadas
estas abstrações de exterioridade, como se elas fossem existentes por si. Mas
não é o que no tempo surja e pereça tudo, porém o próprio tempo é este
vir-a-ser, surgir e perecer, o abstrair essente. O real de análise é bem
diverso do tempo, mas também essencialmente idêntico a ele. O real é limitado,
e o outro para esta negação está fora dele, a determinidade é assim nele
exterior a si, e daí a contradição de seu ser; a abstração opera nessa
exterioridade de sua contradição e a inquietação da mesma é o próprio tempo. O
finito é transitório e temporário, porque ele não é, como ocorre na
representação do conceito nele mesmo, a negatividade total, mas em si, como sua
essência universal, entretanto, diferentemente da mesma essência, é unilateral,
e se relaciona à mesma essência como à sua potência. Mas tais conceitos na sua
identidade conseguem livremente existente para si, Eu=Eu, é “em si” e “para si”
a absoluta negatividade e liberdade. Por isso o tempo não é potência dele, nem
ele está no tempo nem é algo temporal. Mas ele é muito mais a potência do
tempo, como sendo este apenas esta negatividade como exterioridade. Só o
natural, é, enquanto é finito, sujeito ao tempo; na constituição da ideia, o
espírito que é eterno.
Intuição trabalhada, como a entendera e
descrevera o filósofo Gaston Bachelard, significa assumir com essa ideia a
existência nominal de dois polos necessariamente presentes no universo cultural
humano. O polo da objetividade e polo da subjetividade, todavia, entrelaçados e
mediados complexamente nos duros e doces caminhos da constituição da mediação
científica assim como dos demais caminhos existentes, esta ideia cara à
concepção de ciência nestes tempos. O pensamento e a dimensão filosófica de
Bachelard se faz contemporâneo na atualidade potente de sua reflexão.
Felizmente fora da dinâmica consensual entre pesquisadores, pois é conhecido
por sua filosofia não cartesiana, não bergsoniana, não aristotélica e não
kantiana, visto que sua obra excede a epistemologia e a estética e comunicação
com diferentes áreas de saber. Representou o que se chamou de “novo espírito
científico” que, ao refletir sobre episteme, o conhecimento,
problematiza o erro em sua positividade e a importância real da retificação.
Seu novo racionalismo aberto e dinâmico, histórico e factual, inova a concepção
de imaginação social, é porque explora os devaneios e desconfia das
metáforas progressivas. A formação natural das expectativas não leva em
consideração os fatores comparativos previstos na sociedade como muito
incertos. Embora, em determinadas situações, fatos sociais que ocorrem de modo muito
incertos possam se tornar decisivos, tornando-se um guia razoável para as
decisões correntes e os eventos a que se atribui um grau elevado de uma profunda
confiança. Foi um “filósofo da solidão feliz” que de instantes
poéticos nos desestabiliza nas incertezas do mundo real objetivo.
A intuição, um sentimento que os seres humanos afirmam manifestar ao tomar uma decisão sobre algo ou uma situação, como forma de representação do conhecimento consiste na capacidade de reconhecer algo sem de fato ainda entender seu funcionamento. Está fundamentada na noção inicial que temos sobre algo, noção esta que nasce da experiência sensorial e/ou de uma análise superficial das características que compõe determinado elemento. Tomando como base esta noção inicial, conseguimos entender de forma pouco esclarecida do que se trata determinado elemento e já nos dispomos a emitir juízos acerca do mesmo. Todas estas concepções do homem, que se expressam de diversas formas, nasceram a partir da análise que seus sentidos o proporcionaram fazer. Mas há algo a mais nisto. Não bastariam ele olhar para a pedra e sentir seu peso para concluir estas coisas. Teria o homem que pensar por associação, por comparação. Entre habilidades ou competências importa destacar a relação contígua entre o ser capaz de pensar e o ser capaz de aprender e se basear em outras experiências. Têm-se nas reflexões anteriores, um exemplo desta forma básica de entender o mundo que nos cerca. O pensamento por associação. O conhecimento que se constrói através de memórias de experiências passadas e logo comparações com experiências presentes.
