quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Um Jogo de Significantes - Guerras, Arquétipos & Narrativas

                                                                                     Ubiracy de Souza Braga

Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas”. Sun Tzu

                        
As estruturas sociais de classe, gênero e etnia são geralmente reduzidas às  imagens do social e vividas através do meio de reprodução das imagens e de estilo de vida no processo concreto de globalização. Queremos dizer com isto, que a estrutura implica pelo contrário, certo dinamismo transformador. O substantivo “estrutura”, acrescentando a atributos com sufixos tomados da etimologia da palavra “forma”, e que, na falta de melhor expressão, utilizamos metaforicamente, significando simplesmente duas coisas: são dinâmicas e sujeitas a transformações por modificações de um dos termos, e constituem modelos taxionômicos e pedagógicos, quer dizer, que servem comodamente para a classificação, mas que podem servir, dado que são transformáveis, para modificar os níveis de análise por nós considerados no âmbito do imaginário individual (o sonho) e coletivo (os mitos, os símbolos, os ritos). Desnecessário dizer que estamos de acordo com uma aproximação mais evidente entre Claude Lévi-Strauss da  tradição de Radcliffe-Brown.
Em todas as nações e nacionalidades envolvidas em emblemas tais como Oriente Médio, África do Sul, Índia, Rússia, Estados Unidos, Europa, América Latina, Caribe, ou, Primeiro, Segundo e Terceiro Mundo; ou ainda Centro e Periferia; para não repetir Ocidente e Oriente em todas as nações e nacionalidades há problemas raciais, pouco evidentes ou agudos, antigos ou recentes, que se desenvolvem, mas não se resolvem. Uma pesquisa global, no sentido que emprega Ianni (1997) "demonstra que a consciência étnica está realmente em ascensão, como uma força política"; e que as fronteiras dos Estados nacionais, conforme se acham presentemente desenhadas, estão sendo crescentemente desafiadas por essa tendência. O caráter contrastivo destas identidades constitui, portanto, um atributo essencial da identidade étnica. O processo histórico de segregação de Fortaleza tornou-a uma cidade triste, solitária e vazia no Centro da cidade. Sem bares ou restaurantes que sirvam bebida alcóolica numa área superior a 50 mil. Sem boemia e segurança pública. Dos 119 bairros que a capital possui, 88, 22% tem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é baixo ou muito baixo e só 11, 7 % médio ou muito alto o que representa sociologicamente segregação humana.


