quarta-feira, 3 de abril de 2019

Enferma-Gens - Ideologia do Trabalho & Alteridade Social.

                                                                                                                                         Ubiracy de Souza Braga

           “É preciso que a Enfermagem se reconheça negra, porque nós somos negros”. Enfermeira Lucia Ferreira


Maria Stella de Azevedo Santos, Mãe Stella de Oxóssi, Odê Caiodê (1925-2018) foi a quinta Ialorixá do Ilê Axé Opô Afonjá (cf. Paula, 2009) em Salvador, Bahia. Nasceu no dia 2 de maio de 1925, em Salvador, Bahia. É a quarta filha de Esmeraldo Antigno dos Santos e Thomázia de Azevedo Santos. Seus irmãos, por ordem de nascimento são: Coryntha de Azevedo Santos (falecida), Bellanizia de Azevedo Santos (falecida), José de Azevedo Santos, Milta de Azevedo Santos e Adriano de Azevedo Santos (falecido). Sua avó materna foi Theodora Cruz Fernandes, filha de Maria Conibabê, africana de etnia ebá. Aos nove anos de idade, Maria Conibabê estava na aldeia quando mandaram que ela entregasse uma encomenda em um navio, assim que chegou foi presa e trazida para o Brasil. Sua tia, Dona Arcanja, reconhecida como Dona Menininha, tinha o posto de arobá no Gantois e de Sobaloju no Opô Afonjá  de Mãe Aninha, de quem era afilhada. Por volta dos 13 anos de idade, Mãe Stella apresentou um comportamento, o que fez com que Dona Arcanja procurasse ajuda do oluô Pai Cosme de Oxum, que informou que mãe Stella deveria ser iniciada e que seu caminho era de ialorixá, a designação da pessoa incumbida de gerenciar um terreiro de candomblé e a sua liturgia, de exercer toda autoridade sobre os membros de seu grupo, em qualquer nível da hierarquia.

Com isso Dona Arcanja decidiu procurar Mãe Menininha do Gantois. Dona Joaninha, que era governanta da casa, foi que acompanhou Mãe Stella na consulta. Depois de esperar muito para ser atendida, uma filha do Gantois apareceu na sala e avisou que ninguém mais seria atendido naquele dia. Aborrecida, Dona Joaninha seguiu para casa, e relatou o ocorrido à Dona Arcanja, que resolveu levar Mãe Stella ao Ilê Axé Opô Afonjá no dia 25 de dezembro de 1937, quando foi apresentada à Mãe Aninha. Esta entregou Mãe Stella aos cuidados de Maria Bibiana do Espírito Santo, Mãe Senhora. Mãe Stella relatou: - “Voltei para casa com a imagem de tia Aninha, imponente e misteriosa, que com um gesto meio mágico tirou uma fruta – uma maçã vermelha – de uma grande gamela que estava no altar de Xangô, e me entregou. Achei ótimo, esnobei meus irmãos, ainda mais quando me disseram: - Só você ganhou a fruta do pé do santo... Não me saía da cabeça a imagem da ossidagã. Só falava nela e, então, fui informada de que ossidagã era o cargo que ela ocupava no axé. Um ano depois, voltei com minha tia Arcanja, a Sobaloju do Opô Afonjá, e Joaninha, companheira de todas as horas. Tia Aninha já havia falecido e a ossidagã reinava como ialorixá do Axé Opô Afonjá”. Em 12 de setembro de 1939, aos quatorze anos, Mãe Stella foi iniciada por Mãe Senhora e recebeu orucó (nome) de Odê Caiodê. Mãe Stella narra a realização da sua iniciação. 

