Ubiracy de Souza Braga
“A justiça militar está para a justiça, assim como a música militar está para a música”. Georges Clemenceau
Georges
Benjamin Clemenceau (1841-1929) foi um estadista, jornalista e médico francês. Formado
em medicina, ciência que cedo trocou pelas atividades políticas. Com 30 anos em
1871, Clemenceau integrava a Assembleia Nacional, na qual se manifestou
veementemente contra o tratado de paz com o recém-unificado Império Alemão. O
seu posicionamento político tornava-se por vezes um pouco incómodo para alguns
dos seus pares, pois defendia os ideais republicanos e anticlericais de extrema
esquerda. A este político irreverente devem-se a queda de seis governos e a
demissão do presidente da república, o que lhe conferiu o título de “o tigre”. Clemenceau
foi o fundador do jornal La Justice, um periódico de tendência radical,
que aumentou consideravelmente a sua influência política. Em 1897 foi o
responsável pela publicação de L`Aurore, onde o escritor francês Émile
Zola lançou J`accuse a propósito do Caso Dreyfus. Entre 1902 e 1920
Clemenceau foi eleito senador. Ocupou o cargo de primeiro-ministro da França
nos períodos 1906-1909 e 1917-1920. Neste último, chefiou o país durante a 1ª
grande guerra e foi um dos principais autores da Conferência de Paz de Paris,
que resultou no Tratado de Versalhes, onde tinha dois grandes objetivos: A
recuperação de Alsácia e Lorena e a Independência da Renânia. Apenas o primeiro
objetivo foi concluído, a Renânia foi desmilitarizada.
Intervenção militar significa o uso
estratégico das forças militares para controlar determinada situação que
deveria ser de responsabilidade de outro tipo de força ou autoridade. No âmbito
internacional, a intervenção militar se configura quando os militares de um
país são enviados a uma nação terceira com o objetivo de controlar, de maneira
temporária, os interesses daquele país. Normalmente, nestes casos, a
intervenção militar se justifica em situações particulares, como por exemplo,
quando determinada nação sofre com guerras civis intensas ou com falta de um
comando que garanta sua segurança, ou ainda quando a população é negligenciada
pelo governo daquele país. Um exemplo de intervenção militar internacional
aconteceu quando as forças militares dos Estados Unidos da América (EUA) invadiram
o Afeganistão, alegando defender o bem-estar dos cidadãos do país e garantir a
segurança mundial. Tradicionalmente a intervenção militar, como forma de
controlar os três poderes de um país: Legislativo, Executivo e Judiciário, pode
ser considerada um golpe de Estado, ou seja, uma maneira ilegal de “derrubar”
um governo constitucionalmente legítimo.
No caso brasileiro, a intervenção
militar representou um período que ficou historicamente marcado por ser a
ditadura militar brasileira, entre os anos de 1964 e 1985. No dia 1° de abril
de 1964 o governo de João Goulart após renúncia do presidente eleito Jânio
Quadros foi deposto e o regime militar teve início alguns dias depois, a partir
de um golpe de Estado. O fim da ditadura militar no Brasil aconteceu em 1985,
sendo o general João Batista de Figueiredo o último presidente deste período.
Algumas manifestações ocorridas entre 2014 e 2015, contra o legítimo governo
brasileiro, pediam a intervenção militar como solução pragmática para resolver
questões referentes à economia, corrupção e segurança nacional. No entanto, os
manifestantes de direita que exigiam este tipo conservador de intervenção,
normalmente, desconhecem as consequências que este ato autoritário traria para
o direito democrático da sociedade. Vale lembrar que a intervenção militar, como
forma de derrubar o governo, é uma ação inconstitucional, sendo previsto em lei
que as Forças Armadas, ao contrário de ameaçar a democracia, os Três Poderes e
a soberania da Presidência, deverá protegê-los.
