“A necessidade, a natureza e a história não são mais do que instrumentos do Espírito”. Friedrich Hegel
Friedrich Hegel que parte da
análise da consciência comum, não podia situar como princípio primeiro
uma dúvida universal que só é própria da reflexão filosófica. Por isso mesmo
ele segue o caminho aberto pela consciência e a história detalhada de sua
formação. Ou seja, a Fenomenologia vem a ser uma história concreta da
consciência, sua saída da caverna e sua ascensão à Ciência. Daí a analogia que
em Hegel existe de forma coincidente entre a história da filosofia e a história
do desenvolvimento do pensamento, mas este desenvolvimento é necessário,
como força irresistível que se manifesta lentamente através dos filósofos, que
são instrumentos de sua manifestação. Assim, preocupa-se apenas em definir os
sistemas, sem discutir as peculiaridades e opiniões dos diferentes filósofos.
Na determinação do sistema, o que o preocupa é a categoria fundamental que
determina o todo complexo do sistema, e o assinalamento das diferentes etapas,
bem como as vinculasses destas etapas que conduzem à síntese do espírito
absoluto. Para compreender o sistema é necessário começar pela representação,
que ainda não sendo totalmente exata permite, no entender de sua obra a seleção
de afirmações e preenchimento do sistema abstrato de interpretação do
método dialético, para poder alcançar a transformação da representação
numa noção clara e exata. Assim, temos a passagem da representação abstrata, do conceito através do acúmulo de determinações. Aquilo
que por movimento dialético separa e distingue perenemente a identidade e a
diferença, sujeito e objeto, finito e infinito, é a alma vivente de todas as
coisas, a Ideia Absoluta que é a força geradora, a vida e o espírito eterno.
Mas a Ideia Absoluta
seria uma existência abstrata se a noção de que procede não fosse mais que uma
unidade abstrata, e não o que é em realidade, isto é, a noção que, por um giro
negativo sobre si mesma, revestiu-se novamente de forma subjetiva. Metodologicamente
a determinação mais simples e primeira que o espírito pode estabelecer é o Eu,
a faculdade de poder abstrair todas as coisas, até sua própria vida. Chama-se
idealidade precisamente esta supressão da exterioridade. Entretanto, o espírito
não se detém na apropriação, transformação e dissolução da matéria em sua
universalidade, mas, enquanto consciência religiosa, por sua faculdade
representativa, penetra e se eleva através da aparência dos seres até esse
poder divino, uno, infinito, que conjunta e anima interiormente todas as
coisas, enquanto pensamento filosófico, como princípio universal, a ideia
eterna que as engendra e nelas se manifesta. Isto quer dizer que o espírito
finito se encontra inicialmente numa união imediata com a natureza, a seguir em
oposição com esta, e finalmente em identidade com esta, porque suprimiu a
oposição e voltou a si mesmo e, consequentemente, o espírito finito é a ideia,
mas ideia que girou sobre si mesma e que existe por si em sua própria
realidade. A Ideia absoluta que para realizar-se colocou como oposta a si, à
natureza, produz-se através dela como espírito, que através da supressão de sua
exterioridade entre inicialmente em relação simples com a natureza, e, depois,
ao encontrar a si mesma nela, torna-se consciência de si, espírito que conhece
a si mesmo, suprimindo assim a distinção entre sujeito e objeto, tornando-se unidade perfeita de suas
diferenças, sua absoluta verdade.