 Ela “não pensava em nada”, “não tinha noção” do que estava acontecendo: - “É interessante o desígnio, a força dos orixás. Meu caminho era ser ialorixá. Se tivesse ficado no Gantois, casa que guarda os santos de minha avó e meus tios, não poderia realizar meu caminho. Só em 1976, quando fui escolhida lá, entendi isso... é engraçado a força do odu, do destino. Era uma guerra de orixás. Minha herança era de Iansã – minha avó Theodora –, mas Odé me queria”. Lizete Fernandes Copque, prima, companheira de infância de Mãe Stella e iniciada no Gantois para Iansã, relembra: - “Vi Stella voltar para casa de cabeça raspada, com 14 anos. De vez em quando ela caçava; mandava que eu e meus irmãos sentássemos e caçava, dançando; era igual ao que se vê hoje no barracão”. Mãe Stella estudou no colégio Nossa Senhora Auxiliadora, dirigido pela professora D. Anfrísia Santiago. Formou-se pela Escola de Enfermagem e Saúde Pública, exercendo a função de Visitadora Sanitária por mais de 30 anos. Em 29 de junho de 1964, foi designada Colabá por Mãe Senhora. Foi aprendendo os mistérios e segredos do candomblé. Ainda em vida de Mãe Senhora fizera exercer a função de mãe de uma importante iaô - Celenita – que era filha de Ogum.     

 O primeiro pronunciamento público de Mãe Stella foi na II Conferência Mundial de Tradição dos Orixá e Cultura, de 17 a 23 de julho de 1983, em Salvador, quando lançou ideias originais sobre o sincretismo. Ela também participou da III Conferência Mundial de Tradição dos Orixás e Cultura, em 1986, em Nova Iorque, Estados Unidos da América.  Em 1987, Mãe Stella integrou a comitiva organizada por Pierre Verger para a comemoração da Semana Brasileira na República do Benin, na África. Sua presença mereceu destaque e ela foi recebida com honras de líder religiosa.  Em 1999, Mãe Stella conseguiu o tombamento do Ilê Axé Opô Afonjá pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), órgão ligado ao Ministério da Cultura. Em 2001 ganhou o prêmio jornalístico Estadão na condição de fomentadora de cultura. Em 2005 recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e em 2009, ao completar setenta anos de iniciação no Candomblé, recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). É detentora da comenda Maria Quitéria (Prefeitura do Salvador), Ordem do Cavaleiro (Governo da Bahia) e da comenda do Ministério da Cultura. Em 2010, recebeu uma placa pelo centenário do terreiro Opó Afonjá, no Plenário da Câmara de Salvador, Bahia. Em 2013, vai ocupar a cadeira 33 da Academia de Letras da Bahia, cujo patrono é o poeta Castro Alves. Tomou posse no dia 12 de setembro de 2013.       


            A globalização se refere essencialmente a este processo de alongamento, na medida em que as modalidades de conexão entre diferentes regiões ou contextos sociais e políticos se enveredam através da superfície da Terra como um todo globalizado. Ela é definida por Anthony Giddens, sociologicamente, em sua dimensão exógena, “como a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distâncias e vice-versa”. Este é um processo dialético porque tais acontecimentos locais podem se deslocar numa direção anverso às relações sociais e políticas muito distanciadas que os modelam. A transformação local é tanto uma parte da globalização quanto a extensão lateral das conexões sociais através das relações tópicas de tempo e sentido de apropriação e reprodução do espaço. Alteridade  parte do pressuposto básico de que todo o ser humano social interage e interdepende do outro. Antropólogos e cientistas sociais afirmam que a existência do “eu-individual” só é permitida mediante um contato com o outro. Assim, pode também se dizer que a alteridade é a capacidade de se colocar no lugar do outro na relação interpessoal. Mas neste sentido expresso na relação com grupos, família, trabalho, lazer, etc., respectivamente com consideração, identificação e possibilidade da relação dialógica. Alteridade não significa que tenha de haver uma concordância, mas aceitação das partes no diálogo e conflito social.
          A modernidade é inerentemente globalizante. Ela tanto germina a integração das sociedades como a sua fragmentação social. Nela desenvolvem-se as diversidades como também as disparidades. A dinâmica das forças produtivas e das relações de produção, em escala local, regional e mundial, produz interdependências e descontinuidades, evoluções e retrocessos, integrações e distorções, afluências e carências, tensões e contradições. É altíssimo o custo social, econômico, político e cultural da globalização do capitalismo, para muitos indivíduos e coletividades ou grupos e classes sociais subalternos. Em todo o mundo, ainda que em diferentes gradações, a grande maioria é atingida pelas mais diversas formas de fragmentação econômica e social. A realidade é que a globalização do capitalismo implica na globalização de tensões e contradições sociais, nas quais se envolvem grupos e classes sociais, partidos políticos e sindicatos, movimentos sociais e correntes de opinião pública, em todo o mundo. Enquanto totalidade histórico-social em movimento, com a apropriação do espaço e tempo sociais, o globalismo tende a subsumir não só culturalmente o nacionalismo e o tribalismo. As relações de trabalho entre formas sociais, eventos locais e distantes se tornam correspondentes “alongadas” na reprodução pós-consumo das relações sociais pós-capitalistas contemporâneas.
 

