“A fase da transação é a que exige mais
prudência, mais tino, mais devoção”. Justiniano José da
Rocha
O senhorio é o proprietário de um
condomínio, casa, terra ou bens imobiliários que são alugados ou arrendados a um indivíduo ou a uma empresa, que recebe
o nome de inquilino. Quando uma
pessoa jurídica se encontra nesta posição utiliza-se o termo senhorio também.
Outros termos incluem locador e proprietário. O termo senhoria pode ser
utilizado, mas raramente para proprietárias. As duas partes contratantes
assumem um compromisso por lei da propriedade imobiliária mediante a assinatura
de um contrato de arrendamento. Através deste contrato, a parte contratante que
detém o título da propriedade - o senhorio - cede a sua posse e utilização por
um período de tempo limitado à outra parte contratante: o inquilino (cf. Romero, 1994). O senhorio ou a senhoria pode não ser
o real proprietário ou proprietária, mas mantem de alguma forma o direito de
subarrendamento. Um contrato de locação é o que define condições tais como a
renda, as penalizações de atraso no pagamento, a duração da locação e o tempo
de pré-aviso necessário antes de o proprietário ou inquilino rescindir o
contrato.
Alteridade é a concepção que parte do
pressuposto de que todo o ser humano social interage e interdepende do outro.
Assim, pode também se dizer que a alteridade tem como representação a capacidade de se colocar no lugar do outro na relação com grupos, como na família, quase sempre
no trabalho, nas formas desejáveis de lazer e a relação que temos com os
outros, com consideração, identificação e, sobretudo, em como dialogar com o
outro. Mas a noção de outro ressalta que a diferença constitui a vida social, à
medida que esta se efetiva através das dinâmicas das relações sociais, sendo,
que a diferença é, simultaneamente, a base da vida social e fonte permanente de
tensão e conflito. Apontamentos podem ser feitos não só durante o processo de
conquista e colonização das Américas, mas na história social do contato entre diferentes culturas. Para
os indígenas é o símbolo da traição, ou sociologicamente da mestiçagem, quando
a humanidade do “outro” só foi concebida quando integrada à cultura.
A descoberta e colonização violenta
do chamado Novo Mundo, isto é, o longo caminho percorrido da colonização
europeia nas Américas, parece ser o ponto de chegada para a análise teórica que
envolve a alteridade. O encontro com o “outro” é marcado pelo medo e pelo
fascínio, pela distinção clara entre o que é estranho e o que não é. O contraste cultural, de certa forma, acaba
fortalecendo a noção de paradoxo de consequências não intencionais de que
“aquilo que sou é diferente daquilo que não sou”, o que, em outras palavras,
significa dizer que o mundo estranho é um enorme espelho que reflete o que é
familiar ao destacar tudo àquilo que nos é estranho. A alteridade é uma tarefa ética sobre a
condição humana deste outro, partindo
do pressuposto que o outro não é um inimigo desumanizado. Mas que deve ser
visto como um humano ao mesmo tempo igual e diferente. A experiência de se
colocar no lugar do outro implica a
conduta e o reconhecimento de perceber o mundo em que o outro se insere, que é fruto
de suas experiências e hábitos culturais, sua história e conhecimentos. Num contexto marcado pela ausência da ética de
solidariedade, de uma reflexão sobre nossas ações, hábitos e costumes, a
alteridade enquanto proposta torna-se difícil de concretizar-se. Acaba
demonstrando uma prática autoritária entre iguais sob a forma de hierarquia.
O
Relatório da Deutsche Bank, analisa
todos os anos os preços de aluguéis de imóveis
ao redor do mundo para se terem uma noção dos lugares mais caros e mais em
conta para se morar de aluguel. O complexo de moradias, reconhecido como “o
projeto habitacional mais antigo do mundo”, fica na cidade alemã de Augsburg,
na Baviera. O valor do aluguel não subiu ali desde o século XVI, quando era
cobrado em florins. O locador ou senhorio é aquele que cede o bem mediante
pagamento do locatário ou inquilino para que este o utilize conforme suas
finalidades, isto é, para moradia, se for um imóvel residencial. Para o
trabalho, se for um imóvel comercial ou industrial; para locomoção, se for um
automóvel, etc. É o contrato social pelo qual o locador propõe-se a ceder o uso
e o gozo da coisa ao locatário. Mas o presente fundado em 1521 por Jakob
Fugger, um comerciante e banqueiro que destinou parte de seu ímpeto filantrópico
à criação de um complexo residencial dedicado aos necessitados da cidade não
representa in statu nascendi caridade. O presente veio sob a forma de condições
registradas por escrito, como uma espécie de contrato social. Para viver
em Fuggerei, além de necessitado por motivos econômicos, era preciso ser
católico e rezar três vezes por dia.
O
complexo residencial conta com uma igreja e um padre que também vive ali. Mas
há outras exigências disciplinares, como por exemplo, as portas são fechadas às
10 horas da noite. Quem volta para casa depois desse horário precisa pagar uma
multa entre 50 centavos de euro e um euro, dependendo da hora. Originário de
uma família abastada, ele consegue ampliar sua fortuna familiar com operações
comerciais e em mineração. Mas seu sucesso também lhe rendeu críticas,
inclusive de Martin Lutero. Para aplacar as críticas, o banqueiro criou também
um fundo com nome do santo Ulrich,
mediante uma doação de 10 mil florins. Isso garantiria recursos suficientes
para manter o funcionamento das organizações econômicas e sociais de caridade
que criou. Os investimentos da família e os juros que lhes renderam, dai a
crítica religiosa de Lutero, asseguraram a sobrevivência de Fuggerei até a
atualidade. Não há dúvida de que seu segredo origina-se já na palavra alemã Beruf, e quem sabe, ainda mais na
palavra inglesa calling, pois existe
uma conotação religiosa – a de uma tarefa ordenada, ou pelo menos sugerida, por
Deus – que se torna tanto mais manifesta, quanto maior for a ênfase no caso
concreto. Haja vista a trajetória histórica e etnográfica da palavra através
dos “idiomas civilizados” (Kultursprachen),
nos quais se nota que, para aquilo que chamamos vocação, nem os povos
predominantemente católicos, nem aqueles da Antiguidade Clássica conheceram um
termo equivalente, pela sua singularidade, ao passo que existe em
todos os povos predominantes protestantes.