No Brasil, diversos são os fatores sociais e políticos apontados como causa do surgimento das “cidades-dormitório” como ocorre na cidade de Fortaleza. Dentre eles, podem ser destacados os processos de conurbação e metropolização marcados pela expansão urbana de áreas com baixo dinamismo econômico, elevado crescimento populacional e que, ocupada por população de baixa renda residente em assentamentos precários. Há uma associação quase que imediata do processo de metropolização ao surgimento das “cidades-dormitório”  (cf. Ojima; Silva; Pereira, 2007) baseado no modelo dicotômico marxista “centro-periferia”. Essas dinâmicas alteram a apropriação do espaço sob a óptica da contradição marxista na relação centro-periferia de modo a evidenciar novas centralidades. Assim, a identidade produzida pela identidade contrastiva aparece como uma identidade que surgiu historicamente de uma oposição. Para tentar delimitar analiticamente a identidade étnica, é necessário reconhecer os “mecanismos de identificação” que contém a identidade em constante processo histórico e social. Através do desenvolvimento histórico de contato, os grupos étnicos em relação (em conjunção) desenvolvem uma “consciência de si da situação”, o que significa que a identidade étnica varia de acordo com as diversidades e diferenças de contato.
O símbolo não sendo já de natureza linguística deixa de se desenvolver numa só dimensão. As motivações que ordenam os símbolos não apenas já não formam longas cadeias de razões, mas nem sequer cadeias. A explicação linear do tipo de dedução lógica ou narrativa introspectiva já não basta para o estudo das motivações simbólicas. A classificação dos grandes símbolos da imaginação em categorias motivacionais distintas apresenta, com efeito, pelo próprio fato da não linearidade e do semantismo das imagens, grandes dificuldades. Metodologicamente, se se parte dos objetos bem definidos pelos quadros da lógica dos utensílios, como faziam as clássicas “chaves dos sonhos”, segundo as estruturas antropológicas do imaginário, cai-se rapidamente, pela massificação das motivações, numa inextricável confusão. Parecem-nos mais sérias as tentativas para repartir os símbolos segundo os grandes centros de interesse de um pensamento, certamente perceptivo, mas ainda completamente impregnado de atitudes assimiladoras nas quais os acontecimentos perceptivos não passam de pretextos para os devaneios imaginários. Tais são as classificações mais profundas de analistas das motivações do simbolismo religioso ou da imaginação de modo geral literária.  
Tanto escolhem como norma classificativa uma ordem de motivação cosmológica e astral, na qual são as grandes sequências das estações, dos meteoros e dos astros que servem de indutores à fabulação, tanto são os elementos de uma física primitiva e sumária que, pelas suas qualidades sensoriais, polarizam os campos de força no continuum homogêneo do imaginário; tanto, enfim, se suspeita que são os dados sociológicos do microgrupo ou de grupos que se estendem aos confins do grupo linguístico que fornecem quadros primordiais para os símbolos. Quer a imaginação estreitamente motivada seja pela língua, seja pelas funções sociais, se modele sobre essas matrizes sociológicas e antropológicas, quer pelos seus genes raciais intervenham bastante misteriosamente para estruturar os conjuntos simbólicos, distribuindo seja as mentalidades imaginárias, sejam os rituais religiosos, querem ainda, com uma matriz evolucionista, se tente estabelecer uma hierarquia das grandes formas simbólicas e restaurar a unidade no dualismo de Henri Bergson das Deux Sources, quer enfim que atravessando a técnica da psicanálise se tente encontrar uma síntese entre as pulsões de uma libido em evolução e as pressões recalcadoras do microgrupo familiar. São estas diferentes classificações das motivações simbólicas que precisamos criticar antes de estabelecer um método de análise pretensamente firme na ordem das motivações.


Ares, conhecido como Marte pelos romanos, era o deus da guerra, do derramamento de sangue e da violência e o único filho de Zeus e Hera.
           