                       
Em sua dimensão endógena, a globalização pode ser entendida formando um “clima de comunicação”, aqui entendido enquanto estado que tende à estabilização dos elementos componentes, num ambiente/meio atravessado por forças reguladoras e desreguladoras, instalado como efeito generalizado de transmissão/interligação. Pode-se ilustrar isso em dois registros. Com o apuramento técnico da “economia de guerra” que alguns chamam logística, onde há um “clima de comunicação” claramente manifesto, ou que vem gradativamente sendo reconstruído, com o colonialismo ou a destruição das novas e velhas culturas no capitalismo, bem como nos procedimentos e resultados já familiares de controle da informação, com a informática etc., padrão comunicacional nesse clima. O que se chamou vulgarmente de “guerra fria” nas últimas cinco décadas conformava-se à ideia de tal adensamento. Em consequência do adensamento/expansão do clima de comunicação que é cultural e político, se estabelece um modelo tecnológico e padrão de modernização das forças produtivas. 
O enfermeiro é um profissional especializado de nível superior com competência técnica, científica responsável pela organização técnica de trabalho de equipe de enfermagem e pela promoção, prevenção e recuperação da saúde dos indivíduos. O enfermeiro é um profissional integrado, preparado para atuar simultaneamente no quadro técnico-científico da saúde no âmbito assistencial, técnico-administrativo e de promoção gerencial. Na área assistencial esses profissionais estão habilitados a diversos tipos de intervenções prático-pedagógicas de média e alta complexidade, situações que exigem reconhecimento científico e capacidade eficaz de diálogo de tomar decisões imediatas. Lideram e gerenciam unidades hospitalares e colaboradores de nível médio e técnico, que prescrevem a assistência de enfermagem para que técnicos e auxiliares executem as ações. Seguindo um método de trabalho de tendência mundial o enfermeiro prescreve medicamentos e solicita exames na chamada “Estratégia de Saúde da Família”.
         O enfermeiro é o trabalhador profissional da saúde, par excellence habilitado por uma licenciatura em Enfermagem e registado na Ordem dos Enfermeiros, a quem foi reconhecido às competências científicas, técnicas e humanas para praticar cuidados de enfermagem gerais ao indivíduo, família e comunidade, em situação de prevenção primária, secundária e terciária. O enfermeiro assiste o ser humano, doente ou são    individual ou em comunidade, de forma a que este mantenha e/ou recupere a saúde. O enfermeiro objetiva também que o indivíduo atinja a sua máxima capacidade funcional. Em Portugal, comparativamente, não existe a categoria correspondente de Auxiliar e Técnico de Enfermagem, sendo as funções acumuladas pelo enfermeiro. O enfermeiro não é só responsável pelos procedimentos técnicos, como por todo o processo de enfermagem. No entanto, existe a categoria de Assistente Operacional de Saúde,  designado profissionalmente de Auxiliar Técnico de Saúde, que do ponto de vista do conhecimento técnico-profissional colabora com o enfermeiro, e que com a sua delegação e supervisão, pode prestar cuidados técnicos de higiene, conforto e alimentação. Historicamente a enfermagem dava mobilidade social às mulheres negras em meados do século XX.   