Aparece
pela primeira vez na tradução de Lutero, da Bíblia, num lugar do Jesus de Sirac
(II, 20, 21), usada completamente em conformidade com o nosso sentido coloquial
contemporâneo. Da mesma forma que o significado da palavra, o pensamento
subjacente é novo, e é um produto da Reforma. É verdade que certa valorização
do trabalho cotidiano secular, contida nesta concepção, segundo Max Weber,
já se havia manifestado, não apenas na Idade Média, mas também na baixa antiguidade
helenística. Esta valorização do cumprimento do dever dentro das profissões seculares, no mais alto grau
permitido pela atividade do indivíduo. Foi isso que deu pela primeira vez este
sentido ao termo vocação, e que,
inevitavelmente teve como consequência “a atribuição de um significado
religioso ao trabalho secular cotidiano”. Foi nesse conceito de vocação que se manifestou o dogma
central de todos os ramos do protestantismo, descartado pela divisão católica
dos preceitos éticos em praecepta e concilia, e segundo a qual a única
maneira de viver aceitável para Deus não
estava na superação da moralidade secular pela ascese monástica, mas no
cumprimento das tarefas sociais impostas ao indivíduo pela sua posição no
mundo. Nisso é que está a sua vocação.
Nisso é que está a singularidade do pensamento. Contudo, a autoridade da Bíblia, da qual Martin Lutero acreditava retirar a autoridade de sua concepção de vocação, favorecia toda uma interpretação tradicionalista. Especialmente o Antigo Testamento, que, embora não fizesse referência alguma à moralidade secular nas profecias originais, e, afora elas só apresentassem alguns rudimentos e indícios dela, expressa um pensamento religioso muito parecido com essa orientação, segundo a qual “cada um deve preocupar-se com seu próprio sustento e deixar os ateus correr sozinhos atrás do lucro”. Este é o sentido de todos os trechos que tratam das ocupações seculares. Na época apostólica do Cristianismo, antes da intensa perseguição aos cristãos chegada através do Novo Testamento, especialmente com a consagração de São Paulo, as primeiras gerações de cristãos encaravam a vocação secular, seja com indiferença, seja de um modo essencialmente tradicionalista. Como esperavam a vinda do senhor, cada um devia permanecer em seu posto e na atividade secular em que o chamado do Senhor o tivesse achado, e nele continuar trabalhando como antes, não constituindo dessa forma a pobreza um peso para os outros, pois tudo só teria ainda curta duração.
Nisso é que está a singularidade do pensamento. Contudo, a autoridade da Bíblia, da qual Martin Lutero acreditava retirar a autoridade de sua concepção de vocação, favorecia toda uma interpretação tradicionalista. Especialmente o Antigo Testamento, que, embora não fizesse referência alguma à moralidade secular nas profecias originais, e, afora elas só apresentassem alguns rudimentos e indícios dela, expressa um pensamento religioso muito parecido com essa orientação, segundo a qual “cada um deve preocupar-se com seu próprio sustento e deixar os ateus correr sozinhos atrás do lucro”. Este é o sentido de todos os trechos que tratam das ocupações seculares. Na época apostólica do Cristianismo, antes da intensa perseguição aos cristãos chegada através do Novo Testamento, especialmente com a consagração de São Paulo, as primeiras gerações de cristãos encaravam a vocação secular, seja com indiferença, seja de um modo essencialmente tradicionalista. Como esperavam a vinda do senhor, cada um devia permanecer em seu posto e na atividade secular em que o chamado do Senhor o tivesse achado, e nele continuar trabalhando como antes, não constituindo dessa forma a pobreza um peso para os outros, pois tudo só teria ainda curta duração.
No
dia 31 de outubro de 1517, véspera do Dia
de Todos os Santos, o monge agostiniano Martinho Lutero aproveitou a grande
procura das pessoas pelas missas comemorativas e divulgou sua proposta de
reforma da Igreja Católica. Ele literalmente pregou nas portas da Igreja do
Castelo, em Wittenberg suas 95 teses, questionando “as práticas do papado, sua
doutrina e a venda de indulgências”. Também reconhecida como Igreja de Todos-os-Santos de Wittenberg
(em alemão Schlosskirche) é uma
igreja luterana localizada na Alemanha. Ela é reconhecida mundialmente por ter
sido o local onde Martinho Lutero afixou as 95 Teses no ano de 1517. Como a
igreja ficava na rua principal, suas portas funcionava como “uma espécie de
quadro de avisos públicos”. Com esse gesto de debater publicamente com o papa,
Lutero deu início a uma “batalha teológica” que posteriormente se tornaria uma
guerra religiosa que dividiria países europeus e mudaria para sempre a
história. O principal argumento de Lutero era o ensinamento das Escrituras que “o justo viverá pela fé”.
Estabeleceu então a doutrina da “justificação pela fé”, ou seja, a justificação
do pecador diante de Deus não vem pelo esforço pessoal, mas trata-se de algo
recebido por todos que creram na obra de Cristo na cruz. Como o nome indica, a
Reforma desejava reformar a Igreja, não dividi-la.
Os
argumentos de Lutero atingia o centro do poder: o Vaticano. Entre suas
críticas, negava a infalibilidade
papal, sua autoridade para tirar almas do purgatório e que o pontífice possuía
as chaves do céu. Ipso facto que
fosse abandonado o culto aos ídolos (santos). Lutero não apenas leu a Bíblia,
como foi intérprete da Bíblia através da perspectiva de sua
tendência geral, e esta, no decorrer da sua evolução entre 1518 e mais ou menos
1530, não apenas permaneceu tradicional, como se foi tornando cada vez mais
tradicional. Isto é importante na medida em que Lutero não estabelece uma
concepção fundamentalmente nova, nem
mesmo original no pacífico relacionamento da vocação secular aos princípios religiosos. Todavia, a pureza da
doutrina como único critério da infalibilidade da igreja, cada vez mais aceita
por ele depois da guerra dos vinte, bastou para por em cheque o desenvolvimento
de novos pontos de vista no plano ético. O conceito de vocação permaneceu em sua forma tradicional. A vocação para ele era
logo aceito como uma ordem divina, a
qual uma devia adaptar-se. Essa tendência domina o outro pensamento, também
presente, de que o trabalho vocacional é uma, ou melhor, a tarefa ordenada por Deus. Em seu desenvolvimento posterior, o
luteranismo ortodoxo iria levar este princípio mais longe ainda. O único
resultado ético era, pois, algo de negativo: a submissão dos deveres seculares
aos ascéticos da situação existente.
