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sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Luiz Melodia - Artista Popular & Tipógrafo da Pérola Negra.

                                                                                                    Ubiracy de Souza Braga

Carnaval, carnaval, carnaval, eu fico triste quando chega o carnaval”. Luiz Melodia

Como “arte do efêmero”, a música não pode ser completamente reconhecida e por isso é tão difícil enquadrá-la inicialmente em sua dinâmica social, com a formação das cidades, em um conceito simples no âmbito da formação cultural. A música também pode ser definida como uma forma de linguagem que se utiliza da voz, instrumentos musicais e outros artifícios, para expressar algo a alguém. Um dos poucos consensos é que ela consiste em uma combinação de sons e de silêncios, numa sequência simultânea ou em sequências sucessivas e simultâneas que se desenvolvem ao longo do tempo social. Neste sentido, engloba toda combinação de elementos sonoros destinados a serem percebidos pela audição. Isso inclui variações nas características do som, caracterizados pela altura, duração, intensidade e timbre, sendo ainda que podem ocorrer sequencialmente o ritmo e a melodia, ou simultaneamente a harmonia. Ritmo, melodia e harmonia são entendidos aqui apenas em seu sentido de organização temporal, pois a música pode conter propositalmente harmonias ruidosas, que contém ruídos ou sons externos ao tradicional e arritmias com ausência de ritmo formal ou desvios rítmicos.

A música representa uma forma de arte que se constitui na combinação de vários sons e ritmos, seguindo uma pré-organização historicamente. É considerada por diversos autores como uma prática cultural e humana. Não se conhece nenhuma civilização ou agrupamento que não possua manifestações musicais próprias. Embora nem sempre seja feita com esse objetivo, a música pode ser considerada como uma forma de arte, considerada por muitos como sua principal função. A criação, a performance, o significado e até mesmo a definição de música variam de acordo com a cultura e o contexto social. A música vai desde composições fortemente organizadas e a sua recriação na performance, música improvisada até formas aleatórias. Pode ser dividida em gêneros e subgêneros, contudo as linhas divisórias e as relações entre gêneros musicais são muitas vezes sutis, algumas vezes abertas à interpretação socialmente do tipo individual e ocasionalmente controversas. Dentro das artes em geral, a música pode ser classificada como uma arte de representação social, uma arte sublime, uma arte de espetáculo. Definir a música sociologicamente, não é tarefa fácil porque apesar de ser intuitivamente reconhecida por qualquer pessoa, no âmbito histórico da sociologia é difícil encontrar um conceito que abarque todos os significados dessa prática.

Mais do que qualquer outra manifestação humana, a música contém e manipula o som e o organiza no tempo. Talvez por essa razão ela esteja sempre fugindo a qualquer definição, pois ao buscá-la, a música já se modificou, já evoluiu. E esse jogo do tempo é simultaneamente físico e emocional. E é nesse ponto que o consenso deixa de existir. As perguntas que decorrem desta simples constatação encontram diferentes respostas, se encaradas do ponto de vista social do criador (compositor), do executante (músico), do historiador, do filósofo, do antropólogo, do linguista ou do amador. Para indivíduos de muitas culturas, a música está extremamente ligada à sua vida. A música expandiu-se ao longo dos anos, e atualmente se encontra em diversas utilidades não só como arte, mas também como a militar, educacional ou terapêutica (musicoterapia). Além disso, tem presença central em diversas atividades coletivas, como os rituais religiosos, festas e funerais. Há evidências de que a música é reconhecida e praticada desde a pré-história. Provavelmente a observação dos sons da natureza tenha despertado no ser humano, através do sentido auditivo, a necessidade ou vontade de uma atividade que se baseasse na organização de sons. Embora nenhum critério científico permita estabelecer seu desenvolvimento de forma precisa, a história da música confunde-se com a própria história do desenvolvimento da inteligência e da cultura humana.   

                   

 Vale lembrar que o termo específico “música popular brasileira” (MPB) já era historicamente utilizado na vida cotidiana no início do século XX, sem, entretanto, definir um “movimento social” ou grupo de artistas e da popularidade de um gênero musical organizadamente determinado pelo processo de miscigenação na cidade. No ano de final da segunda guerra mundial (1945), o livro: “Música Popular Brasileira”, de Oneyda Alvarenga, relaciona o termo a “manifestações populares, como o bumba-meu-boi”. Somente duas décadas depois ganharia também a sigla Música Popular Brasileira e a concepção que se tem atual do termo. A música popular brasileira surgiu exatamente em um momento de declínio da Bossa Nova, gênero renovador na música brasileira, surgido na segunda metade da década de 1950, considerado um processo simultaneamente industrialista e desenvolvimentista do eixo urbano do Rio de Janeiro-São Paulo. Influenciado pelo jazz norte-americano, a a invenção da Bossa Nova deu novas marcas simbólicas ao samba tradicional. Mas na primeira metade da década de 1960, a Bossa Nova passaria por evidentes transformações culturais e, a partir de uma nova geração de compositores, o movimento chegaria ao fim já na segunda metade daquela década. Ipso facto, se as portas da percepção sobre o samba estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito.

Inicialmente, o estilo que seria conhecido como MPB era denominado como Música Popular Moderna (MPM), terminologia utilizada pela primeira vez em 1965, para identificar: a) canções que já se diferenciavam da bossa nova, b) que não eram samba, nem moda ou marchinha, c) mas, que aproveitavam simultaneamente a suavidade do repertório da bossa nova, d) o carisma das tradições regionais e o cosmopolitismo de canções norte-americanas, que se tornaram conhecidas do público brasileiro por meio do cinema. Um dos primeiros exemplos de canção rotulada como Música Popular Moderna foi “Arrastão”, de Edu Lobo e Vinícius de Moraes, que em 1965, interpretada por Elis Regina, venceu o 1º Festival de Música Popular da TV Excelsior. Em 1966, o samba “Pedro Pedreiro”, de Chico Buarque, também foi classificado como MPM, pois não era bossa nova, nem jovem guarda e nem música de protesto. Também em 1966, um conjunto vocal de Niterói, até então conhecido como “Quarteto do CPC”, sigla do Centro Popular de Cultura, adotou o nome “MPB 4”. Na virada da década de 1960 para a de 1970, deixou-se de adotar a sigla MPM que foi substituída pela sigla MPB – Música Popular Brasileira.              