Com o surgimento do espírito através da natureza abre-se a história da humanidade e a história humana é o processo que medeia entre isto e a realização do espírito consciente de si. A filosofia hegeliana centra sua atenção sobre esse processo e as contribuições mais expressivas de Hegel ocorrem precisamente nesta esfera, do espírito. Melhor dizendo, para Hegel, à existência na consciência, no espírito chama-se saber, conceito pensante. O espírito é também isto: trazer à existência, isto é, à consciência. Como consciência em geral tenho eu um objeto; uma vez que eu existo e ele está na minha frente. Mas enquanto o Eu é o objeto de pensar, é o espírito precisamente isto: produzir-se, sair fora de si, saber o que ele é. Nisto consiste a grande diferença: o homem sabe o que ele é. Logo, em primeiro lugar, ele é real. Sem isto, a razão, a liberdade não são nada. O homem é essencialmente razão. O homem, a criança, o culto e o inculto, é razão. Ou melhor, a possibilidade para isto, para ser razão, existe em cada um, é dada a cada um. A razão não ajuda em nada a criança, o inculto. É somente uma possibilidade, embora não seja uma possibilidade vazia, mas possibilidade real e que se move em si. Assim, por exemplo, dizemos que o homem é racional, e distinguimos muito bem o homem que nasceu somente e aquele cuja razão educada está diante de nós. Isto pode ser expresso também assim: o que é em si, tem que se converter em objeto para o homem, chegar à consciência; assim chega para ele e para si mesmo. A história para Hegel, é o desenvolvimento do Espírito no tempo, assim como a Natureza é o desenvolvimento da ideia no espaço. Deste modo o homem se duplica. Uma vez, ele é razão, é pensar, mas em si: outra, ele pensa, converte este ser, seu em si, em objeto do pensar.
Assim o próprio pensar
é objeto, logo objeto de si mesmo, então o homem é por si. A racionalidade
produz o racional, o pensar produz os pensamentos. O que o ser em si é se
manifesta no ser por si. Todo conhecer, todo aprender, toda visão, toda
ciência, inclusive toda atividade humana, não possui nenhum outro interesse
além do aquilo que filosoficamente é em si, no interior, podendo manifestar-se
desde si mesmo, produzir-se, transformar-se objetivamente. Nesta diferença se
descobre toda a diferença na história do mundo. Os homens são todos racionais.
O formal desta racionalidade é que o homem seja livre. Esta é a sua natureza.
Isto pertence à essência do homem: a liberdade. O europeu sabe de si, afirma
Hegel, é objeto de si mesmo. A determinação que ele conhece é a liberdade. Ele
se conhece a si mesmo como livre. O homem considera a liberdade como sua
substância. Se os homens falam mal de conhecer é porque não sabem o que fazem.
Conhecer-se, converter-se a si mesmo no objeto (do conhecer próprio) e o fazem
relativamente poucos. Mas o homem é livre somente se sabe que o é. Pode-se
também em geral falar mal do saber, como se quiser. Mas somente este saber
libera o homem. O conhecer-se é no espírito a existência. Portanto isto é o
segundo, esta é a única diferença da existência (Existenz) a diferença
do separável. O Eu é livre em si, mas também por si mesmo é livre e eu sou
livre somente enquanto existo como livre. A terceira determinação é que o que
existe em si, e o que existe por si são somente uma e mesma coisa. Isto quer
dizer precisamente evolução que lhe é própria na história da humanidade. O em
si que já não fosse em si seria outra coisa. Por conseguinte, haveria ali uma
variação, mudança. Na mudança existe algo que chega a ser outra coisa. Na
evolução podemos também sem dúvida falar da mudança, mas esta mudança deve ser
tal que o outro, o que resulta, é ainda idêntico ao primeiro, de maneira que o
simples, o ser em si não seja negado.
Para Friedrich Hegel a
evolução não somente faz aparecer o interior originário, exterioriza o concreto
contido já no em si, e este concreto chega a ser por si através dela,
impulsiona-se a si mesmo a este ser por si. O espírito abstrato assim adquire o
poder concreto da realização. O concreto é em si diferente, mas logo só em si,
pela aptidão, pela potência, pela possibilidade. O diferente está posto ainda
em unidade, ainda não como diferente. É em si distinto e, contudo, simples. É em
si mesmo contraditório. Posto que é através desta contradição impulsionado da
aptidão, deste este interior à qualidade, à diversidade; logo cancela a unidade
e com isto faz justiça às diferenças. Também a unidade das diferenças ainda não
postas como diferentes é impulsionada para a dissolução de si mesma. O distinto
(ou diferente) vem assim a ser atualmente, na existência. Porém do mesmo modo
que se faz justiça à unidade, pois o diferente que é posto como tal é anulado
novamente. Tem que regressar à unidade; porque a unidade do diferente consiste
em que o diferente seja um. E somente por este movimento é a unidade
verdadeiramente concreta. É algo concreto, algo distinto. Entretanto contido na
unidade, no em si primitivo. O gérmen se desenvolve assim, não muda. Se o
gérmen fosse mudado desgastado, triturado, não poderia evoluir. Na alma,
enquanto determinada como indivíduo, as diferenças estão enquanto mudanças que
se dão no indivíduo, que é o sujeito uno que nelas persiste e, segundo Hegel,
enquanto momentos do seu desenvolvimento.