É
o contrato comutativo, oneroso, bilateral e de execução continuada. Portanto, é
sempre bom lembrar que locador é o
personagem que figura na condição de senhorio, e locatário é o personagem social que figura na condição de
inquilino. O contrato de aluguel pode ser rompido através da denúncia de uma
das partes. Luvas é o nome dado ao valor excedente
adiantado pago pelo inquilino ao locador (proprietário) ou sublocador,
reservadamente, para assinatura de contrato de locação, além do aluguel mensal.
É um costume que os proprietários de imóveis comerciais localizados em áreas
muito valorizadas adquiriram, frente à grande demanda. A origem da expressão
remete ao cristianismo. No séc.
XVIII, durante as procissões, o andor com a imagem de Cristo era carregado por
fiéis que “deviam trazer luvas nas mãos”. Tais luvas eram fornecidas pela Igreja que cobrava uma pequena
importância para cedê-las aos fiéis que desejavam carregar a padiola. A
expressão “pagar luvas” estendeu-se às próprias contribuições que os fiéis
faziam às paróquias. Mais tarde passou a ter o significado que reconhecemos.
Durante
o período de permanência de D. João no Rio de Janeiro, o número de habitantes
da capital passou de 50 mil para cerca de 100 mil pessoas. Chegaram europeus
das mais diversas nacionalidades. Instalavam-se também inúmeros diplomatas do
governo português. A transferência da corte portuguesa para o Brasil foi o
episódio da história de Portugal e da história do Brasil em que a família real
portuguesa, a sua corte de nobres e mais servos e demais empregados domésticos
(tais como valetes) e inclusive uma biblioteca com mais de 60 000 livros,
radicaram-se no Brasil, entre 1808 e 1821. Tendo a leva numérica inicial de 15
000 pessoas. Posteriormente, após 1821, muitos destes voltaram a Portugal. A
capital do Reino de Portugal foi estabelecida na cidade do Rio de Janeiro,
registrando-se o que alguns historiadores denominam de “inversão
metropolitana”, ou seja, o novo fato político da colônia que passou a ser
exercida a soberania e o governo do império ultramarino português. Pela
primeira e única vez na história política de formação do Estado uma colônia
passava a sediar uma corte europeia, trocando alhos por bugalhos. O plano de
transferência da família real e da corte de nobres para o Brasil, refúgio
seguro para a soberania quando a resistência militar a um invasor fosse inútil
na metrópole, já havia sido anteriormente cogitado.
Historicamente
durante a crise de sucessão de 1580, ante o avanço dos tercios do duque de Alba, D. Antônio I terá sido aconselhado a
buscar um refúgio para além-atlântico. No contexto da Restauração da
Independência (1640), quando a França abandonou Portugal no Congresso de Münster
(1648), o padre Antônio Vieira vislumbrou ideia semelhante a D. João IV,
associando-a ao vaticínio da fundação do Quinto Império. Posteriormente, embora
sem ameaça militar iminente, o diplomata Luís da Cunha defendeu a ideia de se
transferir para o Brasil a sede da poderosa monarquia portuguesa. No início do
século XIX, no contexto internacional criado pela ascensão do império de
Napoleão Bonaparte, a ideia da retirada da família real para o Brasil voltou à
tona no imaginário parlamentar, defendida pelo marquês de Alorna em 30 de maio
de 1801 e, novamente, em 16 de agosto de 1803, por D. Rodrigo de Sousa
Coutinho.
A
ideia ainda vaga na economia política global de uma transferência para o
Brasil, ressurgindo como um meio de reforço à segurança nacional, sobretudo em
contextos de ameaça iminente à soberania de Portugal, foi apresentado como uma
via necessária ao cumprimento de um projeto messiânico,
como em Antônio Vieira, ou como um meio político para redefinir as relações de
forças no equilíbrio europeu pós-Vestefália, com o marquês de Alorna, Luís da
Cunha e o conde de Linhares. Depois das campanhas do Rossilhão e da Catalunha,
a Espanha abandonara a aliança com Portugal, fazendo causa comum com o inimigo
da véspera – a França imperialista de Napoleão. Resultou daí a invasão de 1801,
em que a Grã-Bretanha de nada serviu a Portugal. O plano de Napoleão era o de
aprisionar a família real portuguesa, sucedendo ao Príncipe-regente Dom João de
Bragança, futuro Rei Dom João VI, e o que veio a suceder a Fernando VII de
Espanha e a Carlos IV de Espanha em Baiona – forçar uma abdicação. Teria
Portugal um Bonaparte no trono e, paralelamente, a Inglaterra apossar-se-ia das
colônias do império ultramarino português, sobretudo a extraordinária colônia
do Brasil.
Havia
na Corte em 1813, duas livrarias, ambas de franceses, Paul Martin Filho e Jean
Robert Bourgeois. Em 1821, nove: a de Manoel Joaquim da Silva Porto, à rua da
Quitanda; a de Antônio José Rebelo, no largo do Desterro; a de Jerônimo
Gonçalves Guimarães, à rua do Sabão; a de João Batista dos Santos, à rua da
Cadeia; a de Francisco Luís Saturnino da Veiga, à rua da Alfândega; a de
Cipriano José de Carvalho; a de Francisco Nicolau Mandillo; a da rua Direita,
defronte do Arsenal, que vendia folhetos com os discursos pronunciados nas
Cortes de Lisboa. Em 1823, proclamada a Independência, surgiram outras: a de
José Antônio da Silva, à rua Direita, a de Joaquim Antônio de Oliveira, à rua
José Antônio da Silva, à rua Direita, a de Joaquim Antônio de Oliveira, à rua
da Quitanda, a da rua dos Latoeiros; a da rua da Ajuda; a de Vera Cruz &
Cia, à rua da Quitanda; a da rua das Violas; a da rua Nova do Senado, a da rua
dos Arcos. Eram por vezes lojas mistas. A imprensa
dava comercialmente sinal de vida, em anúncios, de venda de livros usados prova
que o negócio dos livros dava para viver.
O espírito de conciliação (cf. Rodrigues, 1982; Bello, 1983) data dos primeiros
contatos sociais decorrentes da alteridade entre luso-indígenas. Quando os
primeiros portugueses invadiram o Brasil calcula-se em um (1) milhão e
quinhentos mil o número de indígenas que aqui viviam. E começaram, logo nos
primeiros dias, aquele método de
dissolução cultural com que pensaram amansá-los. E assim foi durante longo
tempo. Uma desafeição geral contra a terra e a indiada dominava a gente
portuguesa. Um ódio incontido contra o gentio levava-a a praticar as maiores
iniquidades, como as praticava Mem de Sá e Jerônimo de Albuquerque, ao mandarem
colocar à boca de bombardas, feitos em pedaços, os índios que mataram cristãos.