A Música Popular Brasileira, não por acaso que é vagamente entendida como um estilo musical que iniciou-se em meados dos anos 1960, a tipos de música que surgiram, comparativamente após o início, origem e evolução da Bossa Nova. Todavia ideia do gênero musical “bossa negra” é antiga. - “Ela surgiu em Miami (Estados Unidos da América), em cima do palco, enquanto eu dava uma canja no show do Hamilton. Foi um “jam” que aconteceu sem ensaio. O repertório foi escolhido na hora e incluiu canções de artistas que admiramos - como Baden Powell e Vinícius de Moraes, e outros. O resultado foi ótimo e no camarim decidimos que tínhamos que levar a parceria adiante”, lembra Diogo Nogueira. Durante cinco anos os artistas mantiveram contato social e em 2014 conseguiram afinar as agendas de trabalho para a concretização da Bossa Negra. – “Começamos a montar o repertório e o processo todo, incluindo a produção do álbum, levou cerca de seis meses”, completa Hamilton de Holanda.
Nascido em 1951 no morro do Estácio, no Rio de Janeiro, Luiz Melodia bebeu do samba direto da fonte: o bairro é central na gênese do ritmo. Mas gostava também das guitarras da Jovem Guarda. Luiz Melodia iniciou sua carreira musical em 1963 com o cantor   Mizinho, ao mesmo tempo em que trabalhava como tipógrafo e músico em bares noturnos. Em 1964 formou o conjunto musical “Os Instantâneos”, com Manoel, Nazareno e Mizinho, tocando sucessos da chamada Jovem Guarda, um movimento cultural brasileiro surgido em meados da década de 1960, que mesclava música, comportamento e moda e no estilo musical da bossa nova, com o referido grupo formado com amigos. Essa experiência e a atmosfera lúdica em que vivia do tradicional samba dos morros cariocas resultaram em uma mescla de influências e de sentido de coisas e pessoas que proporcionaram a Luiz Melodia um estilo único de representação da música brasileira. Chamou à atenção de um frequentador do morro do Estácio, o poeta Wally Salomão e de Torquato Neto (1944-1972). Através de Wally, Gal Costa acabou reconhecendo um de seus compositores prediletos, resultando na gravação de “Pérola negra” no disco “Gal a todo vapor” (1972). Pouco depois era vez de “Estácio, Holly Estácio”, ganhar sua interpretação na voz grave da extraordinária Maria Bethânia. 

Foi nesta época historicamente que assumiu o nome de Luiz Melodia - apropriando o sobrenome artístico de seu pai Oswaldo -, e lançou em 1973 seu primeiro e antológico disco “Pérola negra”. Foi casado com a produtora e cantora Jane Reis, com quem tem o filho Mahal, também cantor/compositor, e integrante da dupla de hip hop Aliança 21 com/ Tigrão. Estácio é um bairro da Zona Central da cidade do Rio de Janeiro. Seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), no ano 2000, era de 0,829, o 70º melhor da cidade do Rio de Janeiro. O seu nome é uma homenagem ao fundador da cidade, o invasor Estácio de Sá. A tradicional Igreja do Divino Espírito Santo remonta ao século XVIII. Abriga ainda a sede da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro. O local onde se situa o atualmente o bairro do Estácio (RJ) já foi reconhecido pelo nome de Mata Porcos, devido ao fato de existir nas redondezas uma mata para onde fugiam alguns porcos de um matadouro situado no local. Posteriormente, como acesso ao bairro, foi aberto o Caminho de Mata-Porcos, depois renomeado para Rua Nova do Conde da Cunha, Rua da Sentinela e finalmente Rua Frei Caneca. Bairro inicialmente proletário, na gestão de Pereira Passos foi erguido uma vila operária ao longo da Av. Salvador de Sá, perto de onde se instalou a fábrica da cervejaria Brahma que posteriormente, em 1985, abasteceu o evento Rock`in Rio.   
Erguido com o nome de Casa de Correção da Corte, na época do imperador Pedro II, o Complexo Penitenciário Frei Caneca, um prédio que começou a ser erguido em 1850 no Centro do Rio de janeiro e que se transformou durante 150 anos em oito pavilhões – onde estiveram encarcerados presos políticos famosos internacionalmente, como o escritor Graciliano Ramos, que a publicação, naqueles anos, dos romances Caetés e São Bernardo, já tornara uma celebridade, foi preso em 3 de março de 1936, sem acusação formal, como ocorrera comparativamente com Luís Inácio da Silva, nestes dias, interrogatório ou processo mas suspeito de envolvimento com a Aliança Nacional Libertadora - ANL. Seu fim começou com a demolição, em 2003, do presídio feminino Nelson Hungria, transferido para o complexo de Bangu e da escola de gestão penitenciária. Em novembro de 2006, sua memória fora apagada, com a demolição da penitenciária Milton Dias Ferreira, assim como a de Lemos de Brito e Romero Neto.   
Machado de Assis era morador do bairro do Catete, na segunda metade do século XIX, a música que existia no Brasil estava dividida entre a popular, as polcas, por exemplo, e aquela apreciada pela elite social: a música clássica europeia e as óperas. Bellini, Donizetti e Rosini eram populares nos subúrbios dos bairros das principais cidades entre os brasileiros. O povo tocava violão, nos morros, nos subúrbios através dos fazia batuques enquanto cantava músicas com inspiração africana, influenciadas pelas polcas e valsas que vinham da Europa colonizadora. Conjuntos formados por brancos e mestiços de classe média tocavam em festas familiares, onde não havia piano. Os teatros de revista da Praça Tiradentes apresentavam tangos, maxixes e habaneras. A polca surgiu na Brasil em 1845 e fez extraordinário sucesso. Nos bailes de carnaval e nos clubes, tocavam polcas, maxixes, valsas e choros. Os seresteiros cantavam modinhas e lundus e se apresentavam, muitas vezes, em casas ricas com seu violão, escandalizando com seus temas sensuais e levando a música popular para os salões. 