A trajetória evoca um movimento, mas resulta ainda de uma projeção sobre um plano, de uma redução. Estratégia refere-se ao cálculo das relações de força que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder é isolável em um ambiente. Ela postula um lugar capaz de ser circunscrito como um próprio e, portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações com uma exterioridade distinta. A nacionalidade política, econômica ou científica foi construída segundo esse modelo estratégico. Para descrever essas práticas cotidianas que produzem sem capitalizar, isto é, sem dominar o tempo, segundo Certeau, impunha-se um ponto de partida por ser o foco exorbitado da cultura contemporânea e de seu consumo: a leitura. Da televisão ao jornal, da publicidade a todas as epifanias mercadológicas, a nossa sociedade canceriza a vista, mede a realidade por sua capacidade de mostrar ou de se mostrar e transforma as comunicações em viagens do olhar. Até a economia, transformada em “semiocracia”, fomenta uma hipertrofia da leitura. O binômio produção-consumo poderia ser substituído por seu equivalente: escritura-leitura. A leitura (da imagem ao texto) parece, aliás, constituir o ponto máximo de passividade que caracterizaria o consumidor, constituído em voyeur (troglodita ou nômade) em uma sociedade do espetáculo.   
Enfim, os gestos diferenciados em esquemas sociológicos vão determinar, em contato com o ambiente natural, os grandes arquétipos mais ou menos como Jung os definiu. Os arquétipos constituem as substantificações essenciais dos esquemas. Esta noção em Jacob Burckhardt é sinônima de “origem primordial”, de “enagrama”, de “imagem original”, de “protótipo”. Metáforas de guerra quando Carl Jung evidencia claramente o caráter de trajeto antropológico dos arquétipos quando escreve: - “A imagem primordial deve incontestavelmente estar em relação com certos processos perceptíveis da natureza que se reproduzem sem cessar e são sempre ativos, mas por outro lado é igualmente indubitável que ela diz respeito também a certas condições interiores da vida do espírito e da vida em geral”. Este arquétipo, intermediário entre os esquemas subjetivos culturalmente e as reproduções de imagens fornecidas pelo ambiente perceptivo, é como representar o número da linguagem que a intuição percebe.
Militante armado em vila do Sudão do Sul; país vive guerra civil desde 2014.
Decerto, Jung insiste, sobretudo, no caráter coletivo e inato das imagens primordiais, mas sem entrar nessa metafísica das origens e sem aderir à crença em “sedimentos mnésicos” acumulados do decurso da filogênese podemos fazer nossa uma observação capital do psicanalista, que vê nesses substantivos simbólicos que são os arquétipos “o estádio preliminar, a zona matricial da ideia”. Contudo, bem longe de ter a primazia sobre a imagem, a ideia seria tão-somente o comprometimento pragmático do arquétipo imaginário num contexto histórico e epistemológico dado. No âmbito da guerra, sublinhamos a importância essencial dos arquétipos que constituem o ponto de junção entre o imaginário individual (os sonhos) e coletivo (os mitos, os ritos, os símbolos) e os processos racionais. É que, com efeito, os arquétipos se ligam a imagens individuais e coletivas muito diferenciadas pelas culturas e nas quais vários esquemas se vêm imbricar. Encontram-nos então em presença do símbolo em sentido estrito, símbolos que assumem tanto mais importância quanto são ricos em sentidos diferentes.
No prolongamento dos esquemas explicativos, arquétipos e simples símbolos modernos pode-se considerar o mito. Lembramos, todavia, que não estamos tomando este termo na concepção restrita que lhe dão os etnólogos, que fazem dele apenas o reverso representativo de um ato ritual. Entendemos por mito, “um sistema dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico que, sob o impulso de um esquema, tende a compor-se na narrativa”. O mito é já um esboço de racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se resolvem em palavras e os arquétipos em ideias. O mito explicita um esquema ou um grupo de esquemas. Do mesmo modo que o arquétipo promovia a ideia e que o símbolo engendrava o nome, podemos dizer que o mito promove a doutrina religiosa, o sistema filosófico ou, como bem observou Bréhier, a narrativa histórica e lendária. O método de convergência evidencia o mesmo isomorfismo na constelação e no mito. Enfim, para sermos breves, este isomorfismo dos esquemas, arquétipos e símbolos no seio dos sistemas míticos ou de constelações estáticas pode levar-nos a verificar a existência de protocolos normativos das representações imaginárias, bem definidos e relativamente estáveis, agrupados em torno dos esquemas originais e que antropologicamente a literatura refere-se como estruturas.
Aí se mesclam diversidades e desigualdades de todos os tipos e narrativas, compreendendo manifestações religiosas e linguísticas, mas sempre envolvendo alguma forma de racialização das relações étnicas e sociais. Produzidas ao longo de migrações, escravismos e outras formas de trabalho forçado, convívios pacíficos, conflitos inesperados, progrons, genocídios, revoluções, guerras. Assim, não é difícil admitir, de acordo com Ianni (1997), que o tribalismo, adormecido por séculos, reacende para destruir nações e nacionalidades. Sempre que há um contexto de crise social, há o risco de que as intolerâncias se acentuem. Aliás, está acontecendo uma incrível “racialização do mundo”, embora ocorram desde as grandes navegações, os acontecimentos nos últimos anos do século XX estão acentuando a intolerância racial em escala mundial. Em 1978 Edward Said publicou a sua obra mais conhecida, Orientalismo, na qual analisa a visão ocidental arquetípica oriental, mais concretamente do mundo árabe. Segundo o autor, o Ocidente criou uma visão distorcida do Oriente como o “Outro”, numa tentativa de diferenciação que servia os interesses do colonialismo. Na construção do argumento central do livro Said analisou uma série de discursos literários, políticos e culturais que iam desde textos das Cruzadas ou de Shakespeare, nos quais encontrou um denominador comum: a representação dos habitantes do mundo oriental como bárbaros.
Neste sentido vale lembrar que a contribuição engelsiana conferiu ao marxismo que engloba uma teoria econômica, uma teoria sociológica, um método filosófico e uma visão revolucionária de mudança social, o caráter particular de Antropologia, contrariando a generalização metodológica. A partir das pesquisas antropológicas de L. H. Morgan, lidas e anotadas por Marx, formulou Engels a teoria antropológica do Estado, na obra: ”Der Ursprung der Familie, des Privateigentums und des Staats” (2000), cujos pressupostos não estavam em sua reflexão anterior, nem de forma sistêmica e embasada na história e na antropologia. A sua importância na literatura de diversos países, ocorre que muitos antropólogos se valeram do arcabouço marxista para entender sociedades não capitalistas e sociedades camponesas. Não só a escola estruturalista francesa, da segunda metade do século XX, com Maurice Godelier e Claude Meillassoux são notáveis exemplos. Com o surgimento da Antropologia moderna, como admite Leslie White, este influenciou a geração de antropólogos próximos ao marxismo, como Marshal Sahlins, antes de seu “acerto de contas” no ensaio: “Cultura e Razão Prática”, assim como Erick Wolf e Elman Service.
O volumoso tomo de Bachofen estava escrito em alemão, isto é, na língua da nação que menos se interessava, então, pela pré-história da família contemporânea. Por isso permaneceu ignorado. O sucessor imediato de Bachofen nesse terreno entrou em cena em 1865, sem jamais ter ouvido falar dele. Esse sucessor foi J. F. Mac Lennan, o polo oposto de seu predecessor. Ao invés do místico genial, temos aqui um árido jurisconsulto; em lugar de uma exuberante e poética fantasia, as plausíveis combinações de um arrazoado de advogado. Mac Lennan encontra em muitos povos selvagens, bárbaros e até civilizados, dos tempos antigos e modernos, uma forma de matrimônio em que o noivo, só ou assistido por seus amigos, deve arrebatar sua futura esposa da casa dos pais, simulando um rapto com violência. Este costume deve ser vestígio de um costume anterior, pelo qual os homens de uma tribo obtinham mulheres tomando-as realmente de outras tribos, pela força. Por outro lado, e com frequência não menor, encontramos em povos não civilizados certos grupos (que em 1865 ainda eram muitas vezes identificados com as próprias tribos) no seio dos quais era proibido o matrimônio, vendo-se os homens obrigados a buscar esposas – e as mulheres, esposos – fora do grupo; enquanto isso, outro costume existe, em outros povos, pelo qual os homens de determinado grupo só devem procurar suas esposas no seio de seu próprio grupo.