Foi na base histórica do terrorismo,
realizado aqui, na Índia e na África, que se impôs a paz cristã, que se
sujeitou todo o gentio à lei do colono. Tirar o medo aos cristãos, senhorear o
gentio pela guerra, amedrontá-lo com grandes ameaças, domá-lo e metê-lo no jugo
e sujeição, tomar suas terras e roças e reparti-las pelos colonos. Aí está um
quadro sumário dos contatos luso-indígenas do primeiro século – afirma
Rodrigues (1982), que “ensopou nossa terra de sangue indígena, apesar dos
esforços da catequese jesuítica, sempre mais lembrada e louvada” porque representa um teatro de operações da
história triunfante e oficial.
Se de modo geral, prevalece da parte
do povo o espírito de conciliação, que se manifesta na ideia de Francisco Adolfo de
Varnhagen (cf. Cezar, 2007), na unidade linguística, na mestiçagem, na
tolerância racial e nas acomodações que atenuam os antagonismos sociais, seria
falso sustentar que seu comportamento foi conformista.
Lutas sociais sem fim e com grande derramamento de sangue demonstram as
divisões inconciliáveis entre extratos sociais e políticos dominantes e
dominados e os comportamentos inconformistas. A chamada Guerra dos Bárbaros (1688-91) prossegue miseravelmente campanhas de
extermínio indígena do primeiro século. Travadas no Rio Grande do Norte, quando
os índios resistem à expropriação de suas terras e terminadas com terrível
morticínio, condenado pelas autoridades eclesiásticas, elas se efetuam em todo
o país. Outro exemplo de lutas sangrentas é a guerra do gentio Paiaguá
(1732-1736), ordenada por provisão régia, mais tarde repetida contra todos os
índios bravos, especialmente os botocudos, em 1808. As guerras ofensivas no
Mato Grosso, em Goiás e Minas Gerais exterminaram os grupos indígenas, e não
só, mas por isso também, Capistrano de Abreu descreveu que “os alicerces
assentaram sobre sangue, com sangue se foi amassando e ligando o edifício e as
pedras de desafazem, separam e arruínam”.
As lutas sangrentas pela posse da terra, pela expulsão indígena contínua, de
latifundiários e latifundiários destes com os sertanejos fizeram também correr muito
sangue. Somente em 1699 que se tentou hic
et nunc impor ordem aquele campo de batalha cotidiano. O crime no sertão, onde reinou sempre mais
respeito pela propriedade privada propriamente que pela vida, as lutas de famílias oligárquicas mancharam de
sangue os alicerces sociais e com sangue se foi formando a consciência
política. Nem foram menores a violência, a crueza e o sangue das guerras das
facções armadas de latifundiários de contra quilombos negros, mineiros,
baianos, cariocas, pernambucanos. O de Palmares suportou 17 expedições
punitivas, na última das quais em 1694, foi cercado por 3 mil homens, e custou
inumeráveis vítimas e muito sangue; quilombos do Rio de Janeiro, no século
XVII, foram também afogados em derramamento de sangue. Revoltas populares de
colonos contra excessos fiscais, favores e privilégios sociais foram suprimidas
cruelmente, como no Rio de Janeiro, em 1660, quando foi enforcado Jerônimo
Barbalho e sua cabeça sangrenta foi exposta no pelourinho; ou como no caso comparativo
no extremo, o Maranhão, em 1684, quando Manoel Bequimão e Jorge Sampaio foram
decapitados e Francisco Dias Deiró foi supliciado em efigie.
Portanto,
se as lutas em Minas Gerais, entre paulistas e emboabas (1708-1709), e as atrocidades do Capão da Traição foram menos
cruentas do que se costumam supor, a Guerra
dos Mascates (1710-1711) custou 150 vidas, 80 feridos e 490 presos; em Vila
Rica, nas duas sublevações de 1720, uma e outra cruenta, o Conde Assumar teve
mais de dois mil homens para rebater os sublevados e acabou enforcando e
esquartejando Felipe dos Santos e queimando as casa dos principais
revolucionários; no motim militar de 1728, na Bahia, dos 23 réus, 7 foram condenados
á pena de morte, sendo os dois chefes esquartejados e os demais sofreram
açoites e degredo por toda a vidas para Benguela e Angola; em 1792, os chefes
do movimento da Conjuração Mineira (1792) foram degredados para a África, mas
Tiradentes, o líder radical que não negou haver premeditado o levante, foi
enforcado: - seu corpo será dividido em quatro partes e pregado em postes, pelo
caminho de Minas, no sítio da Varginha e das Cebolas, onde o réu teve as suas
infames práticas, e o mais nos sítios de maiores povoações, até que o tempo
também os consuma”, e infamado réu, seus filhos e netos, “e a casa em que vivia
em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique”.
Em
1798, com a luta na revolução social, em Salvador, dos 32 implicados foram
condenados à morte, executados e esquartejados 4 modestos patriotas que
sonharam com a liberdade nacional; também o martírio do preto da liberdade
Isidoro, nas Minas Gerais, em 1809, as insurreições dos negros Haussás, na
Bahia, em 1807, 1809, 1813 e 1816, com vários mortos, suicídios, açoites,
degredos e condenações à morte; as lutas indígenas de 1813, no Araguaia, com
muitos mortos; finalmente, em 1817, na primeira revolução da independência, em
que combateram mais de 5 mil homens e que deu aos brasileiros mais de 2 meses
de efetivo exercício do governo, perderam a vida ais de 350 pessoas nos
combates, especialmente na batalha de Pindoba, afora os mortos nas ruas, os
“suicidados” que foram falecidos nos cárceres, degredados, e os 4 carbonizados
na Bahia e 9 enforcados em Pernambuco. Essas explosões de sangue demonstram o
inconformismo do povo, o radicalismo da liderança popular e a violência e
crueza da repressão pela minoria dominante. A fase colonial não valida a tese
da tradição política pacífica, que uma historiografia oficial vem sustentando
para abater os impulsos de revolta e para satisfazer as esperanças da minoria
dominadora. No fim do período colonial já se podiam ver alguns frutos positivos
e alguns resultados negativos. Para começar por estes, a liderança, mesmo a que
conciliava, aparando as tensões e os conflitos
mais graves e ameaçadoras, foi sempre privilegiada e ortodoxa. Por isso que
o historiador Capistrano de Abreu escreveu que “o povo foi capado e sangrado”.
