“A baderna me representa”. Marietta BadernaGiannini
Sociologicamente povo é o nome concebido tendo como representação social um conjunto de indivíduos sociais num dado momento histórico que constitui uma nação. Se, por vezes, esta representação não coincide com a totalidade de um território a ela associada, como acontece, é também o conjunto dos cidadãos de um país. Melhor dizendo, um número de pessoas que se constituindo de diversas etnias, estão vinculadas a um determinado regime jurídico: um Estado. Na linguagem vulgarizada, a palavra “povo” pode referir-se à população de uma cidade ou região, a uma comunidade ou a uma família. Também é utilizado para designar povoamento, geralmente pequeno. Mas a população retificava Marx, é uma abstração se desprezarmos as classes de que se compõe. O termo povo é mal empregado no meio científico e técnico-metodológico nos meios de comunicação social. Com frequência, é confundido com a indistinção entre o conceito de população e nação. População é também uma “categoria da prática”, para lembrarmo-nos da sociologia crítica de Alain Touraine, referente a dados estatísticos, demográficos ou econômicos de empresas ou governos estatais. A nação engloba uma população social, política e econômica que compartilham sua origem e identidade, tradição da língua, cultura e religião em geral comuns.
A teoria do modo de produção asiático (“asiatisches Produktionsweise”) como modo de produção característico das milenares formas de constituição e manutenção da sociedade, bem como primeira forma originária e mais geral de sociedade pós-comunidade primitiva, foi fundamental para a concepção histórica e analítica de Marx, como aparecia também em contraposição mais evidente em relação ao desenvolvimento da história greco-romana ocidental. Suas mais importantes formações econômico-sociais, como a China e a Índia, não se teriam alterado substancialmente mesmo com as grandes invasões de povos bárbaros em passado mais remoto, como os mongóis, os árabes e os hunos. Estes povos, apesar de superiores belicamente a chineses e hindus, eram culturalmente atrasados a essas civilizações de culturas milenares. O que transforma analogias na dinâmica de “afinidade eletiva” expressa na literatura tanto por Goethe na arte, quanto por Max Weber na cultura e na política é uma conjuntura que tem uma forma de representação, uma constelação peculiar de valores e de eventos que se dão com o reconhecimento.
A conjuntura latino-americana que tem seu ponto de partida neste momento histórico se caracteriza por dois aspectos fundamentais: a) um desenvolvimento acelerado do capitalismo, uma urbanização intensa e uma industrialização rápida (sob a égide do capital norte-americano), que aprofundam as contradições sociais, tanto na cidade como no campo; b) a revolução cubana, primeira vitória popular contra o imperialismo na América Latina e primeira revolução socialista no continente-dirigida por forças sociais marxistas de um novo tipo, independentes do comunismo tradicional. A combinação destes dois processos, estrutural, econômico-social, e o outro, político e ideológico, terá por resultado o início da nova etapa de interpretação teórica na história, de movimentos populares, e insurreições, que reconhece um novo salto qualitativo com a revolução contínua. Uma etapa que se caracteriza também por uma maior influência e uma renovação do pensamento marxista latino-americano. Nesta conjuntura política de insurreições e golpes de Estado que vai se desenvolver uma relação com a Igreja e sua base social, entre cristianismo e marxismo.
Marietta Baderna nasceu na cidade de Castel San Giovanni, província de Piacenza, no norte da Itália, em 1828. Filha de Antônio Baderna, médico e músico nas horas vagas, rapidamente seu destino artístico se traçou, com dedicação especial ao balé, estreando aos 12 anos nos palcos suas sapatilhas. Rapidamente Baderna passaria a fazer parte da companhia de dança do teatro Scala, de Milão e, aos 21 se destacava como “prima ballerina assoluta” com sucesso pela Itália, participando de diversas turnês em países europeus. Etnograficamente a rebeldia, pelo que se relata, corria no corpo de Marietta, e seu pai, em pleno contexto de ocupação austríaca na Itália, se afirmava como um entusiasmado defensor do movimento democrático que se instalava na movimentada Europa dos meados do Século XIX. À época da resistência, no entanto, os rebeldes revolucionários mantinham como forma de protesto a decisão de que não houvesse vida artística no país enquanto durasse a ocupação - e, militante que era Marietta Baderna seguiu tal orientação político-ideológica. A perseguição sofrida pelos apoiadores do movimento social em conflito era intensa, e assim Antônio e sua filha entenderam que era hora de cruzar o Atlântico em busca de alternativas de vida e trabalho. A família Baderna desembarcou em seguida para o exílio no Brasil em 1849.
Cumpriu o trajeto artístico e pessoal comum aos artistas do período, dedicando seus últimos anos ao ensino da dança. Sua certidão registra o nascimento de Baderna Franca Anna Maria Mattea em 8 de julho de 1828, na cidade de Castel San Giovanni, comuna ligada ao Ducado de Parma e atualmente à Província de Piacenza, filha do cirurgião Antonio Baderna e de Luigia Guani. Dicionários biográficos italianos do século XIX e biografias mais recentes indicam um encaminhamento precoce para a dança, debutando aos 13 anos no Teatro Municipal de Piacenza. Mencionam também seus estudos em Milão, onde frequentou a escola particular de Blasis, “professor de aperfeiçoamento” junto à Imperial Régia Academia de Dança, ligada ao Teatro Scala. Diversos autores afirmam que as primeiras atuações de Marietta Baderna, ainda em Milão, teriam ocorrido no Scala já em 1846. Na primeira turnê europeia, em Londres, levou “bailes novos”, de Blasis, ao Drury Lane e ao Covent Garden em 1847. Boatos gerados visões romanceadas do século XIX, mas que desde Aristóteles, “o menor desvio inicial da verdade multiplica-se ao infinito à medida que avança”.Envolvem não só os motivos imperativos da longa viagem além-mar, como a vida entre nós e as narrativas que cercam a vinda de Maria Baderna ao Brasil. Teatro São Pedro de Alcântara, onde Marietta Baderna costumava se apresentar.
Marietta Baderna Giannini, ou, simplesmente Maria Baderna, foi uma bailarina italiana. Radicada no Brasil em 1849, suas apresentações tornaram-se populares no Rio de Janeiro; seu nome entrou para o vocabulário português como sinônimo de confusão. Baderna nasceu em 1828 na cidade de Castel San Giovanni. Desde cedo teve inclinação para a dança, incentivada pelo pai; aos doze anos fez sua estreia nos palcos em Piacenza. Foi aluna do coreógrafo Carlo de Blasis e tornou-se membro do corpo de baile do Teatro Alla Scala de Milão. Em 1847 apresentou-se na Inglaterra, tendo uma temporada de sucesso no Covent Garden. Em 1849, Marietta Baderna foi contratada pelo Teatro São Pedro de Alcântara, na capital da província imperial, e veio se apresentar no Brasil. Consagrada no Teatro Scala, em Milão, causou furor pela irradiação da notícia nos jornais. Era tão boa que seus fãs não conseguiam se conter no final das apresentações: gritavam seu nome e faziam uma verdadeira balbúrdia. Eram assim reconhecidos “badernas”. Não se sabe se usavam máscaras cobrindo o rosto como era comum nos salões. Voltou para a Itália, mas a força bruta da política obrigou-a a deixar o país. Ela e seu pai eram seguidores do movimento republicano do mazzinismo, derrotado pelos conservadores monarquistas e austríacos após as revoluções ocidentais de 1848.
Tal foi um dos principais estopins dos movimentos sociais nacionalistas, como o mazzinista, contando com a forte participação de setores aristocráticos. Mazzini criou, em 1832, a Jovem Itália, raiz de um movimento mais amplo, a Jovem Europa, cujo objetivo era combater aqueles que concebiam como governos reacionários, absolutistas. Vanguarda na luta por uma associação mundial de povos livres, a Itália deveria, como um primeiro passo decisivo, na sua acepção, unificar-se sob a forma de uma república democrática. Mazzini mesclava elementos religiosos em sua proposta, adotando o mote de “Deus e o povo”, definindo sua ação como “uma cruzada moral e espiritual”. Depois de algumas investidas militares facilmente neutralizadas, o movimento mazzinista foi derrotado, levando vários de seus seguidores à prisão ou ao exílio, como ocorreu com o próprio Mazzini em 1837. Com o avanço do processo social e político de unificação italiano ocorrido na década de 1850 liderado pelo conde Camillo Benso di Cavour, com o aval de Napoleão III - dissidentes puderam retornar ao seu país.
Os grupos sociais dominantes do Norte da Itália, e em particular os de regiões como o Piemonte e a Ligúria, tinham estreitos e antigos vínculos com a França. O controle francês sobre a Itália, entre 1796 e 1815, havia substituído o controle austríaco, mas com vantagens para aqueles grupos regionais, que passaram a gozar de liberdade e autonomia relativamente maiores. Com o esgotamento e a queda do regime napoleônico configurou-se como uma ameaça ao Antigo Regime absolutista do continente e os desdobramentos do Congresso de Viena. A dominação austríaca foi restaurada, acarretando uma perda na relação entre espaço, tempo, lugar e de autonomia, com prerrogativas que desencadearam uma expressiva onda de descontentamentos. A essência do mazzinismo e de organização do Partido da Ação, liderado por Giuseppe Mazzino, objetivava uma insurreição popular que levasse rapidamente à queda do regime dos reis e dos padres, implantando na Itália uma república soberana.
Nunca se preocupou muito com a organização dos complôs que planejava ou estimulava através dos seus escritos. Parecia acreditar no espontaneismo popular, desde que ativado por um pequeno e seleto grupo de homens decididos. De certo modo, ainda que bem mais cauteloso, ele representou a versão italiana do blanquismo que se alçava contra os governos da França, fossem eles quais fossem. Talvez fosse isso, a aposta dele na improvisação e na intuição revolucionária, que o levou a polemizar em diversas ocasiões com Marx e Engels, no exílio em Londres, acreditavam na organização e na demorada preparação antes de lançar-se nas tarefas da insurreição. Viu-se ele como um profeta crente nas virtudes do voluntarismo e no efeito místico da pátria. Todavia o desentendimento maior entre Mazzini e Marx deu-se por ocasião da fundação da I Internacional Socialista (1864-1871), pois o alemão resolveu refazer o Estatuto Primeiro dando-lhe um cunho classista, o que desgostou a posição de Mazzini curiosamente “a favor da integração da classe média no movimento socialista”.