Machado de Assis pôde assistir, no decorrer do século XIX e no começo do século XX, as alterações amplas e decisivas no cenário social e político internacional e nacional, nos costumes, nas ciências da natureza e da sociedade, nas técnicas e em quase tudo o que entende no âmbito do progresso material. Alguns estudiosos supõem, no entanto, erroneamente que as crenças antropológicas atribuídas a Machado de Assis como um escritor engajado são falsas e que ele não esperava nada ou quase nada da história e da política. Afrodescendente, testemunhou a tardia Abolição da Escravatura e a mudança política no país quando a República substituiu o Reinado, e foi grande comentador e relator dos eventos político-sociais. Suas crônicas estão repletas destes comentários. Em 1868, por exemplo, D. Pedro II demitiu o gabinete liberal de Zacarias de Góis e substitui-o pelo gabinete conservador de Itaboraí. Grêmios e jornais liberais acusaram a atitude do imperador de bonapartista. Machado de Assis testemunhou com simpatia aos liberais. Em 1895 com a morte de Joaquim Saldanha Marinho, liberal, maçom e republicano escreveu: - “Os liberais voltaram mais tarde, tornaram a sair e a voltar, até que se foram de vez, como os conservadores, e com uns e outros o Império”. Machado de Assis como afrodescendente e liberal não estava só, e era fervorosamente contrário à escravidão.

  Sua obra foi de fundamental importância para as escolas literárias brasileiras do século XIX e XX e surge nos dias de hoje como de grande interesse acadêmico e público. Influenciou grandes nomes das letras, como Olavo Bilac, Lima Barreto, Drummond de Andrade, John Barth, Donald Barthelme e outros. Para a as frações da classe dominante o óbice maior não vinha do nosso Estado constitucional, que representava o latifúndio e dele se servia: o obstáculo era interposto pela nova matriz internacional, a Inglaterra. Em seu tempo de vida, alcançou relativa fama e prestígio pelo Brasil, contudo não desfrutou de popularidade no exterior em função da divisão internacional do trabalho. Contudo, na modernidade tendo em vista sua inovação, imaginação e audácia em temas precoces e paradoxais, é frequentemente visto como o escritor brasileiro de produção intelectual sem precedentes, de modo que, recentemente, seu nome e sua obra têm alcançado diversos críticos literários, estudiosos e admiradores do mundo inteiro. Machado de Assis é considerado um dos grandes gênios da história da literatura, ao lado de autores como Dante, Shakespeare e Camões.  Entende-se a reivindicação do mais desenfreado laissez-faire, contrapondo-se no plano pragmático ou das ideias a hostilidade que despertava entre os proprietários o controle social da sua nação por um Estado-nação estrangeiro.

Mas como o denominador ideológico comum era o liberalismo econômico, que conhece na época a sua fase áurea, só restava à retórica escravista uma saída para o impasse. Demonstrar que as ideias mestras da doutrina clássica, porque justas deveriam aplicar-se com justeza às circunstâncias, tanto quanto às peculiaridades nacionais. A atenção e o respeito ostensivo ao particular, tão insistentes nos escritos conservadores de Edmund Burke, permeiam a ideologia romântico-nacional que vai de Francisco de Varnhagen a José de Alencar, de Vasconcelos a Olinda, de Paraná a Itaboraí. Será o topo maior da argumentação de cunho protelatório: dar tempo ao tempo, já que o Brasil colonizado e periférico não é a Europa, e é preciso respeitar as diferenças, que na interpretação de literária de Alfredo Bosi (1992: 195) tem como escopo analítico crítico a filtragem ideológica e contemporização. As estratégias do nosso liberalismo intra-oligárquico em todo o período em que se constituía o Estado nacional.

  Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Morro do Livramento, no centro do Rio de Janeiro, então capital do Império, em pleno Período Regencial. Seu pai  Francisco José de Assis, foi um mulato que pintava paredes, filho de Francisco de Assis e Inácia Maria Rosa, ambos pardos e escravos alforriados. A mãe foi a lavadeira Maria Leopoldina da Câmara Machado, portuguesa e branca, filha de Estevão José Machado e Ana Rosa. Consta que a família Machado de Assis imigrara para o Brasil em 1815, oriunda da Ilha de São Miguel, no arquipélago português dos Açores. Os pais de Joaquim Maria Machado de Assis sabiam ler e escrever, fato quase incomum naquele tempo e estratificação social. Ambos eram agregados da Dona Maria José de Mendonça Barrozo Pereira, esposa do falecido senador Bento Barroso Pereira, que abrigou seus pais permitindo morar com ela. As terras do Livramento eram ocupadas pela chácara da família de Maria José e já em 1818 o terreno começou a ser loteado de tão imenso que era dando origem à Rua Nova do Livramento. Maria José tornou-se madrinha do bebê e Joaquim Alberto de Sousa da Silveira, seu cunhado, tornou-se o padrinho, de modo que os pais de Machado resolveram homenagear os dois nomeando-o com seus nomes. 

Nascera junto a ele uma irmã, que morreu jovem, em seus 4 anos, em 1845. Iniciou seus estudos numa escola pública da região, mas aparentemente não se demonstrou interessado por ela. Ocupava-se também em celebrar missas, o que lhe fez conhecer o Padre Silveira Sarmento, que de acordo com certos biógrafos, se tornou seu mentor de latim e amigo. Os biógrafos notam hic et nunc que, interessado pela boemia e pela Corte, imiscuiu-se para subir socialmente abastecendo-se de superioridade e domínio intelectual. Para isso, assumiu diversos cargos técnicos públicos, passando pelo Ministério da Agricultura, do Comércio e das Obras Públicas, e conseguindo precoce notoriedade em jornais onde publicava suas primeiras poesias e crônicas. Em sua maturidade, reunido a colegas próximos, fundou e foi o primeiro presidente unânime da Academia Brasileira de Letras. Sua extensa obra constitui-se de nove romances e peças teatrais, duzentos contos, cinco coletâneas de poemas e sonetos, e mais de seiscentas crônicas. Fundou o periódico: “O Jequitinhonha”, com o seu cunhado Josefino Vieira em 1860, por meio do qual teria difundido o ideal republicano. No entanto, a República lhe trouxe muitos desagrados econômicos e políticos, mas como letrado percebeu um mundo em agonia, sendo “uma voz inquietante que fala baixo, mas provoca sempre”. 