O raciocínio intuitivo hic et nunc da forma como foi apresentado, revela-nos uma superficialidade na forma de compreender o mundo. Retomando ao exemplo do homem: o mesmo não saberia explicar o porquê de nenhuma de suas conclusões, visto que ele se baseou somente em suas antigas experiências. Os fatos usados para formar a conclusão, não são compreendidos pelo homem, ele apenas sabe que são tal como são e aceita isso como natural. Além dessas substâncias e de outras, que estão em menor quantidade, o ar, por exemplo, também apresenta gotículas de água, poeira, e sobretudo partículas de vírus, bactérias e outro micro-organismos. Não entende ele, no plano abstrato da teoria “como” e nem o “por que” daqueles fatos sociais do dia a dia se apresentarem daquela maneira. Tudo que ele sabe, foi captado pelos sentidos, guardado em sua memória. Utilizado em seu dia-a-dia para entender o mundo que lhe é anterior e está ao seu redor. Para se compreender as embarcações a vela, tinha-se que trabalhar, ao menos por algum tempo, tendo como utilidade de uso a habilidade das próprias mãos. Entretanto, curiosamente, ao mesmo tempo, todos os oficiais navais, ao menos durante o período do século XVIII em diante, se viam, e queriam ser vistos pelos outros, nesta relação como gentlemen.
Apesar de ser reconhecido como um homem de posições e atitudes Pontoppidan continua a ser um dos mais discutidos escritores dinamarqueses modernos. Isto em parte por causa do seu carácter pessoal. Pontoppidan era um homem de muitos paradoxos: um nítido liberal no seu tempo, mas um firme patriota, um puritano anticlerical, uma natureza lutadora, mas desiludida, colaborando com os socialistas, mas sempre de uma posição independente e individualista. Mas também em parte devido ao seu estilo que muitas vezes tem sido considerado como ambíguo e impenetrável; a sua mistura de parcialidade e objetividade tem frequentemente confundido leitores e críticos e, de fato, liberais, radicais, conservadores, direitistas e socialistas, todos tentaram encontrar os seus próprios ideais nas obras dele. Ele tem sido considerado como o total antagonista de Georg Brandes e, melhor dizendo, seu aluno mais correto. De todos os escritores avançados modernos, Pontoppidan é o mais influente e o que viveu mais. Os seus escritos críticos marcam-no pioneiro da literatura dinamarquesa do século XX. Os conservadores têm-se inspirado na sua crítica do modernismo após a I Guerra Mundial. Estabeleceu um padrão de “romances sobre a sociedade”, que continua a ser relevante.
A
primeira fase da sua obra caracteriza-se por uma crítica social rebelde, tal
como se revoltou contra os antecedentes privilegiados da sua própria família.
Numa frase famosa, Henrik Pontoppidan zombou da latinização passada do apelido
da sua família, Pontoppidan, a partir do seu original dinamarquês Broby. Broby,
significa literalmente ponte (na) cidade ou, em latim, Pons Oppidum.
Henrik Pontoppidan zombou desta prática, que teve lugar no século XVII, como “a
má ideia do hábito de pessoas educadas, de decorar o seu bom nome dinamarquês
com um Adrienne (vestido feminino usado na época para dançar) latino, uma
ridícula plumagem de pavão”. Em contos prosaicos descreve impiedosamente a vida
dos camponeses e dos proletários do país, com quem ele vivia em contacto
próximo. Ele foi talvez o primeiro escritor dinamarquês progressista a quebrar
com o retrato idealizado dos agricultores. Os contos desta época estão
recolhidos em Landsbybilleder (Retratos de Aldeia, 1883) e Fra
Hytterne (A partir das Cabanas, 1887). É de importância a coletânea
de contos políticos de 1890 Skyer (Nuvens), uma descrição mordaz
da Dinamarca sob a autoritária semi-ditadura dos conservadores, tanto
condenando os opressores como desprezando a falta de insatisfação dos
dinamarqueses. Após este período histórico e pontual, ele concentrou-se cada
vez mais em problemas psicológicos e naturalistas sem desistir do seu
compromisso eminentemente social. A revisão em 1889 de Messias, por
Pontoppidan e a sua peça Den gamle Adam (O velho Adão) de 1890,
foram publicadas anonimamente e desencadearam uma polêmica após serem acusadas equivocadamente
de blasfemas. O editor Ernst Brandes(1844-1892) foi multado em 300 coroas por “Messias”,
em dezembro de 1891, desgraçadamente tendo-se suicidado em 1892.