Não queremos perder de vista que a 1ª mulher eleita na América Latina
foi Violeta Barros, em 1990, na Nicarágua. Apesar da importância da eleição, ela é reconhecida como Violeta Chamorro, sobrenome do marido - pela maioria das pessoas
é lembrado como “viúva” do jornalista Pedro Joaquín Chamorro Cardenal,
assassinado pela ditadura que assolava o país. Ou seja, a primeira mulher
eleita para uma Presidência na América Latina “precisa ter a memória vinculada
a um homem”. A 2ª mulher a presidir um país latino-americano foi Mireya
Moscoso, que governou o Panamá entre 1999 e 2004. Em todas as biografias,
Mireya “é descrita como esposa do Presidente Arnulfo Arias Madrid”. Michelle
Bachelet foi eleita em 2006 para governar o Chile. Ela é a 1ª mulher a presidir
o Chile pela segunda vez, desde a ditadura do general Augusto Pinochet. As
referências de “esposa” e “viúva” também são usadas para Cristina Kirchner, que
governa a Argentina desde 2007. A brasileira
Dilma Rousseff (PT) é a 11ª mulher a ocupar o cargo de presidente da República
na América Latina – a oitava eleita. Dos 33 países da região, a Argentina já
teve duas mulheres no governo. Outros oito países latino-americanos tiveram uma
mulher presidente: Bolívia, Haiti, Nicarágua, Equador, Guiana, Panamá, Chile e
Costa Rica.
O
mandato terminou em 2015 e ela não poderá se candidatar novamente, de acordo com
Constituição do país. A 5ª presidenta eleita na América Latina venceu as
eleições de 2010, assim como Dilma Rousseff. Laura Chinchilla presidiu a Costa
Rica até maio deste ano. Antes de ocupar o cargo, ela já havia sido
vice-presidente de Óscar Arias Sanchez. Dilma Rousseff é a 1ª mulher a governar
o Brasil, vencendo as eleições de 2010 e 2014, sucessivamente, mas foi
derrubada pelo golpe de Estado de 17 de abril de 2016. Segundo Michael Löwy o
que aconteceu no Brasil, com a destituição da presidente eleita Dilma Rousseff,
foi um golpe de Estado pseudolegal, “constitucional”, “institucional”,
parlamentar ou o que se preferir. Mas golpe de Estado. Parlamentares –
deputados e senadores – profundamente envolvidos em casos de corrupção (fala-se
em 60%) instituíram um processo de destituição contra a presidente pretextando
irregularidades contábeis, as chamadas “pedaladas fiscais”, para cobrir déficits nas contas públicas – uma
prática corriqueira em todos os governos anteriores!
Não
há dúvida de que vários quadros do Partido dos Trabalhadores estão envolvidos
no escândalo de corrupção como vem ocorrendo com a Petrobras, mas Dilma Rousseff
não tem nada a ver com isso Na verdade, os deputados de direita que conduziram
a campanha contra a presidente são uns dos mais comprometidos nesse caso,
começando pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cosentino da Cunha
filiado ao PMDB. Exerceu o cargo de
deputado federal entre fevereiro de 2003 e setembro de 2016, quando teve o
mandato cassado pelo plenário da Câmara dos Deputados. Eduardo Cunha
recentemente suspenso foi acusado de corrupção, lavagem de dinheiro, evasão
fiscal etc. Contudo, no caso do Partido dos Trabalhadores (PT), a prática do
golpe de Estado legal parece ser a nova estratégia das oligarquias
latino-americanas, testada em Honduras e no Paraguai, países que a imprensa
costuma chamar de “República das Bananas”, ela se mostrou eficaz e lucrativa para
eliminar presidentes moderadamente) de
esquerda. Agora foi aplicada num país que tem o tamanho de um continente. Lembra-nos
os versos de Cora Coralina quando afirma: - “Mesmo quando tudo parece desabar,
cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque
descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir”.