Os
historiadores brasileiros, afirma Bello (1983), fazem datar historicamente de
longe a decadência do princípio
monárquico. Para Euclides da Cunha, por exemplo, a conciliação do Marquês do
Paraná, prolongada virtualmente até 1860, assinala-lhe o início da descida ou,
como diria Joaquim Nabuco, o início da maré da enchente da democracia. Para
Oliveira Vianna, a ideia republicana, “como força organizada e não como ideia
isolada, vincula-se claramente à reação liberal, iniciada com a queda do
gabinete Zacarias em 1868”. Daí surgiria a organização do partido Republicano
em 1870. A ostensiva intervenção do Imperador, não somente no sacrifício do
gabinete Zacarias, mas na entrega do poder aos conservadores de Itaboraí contra
uma Câmara unanimemente liberal, determinaria mudança geral no sistema de
crenças e ideias dominantes no mundo político. Começaria a “descrença
progressiva nas virtudes do sistema monárquico parlamentar e uma crescente
aspiração para um novo regime, uma nova ordem de coisas”. A queda do gabinete
Zacarias por motivos imediatos, que não recomendavam a argúcia daquele político,
mal influiria na crença ou descrença pública sobre as vantagens do regime
parlamentar. A Monarquia estranha à índole brasileira, transplantada em
circunstâncias extraordinárias, da Europa, onde representava a estratificação
de séculos de história não chegara na América a ser uma superestrutura. A
análise do regime extinto em 1889 reduz-se quase ao estudo das figuras que o
encarnaram ou definiram, a começar naturalmente pela que se encontrava no
pináculo.
A ascensão de Pedro II ao trono no
Brasil, em 1840, afirmando a continuidade
da Monarquia marca o início do longo período de entorpecimento da ideia
republicana, depois das agitações da Regência, dos movimentos sociais
nativistas e republicanos de Pernambuco em 1817 e em 1824, e da prolongada
guerra federalista dos Farrapos, traduz muito mais o cansaço geral das lutas
passadas do que crença ou entusiasmo pelo regime político. A inglória revolta dos
Praieiros, em 1848, derradeiro fermento do velho espirito de insubordinação dos
pernambucanos, assinala também a última escaramuça revolucionária. Pedro II,
mal saído da adolescência, liberta-se das tutelas palacianas, para começar o
governo pessoal, em que mal se disfarça, muitas vezes, em hábil simulação, a
sua jovem vontade fria e tenaz. Com evidente tato, sabe aproveitar-se das
aspirações esparsas de apaziguamento político para levar o Marquês de Paraná a
promover a famosa conciliação de 1853, em que se anulam, no amalgama
oportunista, as antigas ideologias partidárias. Prepara-se para a ação soberana
do jovem imperador, através da maquinaria parlamentar é o grande árbitro da
vida brasileira, expressão por sua vez, do regime econômico dos latifúndios de
escravos que se simboliza.
É
possível distinguir a evolução psicológica de Pedro II em duas fases distintas.
Findaria a primeira antes dos cinquenta anos, ao termo da carnificina na guerra
do Paraguai. Ele é o árbitro da vida na nação, um tanto insulada do mundo.
Disfarça menos a própria autoridade. Liberto do que lhe tutelaram o primeiro
ano de reinado sente-se na plenitude de suas forças. O altivo Paraná pode
realizar sob “inspiração augusta” a política de conciliação, que eliminaria as
fronteiras ideológicas dos partidos,
facilitando consequentemente a ação do poder pessoal do soberano. O casamento
sem amor dá-lhe uma esposa modelar de virtudes domésticas. O romantismo renova
a casada seiva literária, de tão pobre sabor reinol; os primeiros conhecimentos
as da filosofia positivista e agnóstica abrem as elites das escolas superiores
à nova compreensão dos fenômenos do mundo físico e moral. Agia como dissolvente
da ideia monárquica, tão exótica na América republicana e igualitária. O
pesadelo da escravidão humilhava as melhores consciências. Vitorioso na
perseguição e morte de Solano López, Pedro II conseguiu protelar-lhe o
desaparecimento. As suas viagens à Europa e à América são como evasões às
coisas aborrecidas que o cercavam. A nação não tolerava sequer a ideia da
chefia do Estado em mãos de uma princesa, piedosa e digna, mas casada com um
príncipe estrangeiro, profundamente antipático e injustiça ao sentimento
púbico.
Tão
forte quanto na literatura foi a
influência francesa na vida artística do Brasil. No crepúsculo do reinado, esboçava-se
certa reação nacionalista na pintura. Na música, equilibravam-se as influências
francesa e italiana, e na arquitetura religiosa e civil, o que havia de melhor
era a velha tradição colonial portuguesa. A imprensa perdera a paixão ou a
virulência do período regencial. Não reconhecia nesta fase o que se denomina hoje
sensacionalismo. O regime de liberdade que alvorecia e que lhes era compactuado
estimulara o florescimento dos jornalistas doutrinários
na pena de aluguel de Evaristo da Veiga e Justiniano José da Rocha. Num país de
escassas atividades intelectuais, por intermédio dos livros e das revistas de
cultura, convertera-se a imprensa no instrumento e monopólio de divulgação de
ideias. Os homens de letras procuravam abrir os próprios caminhos. – “Antigos
panfletários políticos como Sales Torres-Homem, do extremado Libelo do Povo, acabaram por acomodar-se
nos conselhos do governo. Em publicações ineditoriais do Jornal do Commércio, nos famosos A pedidos, ecoavam debates políticos como as ásperas polêmicas
pessoais, as diatribes de toda espécie, as pequenas calúnias, as pequenas
misérias, como o sentimentalismo piegas de uma cidade de hábitos profundamente
provincianos. Os grandes jornais gabavam-se de neutralidade política, e os que
se enfeudavam diretamente aos dois partidos rotativos só conseguiam êxito
quando em oposição. Nos últimos anos do Império, elevara-se o tom da imprensa
oposicionista. A ardente campanha abolicionista de José do Patrocínio, como os
grandes artigos de Rui Barbosa e Quintino Bocaiúva no Diário de Notícias e no País,
eram claros sinais do novo ímpeto combativo” (cf. Bello, 1983: 43).