Mac Lennan chama as primeiras de tribos exógamas; e as segundas, de endógamas e, de imediato, sem maior investigação, estabelece uma antítese bem definida entre “tribos” exógamas e endógamas. E, ainda quando as suas próprias investigações científicas sobre a exogamia lhe evidenciam que, em muitos casos, senão na maioria, ou mesmo em todos, essa antítese só existe na sua imaginação, nem por isso deixa de toma-la como base para toda a sua teoria. De acordo com ela, as tribos exógamas não podiam tomar mulheres senão de outras tribos, o que apenas podia ser feito mediante rapto, dada a guerra permanente entre as tribos, característica do estado selvagem. De onde provém a exogamia? Em sua opinião, as ideias de consanguinidade e incesto nascidas mais tarde nada têm a ver com ele. Sua causa poderia ser o costume entre eles de matar as crianças do sexo feminino logo após seu nascimento.
Disso resultaria um excedente de homens em cada tribo, tomada separadamente, tendo como consequência imediata a posse de uma mesma mulher, em comum, por vários homens, isto é, a poliandria. Daí decorria, por sua vez, que a mãe de uma criança era conhecida, mas não o pai; por isso, a ascendência era contada pela linha materna, e não paterna pelo direito paterno. E da escassez de mulheres no seio da tribo, atenuada, mas não suprimida pela poliandria, advinha, ainda, outra consequência, que era precisamente o rapto sistemático de mulheres de outras tribos. Para Mac Lennan, como a exogamia e a poliandria procedem de uma só causa, do desequilíbrio numérico entre os sexos, devemos considerar que, “entre todas as raças exógamas, existiu primitivamente a poliandria”. O mérito de Mac Lennan consiste em ter indicado a difusão geral e a grande importância do que ele chama de exogamia. Quanto ao fato da existência de grupos exógamos, não o descobriu e muito menos o compreendeu.
 Além disso, também Morgan observara e descrevera perfeitamente o mesmo fenômeno, em 1847, em suas cartas sobre os iroqueses, e em 1851 na Liga dos Iroqueses, ao passo que a mentalidade do advogado de Mac Lennan causou confusão ainda maior sobre o assunto do que a causada pela fantasia mística de Bachofen no terreno do direito materno. Outro mérito de Mac Lennan consiste em ter reconhecido como primária a ordem de descendência baseada no direito materno, conquanto, também aqui, conforme reconheceu mais tarde, Bachofen se lhe tenha antecipado. Mas, também neste ponto, ele não vê claro, pois fala, sem cessar, “em parentesco apenas por linha feminina” (“kinship through females only”), empregando continuamente essa expressão, exata apara um período anterior, na análise de fases posteriores de desenvolvimento, em que, se é verdade que a filiação e o direito de herança continuam a contar-se exclusivamente segundo a linha materna, o parentesco por linha paterna reconhecida e expressa na estreiteza de critério do jurisconsulto, que forja um termo jurídico socialmente fixo e continua aplicando-o, sem modifica-lo.
Não obstante, sua teoria foi acolhida na Inglaterra com grande aprovação e simpatia. Mac Lennan foi considerado por todos como o fundador da história da família e a primeira autoridade na matéria. A proposta de uma antropologia da guerra não é nenhuma novidade no âmbito dos estudos antropológicos. Concebida por alguns autores como uma espécie de especialização temática da antropologia política, a antropologia da guerra pretende constituir-se como um corpo em torno de conhecimentos sobre os mecanismos sociais de produção de violência, conflitos e guerras. Keith Otterbein num artigo de 1999 descreve o percurso desses estudos disciplinares demarcando quatro períodos: o período da fundação (1850 a 1920); o período clássico (1920-1960); a idade dourada (1960-1980); e o período atual. O período da fundamentação e ipso facto de institucionalização ocorre com Lewis Morgan e Edward Tylor e caracteriza-se essencialmente pela coleta de dados empíricos e por uma visão evolucionista das práticas guerreiras das sociedades ditas primitivas.