Historicamente as favelas mais
conhecidas do Brasil estão localizadas na cidade do Rio de Janeiro e surgiram
por volta de 1900, no período da Guerra de Canudos. A cidadela de Canudos foi
construída próxima a alguns morros, entre eles o Morro da Favela, que recebeu
este nome devido à vegetação predominante no local, que era a favela, uma
planta típica da caatinga, extremamente resistente à seca. Os soldados ao
retornarem ao Rio de Janeiro, deixaram de receber seu soldo e instalaram-se
provisoriamente em alguns morros da cidade, juntamente a outros desabrigados. A
partir deste episódio, os morros recém-habitados ficaram conhecidos como
favelas, em referência à “favela original”. A preocupação do poder público com
a nova forma de moradia instalada informalmente no Rio de Janeiro só aconteceu
em 1927, através do Plano Agache, que representou a denominação popular do
plano de remodelação urbana da cidade do Rio de Janeiro elaborado, ao final da
década de 1920, por Alfred Agache, por solicitação do então prefeito da cidade,
Antônio Prado Júnior. Embora não tenha sido efetivamente organizado, o Plano
abriu novas perspectivas para o urbanismo no Brasil e deu origem à criação do
Departamento de Urbanismo da Prefeitura Municipal.
Em
1948 foi realizado o primeiro Censo nas favelas cariocas e neste contexto a
Prefeitura do Rio de Janeiro, afirma, surpreendentemente, num documento
oficial, precedente às estatísticas, que: “os pretos e pardos prevaleciam nas
favelas por serem hereditariamente atrasados, desprovidos de ambição e mal
ajustados às exigências sociais modernas”. Esta afirmação resgatada por Alba
Zaluar “et al” (2007), exemplifica como o preconceito em torno das favelas e
seus moradores se fixaram tristemente na sociedade brasileira. Considerada
oficialmente a primeira favela do Rio de Janeiro, o Morro da Providência, que
fica atrás da estação ferroviária Central do Brasil, foi batizado no final do
séc. XIX como Morro da Favela, origem do nome
que se espraiou por outras
comunidades do Rio e de resto no Brasil. Os primeiros moradores do Morro da
Favela ex-combatentes da Guerra de Canudos se fixaram no local por volta de
1897.
Cerca
de 10 mil soldados foram para o Rio de Janeiro com a promessa do Governo de
ganhar casas na capital federal da província. Como os entraves políticos e
burocráticos atrasaram a construção dos alojamentos, os ex-combatentes passaram
a ocupar provisoriamente as encostas do morro – e por lá acabaram ficando. Ipso
facto, tanto a origem do nome Favela quanto Providência remete à Guerra de
Canudos, travada entre tropas republicanas e seguidores de Antônio Conselheiro
no sertão baiano. Favela era o nome de um morro que ficava nas proximidades de
Canudos e serviu de base e acampamento para os soldados republicanos. Faveleiro
é também o nome de um arbusto típico do sertão nordestino. O jornalista e
escritor Euclides da Cunha descreveu assim o morro da Favela no seu livro: Os
Sertões, sobre a Guerra de Canudos: - “O monte da Favela, ao sul, empolava-se
mais alto, tendo no sopé, fronteiro à praça, alguns pés de quixabeiras, agrupados
em horto selvagem. À meia encosta via-se solitária, em ruínas, a antiga casa da
fazenda. O arraial, adiante e embaixo, erigia-se no mesmo solo perturbado. Mas
vistos daquele ponto, de permeio a distância suavisando-lhes as encostas e
aplainando-o davam-lhe a ilusão de uma planície ondulante e grande”.