Historicamente o bairro região abrigou até o final do século XX, a zona do meretrício da cidade que não era o único. O lado trágico dessa história higienista é que o lixo é um indicador curioso de desenvolvimento cultural de um bairro, classe ou nação. O bairro se define como uma organização coletiva de trajetórias individuais: com ele ficam postos à disposição dos seus usuários “lugares” na proximidade dos quais estes se encontram necessariamente para atender as suas necessidades cotidianas. Mas o contato interpessoal que se efetua nesses encontros é, também ele aleatório, não calculado previamente; define-se pelo acaso dos deslocamentos exigidos pelas necessidades da vida cotidiana: no elevador, na mercearia, no supermercado. Passando pelo bairro é impossível não encontrar algum “conhecido”, mas ainda permite dizer de antemão que e onde (na escadaria, na calçada).  Datam desse período as instalações hospitalares para atendimento materno-infantil São Francisco de Assis, junto à Estação Praça Onze do metrô. O bairro possui grande importância cultural por estar associado às origens do samba. Foi cantado nos versos de Noel Rosa e de outros compositores de primeira grandeza da música popular brasileira. É conhecido como o “Berço do Samba”, por ter visto nascer a Primeira Escola de Samba, em 1928, a agremiação “Deixa Falar”, fundada por Ismael Silva. Abriga a Escola de Samba Estácio de Sá, campeã do carnaval carioca dez vezes entre 1965 e 2015. A tradicional Igreja do Divino Espírito Santo remonta ao século XVIII. A Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro (PIBRJ) foi organizada em 24 de agosto de 1884, mas posteriormente foi transferida para o novo templo entre a Cidade Nova e o bairro do Estácio, no centro do Rio de Janeiro.          
O nome “Escola de Samba” foi criado pelo compositor Ismael Silva. De acordo com os registros, perto da sede da “Deixa Falar” havia uma escola normal. Então, os sambistas do bairro do Estácio eram chamados de “mestres” ou “professores”. E foi assim que viraram os verdadeiros mestres das primeiras escolas de samba do Rio de Janeiro.  A primeira Escola de Samba do Rio de Janeiro segundo historiadores do Carnaval foi a “Deixa Falar”, fundada em 1928 por sambistas do bairro do Estácio, bairro da região Central do Rio de Janeiro. Alguns desses fundadores da cultura popular aparecem misturados às pastoras da escola. Colorida de vermelho e branco, ela fez sucesso e estimulou a criação de outras agremiações. Os fundadores da Escola adaptaram o samba aos desfiles carnavalescos modernos, com a introdução do andamento mais rápido e a criação de novos instrumentos como o surdo de marcação e a cuíca. Foi aí que o samba-enredo começou a nascer. Antes de passar por uma fase de modernização, a festa era celebrada em Cordões Carnavalescos e Ranchos. Em seu livro “Blocos”, o jornalista João Pimentel relembra a importância social do grupo formado por Tião Maria, que inspirou a criação de outras agremiações: - “Talvez por estar localizado em uma região central da cidade, o Bafo da Onça reunia a Zona Norte e a Zona Sul, mas tinha sua base vital na animada população do bairro”.
Em 2003 o bloco desfilou juntamente com o “Bloco Cacique de Ramos” e o “Bloco Boêmio de Irajá”, como “hors concours” na Avenida Rio Branco, no centro da  cidade do Rio de Janeiro. Entre esses blocos e ranchos destacavam-se: “Rancho Carnavalesco União dos Caçadores” (campeão de vários carnavais); “Rancho Carnavalesco Unidos do Cunha”; “Rancho Carnavalesco Inocentes do Catumbi”; “Bloco Carnavalesco Astória Futebol Clube”, tricampeão de “Banho    Fantasia” na orla da praia de Copacabana e o “Bloco Carnavalesco Vai Quem Quer”, que apesar de pertencer ao bairro do Flamengo, portanto nas proximidades do Centro,  também desfilava nas ruas do Catumbi. No ano de 2011 a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro contabilizou estatisticamente 420 blocos inscritos para desfile nas ruas do centro da cidade e avenidas e ruas da Zona Sul (praias), dentre os quais o próprio Bafo da Onça, e do subúrbio carioca o Boêmio de Irajá, do subúrbio da Leopoldina o bloco Cacique de Ramos, integrando-se como os mais tradicionais da cidade do Rio de Janeiro. 
Em seu livro “Blocos”, o jornalista João Pimentel relembra a importância do grupo formado por Tião Maria, que inspirou a criação de outras agremiações: - “Talvez por estar localizado em uma região central da cidade, o Bafo da Onça reunia a Zona Norte e a Zona Sul, mas tinha sua base vital na animada população do bairro”. Em 2003 o bloco desfilou juntamente com o “Bloco Cacique de Ramos” e o “Bloco Boêmio de Irajá”, como “hors concours” na Avenida Rio Branco. Entre esses blocos e ranchos destacavam-se: “Rancho Carnavalesco União dos Caçadores” (campeão de vários carnavais); “Rancho Carnavalesco Unidos do Cunha”; “Rancho Carnavalesco Inocentes do Catumbi”; “Bloco Carnavalesco Astória Futebol Clube”, tricampeão de “Banho    Fantasia” na orla da praia de Copacabana e o “Bloco Carnavalesco Vai Quem Quer”, que apesar de pertencer ao bairro do Flamengo, portanto nas proximidades do Centro,  também desfilava nas ruas do Catumbi. No ano de 2011 a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro contabilizou estatisticamente 420 blocos inscritos para desfile nas ruas e avenidas e ruas da Zona Sul (praias), dentre o próprio Bafo da Onça, e do subúrbio carioca o Boêmio de Irajá, e da Leopoldina o bloco Cacique de Ramos, integrando-se como os mais tradicionais do Rio de Janeiro. A “Deixa Falar” virou samba de carnaval, influenciando não só sambistas morro do Estácio mas compositores profissionais.                
A Jovelina Pérola Negra, cujo nome de batismo era Jovelina Farias Delford, foi uma cantora e compositora brasileira e uma das grandes damas do samba. Voz rouca, forte, amarfanhada, de tom popular e força batente. Herdeira do estilo de Clementina de Jesus foi, como ela, empregada doméstica antes de fazer sucesso no mundo artístico. Nascida em Botafogo, Jovelina Pérola Negra logo fincou pé na Baixada Fluminense, em Belford Roxo. Apareceu para o grande público ao participar do histórico disco “Raça Brasileira”, em 1985. Pastora do Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano  ajudou a consolidar o pagode. Verdadeira tiete do partidário Bezerra da Silva, Jovelina Pérola Negra começou a demonstrar com voz e talento  seus pagodinhos no Vegas Sport Clube, no bairro de Coelho Neto, levada pelo amigo Dejalmir, que também lançou o nome artístico Jovelina Pérola Negra, “homenagem à sua cor reluzente”. Gravou cinco discos individuais conquistando um extraordinário Disco de Platina. Atualmente são encontradas apenas as coletâneas de obras musdicaisi com os grandes sucessos realizados como “Feirinha da Pavuna”, o extraordinário “Bagaço da Laranja”, gravado com Zeca Pagodinho, “Luz do Repente”, “No Mesmo Manto” e “Garota Zona Sul”, e outros. Infelizmente o sucesso chegou tardiamente ao mercado fonográfico e não realizou o sonho de “ganhar muito dinheiro e dar aos filhos tudo o que não teve”.  