Por serem elas diferenças, à uma, físicas e espirituais, seria preciso, para determinação ou descrição mais concreta, antecipar a noção do “espírito cultivado”. As diferenças são: 1) curso natural das idades da vida, desde a criança, desde a criança, o espírito envolvido em si mesmo – passando pela oposição desenvolvida, a tensão de uma universalidade ela mesma ainda subjetiva em contraste com a singularidade imediata, isto é, como o mundo presente, não conforme a tais ideais, e a situação que se encontra, em seu ser-aí para esse mundo, o indivíduo que, de outro lado, está ainda não-autônomo e em si mesmo não está pronto (o jovem) – para chegar à relação verdadeira, ao reconhecimento da necessidade e racionalidade objetivas do mundo já presente, acabado; em sua obra, que leva a cabo por si e para si, o indivíduo retira, por sua atividade, uma confirmação e uma parte, mediante a qual ele é algo, tem uma presença efetiva e um valor objetivo; até a plena realização da unidade com essa objetividade do conhecer: unidade que, enquanto real, vem dar na inatividade da rotina que tira o interesse, enquanto ideal se liberta dos interesses mesquinhos é das complicações do presente exterior (o ancião). O espírito manifesta aqui sua independência da própria corporalidade, em poder desenvolver-se antes que nela torne. Com frequência, crianças têm demonstrado um desenvolvimento espiritual que vai muito mais rápido que sua formação corporal. Esse foi o caso histórico, sobretudo em talentos artísticos indiscutíveis, em particular no gênios da música. Também em relação ao fácil apreender de variados conhecimentos, especialmente na disciplina matemática; e tal precocidade tem-se mostrado não raramente também em relação a um raciocínio de entendimento, e mesmo sobre objetos éticos e religiosos. O processo de desenvolvimento do indivíduo humano natural decompõe-se então em uma série de processos, cuja diversidade se baseia sobre a relação do indivíduo para com o gênero, e funda a diferença da criança, do homem e do ancião. Essas diferenças são as apresentações das diferenças do conceito. A idade da infância é o tempo da harmonia natural, da paz do sujeito consigo mesmo e com o mundo. Um começo tão sem-oposição quanto a velhice é um fim sem-oposição.
As oposições que surgem ficam sem interesse mais profundo. A criança vive na inocência, sem sofrimento durável; no amor aos seus pais, e no sentimento de ser amado por eles. Onde reina só a imaginação, ela empenha-se em construir castelos no ar a lisonjear o egoísmo e o capricho pessoal, a enganá-los momentaneamente e a diverti-los; mas neste caso, conhecemos sempre, para falar com propriedade, apenas as relações das quimeras assim combinadas. Talvez ponha por escrito os sonhos da sua imaginação: é daí que nos vêm esses romances ordinários, de todos os gêneros, que fazem a alegria do grande público e das pessoas semelhantes aos seus atores, visto que o leitor sonha que está no lugar do herói, e acha tal representação bastante agradável. A história da matemática é uma área de estudo dedicada à investigação sobre a origem das descobertas da matemática e, em uma menor extensão, à investigação dos métodos matemáticos e aos registros etnográficos ou notações matemáticas do passado. A matemática islâmica, por sua vez, desenvolveu e expandiu a matemática conhecida destas civilizações. Muitos textos gregos e árabes sobre matemática foram então traduzidos ao Latim, o que contribuiu com o desenvolvimento da matemática na Europa medieval. Dos tempos antigos à Idade Média, a eclosão da criatividade matemática foi frequentemente por séculos de estagnação. Começando no Renascimento e a partir daí a revelação de novos talentos e progressos técnicos da matemática, interagindo com as descobertas científicas, realizados de forma crescente, continuando decerto sem paixão. Deve ser suprassumida como unidade imediata do indivíduo com seu gênero e com o mundo em geral; é preciso que o indivíduo progrida a ponto de se contrapor ao universal, como a Coisa assente-para-si, pronto e subsistente; e de apreender-se em sua autonomia. Essa autonomia, essa oposição, apresenta em uma figura tão unilateral quanto, na criança, a unidade do subjetivo e do objetivo.