Jogar
as Forças Armadas numa aventura sociológica irresponsável é essa espécie de
última cartada que fez um deputado da oposição comparar a intervenção militar no
Rio de Janeiro à guerra das Malvinas, nos estertores da ditadura argentina. Contudo,
para entender o processo de produção do espaço urbano na cidade do Rio de
Janeiro e como este processo contribuiu para a atual reorganização do espaço,
caracterizada pela intensa fragmentação social, econômica e política, é
necessário compreender o processo de formação da cidade, principalmente ao inicio
de sua transformação em espaço adequado às exigências do modo de produção. Este
período, correspondente a segunda metade do século XIX, de sua forma colonial-escravista
para uma cidade adequada aos interesses do capital e do Estado Republicano. O
entendimento das origens da favela e seu desenvolvimento na cidade do Rio de Janeiro
representa um marco na explicação histórica e teórica das revoltas populares e
de intervenção militar no Rio de Janeiro. O Estado sempre esteve presente no
processo de urbanização da Zona Sul, dotando da infraestrutura necessária para
a ocupação residencial das classes médias e altas.
Mas
um governo impopular e oportunista sabe dos riscos de ser preso depois de
deixar o cargo, diante das inúmeras denúncias de corrupção contra si, em troca
de apoio do golpe de Estado de 17 de abril de 2016, pode tentar qualquer
manobra para se preservar – não necessariamente como candidato que não fora,
mas como alguém em condições de influenciar a sucessão, de modo a garantir um
ministério, por exemplo, e assim manter o foro privilegiado de processos jurídico-políticos
como ocorre com o ex-presidente eleito pelo voto Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
É exatamente este o principal dano colateral – no plano discursivo, pois no
plano da vida cotidiana há outros, que ao mesmo tempo refletem esse discurso –
dessa aventura de militarização da cultura. Pois, como em toda guerra, trata-se
de silenciar o outro lado dos oprimidos. Quem é contra a intervenção militar aparentemente
é contra a segurança da sociedade local ou, pior ainda, é aliado do chamado “crime
organizado” – essa entidade que o golpista Michel Temer, logo que prometeu
“desbaratar”, ideologicamente em recente entrevista.
As favelas na cidade do Rio de
Janeiro começaram a ter início no final do século XIX, quando várias
transformações socioeconômicas pelas quais o Brasil passava e transformações
locais começaram a inchar a área central da cidade, formando os primeiros
cortiços. Acredita-se que a primeira favela carioca tenha surgido em 1897 no
antigo Morro de Santo Antônio, no entanto a favela mais antiga do país situa-se
no Morro da Providência, onde alguns soldados provenientes da Guerra de Canudos
começaram a morar. Segundo dados estatísticos oficiais do Censo de 2010,
coletados pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), existem 763 favelas na cidade do Rio de
Janeiro. Aproximadamente 22% da população da cidade moram em favelas, sendo a
capital fluminense o município com o maior número de moradores ditos “favelados”
do Brasil, 1.393.314 habitantes. Em sua
região metropolitana, 1.702.073 de pessoas moram em “assentamentos subnormais”,
a definição do governo para classificar as favelas, o que corresponde a 14,4%
da população da metrópole. No início do século XX, essas construções
irregulares recém-formadas, assim como os cortiços, eram vistas pela minoria carioca “como
o lar da criminalidade e de doenças”.
Grampos
cirúrgicos são ferramentas utilizadas por cirurgiões e profissionais da área
médica para interromper o fluxo sanguíneo ou outros fluidos durante a cirurgia.
Essas ferramentas são usadas em salas de operação de hospitais, durante muitos
procedimentos ambulatoriais, bem como em campo, por técnicos de emergência
clínica e paramédicos. Há uma variedade
de estilos e tamanhos de braçadeiras cirúrgicas
para acomodar muitas aplicações e funções. A forma da ponta de cada ferramenta
geralmente determina o que pode ser usado, e muitos são projetados para
procedimentos exatos. Um grampo cirúrgico padrão é leve e feito de aço
inoxidável para fins de esterilização e utilitários. A maioria das braçadeiras
pode ser realizada como uma tesoura para facilitar a aplicação. Mandíbulas
serrilhadas seguram o tecido, o vaso ou o órgão com firmeza. As alças
normalmente se encaixam com uma fileira de dentes interligados que permitem ao
cirurgião escolher a quantidade de tensão, ou pressão de bloqueio, no tecido ou
órgão que está sendo fixado. A trava também permite que os cirurgiões deixem,
sem as mãos, um grampo no tempo da duração do procedimento. Comumente usado
para prevenir hemorragia, grampos
cirúrgicos também são usados para impedir que outros fluidos corporais e
bactérias entrem ou escapem dos tecidos durante procedimentos cirúrgicos.