Sua história social representa um testemunho de sofrimento, luta e superação na vida como mulher e artista. De empregada doméstica a vendedora ambulante de linguiça nunca desistiu do sonho de se tornar cantora. Era fã de Bezerra da Silva, e sob sua inspiração começou a fazer apresentações no Vegas Sport Clube, no bairro Coelho Neto, levada pelo amigo Dejalmir. Vale lembrar que foi o próprio Dejalmir quem escolheu seu nome artístico, Jovelina Pérola Negra, em homenagem a sua cor. De Coelho Neto foi para Belford Roxo e depois para o bairro de Madureira, onde no Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano desfilou anos a fio na ala das Baianas. Na Estrela de Madureira conheceu o cantor e sambista Roberto Ribeiro, Jorginho do Império e outros nomes consagrados da escola de Madureira. Começou a cantar ao lado desses artistas e virou atração no Show Botequim do Império, que acontecia na quadra da escola, durante os ensaios, para aumentar o caixa que financiava desfiles. Não se demorou em que seus fãs a considerassem herdeira naturais de Clementina de Jesus, herança das grandes vozes femininas do samba brasileiro.
Jovelina Pérola Negra, cujo nome de batismo era Jovelina Farias Delford, foi uma cantora e compositora brasileira e uma das grandes damas do samba. Voz rouca, forte, amarfanhada, de tom popular e força batente. Jovelina foi uma das peças mais importantes na condução do samba de fundo de quintal e do pagode para a linha de frente da MPB. A artista estreou na música tardiamente, em 1985, quando já tinha 40 anos, com sua participação em três faixas da coletânea Raça Brasileira. No ano seguinte a cantora gravava seu primeiro disco solo com sambas de sua autoria e de compositores como Nei Lopes e Monarco. Ao todo gravou seis discos, entre eles, “Sorriso Aberto”, em 1988, “Sangue Bom”, em 1991, “Vou da Fé”, em 1993, quando conquistou um disco de platina. Nascida em Botafogo, Jovelina Pérola Negra logo fincou pé na Baixada Fluminense, em Belford Roxo. Apareceu para o grande público ao participar do histórico disco “Raça Brasileira”, em 1985. Pastora do Império Serrano ajudou a consolidar o pagode. Verdadeira tiete do partidário Bezerra da Silva, Jovelina começou a dizer seus pagodinhos no Vegas Sport Clube, em Coelho Neto, levada pelo amigo Dejalmir, que também lançou o nome Jovelina Pérola Negra, “homenagem à sua cor reluzente”. Gravou cinco discos individuais conquistando um Disco de Platina. Atualmente são encontradas as coletâneas com os grandes sucessos como “Feirinha da Pavuna”, o extraordinário “Bagaço da Laranja”, gravado com Zeca Pagodinho, “Luz do Repente”, “No Mesmo Manto” e “Garota Zona Sul”, e outros. O sucesso chegou e não realizou o sonho de “ganhar muito dinheiro e dar aos filhos tudo o que não teve”. Jovelina morreu de enfarte, aos 54 anos, dormindo em casa, no bairro da Pechincha, região administrativa de Jacarepaguá, que em Tupi significa: enseada do lugar dos jacarés, através da junção dos termos îakaré (jacaré), paba (lugar) e kûá (enseada). 
Bibliografia geral consultada.

FAZITO, Dimitri, Transnacionalismo e Etnicidade: Romanesthán, Nação Cigana Imaginada. Belo Horizonte. Dissertação de Mestrado. Departamento de Sociologia e Antropologia. Universidade Federal de Minas Gerais, 2000; Idem, “A Identidade Cigana e o Efeito de Nomeação: Deslocamento das Representações numa Teia de Discursos Mitológico-Científicos e Práticas Sociais”. In: Rev. Antropol. Vol.49 n.°2 São Paulo July/Dec. 2006; GOÉS, Ludenbergue, Mulher Brasileira em Primeiro Lugar: O Exemplo e as Lições de Vida de 130 Brasileiras Consagradas no Exterior. São Paulo: Ediouro Publicações, 2007; SOUZA, Tárik, Tem Mais Samba: Das Raízes à Eletrônica. São Paulo: Editora 34, 2008; SANTOS, Michel Rosada dos, Nascentes e Tributários de um Rio Musical - Salve Estácio, Cidade Nova e Praça Onze dos Bambas! E a Vila de Noel...Só quer mostrar que faz samba também.... Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de janeiro, 2009; GOMES, Rodrigo, Samba no Feminino: Transformações das Relações de Gênero no Samba Carioca nas Três Primeiras Décadas do Século XX. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Música. Florianópolis: Universidade do Estado de Santa Catarina, 2011; GREGORY, Jonathan Alexander Araújo, Os Carnavais do Monobloco: Um Estudo Etnomusicológico sobre Blocos e Oficinas de Percussão no Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Música.  Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2012; SANCHES, Taísa de Oliveira Amendola, Cidade, Segregação Urbana e Política Habitacional no Rio de Janeiro: O Caso do Bairro Carioca. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Departamento de Ciências Sociais. Centro de Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 2015; ERMAKOFF, George; FRAGOSO, dom Mauro, Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro, 425 anos. 1590-2015. Rio de Janeiro: Casa Editorial, 2016; Artigo: Poucos Artistas Brasileiros foram tão originais quanto Luiz Melodia. In: https://www.correiobraziliense.com.br/app/2017/08/05/; entre outros. 

quarta-feira, 9 de março de 2016

Naná Vasconcelos – Mito & Bricoleur da Percussão Corporal.