O jovem desagrega a ideia efetivada no mundo, de modo a atribuir-se a si mesmo a determinação do substancial: o verdadeiro e o bem; e atribui ao mundo, pelo contrário, a determinação do contingente, do acidental. Não se pode ficar nessa oposição não-verdadeira: o jovem deve, antes, elevar-se acima da dela à inteligência de que, ao contrário, deve-se considerar o mundo como o substancial, e o indivíduo, inversamente, só como um acidente; e que, portanto, o homem só pode encontrar sua ativação e contentamento essenciais no mundo que se lhe contrapõe firmemente, que segue seu curso com autonomia; e que, por esse motivo, deve conseguir a aptidão necessária para a Coisa. Chagado a esse ponto de vista, o jovem tornou-se homem. Pronto em si mesmo, o homem considera também a ordem ética do mundo não como a ser produzida só por ele, mas como uma ordem pronta, no essencial. Assim ele é ativo pela Coisa, não contra ela; assim se mantém elevado, acima da subjetividade unilateral do jovem, no ponto de vista da espiritualidade objetiva. A velhice, ao contrário, é o retorno ao desinteresse pela Coisa; o ancião habituou-se a viver dentro da Coisa, e por causa dessa unidade (que faz perder a oposição em relação à Coisa) renuncia à atividade de interesse por ela. É bem verdade que a liberdade no pensamento tem somente o puro pensamento por sua verdade; e verdade sem a implementação da vida. Por isso, para Hegel, é ainda só o conceito da liberdade, não a própria liberdade viva. Com efeito, para ela a essência é só o pensar em geral, a forma coo tal, que afastando-se da independência das coisas retornou a si mesma. Mas porque a individualidade, como individualidade atuante, deveria representar-se como viva; ou, como individualidade pensante, captar o mundo vivo como um sistema de pensamento; então teria de encontrar-se no pensamento mesmo, para aquela expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do agir, um conteúdo do que é bom, e para essa expansão do pensamento, um conteúdo do que é verdadeiro.
Com isso não haveria, absolutamente nenhum outro ingrediente, naquilo que é para a consciência, a não ser o conceito que é a essência. Porém, aqui o conceito enquanto abstração, separando-se da multiplicidade variada das coisas, não tem conteúdo nenhum em si mesmo, exceto um conteúdo que lhe é dado. A consciência, quando pensa o conteúdo, o destrói como um ser alheio; mas o conceito é conceito determinado e justamente essa determinidade é o alheio que o conceito possui nele. Esta unidade do existente, o que existe, e do que é em si é o essencial da evolução. É especulativo, esta unidade do diferente, do gérmen e do desenvolvido. Ambas estas coisas são duas e, no entanto, uma. Titane tem como representação social um filme de drama psicológico de terror corporal de 2021, escrito e dirigido por Julia Ducournau, nascida em 18 de novembro de 1983. É uma cineasta francesa cujos filmes usualmente se enquadram no subgênero de horror corporal. Ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes de 2021 pelo filme Titane, o que a tornou a segunda diretora a ganhar o prêmio, bem como a primeira a ganhar o prêmio sozinha. Estreou nos cinemas com o curta-metragem Junior (2011). O filme ganhou o Petit Rail d`Or no Festival de Cannes. Em 2012, Ducournau lançou o telefilme Mange, que acompanha uma bulímica em recuperação que busca vingança de seu algoz da faculdade. Em 2016, lançou seu primeiro longa-metragem, Raw. O projeto foi desenvolvido através do programa Torino Film Lab Framework em 2013. Raw foi exibido na seção Semana da Crítica, no Festival de Cinema de Cannes de 2016. É uma mostra paralela que integra a programação oficial do Festival de Cannes. Foi fundada em 1962 e é organizada pelo Sindicato Francês de Críticos de Cinema. Foi criada após a exibição do filme The Connection dirigida por Shirley Clarke, que foi organizado pelo Sindicato Francês de Críticos de Cinema para o Festival de Cannes (1961).