                  
         A Ordem dos Enfermeiros representa a associação pública profissional que congrega todos os profissionais de Enfermagem que trabalham em Portugal. Tem como atribuições a definição de regras relativas à atividade profissional e respectivo controlo da sua observância. Na prática, podemos dizer que a preocupação da Ordem dos Enfermeiros é para com a regulamentação e disciplina da profissão de Enfermagem, enquanto outras organizações, comparativamente, como os sindicatos se preocupam com os assuntos laborais, decorrentes do contrato de trabalho. Esta instituição tem poderes delegados pelo Estado e foi formalmente criada em 1998. A participação de cada enfermeiro na vida da Ordem dos Enfermeiros é fundamental para o desenvolvimento da profissão, contribuindo para sua valorização e visibilidade social, numa perspectiva de melhoria dos cuidados de saúde prestados aos cidadãos. O vínculo existente entre cada enfermeiro e a Ordem dos Enfermeiros decorre do exercício da profissão, do fato de ser enfermeiro e de ter o dever de cumprir e fazer cumprir o Estatuto que representa o conjunto de artigos que define o funcionamento da organização e a Deontologia.
            Na última década foi aberto aos profissionais de enfermagem um amplo campo de trabalho com a criação do Programa de Saúde da Família (PSF). Em decorrência deste novo espaço e da necessidade de profissionais qualificados para desenvolver atividade neste programa, estão sendo criados cursos de Especialização em Saúde da Família, dos quais o enfermeiro recebe o título de especialista em Saúde da Família. Espera-se legislar brevemente a figura do “Enfermeiro da Família”, que será o Enfermeiro, que, exercendo funções ao nível dos cuidados de saúde primários, tem a si atribuídas, de trezentas famílias de acordo com a orientação da Organização Mundial de Saúde (OMS) seiscentas a oitocentas famílias (três mil indivíduos), acompanhando estas famílias ao longo de todo o seu ciclo vital. A palavra enfermeira/o se compõe de duas palavras oriundas do latim: “nutrix”, que significa mãe, e do verbo “nutrire”, que “tem como significados criar e nutrir”. Essas duas palavras, adaptadas ao inglês do século XIX, acabaram se transformando na palavra “nurse” que, traduzida para o português, significa enfermeira. Ipso facto, enfermagem é uma das poucas profissões da área da saúde que pode mesclar o humano com o científico, pois além de cuidar do paciente quando está doente, a enfermagem atua na prevenção de doenças e na produção de pesquisas empíricas para evitar que as mesmas acometam indivíduos pré-dispostos.  
          Florence Nightingale nascida a 12 de maio de 1820, em Florença, pragmática possuía inteligência e tenacidade de propósitos, determinação e perseverança - o que lhe permitia dialogar com políticos e oficiais do Exército, fazendo prevalecer suas ideias em torno da cura. Poliglota, dominava com facilidade o inglês, o francês, o alemão, o italiano, além do grego e do latim. Em 1845, em Roma, no desejo de realizar-se como enfermeira, estudou as atividades das Irmandades Católicas e, em 1849, fez uma viagem ao Egito, onde decide servir a Deus, trabalhando em Kaiserswert, Alemanha, entre as diaconisas. Seu primeiro papel como enfermeira de guerra ocorreu de fato em 1854, na Guerra da Criméia. Durante os combates da guerra, os soldados fizeram de Florence “o seu anjo da guarda”, pois, de lanterna na mão, percorria as enfermarias dos batalhões e acampamentos, atendendo os doentes, o que a fez reconhecida mundialmente como “Lady with the light”. Ao retornar em 1856, adoentada pelo tifo, Florence recebe um prêmio em dinheiro do governo inglês, em reconhecimento ao seu trabalho como humanista. Ela investe o dinheiro no que dá início à 1ª Escola de Enfermagem, fundada no Hospital Saint Thomas, em 1859, e que passou a servir de modelo fordista em função de seu caráter exitoso para as escolas de enfermagem que vieram gradativamente.
Legião Negra: soldados e enfermeiras.
            Historicamente a origem desse ensino, é recorrente ao ano de 1923,quando foi criada, na cidade do Rio de Janeiro, a Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde Pública, anexa ao Hospital Geral de Assistência daquele Departamento, posteriormente, Escola Ana Néri. Naquela ocasião, Carlos Chagas, como diretor do Departamento, deu uma contribuição decisiva. A saúde pública enfrentava mais uma crise decorrente das epidemias e endemias que representavam uma ameaça à sociedade, bem como à economia primária brasileira. O setor agrário-exportador cafeeiro dependia do saneamento dos portos, para continuidade de suas transações comerciais. Na tentativa de minimizar o problema, Carlos Chagas recorreu e contou com a colaboração da Fundação Rockefeller, que enviou nove enfermeiras norte-americanas com o propósito de estruturar o serviço de enfermagem de saúde pública, no Rio de Janeiro, e fundar uma Escola de Enfermagem. Foram essas enfermeiras as pioneiras organizadoras da Escola e suas primeiras professoras. A direção, como seria natural, ficou também a cargo das norte-americanas, sendo assumida, somente no ano de 1931, por uma brasileira, a enfermeira Rachel Haddock Lobo, finalizando a parceria profissional com as norte-americanas que foram retomando ao seu país.  
 