                                             Ubiracy de Souza Braga

 Naná usava muita percussão corporal, e isso pros gringos era uma coisa que não existia na década de 1970”. Hoto Júnior
    

O momento histórico das disciplinas é o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que visa não unicamente o aumento técnico de suas habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto uma política das coerções que são um trabalho sobre o corpo, uma manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus comportamentos. O corpo humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma “anatomia política”, que é também igualmente uma “mecânica do poder”, está nascendo; ela define como se pode ter o domínio sobre o corpo dos outros, não simplesmente para que façam o que se quer, mas ara que operem como se quer, com as técnicas segundo a rapidez e a eficácia que se determina. A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos dóceis.  A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência). Em uma palavra: ela associa o poder do corpo; faz dele por um lado uma “aptidão”, uma “capacidade” que ela procura aumentar; e inverte por outro lado a energia, a potência que poderia resultar disso, e dela a relação de sujeição estrita.

O corpo, notoriamente, percorre a história da ciência e da filosofia. De Platão a Bergson, passando por Descartes, Espinosa, Merleau-Ponty, Freud, Marx, Nietzsche, Weber e Foucault, a definição de corpo demonstra um puzzle. Quase todos reconhecem a profusão da visão dualista de Descartes, que define o corpo como uma substância extensa em oposição à substância pensante. Podemos perceber que seguindo este modo de compreensão, sobretudo com o advento da modernidade, o corpo foi facilmente associado a uma máquina. O corpo foi pensado como um mecanismo elaborado por determinados princípios que alimentam as engrenagens desta máquina promovendo o seu bom funcionamento. Isto quer dizer que através dos exercícios de abstinência e domínio que constituem a ascese necessária, o lugar atribuído ao conhecimento de si torna-se mais importante: a tarefa de se pôr à prova, de se examinar, de controlar-se numa série de exercícios bem definidos, coloca a questão da verdade – da verdade do que se é, do que se faz e do que é capaz de fazer na constituição do sujeito moral. O ponto de chegada dessa elaboração é na e pela soberania do indivíduo sobre si mesmo.

Se a exploração econômica separa a força e o produto do trabalho, a coerção disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação acentuada. Entendida como consumo cultural, a prática do culto ao corpo situa-se como preocupação geral de mobilidade social, que perpassa a estratificação de classes sociais e faixas etárias, apoiada num discurso clínico difuso que se refere tanto a questão estética, quanto a preocupação alimentar com a saúde. Nas sociedades contemporâneas há uma crescente apropriação do corpo, com a dieta alimentar e o consumo excessivo de cosméticos, impulsionados pelo processo de massificação da propaganda/consumo a desde o desenvolvimento econômico dos anos 1980, onde o corpo ganha mais espaço, principalmente nos meios midiáticos. As fábricas de imagens estéticas do vencedor no cinema, televisão, publicidade, revistas etc., têm contribuído para isso. Ipso facto, nos leva a pensar que a imagem da eterna “fonte de juventude”, associada ao corpo perfeito ideal, ao sucesso na educação, no trabalho e na vida amorosa atravessa as etnias e classes sociais de maneiras diferentes em diversos estilos de vida.

            Para compreendermos a relação entre mito e música, em que Claude Lévi-Strauss desenvolve na parte inicial de Le Cru et le Cuit e também na parte final de L’Homme Nu (1971), na verdade, só ocorre quando o pensamento mitológico passou para segundo plano no pensamento ocidental da Renascença e do século XVIII, em que começaram a aparecer as primeiras novelas, em vez de histórias ainda elaboradas segundo o modelo da mitologia. Foi precisamente por essa altura que testemunhamos o aparecimento dos grandes estilos musicais, característicos do século XVII e, principalmente, dos séculos XVIII e XIX. Mais do que isso, o tema que deu origem à maior parte dos mal-entendidos, seja no mundo de língua inglesa, mas também em França, representado na ideia de que não havia uma única relação, mas dois tipos de relação – uma de similaridade e outra de contiguidade, possível para compreender um mito como uma sequência contínua. Fundamento da verdade não é, então, o mundo “material empírico”, mas o “mundo do pensamento”, que apreende a estrutura inteligível do real de análise. O espírito humano é compreendido como coextensivo ao mundo em que as leis da lógica exprimem as leis que estruturam a realidade.
Há cerca de duzentos anos, a ideia de que a verdade era produzida, e não descoberta começou a tomar conta do imaginário individual (o sonho) e coletivo (os mitos, os ritos, os símbolos) europeu. O precedente estabelecido pelos românticos conferiu a seu pleito uma plausibilidade inicial. O papel efetivo de romances, poemas, peças teatrais, quadros, estátuas e prédios no movimento social dos últimos 150 anos deu-lhe uma plausibilidade ainda maior, obtendo legitimidade, já que as ideias adquirem  força na história. Chamado de “el señor percusión” na Argentina e, reconhecido como “world`s most famous virtuoso of the berimbau” nos Estados Unidos da América, o pernambucano Juvenal de Holanda “Naná” Vasconcelos, tocou no Rio de Janeiro com Milton Nascimento no fim dos anos 1960 e, se apresentou em São Paulo com Geraldo Vandré - no III Festival Internacional da Canção, quando surgiram os “Especiais do Festival de Música Popular Brasileira”, pela TV Record, até o final da década de 1980, a televisão brasileira foi marcada pelo sucesso dos espetáculos transmitidos internacionalmente. Na década de 1970, Naná Vasconcelos ainda acompanhou jazzistas como Egberto Gismonti e Pat Metheny, entre outros, além de formar o grupo de jazz Codona, com o qual lançou 3 álbuns. Naná tem uma extensa carreira no exterior: atuou como percussionista ao lado de diversos e talentosos artistas representados por singularmente por B. B. King, Jean-Luc Ponty, David Byrne, Jon Hassell, Egberto Gismonti, Pat Metheny, Evelyn Glennie e Jan Garbarek.           