A proposta de um “mandado coletivo”
de busca e apreensão, já tentada outras vezes apesar de sua flagrante ilegalidade, foi outro elemento para
revelar o alcance da trajetória de moradores de morros cariocas que sob
suspeita, detém a massa de moradores desses lugares e espaços onde os “procurados”
segundo Rogerio Christofoletti (2018) podem se esconder, como tentou justificar
o ministro da Defesa – como se nos condomínios de classe média e alta não se
cogitasse da possibilidade de fuga, na remota hipótese de alguma incursão
policial ocorrer nessas áreas de convívio cotidiano destes pequenos burgueses. Há
certamente um exagero em se dizer que certas fotos capturam a alma das pessoas,
mas essas, com militares fardados tirando fotos de moradores como fichamento, sem
qualquer dúvida, expõem o profundo sentimento de humilhação desses moradores
diante de tal constrangimento que virou rotina desde a instalação da República
Velha com as práticas de vasculhamento dos morros cariocas. Com a
redemocratização do país o contexto político, com o país atravessando o período
da ditadura militar (1964-1985), e o discurso oficial sobre as possíveis
melhorias sociais para os removidos também dificultaram a resistência
organizada de moradores. Ipso facto, as remoções eram usadas pelo Estado como
propaganda. O programa do governo apresentava o tema como uma questão de “remodelamento
urbano” propugnando uma divisão entre campo e cidade, onde a área da Leopoldina
e a Zona Oeste seriam fabris, com a necessidade de trabalhadores próximos. Já a
Zona Sul seria uma área residencial.
O processo de “remoção” dos anos 1960
e 1970 atingiram áreas como a Favela da Catacumba e a Ilha das Dragas, na
Lagoa; Morro do Pasmado, em Botafogo; Macedo Sobrinho, no Humaitá; Praia do
Pinto, no Leblon; e Parque Proletário da Gávea. A Cruzada São Sebastião,
projeto idealizado por dom Hélder Câmara e construído em 1955 no Leblon, foi um
dos locais que receberam os moradores. No entanto, na maior parte dos casos, entretanto,
eles foram retirados estrategicamente da Zona Sul para as zonas distantes e
desprestigiadas zonas Norte e Oeste, onde passaram a morar em conjuntos
habitacionais criados e programados por cooperativas estatais regionais para
recebê-los: Cidade de Deus, em Jacarepaguá; Dom Jaime Câmara, em Padre Miguel;
Cidade Alta, em Cordovil; e Vila Kennedy e Vila Aliança, ambas em Bangu. - A
vida ficou mais difícil. Trabalhava em Copacabana e, quando cheguei na Cidade
Alta, nem sabia como sair de Cordovil para chegar ao trabalho - lembra a
aposentada Maria Margarida Nonato, “removida” da Praia do Pinto. - No início, a
Cidade Alta não tinha água, luz, asfalto, nenhum armazém. Foi uma surpresa
desagradabilíssima.
No
final dos anos 1970 e início dos anos 1980, o inchaço populacional, a ausência
do Estado e a consequente falta de políticas públicas, tornaram as favelas os principais
centros do narcotráfico no Rio de Janeiro, o que tornou essas áreas ainda mais
violentas. Foi apenas na década de 1990, quando esses assentamentos já estavam
consolidados e as suas populações já eram enormes, que o governo municipal
passou a buscar maneiras de urbanizar as favelas da cidade. Acostumados a
trabalhar perto de onde moravam, os moradores sofreram com a distância e,
especialmente, com a deficiência de transporte público. As justificativas
usadas pelo poder público para defender as remoções também são alvo de
questionamento. Segundo a socióloga Denise Nonato, o discurso nem sempre
coincidia com a prática. - O governo dizia que a área da favela da Praia do
Pinto não era urbanizável. Mas como não poderia ser urbanizada se logo depois
foi vendida deu origem ao condomínio Selva de Pedra? Havia um interesse
imobiliário muito forte ali, e não queria que surgisse uma nova Cruzada São
Sebastião - afirma ela, que saiu da Praia do Pinto para o subúrbio da
Leopoldina na Cidade Alta.