De costumes mais liberais do que os praticados pelos brasileiros, Marietta Baderna original causou outros tipos de espanto e indignação. Fora dos palcos, gostava de praticar o lundum, de origem africana e dançada pelos escravos, e chocou um Brasil que ainda estava longe da conservadora Lei Áurea (1888), de “brancos para brancos”. Mais ainda porque resolveu misturar seu estilo próprio da dança clássica com a popularidade num espetáculo apresentado em um teatro, ambiente reservado à “alta cultura”. Na tradição ocidental a alta cultura tem origens históricas nos ideais estéticos e intelectuais da Grécia Antiga e Roma. Dentro desse ideal clássico, certos autores serviram como referência ideal de estilo e forma, como a literatura realizada no dialeto ático que englobava peças dos dramaturgos Ésquilo, Sófocles, Eurípides e Aristófanes, no século V a. C. além do filósofo ateniense Platão.Mais tarde, especialmente durante o Renascimento, esses valores foram absorvidos pela aristocracia, e como fora evidenciado em obras como o cortesão de Baldassare Castiglione, o reconhecimento clássico tornou-se parte do tipo e estilo ideal aristocrático. Ao longo do tempo, o refinado classicismo da Renascença foi ampliado para abraçar uma gama mais ampla de autores que produziam em diferentes línguas. Dentre esses autores estavam figuras notáveis e diversas como William Shakespeare, Wolfgang Goethe, Cervantes e Victor Hugo.
Marietta Baderna desembarcou no Brasil em 1849 à convite, para dançar no Teatro São Pedro de Alcântara (depois João Caetano), principal teatro carioca. Suas apresentações incorporaram danças afro-brasileiras representadas através do “lundu”, “umbigada” e “cachucha”, consideradas escandalosas pela elite conservadora e racista, mas que faziam sucesso no Rio de Janeiro, lhe garantindo um grupo de fãs ardorosos. As manifestações exaltadas desses fãs garantiram-lhes o nome de “badernistas”, e a palavra baderna tornou-se sinônimo de beleza, embora mais tarde, de confusão ou tumulto. Além de “baderneira”, com a redução sociológica Marietta virou Maria no Brasil, mas mesmo assim foi pioneira no ensino de dança no país. Tentou criar uma escola profissionalizante em 1851 e lecionou em escolas só para garotas do Rio de Janeiro. Marietta estreou no Brasil no dia 29 de setembro de 1849, no balé “Il Ballo delle Fate”. A difusão da dança das negras e o canto de contra hegemonia dos escravos que Marietta Baderna fez-se no processo de subversão bailarina do povo.
Em Portugal, o lundu recebeu polimentos da corte, como o uso dos instrumentos de corda, mas foi proibido por Dom Manuel por ser “contrário aos bons costumes”. Ao vir diretamente de Angola para o Brasil, porém, recuperou aqui o acento jocoso, mordaz e sensual que incomodara a sociedade lisboeta. Nos finais do século XVIII, presente tanto no Brasil como em Portugal, o lundu evolui como uma forma de música urbana, acompanhada de versos, na maior parte das vezes de cunho humorístico e lascivo, tornando-se uma popular dança de salão. Em terras brasileiras, a dança do lundu foi cultivada por negros, mestiços e brancos e, durante o século XIX, o lundu virou lundu-canção, sendo apreciadas em circos, casas de chope e salões do Reinado. Com essa popularidade, tornou-se o primeiro gênero musical a ser gravado no Brasil, com a canção “Isto é bom”, na voz de Baiano em 1902, pela Casa Edison. O lundu saiu de evidência no início do século XX, mas deixou seu legado, principalmente no que tange ao ritmo sincopado, no maxixe que também deve suas origens à polca e à habanera.
O lundu é pari passu uma dança e canto de origem africana introduzido no Brasil provavelmente por escravos de Angola. Originado no batuque africano, o lundu em fins do século XVIII não era ainda uma dança brasileira, mas uma dança africana do Brasil, e começou a ser mencionada em documentos históricos a partir de 1780. O lundu na suas origens tinha sistemática simples, a qual ainda podemos observar na dança de roda, sua familiaridade. Músicos iniciam o ritmo Lundu. As pessoas que querem dançar aproximam-se, já entrando na dança. Um sinal da viola é emitido e a primeira dançarina abre espaço no centro da roda que logo se forma com o grupo. Forma-se a roda e nela fica no centro dançando até convidar alguém para substituí-la. O convite pode ser uma batida de pé diante da pessoa, palmas diante da pessoa, uma umbigada ou um toque de ombros à esquerda e em seguida outro à direita. A dançarina convidada vai para o centro dançar. Dança no centro até escolher quem vai substituí-la. Pode ser uma mulher ou um homem. As substituições continuam por várias vezes. Quando esta no meio da roda, o dançador de corpo relaxado, braços ao longo do corpo, pernas meio fletidas, mantem um sapateado com a planta do pé bate inteira no chão, ao ritmo da música.
Marietta Baderna esteve em turnê pelo Recife, do mestre de Apipucus na capital pernambucana de 1853-54. A versão do lundu fazia parte de um padrão de apresentação teatral frequente no século XIX, de caráter híbrido e forte base musical. Mais do que levar a imaginar a bailarina clássica transitando por cenas lúbricas no palco do Teatro Santa Isabel, os dados da passagem, aliados aos demais interessam como questões teóricas e históricas fundamentais que percorrem a percepção de uma continuada prática de composição de espetáculo por justaposição de peças de diferentes tipos, expostas em desfile ou organicamente integrada, distante de qualquer perspectiva anacrônica sociológica de atualização, que poderia contribuir para a interpretação proto-política em torno das discussões da teatralidade urbana expandida e, sobretudo percebida na cena contemporânea. Dançava nos salões da Corte no Segundo Reinado, mas realizava sua subversão de artista nas ruas, representando novos significados a elementos cotidianos no piso nas ruas das cidades, fora dos entediantes palacetes, provocando aglomerações e causando grande furor.
O
Teatro de Santa Isabel é um teatro localizado na cidade brasileira do Recife,
capital do estado de Pernambuco. É um raro exemplo de genuína arquitetura
neoclássica da primeira metade do século XIX brasileiro. Foi nomeado em homenagem
à Princesa Isabel. Nas suas instalações ocorreram episódios importantes e
curiosos da história do Brasil. O teatro recebeu visitantes ilustres como o
imperador Dom Pedro II, foi palco da campanha abolicionista de Joaquim Nabuco,
e nele Castro Alves conheceu o seu grande amor Eugénia Câmara. Foi o primeiro
teatro do Brasil construído com mão de obra especializada, tendo sido projetado
pelo engenheiro civil francês Louis Léger Vauthier. A ideia de construir um
teatro público no Recife foi do então presidente da província de Pernambuco, Francisco
do Rego Barros, barão, visconde e depois conde da Boa Vista. Em 30 de abril de
1839, ele assinou a Lei número 74, autorizando a construção de um teatro
público para a cidade. O Brasil não dispunha, na época, de profissionais
qualificados, como engenheiros e arquitetos, nem sequer pedreiros ou
carpinteiros especializados. Os engenheiros que existiam tinham formação
militar. Para viabilizar o projeto de governo, Rego Barros promoveu a vinda
de profissionais europeus, engenheiros, matemáticos, técnicos e
operários, entre eles, Louis Léger Vauthier, o engenheiro responsável pela
execução do projeto do novo teatro, que chegou ao Recife em setembro de 1840.
O
primeiro projeto elaborado por Vauthier, cujo orçamento era de 400 contos, foi
rejeitado devido ao seu alto custo. O projeto definitivo, estimado em 240
contos, foi aprovado em fevereiro de 1841, sendo as obras iniciadas no mês de
abril. O local escolhido foi o então chamado Campo do Erário, onde só havia
areia. Atualmente é a Praça da República. Seu público e inspiração nos palcos eram representados por trabalhadores, homens e mulheres negros do povo que bebiam, riam, falavam alto e maculavam a velha sociedade que se espelhava nas decadentes cortes europeias. Em meio ao povo, Marietta passou a ser reconhecida como Maria Baderna e seu público que passou a ser chamado tanto de badernistas quanto de baderneiros. Passagens de sua biografia (cf. Corvisieri, 1998), traduzida em 2001, narram um empresário que deixou de pagar os artistas que se apresentavam sem dar explicações. Ela e suas colegas entraram em greve e não houve apresentação. Sempre que aparecia, era aclamada pelo povo das ruas que gritava seu nome e batia com os pés no chão. Atacada pela crítica ultraconservadora, sem contrato de trabalho para espetáculos, Marietta foi para a Recife fazer apresentações de lundu no teatro Santa Isabel quando desafiou o conservadorismo atroz de seu tempo. Foi uma dançarina das calçadas, da areia das praias, uma artista dos negros, dos mulatos, dos pobres na miscigenação brasileira. Uma bailarina do lundu. Latifundiários e empresários tentaram expulsá-la, mas estudantes de classe média e trabalhadores elegeram-na como símbolo da nascente brasilidade.
Bibliografia geral consultada.
CORVISIERI, Silvério, Badernao: laballerina dei due mondi. Roma: Editore Odradek, 1998; FERREIRA, Jorge, REIS FILHO, Daniel Aarão (organizadores), A Formação das Tradições (1889-1945). Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2007; KATZ, Helena, Um, Dois, Três: A Dança é o Pensamento do Corpo. Belo Horizonte: Fórum Internacional de Dança, 2008; SANCHEZ, Vera Maria Aragão de Souza, A Bailarina - Memória da Construção Discursiva de um Mito na Imprensa do Século XIX. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Memória Social. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2011; COSTA-LIMA NETO, Luiz de França, Música, Teatro e Sociedade nas Comédias de Luiz Carlos Martins Penna (1833-1846): Entre o Lundu, a Ária e a Aleluia. Tese de Doutorado. Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2014; Idem, “Vai de Lundu que Eu Vou de Caxuxa”. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro, Ano 1, n° 100, pp. 62-64; jan. 2014; ALCURE, Adriana Schneider, “Contribuição dos Estudos de Caso e da Pesquisa Indiciária para a História do Espetáculo: O Lundu que Maria Baderna teria Dançado em Recife”. In: Revista Sala Preta. Volume 15, n° 1, 2015; RABETTI, Maria de Lourdes; ALCURE, Adriana Schneider, “Contribuição dos Estudos de Caso e da Pesquisa Indiciária para a História do Espetáculo: O Lundu que Maria Baderna teria Dançado em Recife”. In: Revista Sala Preta, vol. 15, n° 1, 2015; SOARES, Fabiana de Menezes, “Mulheres Substantivas - Olympe de Gouges e Marietta Baderna: O Papel Subversivo das Artes no Contexto dos Direitos Humanos em Movimento”. In: Rev. Estudos Legislativos. Porto Alegre. Ano 10, n° 10, 2016; pp. 15-87; ANDRADE, Sérgio Pereira, Quando o Pensamento Vem Dançando, Quando a Soberania Treme - evento por vir, democracia por vir, razão por vir. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Departamento de Filosofia. Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2016; OLIVEIRA, Juliano de, A Significação da Música no Cinema. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação do Departamento de Música. Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, 2017; PAIVA, Vitor, “A Bailarina Baderna e a História de Resistência por Trás dessa Palavra”. Disponível em: https://www.hypeness.com.br/2018/08; SCHIFINO, Rejane Bonomi, Na Ponta dos Pés: Notas sobre Dança, Cultura e Políticas Públicas em Goiás (1980-2019). Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em História. Faculdade de História. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2019; entre outros.