Em outubro de 2016, ganhou o Prêmio Sutherland de Melhor Primeira Longa no Festival de Cinema de Londres. O crítico David Fear, da Rolling Stone, o considerou candidato ao título de “melhor filme de terror da década”. Em 2021, o segundo longa-metragem de Ducournau, Titane, foi comprado pela distribuidora Neon. Por Titane, Ducournau recebeu a Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes de 2021, onde o filme teve sua estreia mundial. Ducournau é a segunda cineasta a vencer depois de Jane Campion em 1993 por The Piano e a primeira a vencer não em conjunto com outro diretor. Campion venceu em conjunto com Chen Kaige, por Farewell My Concubine. Ela é a segunda entre cinco mulheres nomeada para o Oscar de Melhor Direção e a primeira cineasta feminina na história a receber a Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes, a qual lhe foi concedida em reconhecimento ao seu trabalho no filme O Piano (1993), um sucesso comercial e de crítica, e arrecadou 140 milhões de dólares em todo o mundo, contra um orçamento de 7 milhões. Hunter e Paquin receberam muitos elogios por suas atuações. Em 1993, o filme ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes, tornando Campion a primeira e única diretora a receber o prêmio. Ele ganhou três Oscars de um total de oito indicações em março de 1994: Melhor Atriz para Hunter, Melhor Atriz Coadjuvante para Paquin e Melhor Roteiro Original para Campion. Paquin tinha 11 anos na época e continua sendo a segunda pessoa mais jovem a ganhar um Oscar em uma categoria competitiva, pelo qual também ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original. Em 2022, recebeu seu primeiro Oscar de Melhor Direção, pelo filme The Power of the Dog e se tornou a primeira mulher nomeada duas vezes na categoria. Ducournau também recebeu uma indicação de Melhor Diretor no 75º British Academy Film Awards.
A coprodução franco-belga é estrelada por Agathe Rousselle em sua estreia no cinema como Alexia, “uma mulher que, após ser ferida em um acidente de carro na infância, tem uma placa de titânio implantada em sua cabeça”. Na vida adulta, Alexia se torna uma modelo de carros com uma fascinação erótica por automóveis, o que leva a um encontro sexual bizarro que desencadeia uma série de eventos cada vez mais extravagantes. Vincent Lindon, Garance Marilliere Laïs Salameh também estrelam. Do ponto de vista teórico, histórico e pontual a mecanofilia tem sido usada para descrever obras importantes dos primeiros modernistas, incluindo o Manifesto Excêntrico (1922), escrito por Leonid Trauberg, Sergei Yutkevich, Grigori Kozintsev e outros, membros da Fábrica do Ator Excêntrico, um movimento de vanguarda modernista que abrangia o futurismo russo e o construtivismo. O termo entrou nos domínios da ficção científica e da ficção popular. Cientificamente, em Biofilia – O Vínculo Humano com Outras Espécies, de Edward O. Wilson, Wilson é citado descrevendo a mecanofilia, o amor pelas máquinas, como “um caso especial de biofilia”, enquanto psicólogos como Erich Fromm a veriam como uma forma de necrofilia. Diz-se que designers como Francis Picabia e Filippo Tommaso Marinetti exploraram a atração sexual dos automóveis. Os humanos adquirem cultura por meio dos processos de aprendizagem de enculturação e socialização, o que é demonstrado pela diversidade de culturas nas sociedades. No cinema, culturalmente falando, os críticos descreveram-no como “onipresente” na sociedade ocidental contemporânea e que parece dominar a nossa sociedade e, muitas vezes, o nosso bom senso. Embora nem todos esses usos tenham intenção sexual, os termos também são usados para a fixação especificamente erotogênica em máquinas e levados ao extremo na pornografia hardcore como Máquinas de Foder. Isso envolve principalmente mulheres sendo penetradas sexualmente por máquinas para consumo masculino, o que é visto como os limites da biopolítica sexual atual.