Antes
da primeira Unidade de Polícia
Pacificadora (UPP) ser instalado no Rio de Janeiro como projeto da
Secretaria Estadual de Segurança com o objetivo de instituir polícias comunitárias em favelas,
principalmente na capital do estado, já havia esboços do que viriam a ser as
UPPs. Uma dessas experiências ocorreu com o Grupamento
de Aplicação Prático Escolar (GAPE), uma proposta no histórico Morro da
Providência, no Centro da cidade do Rio de Janeiro, em que recrutas faziam
parte de um laboratório de práticas comunitárias de policiamento. Esta
experiência seria a semente laboratorial desenvolvida por especialistas do Grupo de Policiamento em Áreas Especiais
(GPAE), que, comparativamente guarda poucas diferenças com as novas UPPs. Outra
experiência importante decorreu do Projeto
Mutirão da Paz, na favela conhecida como “Pereirão”, no bairro Laranjeiras,
em 1999. Segundo o site oficial da UPP-RJ, as experiências de Medellín
(Colômbia) também serviriam de inspiração para o futuro projeto de Unidades de Polícia Pacificadora - UPPs.
A
instalação do primeiro GPAE aconteceu em 2000, no Pavão-Pavãozinho e, nos anos
seguintes, receberam unidades os morros: Morro da Babilônia, Chapéu Mangueira,
Providência, Gardênia Azul e Rio das Pedras, na cidade do Rio de Janeiro; e
Morro do Cavalão e Morro do Estado, em Niterói. Em decorrência de conflitos
violentos, outras GPAE foram instaladas no Morro da Chácara do Céu, Morro da
Formiga e Morro da Casa Branca, todos na Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro.
Para Vila Cruzeiro, no bairro da Penha, também Zona Norte do Rio de Janeiro, o
GPAE ocorreu após o assassinato do jornalista Tim Lopes que trabalhava na rede
Globo de televisão. A primeira unidade de polícia pacificadora surgiu em meados
de 2008, no morro Dona Marta, em Botafogo, na Zona Sul do Rio. Após a
instalação da UPP na comunidade, os homicídios foram reduzidos a zero nos
quatro anos subsequentes. Os resultados da política de pacificação do governo
Sérgio Cabral Filho foram elogiados pelo New
York Times. Especialistas reconhecem que a inclusão da cidade para sediar
os Jogos Olímpicos de Verão (2016)
foi o impulso para os investimentos no programa, ampliação e mesmo trajetória
espaço das favelas escolhidas no mapa da pacificação.
Com
uma diminuição considerável do índice de criminalidade nas proximidades das
favelas pacificadas, o fim dos tiroteios é o principal ponto positivo apontado
pelos moradores das áreas pacificadas. Para o antropólogo Luís Eduardo Soares,
o fim dos tiroteios e da circulação de armas de fogo na mão de traficantes
possui ligação direta com a queda aparente dos índices de violência letal.
Também ocorrem as maiores facilidades para entrada de novos serviços prestados
à população. Apesar destes pontos consideravelmente positivos, os analistas
críticos lembram que tais melhorias ocorreram principalmente no primeiro
momento da instalação das unidades de polícia pacificadora. Tiroteios,
inicialmente ausentes nas favelas pacificadas, contudo, voltaram a ser rotina
principalmente no Complexo do Alemão, Vila Cruzeiro sendo emblemáticos os
tiroteios na Corrida pela Paz, do Complexo da Penha ao Complexo do Alemão,
entre bairros, e a morte da policial Alda Rafael Castilho em confronto no
Parque Proletário da Penha.