“Dá para ganhar deles. É Olavo de Carvalho adaptado”. Abraham Weintraub
Os ministros da Educação no Brasil, desde 1979, tiveram um curto período de gestão, alcançando em média somente 2 anos no cargo, devido à instabilidade provocada por crises políticas e econômicas governamentais. Um estudo de ideologias da administração não está preocupado com as origens do “espírito capitalista”, mas sim com as “armas ideológicas” empregadas na luta pela ou contra a industrialização. E quando ideologias são formuladas para defender um conjunto de interesses econômicos, é mais esclarecedor examinar a estratégia de argumentação do que insistir em que o argumento é autointeressado. Afinal, o país atravessou nessas quatro décadas períodos de graves crises econômicas e de instabilidade política, como o impeachment casuístico de dois presidentes da República. O ex-ministro de Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), cuja gestão durou 12 meses de trabalho, destaca que tentou encarar como “prioritária a diminuição do analfabetismo no país”. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), com dados referentes ao ano de 2016, o Brasil ainda tem cerca de 11,8 milhões de analfabetos. A pesquisa realizada pelo estatal IBGE indica dados reais que 7,2% das pessoas maiores de 15 anos não sabem ler, sendo que, comparativamente entre os negros, o percentual chega a 9,9%.
Capital financeiro (cf. Hilferding, 2011) pode ser entendido como o capital representado por títulos, obrigações, certificados e outros papéis com valor negociáveis e rapidamente conversíveis em dinheiro. Uma vez que as necessidades de liquidez variam significativamente entre os agentes econômicos, há uma grande variedade de instrumentos sociais, sob a forma de contratos, que combinam diferentes ativos e são comercializados nos mercados financeiros. Em termos simplificados, a lógica financeira consiste em “fazer dinheiro a partir de dinheiro”, sem necessariamente passar pela esfera da produção de mercadorias. O predomínio crescente dessa lógica econômica, de caráter rentista - isto é, que não tem como finalidade a produção, mas a remuneração do detentor de um ativo - na economia mundial globalizada ocorre desde pelo menos o início dos anos 1980 e 2006. A riqueza financeira mundial incluindo ações e debêntures, cresceu proporcionalmente mais de 14 vezes, enquanto comparativamente o ProdutoInterno Bruto (PIB) mundial cresceu, inversamente, estatisticamente menos de cinco vezes. Trata-se, portanto, de um capital fictício (cf. Marques & Nakatani, 2009) melhor dizendo, um capital não vinculado à esfera da produção e das relações de classe - e que efetivamente acabou por comandar a economia especulativa como um todo.
O Ministério da Educação representa o calcanhar de Aquiles dos programas governamentais desde a redemocratização retomada em 1985. Há uma disputa interna historicamente constituída na área da educação sobre qual projeto de governo deve ser institucionalizado. Os grupos de burocratas em conflito poderiam ser chamados de “pragmáticos” e “ideológicos”. Os primeiros tem como representação a ideologia de segurança nacional desenvolvida entre os militares (cf. Fernandes, 2009), que foram os primeiros a serem envolvidos na campanha de Jair Bolsonaro (PSL). Este grupo inclui ao menos um coronel que tem “afinidades eletivas” com o ministro. Os segundos são extremistas seguidores do escritor fascista Olavo de Carvalho e também ex-alunos do ministro demissionário Ricardo Vélez. Parte da elite militar no Ministério de Educação e Cultura pode ser considerada pragmática e compõe o grupo que ajudou na elaboração das propostas de campanha de Bolsonaro. Dentre as propostas, estava a defesa da educação a distância, a criação de colégios militares em capitais e a modernização da gestão na pasta. Os seguidores de Olavo de Carvalho se incorporaram depois da controversa vitória eleitoral de Bolsonaro, facilitada pela mídia, e tiveram atritos com os que já participavam das discussões sobre educação desde a campanha.
O principal aspecto de entrave para esse grupo ideológico é expulsar literalmente do MEC qualquer resquício do que chamam de “marxismo cultural” ou “pensamentos esquerdistas”. Isso inclui a defesa de projetos como o de caráter positivista “Escola Sem Partido”, a revisão de questões aplicadas ao exame do Enem, ou o ensino disciplinar que aborde questões sociais de interpretação de gênero nas escolas. O grupo ideológico também tem restrições em relação à atuação do Conselho Nacional de Educação (CNE), a regulamentação da Base Nacional Comum Curricular e alguns pontos do Plano Nacional de Educação (PNE). Os seguidores do educador fascista Olavo de Carvalho ocuparam cargos de diretores de programas, assessores ligados diretamente ao ministro, ou à secretaria-executiva. Os indicados ligados aos generais ficaram principalmente à frente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), autarquia vinculada ao Ministério da Educação. Seu objetivo é promover estudos, pesquisas e avaliações periódicas sobre o sistema educacional. O problema é que a insistência em combater o “marxismo cultural” deixa as questões essenciais do MEC mais uma vez em segundo plano como ocorrera antes.
O instituto nacional realiza pesquisas e levantamentos estatísticos fornecendo avaliações em todos os níveis e modalidades de ensino. Suas atividades mais reconhecidas são a realização do concurso/Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); a realização do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade); a organização das avaliações periódicas dos ensinos básico e superior de todo o território brasileiro. Na prática, trata-se da crise de autoridade que já significou uma série de decisões revogadas e demissões no setor. Mais de 10 pesquisadores foram demitidos e postos dentro da pasta e do Inep estão vagos. A disputa também pode afetar programas importantes, como o Exame Nacional do Ensino Médio (cf. Locco, 2005). Apesar de ser aplicado apenas em novembro, o cronograma estipula que as provas estejam prontas para o envio às gráficas no início de maio. A educação básica e a regulamentação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) também são áreas que, apesar de não serem ofertadas diretamente do MEC, podem sofrer com a persistência da crise de valores do ministério. Ocorre porque as redes estaduais e municipais dependem da articulação com o governo federal para “tirar do papel” (teoria) os programas que precisam ser executados nas escolas. O motivo político tem sido uma suposta reforma ministerial.
O inexperiente ministro da Educação assume o cargo envolvido em polêmicas e com um ministério que sofreu demissões desde o início do governo. O MEC já teve ao menos 14 demissões, sendo que dois cargos estratégicos ainda estão vagos: a secretaria da Educação Básica e a presidência do Inep. Além da preocupante falta de experiência em educação e gestão pública, Abraham Weintraub é seguidor do astrólogo Olavo de Carvalho. Demonstra um estranho alinhamento ideológico pari passu às pautas neoliberais e de extrema-direita e diz que irá combater o “marxismo cultural”. Ideologicamente a uma suposta forma de marxismo, alegadamente adaptada a termos culturais pela extraordinária Escola de Frankfurt (cf. Jay, 2008), que teria se infiltrado nas sociedades com o objetivo de destruir suas instituições e valores tradicionais através do estabelecimento de uma “sociedade global, igualitária e multicultural”. A Escola de Frankfurt constituiu-se em um grupo pluralista de intelectuais que na primeira metade do século passado produzira um pensamento reconhecido como Teoria Crítica. Dentre eles temos Theodor Adorno, Max Horkheimer, Herbert Marcuse e o herdeiro Walter Benjamim que desenvolveram numerosas teses sobre estruturas de poder e dominação econômica, política, cultural e psicológica da civilização industrial avançada.
Novo Ministro da Educação é acusado de replicar discurso nazista. É neste sentido que entendemos que o mundo cotidiano a liquidação do particular pelo universal é experimentada como sofrimento e mal-estar da civilização. Tanto os frankfurtianos quanto Freud entenderam este aspecto essencial da realidade norte-americana e europeia. Nesse cenário vão se propagar, erroneamente, cada vez mais ideias que aspiram por um vulgar impulso por transcendência. O desespero pelo que existe propaga as ideias, que em outros tempos foram contidas. Qualquer um, inclusive as pessoas que se ocupam com negócios desse mundo, considerará um desvario a ideia de que esse mundo finito de tormento infinito seja abarcado por um plano universal divino. Theodor Adorno refere-se a essa experiência da “via negativa” da “metafísica em queda” como a busca da “imediatez subjetiva intacta” ou “subjetivismo do ato puro”, experiência que nos daria o “interior dos objetos”, a redenção do materialismo por meio da metafísica que, finalmente, revelaria a aparente verdade do mundo. Que ele tenha, por outro lado, querido intensivamente ter contradito tal veredito, testemunham os 370 fragmentos que compõem o livro inacabado, nos quais Adorno trabalhou uma parcela significativa de sua vida intelectual, de 1938 até o final de sua vida, em 1969. Seu principal objetivo diria respeito à própria natureza e alcance da filosofia da música enquanto disciplina organizada do ponto de vista do conhecimento científico.
De acordo com essa suposta teoria conspiratória, a Escola de Frankfurt seria a origem de um movimento contemporâneo da esquerda mundial para destruir a cultura ocidental. Essa teoria da conspiração tem recebido apoio de um “think tank” norte-americano chamado “Free Congress Foundation”, e é divulgada majoritariamente por ultraconservadores como Pat Buchanan e William S. Lind. No Brasil seu principal proponente é o fascista Olavo de Carvalho, além de Marcel Van Hattem, o Instituto Liberal, Rodrigo Constantino do Instituto Millenium, os proponentes da chamada “Escola sem Partido”, o padre católico Paulo Ricardo. Jair Bolsonaro e vários membros do seu governo, dentre eles o demissionário ministro da educação, Ricardo Vélez Rodríguez e o ministro das relações exteriores, Ernesto Araújo, também acreditam na existência de tal conspiração. A expressão “marxismo cultural” é uma ideologia que deriva de uma teoria conspiratória similar que foi muito popular durante a ascensão do nazismo na Alemanha da primeira metade do século XX, onde recebia o nome de “bolchevismo cultural”. Os conspiracionistas afirmam que o multiculturalismo e a cultura politicamente correta seriam a realização dos planos da Escola de Frankfurt!