A Arse Elektronika, uma conferência anual organizada pelo coletivo austríaco de artes e filosofia monochrom, propagou uma abordagem DIY/feminista às máquinas sexuais. Os autores estabeleceram uma ligação entre a mecanofilia e a militarização masculina, citando as obras do animador Yasuo Ōtsuka e do Studio Ghibli. O filme francês de 1973, La Grande Bouffe, inclui “uma cena em que um homem e um carro copulam, com consequências fatais”. O filme Crash, de David Cronenberg, lançado em 1996, retrata “um culto de pessoas fascinadas por acidentes de carro”. O filme francês Titane, vencedor da Palma de Ouro em 2021, retrata cenas de uma mulher mecanofílica fazendo sexo com carros. Uma norma cultural codifica a conduta aceitável na sociedade; serve como uma diretriz para comportamento, como vestimenta, linguagem e comportamento em uma situação, que serve como um modelo para expectativas em um grupo social. Aceitar apenas uma monocultura em um grupo social pode trazer riscos, assim como uma única espécie pode definhar diante de uma mudança ambiental, por falta de respostas funcionais à mudança. Assim, na cultura militar, a coragem é contada como um comportamento típico de um indivíduo, e o dever, a honra e a lealdade ao grupo são contadas como virtudes ou respostas funcionais no continuum do conflito. Na religião, atributos análogos podem ser identificados em um grupo social. Mudança cultural, ou reposicionamento, é a reconstrução de um conceito cultural de uma sociedade. As culturas são afetadas internamente tanto por forças que incentivam quanto por forças que resistem às mudanças. As culturas são afetadas externamente pelo contato entre sociedades. A UNESCO tentam preservar a cultura e o patrimônio cultural. A cultura é um conceito central na antropologia, abrangendo a gama de fenômenos que são transmitidos através da aprendizagem social nas sociedades humanas, que compartilham universais culturais, como arte, música, dança, ritual, religião e tecnologias como uso de ferramentas, culinária, abrigo e vestuário.
O conceito de cultura
material abrange as expressões físicas da cultura, como tecnologia,
arquitetura e arte, enquanto os aspectos imateriais da cultura, como princípios
de organização social (incluindo práticas de organização política e
instituições sociais), mitologia, filosofia, literatura (escrita e oral) e
ciência compreendem o patrimônio cultural intangível de uma sociedade. Nas
humanidades, um sentido de cultura como um atributo do indivíduo tem sido o
grau em que eles cultivaram um nível particular de sofisticação nas artes,
ciências, educação ou costumes. O nível de sofisticação cultural também
tem sido usado às vezes para distinguir civilizações de sociedades menos
complexas. Essas perspectivas hierárquicas sobre cultura também são encontradas
em distinções baseadas em classe entre uma alta cultura da elite social e uma
baixa cultura, cultura popular ou cultura folclórica das classes mais pobres,
distinguidas pelo acesso estratificado ao capital cultural. Na linguagem comum,
cultura é frequentemente usada para se referir especificamente aos
marcadores simbólicos usados por grupos étnicos para se distinguirem
visivelmente uns dos outros, como modificações corporais, roupas ou joias. O
conceito de cultura de massa cotidianamente se refere às formas de cultura de
consumo produzidas em massa e mediadas em massa que surgiram no século XX.