       
 
           Maria Stella de Azevedo Santos, conhecida por Mãe Stella de Oxóssi, recebe homenagem do Museu Nacional de Enfermagem Anna Nery (Munean), localizado em Salvador, no Pelourinho, com exposição de longa duração. A curadoria é resultado de um trabalho que tem como objetivo demonstrar a contribuição dos negros para o desenvolvimento da Enfermagem, a partir do período colonial até os dias atuais. Pontuando o papel das escravizadas e das mulheres negras que executavam e ainda executam atividades de enfermeira, a diretora do Museu, Júlia Lemos, ressalta a importância e colaboração da quinta yalorixá do Ilê Axé Opó Afonjá para a área da saúde. - “Não há como falar de Enfermagem sem falar de Mãe Stella, pois muitas pessoas não sabem que ela foi enfermeira”. O terreiro de Mãe Stella fica no bairro São Gonçalo do Retiro, região do Cabula, na cidade de Salvador. No Munean, histórias étnicas/lúdicas de personagens afrodescendentes pertencentes ao mundo da Enfermagem são recontadas.
As mães de ama, mães de leite, e mulheres pretas que participaram de guerras ou conflitos, como Maria Soldado, enfermeira da Legião Negra, comissão que arrecadava bens para a comunidade negra paulista, são representadas na exposição. - “A memória das mulheres negras do Brasil, cuidadoras de crianças, parteiras, nutrizes, chamadas de mães de criação, resistiram aos imperativos da escrita oficial da história da enfermagem”, escreve o pesquisador Paulo Campos, pós-doutor pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. - “A exposição é importante para manter viva a nossa condição histórica, resgatando a nossa história e reconhecendo a contribuição afro”, menciona o enfermeiro e professor da Universidade Federal de Pernambuco Itamar Lages. Segundo a pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz, na região Nordeste, 6,6% dos profissionais de Enfermagem se identificam como pretos. Integrante do Conselho Regional de Enfermagem da Bahia, Aline Soares destaca a colaboração de afrodescendente para o desenvolvimento da Enfermagem e analisa a discriminação que os negros têm de enfrentar no mercado de trabalho.
As “mãos da Enfermagem brasileira são negras”. Aline Soares ressalta que os técnicos de enfermagem baianos, que na maioria são negros, são fundamentais para o trabalho desenvolvido nesta área técnico-científica. - “Infelizmente, nas universidades de Enfermagem, não há muitos negros. Ainda há muito preconceito quando negros assumem cargos de poder. As pessoas acham que o cargo foi dado e não conquistado”, ressalta a enfermeira. Lúcia Ferreira, umas das enfermeiras que foi homenageada pelo Munean, abordou o preconceito que os negros sofrem na profissão e no cotidiano. “As pessoas não sabem da sobrecarga que é ser chamada de ‘neguinha’. Eu fui a única negra no meu curso de graduação. É preciso que a Enfermagem se reconheça negra, porque nós, somos negros”, disse, com lágrimas nos olhos, ontem, na abertura da exposição. A doutora Valmira dos Santos, primeira mulher negra doutora a lecionar na Universidade Federal da Bahia, contou sobre a dificuldade, por ser afrodescendente, que enfrentou na instituição de ensino superior. - “Não foi fácil, mas, eu tenho a estrutura resiliente, que faz com que eu aguente certas situações. É assim que eu venho vivendo com muito orgulho e força”.           