Etnograficamente o período clássico é atravessado por duas tendências distintas: a) a continuação de uma linha analítica de cariz ainda evolucionista, concentrada no estabelecimento de tipologias comparativas sobre os procedimentos violentos e guerreiros em diferentes sociedades primitivas; b) o surgimento do mito do “selvagem pacífico”. No primeiro caso o autor destaca um texto de Bronislaw Malinowski (1941), no qual estabelece seis tipos sociais de conflitos armados, segundo uma escala “dos menos violentos aos mais violentos”. São eles: 1) as lutas entre membros do mesmo grupo, 2) as lutas como mecanismos jurídicos de regulação de diferenças entre indivíduos, 3) razias militares com carácter recreativo, 4) as guerras enquanto expressão política de um protonacionalismo, 5) expedições militares com fins de pilhagem organizada, 6) guerras como instrumento de política nacional. Nesta tipologia só os últimos dois tipos de violência, ou de guerras propriamente ditas imperialistas, assumem um caráter verdadeiramente moderno e letal como ocorreu recentemente com o ataque dos aviões ocorridos em 11 de setembro às torres gêmeas.
Lembrando ainda que em torno do agrupamento imaginário de imagens que ela é suscetível de se articular numa estrutura mais geral e que não são agrupamentos rígidos. Assim como, por um lado, de formas imutáveis pelos traços tipológicos dos indivíduos, e por outro lado, que ligam as suas transformações sociais às pressões históricas e antropomórficas numa filosofia pretensamente de análise do imaginário que se interrogue sobre a forma comum que integra esses regimes heterogêneos e sobre a significação funcional dessa forma de imaginação e do conjunto das estruturas e dos regimes que ela subsumiu. Na ordem da produção simbólica, o objeto carece de unicidade e singularidade, pois, objetos tornam-se simulacros indefinidos uns dos outros e, juntamente com os objetos, os homens que os produzem. A pretensa objetividade do mundo erigido a partir da racionalização técnica corresponde à universalização de um modelo arbitrário advindo da generalização da economia política na forma da lei do valor. A partir do código, considerado como sistema de signos generalizados, a simulação opera a inversão das relações entre o real e sua representação, estabelecendo simples oposições binárias que permitem a objetividade do discurso e o controle dos objetos. Em relação ao discurso, reduzindo o signo ao puro jogo dos significantes, anula a relação entre significante e significado necessária ao processo de significação.