Justiniano
José da Rocha que redigia na Corte, O
Brasil, tinha razão quando situava a nova Folha de Borges da Fonseca como outra ressureição do Repúblico. O movimento de rebeldia
estava em ressurreição. O terrível panfletário colocar-se-ia desde logo na
esquerda das forças oposicionistas, ipso facto, o centro e a direita da Praia não a poupariam por isso mesmo. Em
agosto de 1847, foi levado a julgamento: não negou suas ideias republicanas e
confessou-se adversário de D. Pedro I. Foi condenado a oito anos de prisão por
ter, em seu jornal, injuriado aa pessoa do Imperador e escrito a favor da
desmembração do Império. Em dezembro a Relação
de Pernambuco anula a iníqua sentença. Foi no período de julgamento que Borges
da Fonseca lançou O Repúblico, que
circulou como meio de comunicação entre 13 de agosto de 1847 e 4 de novembro de
1848 e em que se pode acompanhar o processo de sua aproximação com a Praia,
iniciado de uma posição de veemente repulsa. A epígrafe de seu novo jornal, de
que circularam 120 números era significativa. Com a rebelião, o jornal desapareceu e, a 12 de janeiro de 1849, o chefe
de Polícia, Jerônimo Martiniano Figueira de Melo, que figura entre os primeiros
bacharéis formados pela Faculdade de Direito de Olinda, em 1832, apreendeu a
tipografia e recolheu-a ao Arsenal de
Guerra, pois sua atividade “não podia deixar de ser sumamente danosa à
causa da ordem e da legalidade”.
O
jornal impresso em sua oficina cuja redação foi atribuída sem fundamento, a
Jacinto Manuel Severino da cunha, mereceu de Justiniano José da Rocha, segundo
Sodré (1999), “nova diatribe”. Para o servidor do regresso, cabia aquela folha
“espalhar na classe inferior as suas monstruosas doutrinas”, pondo-as “ao
alcance dos que menos tempo têm para ler, menos ainda para refletir, dos que
por triste predisposição facilmente se inflamam com incendiárias declarações”.
Posição característica da reação, em todos os tempos, como se verifica pela
repetição dela, inconformada em que consentisse em ouvir os que lhe
contrariavam os interesses, em não ver as “classes inferiores” concordar na
tutela dos justinianos e seus mandantes, encarregando-os de ler, por elas, de
pensar por elas, mas ao contrário, com “a triste predisposição” para a
liberdade. Como escritor tornou-se reconhecido por sua índole panfletária, em
que sobressaía o jornalista, patente na obra Ação, Reação, Transação, de 1855. Traduziu O Conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas (1845) e Os Miseráveis, de Victor-Marie Hugo
(1862). Em 1837 Manuel de Araújo Porto Alegre publica a primeira caricatura do Brasil (cf. Lustosa, 2013),
retratando as disputas entre personagens políticas das Regências. A litografia demonstra
Justiniano José da Rocha contratado por um alto salário para ser o redator do
jornal Correio Oficial do período
regencial, publicado no Rio de Janeiro entre 2 de janeiro de 1830 a 30 de
dezembro de 1840, e que de 1° de julho de 1833 a 30 de junho de 1836 publicou
as matérias oficiais da Regência e,
na gravura, “aparece de joelhos recebendo um saco de dinheiro do governante”.
Este
seu papel subserviente ao poder de Justiniano foi paradigmático como símbolo de
um setor da imprensa brasileira, como assinala Nelson Werneck Sodré: “Porta-voz
conservador, pena alugada, Justiniano
é apresentado, pela historiografia oficial, como nosso maior jornalista, sem
que, para isso, tivesse tido condições”. O historiador acrescenta ainda que foi
ele o personagem típico do jornalismo
de seu tempo, ocupando destaque na imprensa palaciana. Foi apadrinhado pelo
maranhense e ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Paulino José Soares de
Souza, além de visconde de Uruguai que, como ministro, “julgara oportuno
possuir o governo um jornal que se lhe prestasse à publicidade como meio de
influência e formação de opinião”. Alguns
fatores externos à constituição do gênero folhetim também permitiram seu grande
sucesso na Europa oitocentista e no Brasil do século XIX. Dentre os periódicos
fundados ou que participou Justiniano José da Rocha, estão O Atalante (1836), O Cronista,
fundado por Josino do Nascimento Silva e Firmino Rodrigues da Silva para
combater o Regente Feijó, O Brasil
jornal oficial do Partido Conservador, o Correio
do Brasil, O Constitucional e,
por fim, O Regenerador, O Atalante (1836). A imprensa teve
importância capital para os que aspiravam cargos eletivos na arena política ou
viver das letras no século XIX, dentro e fora do Brasil, uma vez que o jornal atingia
um número cada vez maior de leitores, possibilitando formação e o acesso à popularidade.
Como
o desenvolvimento das técnicas de impressão a partir de 1830 responde de modo
eficaz a uma demanda de leitura em plena expansão, ampliando o incipiente mercado dos livros e o da imprensa não podiam
ignorar essa massificação de leitores.
A imprensa tem papel fundamental na formação desses novos leitores europeus. A
descoberta da “mina de ouro” para os jornais ocorre nas províncias brasileiras naquela
década, criando, como é de se esperar, um público amplo e cativo. Espelhando o
paradigma familiar, representado através da troca de lealdade e obediência por
proteção e favores constituía a matriz das relações sociais entre clientes e
patrões, recriados quase que indefinidamente entre os mais diversos estratos
sociais. Em 1836, José Justiniano da Rocha, saúda a novidade da ficção
“abençoada invenção periódica”, principalmente no Rio de Janeiro, centro político
e irradiador da cultura em nível nacional. O folhetim
surgiu na França no início do século XIX. Foi importado e incorporado para os
meios de comunicação no Brasil logo depois, fazendo enorme sucesso na segunda
metade do século XIX. Ao tratar de amenidades da vida da classe média, se
aproximava do realismo literário. Também realizava um registro ágil do
cotidiano típico do jornalismo, mas não com a pretensão de registrar a “verdade”,
mas apenas de ser verossímil.