Há
muito é lugar comum compreender que o discurso filosófico correlacionou verdade
e ser. Se verdade se encontra, justificadamente, num nexo originário com o ser,
então o fenômeno da verdade remete ao âmbito da problemática ontológica
fundamental. Três teses caracterizam a apreensão tradicional da essência da
verdade e a opinião gerada em torno de sua primeira definição: 1. O “lugar” da
verdade é o enunciado (o juízo). 2. A essência da verdade reside na
“concordância” entre o juízo e seu objeto. 3. Aristóteles, o pai da lógica, não
só indicou o juízo como o lugar originário da verdade, como também colocou em
voga a definição da verdade como “concordância”. A famosa questão, com a qual
se supunha colocar os lógicos em apuros, é a seguinte: O que é a verdade? Se
ela consiste na concordância do conhecimento com o seu objeto deve
distinguir-se dos demais. Um conhecimento é falso quando não concorda com o
objeto a que é submetido, mesmo que tenha algo que possa valer para outros
objetos. O que significa o termo “concordância”? A concordância de algo com
algo tem o caráter da relação de algo com algo. Toda concordância e, também, toda “verdade” é uma relação. Mas nem toda relação é uma
concordância. Um sinal assinala para o assinalado.
A
indivisibilidade de controle e consentimento tornam necessário que se percebam
as organizações formais como sistemas cooperativos, ampliando a estrutura de
referência dos relacionados com a manipulação de recursos da organização. No
ponto de ação da decisão executiva, o aspecto econômico da organização
proporciona instrumentos inadequados de controle da estrutura concreta. Esta
ideia poderá ser prontamente percebida se se voltar a atenção para o papel do
indivíduo na economia da organização. Do ponto de vista da organização como
sistema formal, os homens são encarados funcionalmente, quanto ao seu papel,
como participantes de segmentos determinados do sistema cooperativo. Na
realidade, porém, os indivíduos se mostram propensos à despersonalização, a
exceder os limites de seu papel segmentário, para participar como integrais. Os
sistemas formais não podem abranger as modificações assim introduzidas e,
consequentemente, falham como instrumento de controle, quando se confia apenas
neles. O indivíduo integral cria novos problemas para a organização, em parte
por causa das necessidades de sua própria personalidade, parcialmente porque
traz consigo um conjunto de hábitos arraigados, talvez, como obrigações com
determinados grupos especiais fora da organização. Na adequação de sistemas
formais de coordenação, as necessidades individuais não permitem a devida
atenção às metas enunciadas do sistema, naturalmente em que se incluem. O
perigo inerente à delegação surge essencialmente daí. A delegação é um ato de
organização, relacionado com designações formais de funções e poderes.