       Após a Escola formar sua primeira turma, nasce a ideia da criação de uma associação que congregasse as enfermeiras recém-graduadas pela Ana Néri. Mesmo com todo o empenho dessas ex-alunas, somente no ano de 1926 se consolida, com a primeira reunião da entidade: aos doze dias do mês de agosto daquele ano, recebendo a denominação global de Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas (ANED), extrapolando, pois, a iniciativa de reunir enfermeiras que fossem formadas somente por aquela Escola. Apenas a título de informação, devemos adiantar que, na trajetória dessa entidade, entre outras designações a ela conferidas, passa a intitular-se, a partir de 1954, Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), conservando a sigla até o presente. Essa referência torna-se necessária pela importância política dessa entidade na articulação  das políticas voltadas para o ensino de enfermagem no Brasil, em seus diferentes níveis. Além disso, vale lembrar que num país que carece de centros de documentação e pesquisa, a Enfermagem tem seguido sem preservar adequadamente a sua história,  sobretudo com as limitações que a desorganização dos arquivos oferece para o desenvolvimento da pesquisa, e a importância da recuperação e preservação de fontes escritas, orais e iconográficas dos arquivos existentes e daqueles por serem criados.
              Por estas tantas razões, o Centro de Estudos e Pesquisas de Enfermagem CEPEn da ABEn Nacional e das Seções, deve ter papel relevante na mudança deste comportamento. Precisa, pois, ampliar seus limites, entendendo que a pesquisa explica e descreve a história social e política, e que, para entendê-la, é preciso usar métodos e fontes adequadas, através do fortalecimento de redes sociais de comunicação e memória em que a produção e a divulgação do reconhecimento do trabalho humano andem juntas. Três batalhões de voluntários compostos por afrodescendentes lutaram contra a ascensão de Getúlio Vargas em 1930. Esses batalhões passaram a ser chamados de Legião Negra. Em verdade tratava-se de uma dissidência da Frente Negra Brasileira (FNB), criada em 14 de julho, cinco dias após o início da chamada Revolução Constitucionalista, um batalhão específico chamado de “Legião Negra de São Paulo”. Para compreendermos a ideologia da Legião Negra, é mister entender a organização da Frente Negra Brasileira, tendo em vista que a Legião Negra representou sua cisão. A FNB tinha como escopo e objetivo central “promover a elevação moral, intelectual e profissional, assistência, proteção e defesa social, jurídica e econômica da gente negra”.
            Pelas estimativas de um de seus dirigentes, a entidade chegou a reunir 30 mil filiados, somando os efetivos de todas as delegações, as quais funcionavam como espécie de filiais da sede na capital paulista. A Frente Negra criou uma série de símbolos diacríticos, a fim de garantir visibilidade para as suas ações, qual uma identidade específica para seus associados e, ao mesmo tempo, adquirir visibilidade no âmbito demográfico negro e na sociedade em geral. As mulheres negras que participaram da revolução demonstraram enorme coragem, fibra e destemor. Estimou-se que na Legião Negra, o número de combatentes girou em torno de dois mil membros. A Cruz Vermelha teve representação na Revolução Constitucionalista. Sua presidente, Maria Emília Leal, viajou pelo interior, levando mensagens entre o campo de batalha e o quartel general da capital paulista. Ela promovia cursos de enfermagem para moças e viúvas que, aprendidos os elementos principais da atividade iam aplica-los em hospitais e postos de emergência, nas frentes. O apoio das mulheres foi tamanho quando envolveram seus filhos na causa constitucionalista,  em cujo movimento social criou-se um grupo secreto para destituir Vargas, cujo nome era dos cinco estudantes mortos. Enfermeira de Rosário do Sul é a vencedora do concurso Minha história de luta na Enfermagem.