Algumas escolas de filosofia, como o marxismo e a teoria crítica, argumentam que a cultura é frequentemente usada politicamente como uma ferramenta das elites para manipular o proletariado e criar uma falsa consciência. Essas perspectivas são comuns na disciplina de estudos culturais. Nas ciências sociais mais amplas, a perspectiva teórica do materialismo cultural sustenta que a cultura simbólica surge das condições materiais da vida humana e que a base da cultura é encontrada em disposições biológicas evoluídas. Quando usado como um substantivo contável, uma cultura é o conjunto de costumes, tradições e valores de uma sociedade ou comunidade, como um grupo étnico ou nação, e o conhecimento adquirido ao longo do tempo. Nesse sentido, o multiculturalismo valoriza a coexistência pacífica e o respeito mútuo entre diferentes culturas que habitam o mesmo planeta. Às vezes, o termo “cultura” também é utilizado comparativamente para descrever práticas específicas dentro de um subgrupo de uma sociedade, uma subcultura ou uma contracultura. Dentro da antropologia cultural, a ideologia e a postura analítica do relativismo cultural sustentam que as culturas não podem ser facilmente classificadas ou avaliadas objetivamente porque qualquer avaliação está necessariamente situada dentro do sistema de valores de uma determinada cultura elucidado na esteira da filosofia. A cultura, que caracteriza as sociedades humanas, é organizada/organizadora via o veículo cognitivo da linguagem, a partir, segundo Morin (1998, 2008), do “capital cognitivo coletivo” dos conhecimentos adquiridos, das competências aprendidas, das experiências vividas, da memória histórica, das crenças míticas de uma sociedade. E, dispondo de seu capital cognitivo, a cultura institui as regras/normas que organizam a sociedade e governam os comportamentos individuais.
Estas regras geram processos sociais e regenera globalmente a
complexidade social adquirida por essa mesma cultura. Assim, a cultura não deve
ser compreendida pelas metáforas estruturais, que são termos impróprios em uma
organização recursiva onde o que é produzido e gerado torna-se produtor e gerador
daquilo que o produz ou gera. Isso facto, cultura e sociedade estão em relação
geradora mútua; nessa relação, não podemos esquecer as interações entre
indivíduos, eles próprios portadores ou transmissores de cultura, que regeneram
a sociedade, a qual regenera a cultura. Daí a tese sociológica segundo a qual,
“se a cultura contém um saber coletivo acumulado em uma memória social, se é
portadora de princípios, modelos, esquemas de conhecimento, se gera uma visão
de mundo, se a linguagem e o mito são partes constitutivas da cultura, então a
cultura não comporta somente uma dimensão cognitiva: é uma máquina cognitiva
cuja práxis é cognitiva”. É neste sentido próprio de saber cognitivo que uma
cultura abre e fecha as potencialidades bioantropológicas do conhecimento. Ela
as abre e atualiza fornecendo aos indivíduos o seu saber acumulado, a sua
linguagem, os seus paradigmas, a sua lógica, os seus esquemas, os seus métodos
de aprendizagem, métodos de investigação, de verificação, etc., mas, ao mesmo
tempo, ela as fecha e inibe com as suas normas, regras, proibições, tabus,
o seu etnocentrismo, a sua autossacralização, a sua ignorância de
ignorância.
Ainda aqui, o que abre o conhecimento é o que fecha o conhecimento. Desde o seu nascimento, o ser humano conhece não só por si, para si, em função de si, mas, também pela sua família, pela sua tribo, pela sua cultura, pela sua sociedade, para elas, em função delas. Assim, o conhecimento de um indivíduo alimenta-se de memória biológica e de memória cultural, associadas na própria memória, que obedece a várias entidades de referência, diversamente presentes nela. Tudo o que é linguagem, lógica, consciência, tudo o que é espírito e pensamento, constitui-se na encruzilhada dialógica entre dois princípios de tradução, um contínuo, o outro descontínuo (binário). As aptidões individuais organizadoras do cérebro humano necessitam de condições socioculturais para se atualizarem, as quais necessitam das aptidões do espírito humano para se organizarem individual e socialmente. A cultura está nos espíritos, vive nos espíritos, os quais estão na cultura, vivem na cultura. Meu espírito conhece através da minha cultura, vivem na cultura. Meu espírito conhece através da minha cultura, mas, em certo sentido, a minha cultura conhece através do meu espírito. Assim, portanto, as instâncias produtoras do conhecimento se coproduzem simultaneamente umas às outras; há uma unidade recursiva complexa estabelecida entre produtores e produtos do conhecimento, ao mesmo tempo em que há relação hologramática entre cada uma das instâncias, cada uma contendo as outras e, nesse sentido, cada uma contendo o todo enquanto todo. Falar em complexidade é falar respectivamente em relação de interação per se complementar, concorrente, antagônica, recursiva e hologramática entre essas instâncias cogeradoras do reconhecimento humano. Mas não é apenas essa complexidade que permite compreender a possível autonomia relativa do espírito (faculdades intelectuais) e no sentido técnico do cérebro individual. Mas é assim mesmo que o espírito individual pode autonomizar-se em relação à sua determinação biológica. Recorrendo às suas fontes e recursos socioculturais.