Em
tese, estas designações se referem a papéis ou funções oficiais, e não ao
indivíduo, como tal, que nem sempre coincide com as metas do sistema formal. Ipso
fato, a importância teórica da ênfase abstrata do sistema cooperativo como
tal origina-se da introspecção, que permite verificar determinadas ações e
consequências que são determinadas independentemente da personalidade das
pessoas no caso envolvidas. Assim, ao aludir ao paradoxo da organização - a
tensão criada pelas consequências inibitórias de determinados tipos de
estruturas não-convencionais nas organizações, não significa que as próprias
pessoas estejam em dúvida ou enfrentando dilemas. É a natureza das
consequências da interação de interesses divergentes que cria a condição,
resultado este que poderá surgir independentemente a percepção consciente ou
das qualidades dos participantes individuais. Sistemas de ação racional são
característicos tanto de indivíduos como de organizações. Reconhecer a
relevância sociológica das estruturas formais da ciência, nada tem a ver com a
importância, ao longo deste caminho, com a natureza da autoridade nas
organizações formais, encarecendo os fatores sociais de coesão e persuasão como
fontes legais ou coercitivas. Tal redefinição é, a mesma com que se introduziu
o conceito de Eu, que se origina na filosofia da história de Friedrich Hegel,
como sendo histórico e social, e só depois no âmbito da sociologia.
Da
mesma forma, a definição de autoridade, é condicionada por fatores sociológicos
de sentimento e coesão ou, de forma mais generalizada, a definição de
organizações formais como sistemas cooperativos apenas marca os limites
iniciais de elaboração de um procedimento na organização do processo de
trabalho. Assinalar é uma relação ente o sinal e o assinalado, mas não uma
concordância. Decerto, nem toda concordância significa uma espécie de convenientia,
tal como se fixou na definição de verdade. A ela pertence estruturalmente uma
espécie de “perspectiva”. O que é isso em cuja perspectiva concorda aquilo que,
na adaequatio, se relaciona? Ao esclarecer a relação de verdade, deve-se
também considerar a especificidade dos membros da relação. Em que perspectiva intellectus
e res concorda? Será que, em seu modo de ser e em seu conteúdo essencial,
eles proporcionam algo em cuja perspectiva pode concordar? Caso seja impossível
uma igualdade entre eles, por não pertencerem à mesma espécie, não será,
segundo a hermenêutica então possível que ambos (intellectus e res)
sejam semelhantes? A partir dessas questões evidencia-se que, para se
esclarecer a estrutura da verdade, não basta simplesmente pressupor esse todo
relacional, mas é preciso reconduzir o questionamento a seu contexto ontológico
que sustenta esse todo como tal.
Mas
será necessário para isso arrolar toda a problemática epistemológica referente
à relação sujeito-objeto? Ou será que a análise pode restringir-se à
interpretação da “consciência (Bewusstsein) imanente da verdade”,
permanecendo-se, portanto, “na esfera” do sujeito? Segundo a opinião geral, só
o conhecimento é verdadeiro. Conhecer, porém, é julgar. Em todo julgamento,
deve distinguir a ação de julgar enquanto processo psíquico real e o conteúdo
julgado enquanto conteúdo ideal. Deste último, diz-se que é “verdadeiro”. Em
contrapartida, o processo psíquico real é simplesmente dado ou não. O conteúdo
ideal do juízo é, pois, o que se acha numa relação de concordância. E esta diz
respeito a um nexo entre o conteúdo ideal do juízo e a coisa real sobre a qual
se julga. Em seu modo de ser, a concordância é real, ideal ou nenhuma destas?
Como se deve apreender ontologicamente a relação entre o ente ideal e o real
simplesmente dado? Essa relação subsiste e consiste em juízos fáticos não
somente entre o conteúdo do juízo e o objeto real, mas também entre o conteúdo
ideal e a ação real de julgar; e aqui a relação não será manifestamente mais
“intrínseca”? Enfim, a questão é: quando é que o fenômeno da verdade se torna
expresso no próprio conhecimento? Sem dúvida, quando o conhecimento se mostra
como verdadeiro. É, portanto, a própria verificação de si mesmo que lhe
assegura a sua verdade. No contexto fenomenal dessa verificação, é que a
relação de concordância deve tornar-se visível. O sociólogo não observa a
realidade social e sim práticas. Deve ser um homem que sente, não deve
ser jamais um homem que acredita.
Bibliografia
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