É neste sentido inverso que o ministro conspira contra a educação - “Em vez de as universidades do Nordeste ficar aí fazendo sociologia, fazendo filosofia no agreste, [devem] fazer agronomia, em parceria com Israel”, disse ele no ano passado, em uma transmissão ao vivo citada no UOL. Para Antonio Gonçalves, presidente do ANDES-SN, o novo ministro é uma “solução caseira” a Ricardo Vélez. Para Gonçalves, o ex-ministro saiu do cargo devido à sua incapacidade política e de gestão. - “O novo ministro não tem qualquer experiência na área da Educação e de Gestão Pública. No entanto, é uma figura híbrida. Tem alinhamento com as políticas econômicas neoliberais e também com a ideologia de extrema-direita desse governo, o que é extremamente preocupante. E tem demonstrado desconhecer as reais necessidades educacionais do país”, avaliou o presidente do Sindicato Nacional. Em seu discurso o ministro afirmou que é necessário “melhorar o serviço” prestado pelo ministério. Ressaltou que quer “acalmar os ânimos” e entregar os resultados esperados para melhorar a educação, sem aumento de gastos. O que se subentende controle de investimentos estatais na educação.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) publicou mais uma edição do “Panorama da Educação” (2017), onde apresenta os principais dados do Brasil no relatório “Education at a Glance” (EaG), divulgado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em Paris. Com dados do Brasil e de outros 40 países, o EaG oferece, anualmente, uma visão geral desses sistemas educacionais com o objetivo de possibilitar a comparação internacional. No entanto, apesar da melhora no nível de investimentos em educação no país, o Brasil continua entre os últimos do ranking dos testes de avaliação do PISA e com indicadores de desempenho ruins nas avaliações nacionais como no Saeb. Ocorre que o aumento no investimento em educação nos últimos anos, além de não ter revertido na melhoria do desempenho dos alunos, foi destinado, em grande parte, para o ensino superior em detrimento do ensino básico durante a gestão anterior.A gestão do Ministério de Educação e Cultura (MEC), desde que assumiu o cargo, buscou o equilíbrio entre os investimentos e reverteu a tendência de queda na educação de 2016 para 2017 houve um aumento do investimento na educação básica, atingindo R$ 56,3 bilhões e no ensino superior, garantiu um aumento para R$ 79,7 bilhões, em 2017.
Aos 47 anos de idade, Abraham Weintraub é professor universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 2014. Sua produção acadêmica não traz menção à educação, mas sim à economia, principalmente ao nebuloso tema da Previdência. Especializados em Previdência, os irmãos Weintraub têm tratado, na transição, da proposta de reforma da área, mas também de outros temas, como a independência do Banco Central. Em 2015, o ministro fundou o Centro de Estudos em Seguridade (CES), que se apresenta como uma associação civil sem fins lucrativos fundados por professores dos cursos de Atuária e Contabilidade da Universidade Federal do Estado de São Paulo. O CES, conforme matéria publicada no jornal Estadão no final de 2018 poderia ser o alvo que desencadeou uma sindicância em curso contra os irmãos Weintraub. Isto porque o Centro de Estudos de Seguridade foi a única instituição a apoiar a realização da “Cúpula Conservadora das Américas”, evento idealizado pelo filho do presidente da República. Abraham e Arthur falaram sobre economia no evento. Dois de seus colegas consultados pela reportagem do jornal disseram que ele teve uma passagem discreta pela universidade porque parecia se dedicar mais aos seus projetos do que à academia.
Em 2014, apoiou a campanha presidencial de Marina Silva (REDE). Antes de abraçar a carreira acadêmica, Abraham atuou no Banco Votorantim e na Quest Corretora. A aproximação dos irmãos Weintraub com presidente se iniciou há quase dois anos, por intermédio de Onyx Lorenzoni (DEM), o ministro da Casa Civil. Ao mesmo tempo ganhou a confiança do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o filho mais engajado com milícias do presidente como é de domínio público. Em princípio, Abraham atuaria no ministério da Economia como um dos responsáveis por elaborar a reforma da Previdência. Mas o ministro Paulo Guedes preferiu nomear alguém com experiência legislativa para a função de secretário especial de Previdência e Trabalho. Era necessário convencer parlamentares sobre a necessidade de se aprovar a reforma. Assim, a vaga ficou com o ex-deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN). Abraham acabou, então, na secretaria executiva da Casa Civil. Enquanto isso, o irmão dele, Arthur, tornou-se chefe da assessoria especial da Presidência da República.
Abraham Weintraub afirmou ainda que não tem filiação partidária, e sim convicções políticas. - “O que trago de diferente dos ministros anteriores: não sou filiado a partido político, sou um técnico, professor universitário, de uma universidade de muito renome. Tenho capacidade de gestão para entregar o resultado”. Os judeus, disse uma vez Léon Poliakov, são franceses que, ao invés de não irem mais à igreja, não vão mais à sinagoga. Na tradução humorística de Hagadah, essa piada designava crenças no passado que deixaram de organizar um conjunto de práticas. As convicções políticas parecem, hoje, seguir o mesmo caminho. Alguém seria socialista por que foi, sem ir às manifestações, sem reunião, sem palavra e sem contribuição financeira, em suma, sem pagar. Mas reverencial que identificatória, a pertença só se marcaria por aquilo que se chama uma voz. Este resto de palavra, como o voto de quatro em quatro anos. Uma técnica simples manteria o “teatro de operações” desse crédito.
Vale lembrar que a capacidade de crer parece estar em recessão em todo o campo político. A tática é a arte do fraco. O poder se acha amarrado à sua visibilidade. Mas a vontade de “fazer crer”, de que vive a instituição, fornecia nos dois casos um fiador a uma busca de amor e/ou de identidade. Importa então interrogar-se sobre os avatares do crer em nossas sociedades e sobre as práticas originadas a partir desses deslocamentos. Durante séculos, supunha-se que fossem indefinidas as reservas de crença. Aos poucos a crença se poluiu, como o ar e a água. Percebe-se ao mesmo tempo não se saber o que ela é. Tantas polêmicas sobre os conteúdos ideológicos do voto e os enquadramentos institucionais para lhe fornecer não foram acompanhadas de uma elucidação acerca da natureza do ato de crer. Os poderes antigos geriam habilmente a autoridade. São os sistemas administrativos, sem autoridade, que dispõem de mais força em seus “aparelhos” e menos de autoridade legislativa.
Nomeado para preencher a vaga aberta no cargo de ministro da Educação, o economista Abraham Weintraub, natural da cidade de São Paulo, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), mestre em administração na área de finanças pela Faculdade Getúlio Vargas (FGV) e graduado em Ciências Econômicas pela Universidade de São Paulo (1994). É um executivo do mercado financeiro, com mais de vinte anos de experiência, atuado como economista-chefe e diretor do Banco Votorantim, e como sócio na Quest Investimentos. Weintraub foi integrante da equipe de transição do governo do presidente Bolsonaro, e ocupou o cargo de secretário executivo da Casa Civil, sob o comando de Onyx Lorenzoni, formado em medicina veterinária pela Universidade Federal de Santa Maria, presidiu a Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados entre 2008 e 2009.Em 2016, votou a favor do processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT). Já durante o Governo Michel Temer, votou a favor da PEC do “Teto dos Gastos Públicos”. Em abril de 2017 foi favorável à Reforma Trabalhista. Em agosto de 2017 votou a favor do processo em que se pedia abertura de investigação do então presidente da Republica Michel Miguel Elias Temer Lulia (PSDB). A sua atuação em plenário o caracteriza como um dos mais ferrenhos opositores do Partido dos Trabalhadores (PT), tendo buscado associar sua imagem ao combate à corrupção no Brasil, “antes de admitir publicamente o recebimento de caixa 2 da empresa JBS para campanha eleitoral em 2017”.
Segundo os dados mais recentes do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), nenhum Estado brasileiro atingiu a meta prevista para o ensino médio em 2017, e alguns Estados inclusive registraram piora no desempenho dos alunos. É, também, uma etapa com alto índice de evasão: cerca de 3 milhões de jovens abandonam o ensino médio por ano, em média. Ele sustenta algumas teses contraditórias para um financista. Em primeiro lugar, sobre sua nomeação para a pasta da Educação de que o Brasil não precisa aumentar seus gastos em educação. Além disso, que o governo deve “usar a Constituição brasileira para sair do lamaçal”, que a maioridade penal deve ser reduzida para 16 anos, “principalmente para crimes hediondos”, e que o conservador “tem que ser mais engraçado que os comunistas” e usar “humor e inteligência” para “ganhar a juventude”.Essas são algumas das ideias que ele expressou em dois vídeos publicados no canal oficial do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Na ocasião, Abraham Weintraub e Luís Philippe Bragança conversaram, durante quase duas horas, sobre o programa de campanha da chapa de Jair Messias Bolsonaro. Abraham é um economista judeu e professor brasileiro, especialista em direito previdenciário e em finanças, além de executivo do mercado financeiro. No dia 1º de janeiro de 2019, foi nomeado secretário-executivo da Casa Civil, e em 8 de abril de 2019, foi nomeado Ministro da Educação do Brasil.
Na sua concepção moderna, o conceito de “finanças” nasceu nos anos 1960 e sua abordagem característica é normativa, isto é, um decisor, seja um investidor individual ou gerente empresarial, busca maximizar uma função-objetivo, seja em utilidade ou em retorno esperado, ou agregar valor para o acionista, para um dado preço de título obtido no mercado. No nível microeconômico, as finanças representam o estudo dos gastos financeiros, da gestão de estoque e da captação de fundos por fundações e instituições. O termo finanças pode, assim, incorporar o estudo do planejamento do dinheiro e outros ativos na própria área; o gerenciamento e controle desses ativos ou recursos; e a análise e gerenciamento de riscos de projetos. Economia financeira é a área de conhecimento do estudo econômico que avalia a relação social entre as variáveis financeiras, como o preço, taxas de juro, ações sobre as componentes econômicas, como bens e serviços. Em suma, explora como investidores racionais consideram o risco e o retorno numa estratégia de investimento. Os conceitos de racionalidade e eficiência de mercado depende de uma definição da informação e valor conjugados de teorias de comportamento relativas à avaliação das escolhas possíveis de mercado. Um dia após a posse, Abraham Weintraub, anunciou a nomeação de quatro secretários para a pasta, além de mais uma mudança na Secretaria-Executiva do Ministério de Educação e Cultura.
Em um comunicado divulgado pela Assessoria de Imprensa, o ministério afirmou que “o presidente da República, Jair Bolsonaro, deu Carta Branca para Weintraub escolher todo o seu primeiro escalão”. Na terça-feira, nas cerimônias de posse e transmissão de cargo, o novo ministro disse que “não é radical e que é capaz de entregar resultados”. Com a mudança, apenas duas secretarias do MEC foram mantidas desde o início do governo: a Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação, e a Secretaria de Alfabetização, que foi criada pelo novo governo e é ocupada por Carlos Nadalim, incumbido de apresentar uma nova política nacional para a alfabetização. Antônio Paulo Vogel de Medeiros é o quinto nome indicado publicamente para o cargo de secretário-executivo do MEC, considerado o “número 2” no cargo. Em janeiro, o primeiro a efetivamente assumir o cargo foi Luiz Antônio Tozi e, até agora, foi o que se manteve na função pública por mais tempo, pouco mais de dois meses. Ele foi exonerado em 12 de março após uma disputa interna entre grupos ligados aos militares e os seguidores do escritor Olavo de Carvalho. Na época da exoneração, o nome de Rubens Barreto da Silva, foi lembrado que na véspera havia sido nomeado secretário-executivo adjunto.