O
jornalista Justiniano José da Rocha nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 8 de
novembro de 1812. Filho de uma escrava, em 1823 seguiu para a França em
companhia de José Joaquim da Rocha, um dos patriotas exilados por D. Pedro I e
que se acredita ter sido seu pai. Educou-se em Paris e, de volta ao Brasil,
completou em 1833 o curso de direito em São Paulo e publicou o Compêndio de
geografia elementar (1838). Dirigiu O
Brasil, órgão do Partido Conservador
cuja primeira edição data de 16 de junho de 1840. Foi deputado geral por Minas
Gerais em duas legislaturas, nas décadas de 1840 e 1850. Foi um polemista
durante o Segundo Reinado, objeto da primeira charge política publicada no
país: uma caricatura que demonstrava o jornalista no momento em que recebia
dinheiro do Partido Conservador. Publicou anonimamente o panfleto Ação, reação, transação (1855), sobre os
fatos políticos da história do Brasil no período entre a Independência e a
conciliação, e outros do mesmo tipo. Dirigiu e fundou vários jornais, entre os
quais se destaca O Regenerador,
publicado a partir de 1860. Justiniano José da Rocha morreu no Rio de Janeiro,
em 10 de julho de 1862.
No
plano político, caberia a Justiniano José da Rocha a elaboração de uma teoria do movimento batizado por conciliação. A apologética da época e de
sua política fundava-se no princípio que o ideólogo tornava axiomático e que
dizia inspirar-se no estudo da História. Na luta da autoridade com a liberdade,
sucediam-se, segundo ele, períodos de ação, de reação e, por fim, de transação.
Neste último, o progresso do espírito humano realiza-se, e se firma a conquista
da civilização. O justo equilíbrio seria a conciliação dos contrários, do
radicalismo, atuante e dinâmico, com a reação que procurava deter-lhe a marcha,
firmando o princípio da autoridade. A fase da transação era a que exigia mais prudência, “mais tino, mais devoção
nos estadistas a quem é confiada a força governamental e a alta direção dos
negócios públicos; pois se a não sabem ou não querem reconhecer, se não querem
ou não sabem facilitar, se ainda mais a contrariam, provocam calamidade a que
depois não há sabedoria que possa acudir”.
Os
artigos de jornais, formando um processo de trabalho e de comunicação, incluem,
além da vinculação com os proprietários da empresa, o público consumidor, a
circulação e cooperação, os quais são expressivos para o estudo de cooptação das teorias e explicações
históricas, que ajustadas ao imediatismo da publicação, assumem indisfarçável
caráter ideológico. Ipso facto, os
panfletos são muitas vezes fontes de maior interesse. Sua produção envolve
perguntas cujas respostas encaminham sua decodificação. Sendo um
pronunciamento, deseja atingir a quem, defender o que ser atacado por que
supôs. O panfleto Ação; Reação; Transação, de Justiniano José da
Rocha, publicado em 1855, é um ensaio político. O aspecto ideológico do texto
se delineia quando fundamenta a periodização que embora ele tenha balizado sua
história entre 1822 e 1856, é impelido a retroceder ao fundamentar-se no período
colonial e, em prospecção futura a um processo de novas ações e reações, caso a
transação não cumpra seus objetivos de pacificação. A regra é clara. O primeiro
e o segundo períodos, isto é, de 1822 a 1836, referem-se à luta da democracia
com o princípio monárquico.
Assim
a produção social através da cooperação
de indivíduos no mesmo processo de trabalho e de produção, executa diversas
operações simultaneamente, ou economiza os meios de produção por meio de seu
uso coletivo, ou confere a passagem do processo de trabalho individual ao leitmotiv, o caráter de trabalho social
médio, quando a força produtiva específica da jornada de trabalho combinada é
força produtiva social do trabalho ou, com a divisão sociológica do trabalho, a
composição técnica enquanto força produtiva do trabalho social. Ipso facto, ela
deriva da própria cooperação. Ao cooperar
com outros modos de planejamento, o trabalhador supera suas limitações
individuais e desenvolve sua capacidade genérica. Se os trabalhadores não podem
cooperar diretamente uns com os outros sem estar juntos, de modo que sua
aglomeração num determinado local de trabalho é condição de sua cooperação, os
trabalhadores assalariados não podem cooperar sem que o mesmo capital, o mesmo
capitalista os empregue simultaneamente, comprando ao mesmo tempo, portanto,
suas forças de trabalho. O valor total dessa combinação, ou a soma dos salários
dos trabalhadores por um dia, uma semana, tem de estar
reunido no bolso do capitalista antes da própria força de trabalho ser reunida
no processo de produção.
Com
o triunfo da democracia, a ação é o
tema político central reduzindo-se a parte inicial à justificativa da segunda.
O mesmo se dá em relação ao terceiro e quarto períodos. A reação e o triunfo
monárquico redundam na mesma temática, demonstrando que a divisão é mais um
recurso didático de forma do que fruto de uma exigência teórica. O último
período, também não se caracteriza como “último”, pois entrevê a continuação do
processo. Tanto a ação quanto a reação são concebidas comportando fases de luta
e de triunfo. A ação (1822 a 1836)
inicia-se com o antagonismo entre “as camadas superiores da inteligência” e o
absolutismo. Na Constituinte as contradições acirraram-se. O poder reagiu,
dissolveu a Assembleia e organizou a repressão. Entretanto, ofereceu uma
Constituição em que aparentemente assegurava todas as liberdades, realizando
uma obra idealizada do admirável fruto dos publicistas mais adiantados na
formação da escola liberal. O ódio aos portugueses torna-se o principal motor
do desenvolvimento democrático que foi aparecendo em toda a população e, que
poderia ter sido tão fatal ser a Providência, não houvesse querido salvar-nos.
Na conjuntura final do primeiro reinado, a conspiração democrática chegou ao
auge. A reação (1836-1852) originou-se da extinção dos meios legítimos de
atuação do poder que por sua vez havia gerado revoltas, descontentamentos e
anarquia. As revoltas sucederam-se, ascendendo nos espíritos o desejo de
encurtar a minoridade do príncipe.