 
           O estado da civilização é fruto principalmente da extra-escolaridade cultural. É mais um produto de sua natureza individual, de sua formação doméstica e de sua existência social do que de sua preparação disciplinar. Esta palavra significa um ato de dedicação. E de uma dedicação a fundo, positiva tanto aos extremos como ao que fica entre eles, como culto, cultivo e cultura são três aspetos articulados da mesma linha de reflexão desde quando nos aperfeiçoamos pela cultura do Espírito. Muda o objeto de nossa dedicação, mas significa sempre uma entrega total do nosso ser para alcançar a essência através das aparências, de modo a tirar do cultivo da terra o alimento do nosso corpo, da cultura intelectual o aperfeiçoamento do nosso espírito e da universidade o reconhecimento da plenitude da verdade. Esse radical culto pode, portanto apresentar três sentidos. O sentido individual de representação é o que chamamos de cultura intelectual. Tem um sentido subjetivo e significa a passagem da informação à formação do saber e da personalidade. O segundo tem um sentido objetivo e significa a conquista de elementos característicos das instituições e  de representar uma coletividade. O sentido próprio de construir, a saber, habitar, cai no esquecimento.
             Em que medida construir pertence ao habitar? Quando construir e pensar são indispensáveis para habitá-lo. Ambos são, no entanto, insuficientes para habitá-lo se cada um se mantiver isolado, distantes, cuidando do que é seu ao invés de escutar um ao outro. Ipso facto construir e pensar pertence ao habitar. Permanecem em seus limites. Quando aprendemos a pensar que tanto um como outro, provém da obra de longa experiência de um exercício incessante de pensar. A cultura intelectual, portanto, em sentido próprio, refere-se a cada pessoa humana em particular e como um todo irredutível. Somos um ersatz: a cultura social é subsidiária da cultura intelectual, já que a sociedade existe para o homem. E não o homem para a sociedade. Embora seja esta uma condição prática, indispensável para a realização daquele. Não há cultura intelectual liberta sem cultura social organizada. A cultura intelectual representa a passagem do domínio e controle da informação da nossa individualidade total. Pela informação recebemos os elementos que vão permitir a eclosão de nossas possibilidades naturais. É a função da formação hermenêutica quando aglutinamos e assimilamos esses elementos, de tipo variados, contraditórios, reduzindo-os a uma unidade irredutível e elaborando com isso a nossa personalidade.
Bibliografia geral consultada.
ERDMANN, Alacole et al., Teses Produzidas nos Programas de Pós-Graduação em Enfermagem de 1983 a 2001. In: Revista da Escola de Enfermagem da USP, 39, 497-505; 2005; ORICHIO, Ana Paula Carvalho, Oficiais Enfermeiras para a Marinha do Brasil. Do Curso de Formação Militar à Ocupação de Espaços no Hospital Naval Marcílio Dias (1980-1984). Tese de Doutorado. Escola de Enfermagem Anna Nery. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2012; CARRIJO, Alessandra Rosa, Ensino de História da Enfermagem: Formação Inicial e Identidade Profissional. Tese de Doutorado. Escola de Enfermagem. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012; BASTOS, Rachel Benta Messias, Raça e História: A Metamorfose do Negro no Contraponto Mito da Democracia Racial. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2013; LÖW, Lily, Enfermeiras Negras na Revolução Constitucionalista de 1932. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, 2013; SANTIAGO, Emiliane Silva, Currículo da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - USP: Inovações de Profa. Glete de Alcantara (1953-1963). Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Psiquátrica. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto. Universidade de São Paulo, 2015; BIFF, Daiane, Cargas de Trabalho de Enfermeiros da Estratégia Saúde da Família. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Enfermagem. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2016; FERNANDES, Carlos Roberto, O Corpo Mediador do Cuidado da Enfermagem: Uma Epistemologia do Conceito Fundamentada em Wilhelm Dilthey. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação. Escola de Enfermagem. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016; ALMEIDA, Anna Paula Alves da Silva, Fadiga e a Capacidade para o Trabalho em Profissionais de Enfermagem: Avaliação em um Hospital de Ensino da Rede SUS - Uberlândia. Dissertação de Mestrado em Geografia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2018; BARBOSA, Elane da Silva, Do Estágio ao Internato: O Percurso da Formação da Enfermeira para o Cuidado. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará, 2019; TORRES, Maria Nahir Batista Ferreira, O Ensino de História da Enfermagem: Trajetórias e Lugar na Formação do Enfermeiro. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Centro de Educação. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará, 2019; SIMÕES, Luiza Lúlia Feitosa, Saberes Docentes e Formação Pedagógica de Professores Enfermeiros: Um Estudo de Caso. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Centro de Educação. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará, 2019; entre outros.

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