Enfim, ele é politicamente ligado a Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil. Na pasta, ocupava o segundo posto. Participou da equipe de “transição”, com pequenas contribuições para a área da Previdência Social. Em uma entrevista, ele explicou por que ele e o irmão, Arthur Weintraub, decidiram apoiar Bolsonaro: - “Diante de ameaças, é necessário lutar pelo país em que se vive. Os venezuelanos descobriram isso muito tarde. Perderam o controle de sua pátria e hoje são colônia dos ditadores que controlam Cuba. São escravos”. Ele é ultradireitista, mas não se reconhece assim. - “Esquerda ou direita, acho que é uma rotulação pobre. Somos humanistas, democratas, liberais, lemos a Bíblia (Velho e Novo Testamento) e a temos como referência”. Abraham Weintraub já tornou público que idolatra e segue Olavo de Carvalho, que era também guru de Ricardo Vélez Rodríguez. Abraham Weintraub defende adaptar a “teoria” do jornalista e astrólogo Olavo de Carvalho para vencer a esquerda. Na “Cúpula Conservadora das Américas”, ele foi um dos membros mais engajados. Em entrevista a Luiz Philippe Bragança, ainda antes da posse de Jair Messias Bolsonaro, ele criticou seus colegas na universidade, com a afirmação de que tinha sido “ameaçado por apoiar o candidato de ultradireita”, mas o que se deve compreender no mundo contemporâneo é que ela envolve frequentemente expectativas em torno da tradição, seja ela real ou meramente imaginada.
Bibliografia geral consultada.
LUHMANN, Niklas. “L’Opinione Pubblica”. In: Stato di Diritto e Sistema Sociale. Napoli: Guida Editori, 1978; DUSSEL, Enrique, Introducción a la Filosofia de la Liberación.
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São Paulo: Editora Brasiliense, 2009; SILVA, Breno Carlos da, Gustavo Capanema: A Construção das Relações entre a Intelligentsia Nacional e o Estado no Brasil (1934-1945). Dissertação de Mestrado. Departamento de Antropologia, Política e Filosofia. Faculdade de Ciência e Letras. Araraquara: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2010; HILFERDING, Rudolf, Il Capitale Finanziario. V. Sermonti (Tradutor). Milano: Editora Mimesis, 2011; GRÜN, Roberto, “Escândalos, Tsunamis e Marolas: Apontamentos e Desapontamentos sobre um Traço Recorrente na Atualidade”. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais, 26 (77), Outubro de 2011; YANAGUITA, Adriana Inácio, Financiamento da Educação no Brasil (1990-2010): Impactos no Padrão de Gestão do Ensino Fundamental. Tese de Doutorado em Educação. Faculdade de Filosofia e Ciência. Marília: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, 2013; BELTRÃO, Demetrius Amaral, Direito Econômico, Planejamento e Orçamento Público. Tese de Doutorado em Direito Político e Econômico. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2015; MORENO, Ana Carolina, “Governo Interveio em 6 de 12 Nomeações de Reitores de Universidades Federais até Agosto”. In: https://g1.globo.com/educacao/2019/08/31/; TAVARES, Pedro Henrique de Sousa, Financeirização no Ensino Superior: A Educação como Fronteira de Valorização e Acumulação de Capital - O Caso da Kroton Educacional. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019; OLIVEIRA, Marcos Brabosa de, “Universidade: Por trás do Projeto Weintraub”. In: outraspalavras/26/07/2019; entre outros.
“Estudantes presos em Ibiúna poderão sair até o Natal”. In: Folha de S. Paulo, 06 de outubro de 1968, p. 11.
Ibiúna representa um município brasileiro do estado de São Paulo. Situa-se na Região
Metropolitana de Sorocaba, na extensa Mesorregião Macro Metropolitana Paulista
e na Microrregião de Piedade. Localiza-se a uma latitude 23º39`23” Sul e a uma
longitude 47º13`21” Oeste, estando a uma altitude de 996 metros. Sua população
foi estimada em 80 062 habitantes, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia
Estatística. O município é formado pela sede e pelos distritos de Carmo Messias
e Paruru. Ibiúna possui a segunda maior população rural do estado de São Paulo,
menor apenas que a capital do estado. Por estar localizada geograficamente entre
as grandes bacias hidrográficas do Tietê e Paranapanema, a região que abarca o
atual município de Ibiúna provavelmente já reunia ótimas condições para o
estabelecimento de grupos humanos há milênios atrás. De acordo com algumas
pesquisas arqueológicas, os primeiros indícios da presença de grupos ameríndios
no estado de São Paulo datam de fins do Pleistoceno, sendo que a área onde hoje
está a capital e região metropolitana contam com datações radiocarbônicas de
cerca de 6.000 anos atrás. Estes primeiros grupos humanos produziam tecnologicamente diversas
ferramentas feitas em pedra, madeira e ossos, utilizando assim diversos tipos
de matéria-prima para confecção desses instrumentos de subsistência. Sua alimentação era
baseada na caça de animais e coleta de frutos e raízes, lhes sendo desconhecida
a agricultura nesse primeiro momento.
As
primeiras populações indígenas agricultoras só teriam alcançado a região de
Ibiúna e outras próximas dos grandes rios paulistas por volta do início da Era
Comum. Ancestrais dos atuais grupos Tupi-Guarani e Macro-Jê, essas populações
cultivavam mandioca, feijão e milho, assim como diversas várias espécies não
alimentícias, como cabaças, tabaco, algodão e urucu. Também produziam cerâmica,
tecnologia provavelmente desconhecida pelos primeiros grupos que haviam se
estabelecido nas margens de rios como o Una e o Sorocamirim e arredores. Séculos
depois, os primeiros colonizadores europeus se depararam com diversos grupos
Guaianás, também reconhecidos como Guaianazes nas cabeceiras do rio Sorocaba e
boa parte do Planalto Paulista. Falante de um idioma relacionado ao tronco
Macro-Jê, o contato entre este povo e os portugueses se deu já nas primeiras
décadas de colonização da América, geralmente mencionados nas documentações dos
séculos XVI e XVII como “índios bravos”. Por resistirem ao avanço português
sobre suas terras, diversos conflitos ocorreram, sendo muitas vezes
escravizados, mortos ou eventualmente expulsos para o interior do continente. O
nome Guaianá não corresponde à identidade própria
desses povos, já que esse termo era normalmente utilizado para designar
diversas gentes não-tupis. A presença de grupos Tupi na região das
nascentes do rio Sorocaba também parece ser confirmada pelos registros
arqueológicos, inclusive durante o período colonial.
Os
Acordos MEC-USAID foram implementados no Brasil com a lei 5.540/68. Foram
negociados secretamente e só se tornaram públicos em novembro de 1966 após
intensa pressão política e popular. Foram estabelecidos entre o Ministério da
Educação (MEC) do Brasil e a Agência dos Estados Unidos para o
Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês) para reformar o
ensino brasileiro de acordo com padrões impostos pelos Estados Unidos da América.
A USAID surgiu em 1961, com a assinatura do Decreto de Assistência Externa
do Presidente John F. Kennedy, unificando diversos instrumentos assistenciais
dos Estados Unidos. Diretamente ou através de agências subsidiárias, a USAID
atua como um reforço à política externa norte-americana, cooperando nas áreas
de economia, agricultura, saúde, política e assistência humanitária. A agência
tem sido objeto de críticas e acusada de trabalhar em colaboração com a CIA por
conta de suas atividades de inteligência na desestabilização de governos não
alinhados com as políticas dos Estados Unidos da América (USA). Apesar da ampla discussão ocorrida anteriormente sobre a
educação, iniciada ainda em 1961, essas reformas foram implantadas pelos
militares que tomaram o poder após o Golpe Militar de 1° de abril de1964. A reforma mais
visível ocorreu na renomeação dos cursos.
A
tradição de 1º de abril remonta à instituição do Calendário
Gregoriano, que substituiu o Calendário Juliano por determinação do
Concílio de Trento, o conselho ecumênico da Igreja Católica. O Calendário
Gregoriano divide o ano em quatro estações distribuídas ao longo de 12 meses,
ou 365 dias, de acordo com o movimento da Terra em relação ao Sol e estabelece
o primeiro dia do ano em 1º de janeiro. Com a instituição do novo calendário
pelo papa Gregório XIII, em 1582, historiadores contam que parte da população
francesa se revoltou contra a medida e se recusou a adotar o 1º de janeiro como
início do ano. Zombados pelo resto considerado da população, os resistentes às
mudanças sociais e política eram convidados para festas e comemorações
inexistentes no dia 1º de abril. Nascia assim a tradição de zombaria e
de pregação de peças. Há também relatos históricos que relacionam a data ao
festival de Hilária - uma festa romana no período anterior ao nascimento de
Cristo - que celebrava o equinócio de março em honra à deusa Cibele, a “Mãe dos
Deuses", uma divindade que reunia aspectos das deusas gregas Gaia, Reia e
Deméter. No Brasil, a tradição foi introduzida em 1828, com o noticiário
impresso mineiro “A Mentira”, que trazia em sua edição a morte do colonizador
português Dom Pedro I na capa e foi em 1º de abril.
Mas
não são apenas as pessoas que contam mentiras no 1º de abril. Empresas
entenderam o potencial de marketing e a oportunidade de engajamento das
“pegadinhas” para aumentar a visibilidade no mercado e passaram, desde o século
passado, a participar da celebração. Entre os mais conhecidos exemplos está a
emissora pública britânica BBC, que tradicionalmente prega peças no público
desde a década de 1930. Em uma das memoráveis brincadeiras, a BBC afirmou que o
governo do Reino Unido trocaria o mecanismo de ponteiros do Big Ben - o relógio
mais famoso do mundo e símbolo nacional - por um mostrador digital. A mentira,
veiculada em 1980, ainda prometeu que a primeira pessoa a ligar para a rádio
ganharia os antigos ponteiros do grande relógio como lembrança. A ação gerou
milhares de ligações e cartas e acabou causando problemas à emissora, que teve
que explicar a manobra durante a programação nas semanas seguintes. Nos Estados
Unidos, em 1992, a National Public Radio (NPR), também uma emissora
pública de comunicação, veiculou entrevista do comediante Rich Little em que
ele se passava pelo ex-presidente Richard Nixon. No quadro, chamado “Conversa
da Nação”, o personagem afirmava categoricamente que se candidataria novamente
à Presidência naquele ano. O problema é que Nixon, figura política controversa,
havia renunciado durante processo de impeachment em 1974 pelo
envolvimento no escândalo de Watergate, o que no âmbito da comunicação
social gerou revolta nos ouvintes.