Em
uma providencial inversão de papéis, a oposição democrática empalma a
maioridade, e o governo não conseguiu se lhe opor porque na verdade, “a
maioridade era o remate de sua obra”. Os ministérios que se sucederam de 1840 a
1851, contribuíram para obra da reação conservadora, melhor dizendo o
fortalecimento do poder moderador. Curiosamente, o poder moderador, repugnante
aos princípios parlamentares, foi reforçado inclusive por ministérios liberais,
embora no poder, achavam-se tolhidos pela tendência que encontravam a sociedade
os obrigava a recuar. A facção extremada dos liberais acreditou poder pelas
armas, defender algumas das conquistas democráticas. Temendo a velha ideia
grega de que anarquia leva ao caos e a incapacidade de governabilidade, a
reação monárquica recrudesceu e encetou a reforma do código de processo na
determinação de revogar as instituições democráticas. Dessa nova organização
“nasceu um monstro horrível, que ameaça toa a segurança individual que aniquila
toda a liberdade, monstro que,
segundo Janotti (1982), em mil vítimas que cotidianamente, persegue, não se
farta, não sacia os seus instintos: a prisão
arbitrária.
Não
será a primeira vez que o sentido e o significado do habeas corpus serão reduzidos em sua eficácia simbólica, de forma
quase absoluta. A força política das assembleias provinciais despareceu. O
Exército e a Marinha reorganizaram-se. A Guarda Nacional transformou-se em
instrumento de poder. O país não poder estar permanentemente ao sabor dos
acontecimentos da ação e da reação, deve descobrir na sabedoria política os
meios de combinar os dois elementos constitucionais, “ordem como condição de
liberdade” e “liberdade como condição de ordem”. Impõem-se a transação. Ao escrever a reação, na teoria, Justiniano José da Rocha, revela algumas
inconsistências de seu discurso ideológico.
Mas como a reação surge necessariamente ao término da obra democrática e se lhe
opõe em todos os atos, aprioristicamente pode-se prever o seu desenrolar. Assim
o autor descaracteriza fatos históricos atribuindo-lhes inexorabilidade. Como
poderia o princípio monárquico conciliar-se com a democracia, que no período de
interpretação da ação fora
identificada com a República?
No
tema da transação, a vontade
interfere no processo histórico, juntamente com o patriotismo, os grupos de
poder decidirão os destinos da sociedade. A ideia central é a mais abrangente
do discurso. Comumente apontar-se-ia a transação como ideia dirigente do texto,
pois nela se realiza o equilíbrio entre a democracia e a autoridade, mas, na
busca do sentido mais amplo e explicativo das três fases, encontra-se o sentido
moralista: a luta entre o bem e o mal. O mal no tema da ação representa a
anarquia, e a reação representa o absolutismo. O bem é a transação que evita os
excessos da ação e da reação. Foi nesse
universo político, que se estende apenas até 1855, para Janotti (1982), que
Justiniano José da Rocha se movimenta e define a sua opinião sobre a arena política.
Ativo jornalista, em 1840 posicionara-se contra a maioridade, por ser ela
anticonstitucional. Mas conservador convicto, a partir de 1841 defende os
ministérios do partido conservador, sendo subvencionado
diretamente pelo poder. Em 1852 e 1853 sustentou no Correio do Brasil polêmica com Sales Torres Homem, sobre a
inconveniência da conciliação. Experiente foi deputado por Minas
Gerais nas legislaturas de 1842-1843, de 1850-1852 e na de
1853-1856. De início havia sido contra a conciliação preconizada pelos
liberais, mas aderiu ao projeto do visconde de Paraná, para no mesmo ano em que
saiu a publicação Ação, Reação; Transação rompeu com o ministério. Esse
rompimento em maio de 1855 fundamentava-se em sua discordância em relação á
política externa, na questão platina, pois o gabinete agira sem consultar a
câmara, à sombra de poderes que Carneiro Leão enfeixara em suas mãos. Não era
mais um político conciliador em suas ações. Ao desprezar a pena de aluguel não
foi mais reeleito.
Bibliografia geral consultada.
SCHWARZ, Roberto, Ao Vencedor as Batatas. Forma Literária e Processo Social nos Inícios do Romance Brasileiro. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975; RODRIGUES, José Honório, Conciliação e Reforma no Brasil: um desafio histórico-cultural. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1982; JANOTTI, Maria de Lourdes Mônaco, “A Falsa Dialética: Justiniano José da Rocha”. In: Revista Brasileira de História, 2 (3), 1982, pp. 3-17; BELLO, José Maria, História da República – 1889-1954. Síntese de Sessenta e Cinco Anos de Vida Brasileira. 8ª edição. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1983; ROMERO, Emílio, O Inquilino do Imaginário: Formas de Alienação e Psicopatologia. São Paulo: Lemos Editorial, 1994; TORRES, Valéria Aparecida Rocha, Justiniano Jose da Rocha e a Memoria do Período Regencial. Dissertação de Mestrado. Departamento de História. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 1998; CEZAR, Temístocles, “Varnhagen em Movimento: Breve Antologia de uma Existência”. In: Topoi, vol. 8, n° 15, jul.-dez., 2007, pp. 159-207; MARTINS, Eduardo, A Invenção da Vadiagem: Os Termos de Bem Viver e a Sociedade Disciplinar no Império do Brasil. 1ª edição. Curitiba: Editora CRV, 2011; LUSTOSA, Isabel, “La Caricature Brésilienne: Aspects Notables de son Histoire”. In: Ridiculosa, vol. 1, pp. 321-343, 2013; MOLINA, Matías Martínez, História dos Jornais no Brasil – da era colonial a regência (1500-1840). São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2015; CALDEIRA, Claudia Adriana Alves, Justiniano José da Rocha: Bastidores da Imprensa Política. Tese Doutorado em História Política. Programa de Pós-Graduação em História. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2016; GODOI, Rodrigo Camargo de, Um Editor no Império: Francisco de Paula Brito (1809-1861). São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2016; BARNABÉ, Luis Ernesto, A História Antiga em Compêndios Franceses e Brasileiros no Imperial Colégio de Pedro II ou o Caso Justiniano José da Rocha: História, Disciplina Escolar e Impresso (1820-1865). Tese de Doutorado. Faculdade de Ciências e Letras. Assis: Universidade Estadual Paulista, 2019; FIORIN, Rangel Perrucci, A Transação Tributária como Instrumento de Autocomposição e Eliminação da Litigiosidade. Tese de Doutorado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito. Faculdade de Direito. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2020; entre outros.
Justiniano era avô materno de José da Rocha Mendes (natural de Barbacena, MG). Por sua vez, José era avô de minha mãe Leda Mendes (de Entre Rios de Minas). Assim herdei o sobrenome Mendes, do meu bisavô José da Rocha Mendes. Segundo biografia de Justiniano, de Elmano Cardim, dá Justiniano como filho legítimo de José Caetano da Rocha e de Maria Luiza Muzzi, carioca descendente de italianos.
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