O ponto nevrálgico para a crítica às unidades
de polícia pacificadora foram as manifestações públicas de junho de 2013,
quando o caso do desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo na Rocinha,
analisados noutro lugar, se tornou um símbolo da crítica ao programa ou mesmo
ao reforço militar que as UPPs da Penha e Complexo do Alemão começaram a
receber em resposta aos ataques a policiais destas unidades. Este reforço
provocou movimentação de organizações e ambos os complexos de favelas, que
emitiram um manifesto público sobre a presença militar. Em termos culturais, as
favelas passaram por uma profunda mudança em seus hábitos. A Resolução 13
definiu as Unidades de Polícia Pacificadoras como “responsáveis pela
autorização de eventos dentro das favelas”, delimitando ainda mais a segregação
social. Com isso, ficaram prejudicados os eventos recreativos dos “bailes funk”
em geral, mesmo após a recente revogação da resolução. Atualmente em função das
estratégias de planejamento, moradores enfrentam dificuldades em realizar
eventos em suas próprias comunidades. Enfim, o Plano Estratégico de Intervenção
sob o governo do golpe de Estado de 2016, tendo como prócer Michel Temer, tem
80 páginas, 5 objetivos, 66 metas, e 70 ações, mas não diz quantos policiais
precisam ser treinados, quantos materiais devem ser comprados ou qual é a
redução de índices criminais que se pretende evidenciar.
Bibliografia geral consultada.
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Myth of Marginality: Urban Poverty and the Politics in Rio de Janeiro. Thesis PhD. Berkeley: University of
Califórnia Press, 1975; CASTRO, Celso, O
Espírito Militar: Um Estudo da Antropologia Social na Academia Militar das
Agulhas Negras. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990; CARVALHO, José Murilo, Desenvolvimiento de la Ciudadania en Brasil. México: Fondo de
Cultura Económica, 1995; KHAN, Túlio, As
Bases de Autenticação do Regime Autoritário. Tese de Doutorado em Ciência Política.
São Paulo: Universidade de São Paulo, 2002; BASSIOUNI, Mahmoud Cherif, La Cooperazione Internazionale per la
Prevenzione e la Repressione della Criminalitá Organizzata e del Terrorismo.
Milano: Dott. Antonino Giufrè Editore, 2005; AGUIAR, Maria Léa Monteiro de, “O
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entre Trafic, Police et Favelas à Rio de Janeiro”. In: Déviance et Société, volume 32, 2008; SANTOS, Eduardo
Heleno de Jesus, Extrema Direita, Volver! - Memória, Ideologia e Política
dos Grupos Formados por Civis e a Reserva Militar. Dissertação de Mestrado.
Instituto de Ciências Humanas e Filosofia. Departamento de Ciência Política. Niterói:
Universidade Federal Fluminense, 2009; FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão. 42 edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2014; FRANCO, Marielle, UPP - A Redução da Favela a Três Letras: Uma Análise da Política de
Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado em
Ciências. Programa de Pós-Graduação em Administração. Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2014; BETTO, Frei, Golpe en Brasil. Genealogia de una farsa. Em parceria com Noam Chomsky, Michael Löwy, Adolfo Pérez Esquivel, entre outros. Buenos Aires: Editorial Conselho Latino-americano de Ciências Sociais, 2016; LÖWY, Michael, “O Golpe de Estado de 2016 no Brasil”. In: https://blogdaboitempo.com.br/
2016/05/17; CAMARGO, Giovane
Matheus; BORDIN, Marcelo; SOUZA, Aknaton Toczek, “As Intervenções Federais no
Rio de Janeiro: A Hipermilitarização do Cotidiano”. In: Revista NEP - Núcleo
de Estudos Paranaenses. Curitiba, vol.4, nº2, dez. 2018; entre outros.
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