A
emissora ficou com todas as linhas telefônicas congestionadas até que, em
determinado momento, foi anunciada a pegadinha do Dia dos Tolos. A Amazon, a
maior loja online do mundo, também celebra o Dia da Mentira com
brincadeiras que, muitas vezes, confundem os usuários. Em 2015, a Amazon
reverteu sua página principal para a versão de 1999 - época em que a internet
ainda era rudimentar. Até descobrirem a brincadeira, os usuários deveriam
passar pela experiência de “túnel do tempo” na navegação do site. Apesar da permissão lúdica no dia 1º de abril,
a mentira pode se tornar hábito e degradar relações sociais. Em tempos de ampla
difusão de conteúdos na internet, uma mentira pode ser considerada até mesmo fake
News - notícias falsas ou com dados manipulados deliberadamente para
enganar ou enviesar as conclusões do leitor - e ser punida legalmente. Para o
psiquiatra Ilton Castro, existem diferentes níveis de mentira: há aquelas que
suavizam realidades e as que são usadas para usufruir benefícios em detrimento
de outras pessoas. Há também a condição psicológica conhecida como mitomania,
definida pelo uso compulsivo de mentiras. - “No jogo social, é normal mentir ou
omitir alguma coisa, mas existem casos considerados sérios. A mentira aparece
como um hábito. O mitomaníaco mente e acredita no que diz. A fantasia vira
realidade e ganha enredos intermináveis. A mentira cresce”. O uso exacerbado de
mentiras pode indicar transtorno de personalidade e fragilidades psicológicas
que necessitam ser trabalhadas.
O
antigo curso primário (5 anos) e ginasial (4 anos) foram fundidos e renomeados
como primeiro grau, com oito anos de duração. o antigo curso científico foi
fundido com o clássico e passou a ser denominado segundo grau, com três anos de
duração. O curso universitário passou a ser denominado terceiro grau. Essa
reforma eliminou um ano de estudos, fazendo com que o Brasil tivesse apenas 11
níveis até chegar ao fim do segundo grau enquanto países europeus e o Canadá
possuem um mínimo de 12 níveis. Documentos obtidos pelo WikiLeaks mostram que
nas ações da USAID na Venezuela, entre os anos de 2004 e 2006, houve intenções
de desestabilizar o governo do país. A USAID fez uma doação de 15 milhões de
dólares a várias organizações civis, com o intuito de impulsionar a estratégia
do ex-embaixador de Washington na Venezuela, William Brownfield, baseada em
provocar uma fratura interna no chavismo, e em organizar os setores
descontentes com as reformas realizadas pelo Partido Socialista Unido da
Venezuela (PSUV). Em 3 de abril de 2014, a imprensa revelou que a partir de
2009, a USAID organizou e participou ativamente em uma operação secreta
americana para derrubar o governo de Cuba, com a criação de uma rede de comunicação,
similar ao twitter visando provocar uma “Primavera Cubana”.
O
programa foi financiado pelo governo dos Estados Unidos da América e criou uma
rede supostamente independente, mas na verdade falsa, com o objetivo de criar “uma
comoção e incitar uma revolta popular levando a queda do governo cubano”. O
programa, chamado de ZunZuneo, armazena dados estritamente pessoais dos
assinantes cubanos e informações demográficas, com seu gênero, idade,
receptividade e tendências políticas. O nome ZunZuneo se relacionada ao nome do
pássaro colibri em Cuba - o zunzún. O projeto foi iniciado em 2009,
depois da prisão do americano Alan Gross, que executava missão clandestina da
USAID em Cuba e foi condenado à prisão quando foi descoberto. Os usuários não
sabiam que o projeto foi criado por uma agência dos EUA ligada ao Departamento
de Estado, nem que os americanos coletaram informações pessoais sobre eles para
que esses dados fossem usados para fins políticos. Os organizadores do ZunZuneo
criaram o que parecia ser um negócio legítimo. Fizeram um portal de internet, e
uma campanha, de maneira que os usuários pudessem se inscrever e enviar suas
próprias mensagens de texto a grupos de sua escolha. Seus
contratantes omitiram que o projeto tinha ligações diretas com
Washington D. C.
Para
tal, criaram uma rede de empresas de fachada com sede em Espanha e contas
bancárias nas Ilhas Cayman, na tentativa de esconder as transações financeiras
e recrutaram executivos de empresas privadas para fazer parte da fachada do
projeto, de forma que não ficasse claro que o projeto foi financiado com o
dinheiro dos contribuintes norte-americanos e estava sendo executado pela
USAID. – “Não será mencionada a participação do governo dos Estados Unidos”,
disse um relatório da empresa Mobile Acord, uma das empresas que colaborou com
o programa como contratadas. - “É absolutamente crucial para o êxito a longo
prazo do serviço e para garantir o cumprimento da missão”. A revelação do
programa veio confirmar afirmações anteriores de Raúl Castro que em janeiro de
2014, havia afirmado que havia tentativas contra de introduzir o capitalismo
neocolonial em Cuba. As atividades em Cuba se assemelham as atividades
reveladas em 2013 pelo jornal Der Spiegel, com base em documentos
revelados por Edward Snowden, um analista de sistemas, ex-administrador de
sistemas da CIA e ex-contratado da National Security Agency (NSA) que tornou
públicos detalhes de programas do sistema de vigilância
global da NSA americana, referentes as Campanhas EFFECTS (Operações
confidenciais), do GCHQ britânico.
O sítio Muduru, localizado no bairro dos Alves, na cidade de Ibiúna, na Serra de São Sebastião a 70 km da capital de São Paulo, tornou-se destaque nas páginas dos jornais publicados em outubro de 1968, dentro e fora do Brasil, por ter sido escolhido para abrigar em torno de 700 estudantes no 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE). É uma organização estudantil representante de alunos do Ensino Superior do país, tendo sede em São Paulo, além das regionais no Rio de Janeiro e Goiás. Fundada em 11 de agosto de 1937, a instituição desempenha um papel singular na política desde o início do século XX, especialmente aqueles ligados à esquerda política. Essa propriedade, que pertencia a Domingos Simões, também chegou a ser utilizada para abrigo de militantes e disponibilizada ao congresso, após uma reunião com Therezinha Zerbini fundadora do Movimento Feminino pela Anistia e Frei Tito de Alencar, frade dominicano e estudante de Filosofia na Universidade de São Paulo (USP). A luta estudantil contra os governos autoritários, com o golpe de Estado de 1° de abril de 1964 contra o governo popular democrático de João Goulart (1919-1976), teve início nos primeiros momentos de ação política do golpe civil-militar.
As atividades ideológicas e sociais da “elite orgânica”, na expressão de Dreifuss (1981: 231 e ss.), consistiam em doutrinação geral e doutrinação específica, ambas coordenadas com atividades político-ideológicas mais amplas no Congresso, sindicatos, movimento estudantil e clero. A doutrinação geral visava a apresentar as abordagens da elite aos responsáveis por tomadas de decisão políticas e ao público em geral, assim como causar um impacto ideológico em públicos selecionados e no aparelho do Estado. A doutrinação geral através da mídia era realizada pela ação encoberta e ostensiva, de forma defensiva e defensiva-ofensiva, onde conflitos e tensões subsistem de forma necessária. Nessas situações, não há alternativas senão na confiança recíproca. Constituía-se basicamente numa medida neutralizadora. Visava infundir ou fortalecer atitudes e pontos de vista tradicionais na esfera de ação política de direita e estimular percepções negativas do bloco popular nacional-reformista. No ordenamento jurídico brasileiro, a abordagem pessoal por qualquer agente de segurança só é permitida quando há razões, concretas e objetivas, para a suspeita de que o indivíduo esteja portando bem ilícito ou praticando algum desvio ou delito.
Ela atacava o comunismo, o socialismo, a oligarquia rural e a falsa ideia de “corrupção” do populismo. No aspecto positivo, argumentava que a prosperidade do país e a melhoria dos padrões de vida do povo se deviam à iniciativa privada e não se deviam, certamente, a métodos socialistas ou à inversão do Estado na economia. Sua abordagem negativa podia ser vista nasua utilização de uma mesclagem de técnicas sofisticadas e uma grosseira propaganda anticomunista, constituindo uma pressão ideológica, que explorava representativamente o chamado “encurralamento pelo pânico organizado”. O objetivo geral da doutrinação específica era modelar as várias frações das classes dominantes e diferentes grupos sociais das classes médias em um momento de opinião com objetivos em curto prazo amplamente compartilhados, qual seja, a destruição de João Goulart da presidência e a contenção da mobilização popular, às demandas históricas das esquerdas e, ipso facto pregadas por ele mesmo: as reformas de base. A elite institucionalmente publicava, diretamente ou através das editoras, uma série de trabalhos, incluindo livros, panfletos, periódicos, jornais, revistas e folhetos. Saturava o rádio e a televisão com mensagens ideológicas.
Frei Tito de Alencar Lima nasceu em Fortaleza, em 14 de setembro de 1945 e morreu enforcado em Éveux, em 10 de agosto de 1974. Foi um frade católico alvo de perseguição da ditadura militar após ser fichado pela polícia devido a sua participação no Congresso clandestino da União Nacional dos Estudantes (UNE), no ano de 1968. Nasceu em Fortaleza e estudou no Liceu do Ceará. Sua militância se iniciou na União Cearense de Estudantes Secundaristas e, em 1963, mudou-se para Recife, após ser escolhido como dirigente regional da região nordeste da Juventude Estudantil Católica (JEC). Em 1966, ingressou no noviciado dos dominicanos em Belo Horizonte, e fez a profissão dos votos no ano seguinte. Em 1968 mudou-se para São Paulo para estudar filosofia na Universidade de São Paulo (USP) e no mesmo ano, no dia 12 de outubro, foi preso por participar do 30º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna após ser fichado pela polícia e se tornar alvo de perseguição da ditadura militar. Foi preso pela segunda vez dia 4 de novembro de 1968 junto com outros companheiros da ordem dos dominicanos pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS).
Nessa ocasião foi acusado junto aos outros presos, de manter contatos com a Ação Libertadora Nacional (ALN) e seu dirigente, Carlos Marighella, um dos principais organizadores da luta armada contra a ditadura. Frei Tito foi submetido à palmatória e choques elétricos. Posteriormente foi transferido para o Presídio Tiradentes, onde permaneceu até 17 de fevereiro de 1970 e, em seguida, nas mãos da Justiça Militar, foi levado para a sede da Operação Bandeirantes (Oban). Na prisão, Frei Tito escreveu sobre a tortura com a qual conviveu, quando este documento se transformou em um símbolo da luta pelos direitos humanos. Em dezembro de 1970, incluído na lista de presos políticos trocados pelo embaixador suíço Giovanni Bucher, sequestrado pela Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), um grupo de luta armada brasileira de extrema-esquerda que lutou contra a ditadura militar brasileira, visando à instauração de um governo de cunho socialista no país. Frei Tito foi banido do Brasil pelo governo militar de Emílio Garrastazu Médici seguindo para o Chile. Sob a ameaça de novamente ser preso, fugiu para a Itália. De Roma, foi para Paris, onde recebeu apoio afetivo dos dominicanos. Traumatizado pela tortura, Frei Tito submeteu-se a um tratamento psiquiátrico e, no dia 10 de agosto de 1974, cometeu suicídio.