Formou entre os anos de 1978 e 1982, ao lado de Don Cherry e Collin Walcott, o grupo de jazz Codona. Em 1981, tocou no Woodstock Jazz Festival, realizado em 1981 em Woodstock, Nova York em comemoração ao 10º aniversário do Creative Music Studio. Em 1998, contribuiu com a música “Luz de Candeeiro” para o álbum “Onda Sonora: Red Hot + Lisbon”, compilação beneficente em prol do combate à AIDS, produzida pela Red Hot Organization, entidade internacional, sem fins lucrativos, dedicada ao combate à Aids através da cultura pop. No dia 9 de dezembro de 2015, Naná Vasconcelos recebeu o título de Doutor Honoris Causa na cidade de Recife junto à Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRuPE). E, por oito anos consecutivos (1983-1990), o prêmio de “Melhor Percussionista do Ano” da conceituada revista Down Beat, dedicada ao jazz. Seu primeiro número foi lançado em 1935, em Chicago. O seu nome deriva da expressão musical downbeat, também interpretado como ruído de “uma batida”. A Down Beat publica os resultados das enquetes anuais realizadas entre os seus leitores e críticos sobre uma grande variedade de categorias musicais. A Down Beat Jazz Hall of Fame inclui os vencedores das pesquisas feitas tanto entre os críticos como entre os leitores. Os resultados da enquete entre os leitores são publicados em dezembro e dentre os críticos em agosto; é considerada a “bíblia do jazz”. Em 2013, o músico fez a trilha sonora: “O Menino e o Mundo”, quando disputou o Óscar de melhor filme de animação em 2016.
       Esta é a razão por que devemos estar atentos e conscientes de que se tentarmos ler um mito da mesma maneira que lemos uma novela ou um artigo de jornal, ou seja linha por linha, da esquerda para a direita, não poderemos chegar a entender o mito. Isto porque, metodologicamente, seguindo a trilha aberta por Lévi-Strauss (1964; 1976; 1985; 1989) temos de apreendê-lo como uma totalidade e descobrir que o significado básico do mito não está ligado à sequência em que ocorrem os acontecimentos. Mas antes, se assim se pode dizer, a grupos de acontecimentos, ainda que tais acontecimentos ocorram em momentos distintos na história. Portanto, temos de ler o mito mais ou menos como leríamos uma partitura musical, pondo de parte as frases musicais e tentando entender a página inteira. Melhor dizendo, não só temos de apreedê-la da esquerda para a direita, mas simultaneamente, na vertical, de cima para baixo. Temos de perceber cada página como uma totalidade. E só considerando o mito como se fosse uma partitura orquestral. Escrita frase por frase, é que o podemos entender e descrever como uma totalidade e extrair o seu significado.            
       O objetivo de Claude Lévi-Strauss foi permanentemente o da consolidação de uma ciência social com um grau de objetividade e rigor presente nas ciências em geral. Para isso, seu programa estruturalista se fundamentava sob uma concepção metodológica interdisciplinar, sendo que a linguística se transformou em uma das principais disciplinas que inspiraram o estruturalismo lévi-straussiano. Sob a influência do linguista Roman Jakobson, de quem se torna colega nos Estados Unidos da América (EUA) nos anos 1940, e da obra de Ferdinand de Saussure, Lévi-Strauss concebe a idéia de que tanto na etnologia quanto na linguística, não é a análise comparativa que fundamenta a generalização, mas sim o contrário, uma vez que a atividade inconsciente do espírito é a de impor formas a um conteúdo, formas estas através de dimensões iguais para todos os espíritos. Por isso, seu objetivo principal através de um meticuloso exercício interpretativo é o de atingir a estrutura inconsciente, através de um encontro entre o método etnológico e o método linguístico. Não por acaso, para o autor a linguística é, dentre as ciências sociais, a que alcançou maiores progressos, isto porque esta ciência se preocupa em atingir a estrutura inconsciente (a da linguagem) e, toma como base da análise a relação entre os termos, além de introduzir a noção de sistema e de buscar descobrir leis gerais através de um processo cognitivo de indução.           
 