Bibliografia geral consultada.

CLASTRES, Pierre, Archéologie de la Violence. La Guerre dans les Sociétés Primitives. Paris: Éditions Libre, 1977; Idem, La Palabra Luminosa: Mitos y Cantos Sagrados de los Guaraníes. Buenos Aires: Ediciones del Sol, 1993; BACHELARD, Gaston, La Intuición del Instante. México: Fondo de Cultura Económica, 1985; SACHS, Ignacy, Espaços, Tempos e Estratégias do Desenvolvimento. São Paulo: Editora Vértice, 1981; Idem, Ecodesenvolvimento: Crescer sem Destruir. São Paulo: Editora Vértice, 1986; Idem, Estratégias de Transição para o Século XXI: Desenvolvimento e Meio Ambiente. São Paulo: Studio Nobel/ Fundap, 1993; MARCHAL, Roland, “La Cause des Armes au Mozambique: Anthropologie d une Guerre Civile”. In: Cultures & Conflits, 1990; JUNG, Carl, Sincronicidade. 5ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1991; BACHOFEN, Johann Jakob, El Matriarcado: Una Investigación sobre la Ginecocracia en el Mundo Antiguo según su Naturaleza Religiosa y Jurídica. 2ª edición. Madrid: Ediciones Akal, 1992; FLORÊNCIO, Fernandes, “Christian Geffray e a Antropologia da Guerra: Ainda a Propósito de La Cause des Armes au Mozambique”. Disponível em: http://ceas.iscte.pt/etnografica/; DURAND, Gilbert, As Estruturas Antropológicas do Imaginário: Introdução à Arquetipologia Geral. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1997; ENGELS, Friedrich, El Origen de la Familia, la Propriedad Privada y el Estado. Moscú: Editorial Progreso, 2000; HOBSBAWM, Eric, Nazioni e Nazionalismi dal 1780. Programma, Mito, Realtà. Torino: Einaudi Editore, 2002; LANNA, Marcos, “De Claude Lévi-Strauss a Pierre Clastres: Da Troca à ´Filosofia da Chefia` e desta à Política como Código Estrutural”. In: Perspectivas. São Paulo, vol. 43, pp. 17-33, jan./jun. 2013; BIUSO, Alberto Giovanni, Anarchisme et Anthropologie. Pour une Politique Matérialiste de la Limite. Paris: Éditions Asinamali, 2016; CAPITANI, Dhandara, Multiplicidade Transcendente: Imaginário e Arquétipos na Lírica Feminina. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Letras. Cascavel: Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, 2019entre outros.

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