No dia 1º de abril de 1964 a sede da União Nacional dos Estudantes (UNE) foi invadida e incendiada por militares comandados pelo presidente cearense marechal Humberto Castelo Branco. A Lei Suplicy de Lacerda, decretada em novembro de 1964, colocou a UNE na clandestinidade. O novo regime político organizado em abril de 1964 tinha no movimento estudantil um forte elemento de antagonismo, razão por que o governo procurou substituir as entidades estudantis existentes, regidas pelo Decreto Café Filho, de 1955, por outras, controladas direta ou indiretamente pelo Ministério da Educação. O instrumento criado pelo Estado de Exceção dessa tentativa de controle foi baseado na Lei nº 4.464, de 9 de novembro de 1964, reconhecida como Lei Suplicy, devido ao nome do ministro da Educação que a patrocinou, Flávio Suplicy de Lacerda. Os acontecimentos posteriores a 1968, quando o regime assumiu sua feição ditatorial por meio do AI-5, fizeram com que se desse pouca importância à natureza da violência surgida a partir de 1964 e ao modo como ela foi enfrentada pelo governo Castello Branco. Ali estava a gênese da tortura e, frequentemente coberta por uma definição imprecisa do conceito nas legislações de organizações militares, sobretudo, de uma política que arruinaria as instituições políticas e militares do país.
Art. 1º: - Os órgãos de representação dos estudantes de ensino superior, que se regerão por esta Lei, têm por finalidade: a) defender os interesses dos estudantes; b) promover a aproximação e a solidariedade entre os corpos discente, docente e administrativo de ensino superior; c) preservar as tradições estudantis, a probidade da vida escolar, o patrimônio moral e material das instituições de ensino superior e a harmonia entre os diversos organismos da estrutura escolar; d) organizar reuniões e certames de caráter cívico, social, cultural, científico, técnico, artístico, e desportivo, visando o aprimoramento da formação universitária. Art. 2º - São órgãos de representação dos estudantes de ensino superior: a) o Diretório Acadêmico (D.A.), em cada estabelecimento de ensino superior; b) o Diretório Central de Estudantes (D.C.E.), em cada Universidade; c) o Diretório Estadual de Estudantes (D.E.E.), em cada capital de Estado, Território ou Distrito Federal, onde houver mais de um estabelecimento de ensino superior; d) o Diretório Nacional de Estudantes (D.N.E.), com sede na Capital Federal. E, principalmente: Art. 14. É vedada aos órgãos de representação estudantil qualquer ação, manifestação ou propaganda de carácter político-partidário, bem como incitar, promover ou apoiar ausências coletivas aos trabalhos escolares.
Flávio Suplicy de Lacerda foi ministro da Educação no governo Castelo Branco (cf. Figueiredo, 1980), de 15 de abril de 1964 a 8 de março de 1965, e de 22 de abril de 1965 a 10 de janeiro de 1966. Durante sua gestão no Ministério de Educação e Cultura, estabeleceu um acordo de cooperação com a United States Agency for International Development (USAID), que visava transformar o ensino brasileiro num projeto tecnocrático. Essa estratégia político-ideológica foi reconhecida como um Acordo institucionalizado. Com ele as universidades seriam as maiores afetadas. Redutos de manifestações estudantis nas mais diversos matizes da esquerda brasileira, as universidades eram vistas “pelo comando da ditadura militar como focos de subversão ao regime”. O acordo serviria para transformar o jovem ensino superior brasileiro não mais numa formação crítica do cidadão na sociedade, mas tão somente em cursos de formação meramente profissional e técnica. Nessa mesma conjuntura golpista, surgiram os primeiros rumores de privatização das universidades federais e estaduais, que, tal qual todo o projeto previsto no acordo norte-americano, revoltou os estudantes. Com a crise de hegemonia civil-militar, o movimento estudantil brasileiro entrou na sua fase mais aguerrida, com uma série de revoltas realizadas entre 1966 e 1968, ano de seu auge nas organizações. Vários desses conflitos tiveram vítimas fatais entre os estudantes.
A lei determinava que os diretórios acadêmicos (DA) continuariam tendo existência obrigatória nos estabelecimentos de ensino público superior. Os estudantes das universidades teriam seu Diretório Central de Estudantes (DCE) composto de representantes dos diretórios. Estes se reuniriam, também, para organizar os Diretórios Estaduais de Estudantes (DEE), os quais, por sua vez, comporiam, por meio de representantes, o Diretório Nacional de Estudantes (DNE). A lei “assegurava” a participação de representantes discentes junto aos órgãos de deliberação coletiva e aos departamentos das instituições de ensino superior, designados pelos estudantes. Atendia, também, antiga reivindicação do movimento estudantil, tornando obrigatório o voto para a eleição das diretorias. Em compensação, vedava aos órgãos de representação estudantil “qualquer ação, manifestação ou propaganda de caráter político-partidário, bem como incitar, promover ou apoiar ausências coletivas aos trabalhos escolares”, cujo objetivo, ainda que indireto, seja a promoção de uma pessoa, um partido político ou uma ideologia partidária.
Mas em contrapartida a lei procurava limitar e desacelerar a participação social das diretorias das entidades estudantis, tornando inelegíveis “os estudantes repetentes, dependentes ou matriculados em regime parcelado, proibindo o abono de faltas pela participação nos diretórios”. Ao contrário do que acontecia com as entidades estudantis gerindo seu processo eleitoral, a lei determinava que as eleições para os diretórios devessem “ser acompanhadas por um professor designado pela direção da escola ou da universidade”. A fiscalização do cumprimento da lei deveria ser feita pelas Congregações ou Conselhos Departamentais, para os diretórios; pelos Conselhos Universitários (CU), no caso do Diretório Central do Estudantes (DCE), e pelo Conselho Federal de Educação (CFE), instituído pela lei nº 4024/61 reconhecida como Lei de Diretrizes e Bases de/1961, no caso respectivo do DEE e DNE. As universidades e as entidades estudantis deveriam adaptar seus Estatutos à lei em 60 dias. Para não deixar dúvidas sobre a determinação militar, a lei estipulava que os diretores de faculdade ou reitores de universidades incorreriam em “falta grave” se permitissem ou tolerassem o não cumprimento das normas por ação ou por omissão.
Diante da Lei Suplicy, os estudantes precarizaram as atividades políticas e se dividiram. Uma corrente era favorável à participação nos “Diretórios oficiais” mantendo-se ou não entidades “livres” paralelas. Outros defendiam o boicote aos “Diretórios oficiais”, anulando seus votos nas eleições obrigatórias. Esta última posição prevaleceu, fazendo com que após a contenção política iniciada pela promulgação do AtoInstitucional nº 5, o Decreto Aragão, sucessor da Lei Suplicy, fosse aplicado com mais intensidade. Edson Luís de Lima Souto nascido em Belém, em 24 de fevereiro de 1950 e assassinado por policiais militares no Rio de Janeiro, em 28 de março de 1968. foi um estudante secundarista morto, durante confronto no restaurante Calabouço, centro do Rio de Janeiro. Seu assassinato marcou o início de um ano turbulento de intensas mobilizações contra o regime militar que endureceu até decretar o chamado AI-5. Nascido em uma família pobre, iniciou os estudos na Escola Estadual Augusto Meira em Belém, no Pará. Mudou-se para o Rio de Janeiro para fazer o segundo grau no Instituto Cooperativo de Ensino, no qual funcionava o restaurante Calabouço.
Em 28 de março de 1968, os estudantes do Rio de Janeiro estavam organizando uma passeata-relâmpago para protestar contra a alta do preço da comida no restaurante Calabouço, que deveria acontecer no final da tarde do mesmo dia.Por volta das 18 horas, a Polícia Militar chegou ao local e dispersou os estudantes que estavam na frente do complexo. Os estudantes se abrigaram dentro do restaurante e responderam à violência policial utilizando paus e pedras. Isso fez com que os policiais recuassem e a rua ficasse deserta. Quando os policiais voltaram, tiros começaram a ser disparado do edifício da Legião Brasileira de Assistência (LBA), o que provocou pânico entre os estudantes, que fugiram. Os policiais acreditavam – não se sabe por qual razão, que os estudantes iriam atacar a Embaixada dos Estados Unidos e invadiram o restaurante. Durante a invasão, o comandante da tropa da PM, aspirante Aloísio Raposo, atirou e matou o secundarista Edson Luís “com um tiro a queima roupa no peito”. Outro estudante, Benedito Frazão Dutra, também baleado, chegou a ser levado ao hospital, mas morreu. Temendo que a PM sumisse com o corpo, os estudantes não permitiram que ele fosse levado para o Instituto Médico Legal (IML), mas o carregaram em passeata diretamente para a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, onde foi velado. A necropsia foi feita no próprio local pelos médicos Nilo Ramos de Assis e Ivan Nogueira Bastos na presença do Secretário de Saúde do Estado do Rio de Janeiro. Óbito n° 16.982 teve como declarante o estudante Mário Peixoto de Souza.
O registro de ocorrência n° 917 da 3ª Delegacia de Polícia informou que, no tiroteio ocorrido no restaurante Calabouço, outras seis pessoas ficaram feridas: Telmo Matos Henriques, Benedito Frazão Dutra (que morreu logo depois), Antônio Inácio de Paulo, Walmir Gilberto Bittencourt, Olavo de Souza Nascimento e Francisco Dias Pinto. Todos foram atendidos no Hospital Souza Aguiar. No período que se estendeu do velório até a missa da Igreja da Candelária, realizada em 2 de abril foram mobilizados protestos em todo o país. Em São Paulo, quatro mil estudantes fizeram uma manifestação na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Também foram realizadas manifestações no Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade São Francisco, na Escola Politécnica da Universidade de Sao Paulo e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O Rio de Janeiro parou no dia do enterro. Para expressar seu protesto, os cinemas da Cinelândia amanheceram anunciando três filmes: A noite dos Generais, À queima roupa e Coração de Luto. Centenas de cartazes foram colados nas paredes e postes da Cinelândia com frases como: “Bala mata fome?”, “Os velhos no poder, os jovens no caixão” e “Mataram um estudante. E se fosse seu filho?”. Edson Luis foi enterrado ao som do Hino Nacional, cantado pela multidão em vigília.
Diante do quadro de terror/horror no início de 1970, poucos eram os estabelecimentos de ensino superior onde existiam diretórios acadêmicos “oficiais” ou “livres”. Foi só a partir de 1973, que os estudantes começaram a organizar entidades livres que vingaram, instituindo o voto direto para o DCE, e fazendo as entidades “oficiais” saírem dos limites da Lei Suplicy. A lei determinava que os diretórios acadêmicos continuariam tendo existência obrigatória nos estabelecimentos de ensino superior. Os estudantes das universidades teriam seu Diretório Central de Estudantes (DCE) composto de representantes dos diretórios acadêmicos. Estes se reuniriam, também, para organizar os diretórios estaduais de estudantes que comporiam, por representantes, o Diretório Nacional de Estudantes (DNE). Durante a ditadura militar, o movimento estudantil ocupou um espaço destacado na estratégia política ao regime. Manifestações coordenadas pela UNE denunciaram os problemas da educação e expuseram o lado destes tempos sombrios do regime. Todos os eventos políticos da entidade eram organizados e realizados em clandestinidade.