Naná Vasconcelos recebeu, na quarta-feira, dia 9/12/2015, o título de doutor honoris causa da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), localizada no bairro de Dois Irmãos, Zona Norte do Recife. O título foi concedido durante solenidade no salão nobre da universidade. Com o título, o doutor honoris causa recebe o mesmo tratamento que daquelas pessoas que fizeram tradicionalmente doutorado acadêmico. A iniciativa de entregar o título a Naná, considerado um dos grandes nomes da cultura pernambucana, brasileira e mundial, foi do Núcleo de Estudos Afro Brasileiros (Neab/UFRPE). Compareceram à solenidade amigos e parentes do artista, além da Ministra das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, Nilma Lino Gomes. Nascido no dia 2 de agosto de 1944, em Recife, Naná Vasconcelos é responsável por unir três continentes: Europa, África e América do Sul, com sua música através do berimbau. Ganhou 8 prêmios Grammy e, como vimos, menção da revista “Down Beat”, e outras notáveis publicações especializadas.
Não há na música e percussão brasileira trajetória igual. Naná Vasconcelos é dos poucos artistas brasileiros que subiu dialeticamente nos palcos do mundo quando não brilha num papel de relevo é porque está desempenhando o papel principal. Quando partiu para os mais famosos palcos da Europa e dos Estados Unidos da América (EUA), Naná já havia redesenhado, na falta de melhor expressão, com a mediação complexa entre cores vibrantes o papel e singularidade instrumental do “berimbau” na música popular mundial brasileira. O berimbau é um elemento fundamental na capoeira, sendo reverenciado pelos capoeiristas antes de iniciarem um jogo. Antropologicamente alguns praticantes o consideram um instrumento sagrado. Ele comanda a roda de capoeira, a jinga do corpo, dita o ritmo e o estilo de jogo. São dados nomes às variações de toques mais conhecidas, e quando se toca repetidamente um mesmo toque, diz-se que está jogando a capoeira daquele estilo. As variações mais comuns são “Angola” e “São Bento Grande”. Na capoeira, até três berimbaus podem ser tocados conjuntamente, cada um com uma função técnica mais ou menos definida.
Esteticamente o berimbau (Brasil) ou “hungo” (Angola) é um instrumento de corda de origem angolana, também conhecido como “berimbau de peito”, em Portugal, ou como “hungu” em Angola e em grande parte do continente africano. Em Angola, também é conhecido por “m`bolumbumba” e é utilizado entre os quimbundos, “ovambos”, “nyanekas”, “humbis” e “khoisan”. Este instrumento foi levado pelos escravos angolanos para o Brasil, onde é utilizado para acompanhar uma dança/luta acrobática chamada capoeira. No sul de Moçambique, tem o nome de “xitende”. O instrumento é internacionalmente conhecido por ser tema de uma canção popular de Baden Powell, grande violonista brasileiro. A letra da música foi escrita por Vinícius de Moraes. Considerado um dos maiores percussionistas do planeta, Naná Vasconcelos especializou-se em instrumentos brasileiros, em especial o berimbau, inclusive expandindo a sua técnica. Preservado na Bahia até o presente, o “berimbau” sempre foi um souvenir típico do Estado, vendido aos turistas muito mais como adorno que como instrumento - colorido e enfeitado, bem diferente daquele que os capoeiristas utilizam.
Naná, que aos 12 anos tocava profissionalmente em bares e clubes noturnos (onde lhe exigiam autorização judicial), ao lado do pai, aprendeu a tocar sozinho, usando as panelas de casa, ainda na infância. Não frequentou aulas de música, não ingressou na faculdade. Em entrevista concedida ao “Viver”, ele afirmou: - “Quando você aprende teoria musical por livros, precisa sempre consultar os textos. Quando você aprende com o corpo, é como andar de bicicleta. Seu corpo se lembra”. Em 2015, ele passou quase um mês internado para tratar do câncer no pulmão esquerdo, no mesmo centro médico onde veio a falecer. Um de seus últimos projetos foi o “Café no bule”, em parceria com Zeca Baleiro e Paulo Lepetit. Compostas a distância, por telefone e e-mail, e em encontros em São Paulo, as 10 faixas mesclam referências de vários ritmos, como jazz, afoxé, samba, maracatu e jazz. Entre elas, três vinhetas, espécie de “gole d’água ou de vinho”, ideia conspícua de Naná Vasconcelos, que gostava de brincar com construções onomatopeicas dentre a realidade que a mesma representa. A palavra tenta imitar, pois, o som natural da coisa significada. Traduz ruídos, gritos, a linguagem sonora dos animais, o som de máquinas, a voz humana, expressão de alguns sentimentos como a dor, o riso, o barulho que acompanha os fenômenos da natureza, instrumentos musicais, etc.
 
O governador pernambucano Paulo Câmara decretou luto oficial de três dias no Estado. - “Pernambuco acordou triste. O silêncio causado pelo desaparecimento de Naná Vasconcelos em nada combina com a força da sua música, dos ritmos brasileiros que ele, como poucos, conseguiu levar a todos os continentes. Naná era um gênio, um autodidata que com sua percussão inventiva e contagiante conquistou as ruas, os teatros, as academias. Meus sentimentos e a minha solidariedade para com os seus familiares”, diz o documento assinado pelo político. O prefeito do Recife, Geraldo Júlio, também lamentou o falecimento do mestre Naná Vasconcelos, homenageado do Carnaval do Recife (2013) e lembrou que, por 15 anos, o percussionista fez a abertura oficial da folia do Recife. Nas redes sociais, amigos e artistas de Naná Vasconcelos prestaram as últimas homenagens, incluindo o rapper Emicida, que colaborou com Naná na trilha da animação “O menino e o mundo”, e Gilberto Gil, que publicou uma foto antiga dos dois juntos. Eleito oito vezes o melhor percussionista do mundo pela revista americana Down Beat(votação feita pelos críticos musicais da revista) e ganhador de oito prêmios Grammy (brasileiro com mais prêmio Grammy), era considerado uma autoridade mundial em percussão. Dotado de uma curiosidade intensa, indo da música erudita do brasileiro Villa-Lobos ao roqueiro Jimi Hendrix, Naná Vasconcelos aprendeu a tocar praticamente todos os instrumentos de percussão, embora nos anos 1960 tenha se especializado no berimbau.
Bibliografia geral consultada:
LÉVI-STRAUSS, Claude, O Cru e o Cozido (Mitológicas I). São Paulo: Editora Brasiliense, 1964;  Idem, “O Descobrimento da Representação nas Artes da Ásia e da América”. In: Antropologia Estrutural. Rio de Janeiro: Editor Tempo Brasileiro, 1985; Idem, Mito e Significado. Lisboa: Edições 70, 1989; BACHMANN, Marie Laurie, La Rítmica Jacques-Dalcroze: Una Educación por la Música y para la Música. Madrid: Ediciones Pirámide, 1998;   ALMEIDA, Jorge, Ensino e Aprendizagem dos Alabês: Uma Experiência nos Terreiros Ilê Axé Oxumarê e Zoogodô Bogum Malê Rundô. Tese de Doutorado em Música. Salvador: Universidade Federal da Bahia,  2009; DI LUCA, Thiago, O Desenvolvimento de Competências Musicais a partir de Práticas Corporais e Criativas no Fazer Música em Grupo. Novo Hamburgo: Feevale, 2011; BOZZO JR., Carlos, “De como Juvenal se Tornou o Fenômeno Naná Vasconcelos”. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2013/05/11; DEMENECK, Ben-Hur, “Naná Vasconcelos - O Berimbau Global”. Disponível em: Revista Internacional de Folkcomunicação. Volume 11, nº 22, 2013; SOUZA FILHO, Florival José de, Candomblé na Cidade de Aracaju: Território, Espaço Urbano e Poder Público. Dissertação de Mestrado em Sociologia. Núcelo de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe, 2013; CRUZ, Norval Batista, Corpo, Ancestralidade, Oralidade e Educação no Ile Aiê Omo Tifê: O Corpo de Xangô. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira. Faculdade de Educação. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2013; AMORIM, Roberto Ricardo Santos de, Batucadeiros: Educação Musical por Meio da Percussão Corporal. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Brasília: Universidade de Brasília, 2016; CHAGAS, Paulo Henrique Barbosa Souza, O Berimbau de Naná Vasconcelos na Música Contemporânea. Dissertação de Mestrado. Departamento de Música. Universidade de Évora, 2016; entre outros.   
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* Sociólogo (UFF), Cientista político (UFRJ) e Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes. São Paulo: Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará (UECE).