A
primeira ação da ditadura militar brasileira ao tomar o poder em 1964 e depor o
presidente João Goulart foi, metralhar, invadir e incendiar a sede da UNE, na
Praia do Flamengo 132, na fatídica noite de 30 de março para 1º de abril.
Ficava clara a dimensão do incômodo que os militares golpistas e os grupos
elitistas conservadores sentiam em relação à entidade. A ditadura perseguiu,
prendeu, torturou e executou centenas de brasileiros, muitos deles estudantes.
O regime militar retirou legalmente a representatividade da UNE por meio da Lei
Suplicy de Lacerda e a entidade passou a atuar na ilegalidade. As universidades
eram vigiadas, intelectuais e artistas reprimidos, o Brasil escurecia. Em 1966,
um protesto em Belo Horizonte na Faculdade de Direito é brutalmente reprimido.
No mesmo ano, também na capital mineira, a UNE realiza um congresso clandestino
porão de uma igreja. Já no Rio de Janeiro, na Faculdade de Medicina da UFRJ, a
ditadura reprimi com violência os estudantes no episódio conhecido como
Massacre da Praia Vermelha. A UNE continuou a existir nas sombras da ditadura,
em firme oposição ao regime, como aconteceu no ano de 1968, marcado por
revoluções culturais e sociais em quase todo o mundo ocidental.
Decorre
daí que estudantes e artistas engrossaram a Passeata dos Cem Mil no Rio de
Janeiro, pedindo democracia, liberdade e justiça. No entanto, os militares
endureciam a repressão em episódios como o assassinato do estudante
secundarista Édson Luis e a invasão do Congresso da UNE em Ibiúna (SP), com a
prisão de cerca de mil estudantes. No fim do mesmo ano, a proclamação do Ato
Institucional nº 5 (AI-5) indicava uma violência ainda maior. Nos anos
seguintes, a ditadura torturou e assassinou estudantes como a militante
Helenira Rezende e o presidente da UNE, Honestino Guimarães, perseguido e
executado durante o período de clandestinidade da entidade. Mesmo assim, o
movimento estudantil continuou nas ruas, como nos atos e missa de 7º dia da
morte do estudante da USP, Alexandre Vannucchi Leme, em 1973. Ao final dos anos
1970, com os primeiros sinais de enfraquecimento do regime militrar, a UNE
começou a se reestruturar. O Congresso de reconstrução da entidade aconteceu
Salvador, em 1979, reivindicando mais recursos para a universidade, defesa do
ensino público e gratuito, assim como pedindo a libertação de estudantes presos
do Brasil. No início dos anos 1980, os estudantes tentaram também recuperar sua
sede na Praia do Flamengo, mas foram duramente reprimidos e os militares
demoliram o prédio. Na manhã de 4 de abril foi realizada um missa na Igreja da Candelária em memória de Edson. Após o término da missa, as pessoas que deixavam a igreja foram cercadas e atacadas pela cavalaria da Polícia militar com golpes de sabre. Dezenas de pessoas ficaram feridas. Outra missa seria realizada na noite do mesmo dia. O governo militar proibiu a realização dessa missa, mas o vigário-geral do Rio de Janeiro, D. Castro Pinto, insistiu em realizá-la. A missa foi celebrada com cerca de 600 pessoas. Temendo que o mesmo massacre da manhã se repetisse, os padres pediram que ninguém saísse da igreja. Do lado de fora havia três fileiras de soldados a cavalo com os sabres desembainhados, mais atrás estava o Corpo de Fuzileiros Navais e vários agentes do DOPS. Num ato de coragem, os clérigos saíram na frente de mãos dadas, fazendo um “corredor” da porta da igreja até a Avenida Rio Branco para que todos os que estavam na igreja pudessem sair com segurança. Apesar desse ato, a cavalaria militar em represália aguardou que todos saíssem e os encurralaram nas ruas apertadas da Candelária. Novamente o saldo negativo foi de dezenas de pessoas feridas. Percebe-se a impossibilidade de se ver o menino que vivia na rua, como uma criança ou a adolescente. Ele era visto como “menor”. Foram mortas crianças, adolescentes e jovens que viviam à margem de tudo que a sociedade imaginava constituir a infância. Eram nomeadas “de rua”. Como se o traço humano, o nascimento, fosse subtraído. Não tinham nomes, família, humanidade. Nasciam e morriam nas ruas.
A maior parte dos membros participantes do 30º Congresso estava dormindo quando a polícia chegou ao sítio Muduru, na pequena cidade de Ibiúna, no interior de São Paulo. Por volta das 7h30 daquele sábado, dia 12 de outubro de 1968, agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) invadiram à propriedade acompanhados por homens armados da Força Pública, como eram denominadas as tropas estaduais. Após anunciar o cerco com disparos de metralhadora, os policiais prenderam 739 estudantes que estavam hospedados no sítio para os debates do encontro. Os estudantes tornaram-se alvo do Aparato Repressivo de Estado (ARE). Muitos foram monitorados, fichados, presos, torturados e mortos. O histórico da repressão militar em Sorocaba e região destaca o episódio icônico daquela conjuntura, a prisão de quase mil estudantes em outubro de 1968, num sítio em Ibiúna, durante o 30º Congresso Nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE), dissolvido por ação conjunta de 215 policiais da Força Pública e do temido DOPS, comandado pelo coronel da PM de Sorocaba, Divo Barsotti do 7º Batalhão Policial.O 30º Congresso da UNE foi finalizado com a invasão do sítio pela polícia às 07 horas e 15 minutos da manhã de 12 de outubro de 1968. - “Todos foram presos”, foi a frase utilizada pela imprensa para destacar o resultado da operação policial, que prendeu quase todos os estudantes participantes. A comissão criada pelo governo para definir o valor de indenização a ser paga a União Nacional dos Estudantes (UNE), pela perda de sua sede durante a ditadura, em 1964, estipulou em R$ 44,6 milhões a reparação. Esta é a primeira reparação coletiva do Estado brasileiro quando foram depositados R$ 30 milhões desse montante na conta da entidade. A segunda parcela restante, de R$ 14,6 milhões, foi também paga em 2011. O governo reconheceu a responsabilidade do Estado pelo incêndio que destruiu a sede da UNE. A comissão trabalhou durante 60 dias e apresentou seu Parecer aos ministros da Justiça, Luiz Paulo Barreto, e ao ministro da Secretaria Geral da Presidência, Luiz Dulci. Os dois acataram o Parecer da comissão. A lei sancionada por Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT) previa indenização de até R$ 97,2 milhões, montante que representa seis vezes o valor do terreno, mas avaliado por baixo do valor de mercado pela Caixa Econômica Federal em torno de R$ 16,2 milhões. O valor fixado pela comissão representa pouco menos da metade do limite da lei. A indenização foi paga pela Comissão de Anistia. O presidente Lula participou de um ato simbólico de inauguração da pedra fundamental da reconstrução do prédio, na Praia do Flamengo. O projeto da arquitetura do prédio foi uma doação de Oscar Niemeyer (1907-2012).
A canção Menino, composta por Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, gravada no álbum Geraes (1976), e também por Elis Regina nas apresentações e no disco Saudade do Brasil (1980), refere-se a Edson Luís. A canção “Coração de Estudante”, composta por Wagner Tiso inicialmente sob o nome de “Tema de Jango” para um documentário sobre João Goulart, ganhou letra de Milton Nascimento lembrando a tragédia de Edson Luís e a canção foi rebatizada como “Coração de Estudante”. A canção foi gravada no álbum “ao vivo” em 1983. Em 28 de março de 2008, para lembrar os quarenta anos de sua morte, foi inaugurada uma estátua em homenagem ao estudante Edson Luís na Praça Ana Amélia, entre a Avenida Churchill e a Rua Santa Luzia, no Rio de Janeiro. O trevo viário que liga o Aterro do Flamengo às avenidas General Justo e Presidente Antônio Carlos, próximo ao Aeroporto Santos Dumont, passou a ser reconhecido como Trevo Estudante Edson Luís de Lima Souto. A trágica cena do seu violento assassinato foi representada na novela do Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), Amor e Revolução, no dia 28 de setembro de 2011. Foi escrita por Tiago Santiago, com colaboração de Renata Dias Gomes, Miguel Paiva e Elliana Garcia, e dirigida por Reynaldo Boury, Luiz Antônio Piá e Marcus Coqueiro e produção-executiva de Sérgio Madureira. A ditadura militar é o tema da trama, as consequências do golpe militar no país entre os anos 1960 até o final dos anos 1980, envolvendo a moda, a música, a expansão da televisão na vida. Foram investidos 25 milhões de reais na produção da novela, entre cenários, a compra de novos equipamentos e gravações em externas.
Bibliografia geral consultada.
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Grande Irmão: Da Operação Brother Sam aos Anos de Chumbo. O Governo dos Estados
Unidos e a Ditadura Militar Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Civilização
Brasileira, 2008; MAIA JUNIOR, Edimilson Alves, Memórias de Luta: Ritos Políticos do Movimento Etudantil Universitário (Fortaleza, 1962-1969). Fortaleza: Edições UFC, 2008; PAULA, Gil César Costa de, A Atuação da União Nacional dos Estudantes – UNE: Do Inconformismo à Submissão do Estado (1960-2009). Tese de Doutorado. Faculdade de Educação. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2009; MULLER, Angélica, A Resistência do Movimento Estudantil Brasileiro contra o Regime Ditatorial e o Retorno da UNE à Cena Pública (1969-1979). Tese Doutorado em História Social. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2010; SANTANA, Flávia de Angelis, Movimento Estudantil e Ensino Superior no Brasil: A Reforma Universitária no Centro da Luta Política Estudantil dos Anos 60. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em História. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2014; SOUZA, Eliezer Felix de, Flávio Suplicy de Lacerda: Relações de Poder no Campo Acadêmico/Político Paranaense e o Processo de Federalização e Modernização da Universidade do Paraná (1930-1971). Tese Doutorado em Educação. Ponta Grossa: Universidade Estadual de Ponta Grossa, 2016; ROSSI, Pamela de Mattos, Os Acordos MEC-USAID no Jornal o Estado de S. Paulo (1962 -1973). Dissertação de Mestrado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2018; SILVA, Rosicleide Henrique da, Golpe Civil-Militar: Apoio de Estudantes, Mulheres e Imprensa. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação - Doutorado. Centro de Educação. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2019; LIMA, Gilneide de Oliveira Padre, Do Corpo Insepulto à Luta por Memória, Verdade e Justiça: Um Estudo do Caso Dinaelza Coqueiro. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Memória, Linguagem e Sociedade. Vitória da Conquista: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, 2019; entre outros.