Em relação à
determinação cultural utilizando sua aptidão bioantropológicas para organizar o
conhecimento. O espírito individual pode alcançar a sua autonomia jogando com a
dupla dependência que, ao mesmo tempo, o constrange, limita e alimenta. Pode
jogar, pois há margem, entre hiatos, aberturas, defasagens. Entre o
bioantropológico e o sociocultural, o ser individual e a sociedade. Assim, a
possibilidade de autonomia do espírito individual está inscrita no princípio de
seu conhecimento. E isso em nível de seu conhecimento cotidiano, quanto em
nível de pensamento filosófico ou científico. A cultura fornece ao pensamento
as suas condições sociais e materiais de formação, de concepção, de
conceptualização. Impregna, modela e eventualmente governa os conhecimentos
individuais. A cultura e, pela via da cultura, a sociedade está no interior do
conhecimento. O conhecimento está na cultura e a cultura está na representação
do conhecimento. Um ato cognitivo per se é, ipso facto, um elemento do complexo
cultural coletivo que se atualiza em um ato cognitivo individual.
As nossas percepções ou mesmo concepções estão sob um controle, não apenas de constantes fisiológicas e também psicológicas, mas níveis de variáveis culturais e históricas. A percepção é submetida a categorizações, conceptualizações, taxinomias, que influenciarão o reconhecimento e a identificação das cores, das formas, dos objetos. O conhecimento intelectual organiza-se em função de paradigmas que selecionam, hierarquizam, rejeitam as ideias sociais e as técnicas, bem como em função de significações mitológicas e de projeções imaginárias. Assim se opera a “construção social da realidade”, ou antes, a “co-construção social da realidade”, visto que a realidade se constrói também a partir de dispositivos cerebrais, em que o real (imagem) se consubstancializa e se dissocia do irreal (ficção), que constitui a visão de mundo, que se concretiza em verdade, em erro, na mentira. Para conceber a sociologia do conhecimento, é necessário, segundo Edgar Morin, conceber não só o enraizamento do conhecimento na sociedade e a interação social do conhecimento/na sociedade. Mas no anel recursivo no qual o conhecimento é produto/produtor sociocultural que comporta uma dimensão própria cognitiva. Os homens de uma cultura, pelo seu modo de conhecimento, produzem a cultura que produz seu reconhecimento. A cultura gera os conhecimentos que regeneram a cultura. Ao considerar-se a que ponto o conhecimento é produzido por uma cultura, dependente de uma cultura, integrado a uma cultura, pode-se ter a impressão de que nada seria capaz de libertá-lo. Mas isso seria, sobretudo, ignorar as potencialidades de autonomia relativa, no interior de todas aquelas culturas, dos espíritos individuais. Os indivíduos não são todos, e nem sempre, mesmo nas condições culturais mais fechadas, máquinas triviais obedecendo impecavelmente à ordem social e às injunções culturais.
Isso seria ignorar que toda cultura está vitalmente aberta ao mundo exterior, de onde tiram conhecimentos objetivos e que conhecimentos e ideias migram entre as culturas. Seria ignorar que aquisição de uma informação, a descoberta de um saber, a invenção de uma ideia, podem modificar e transformar uma sociedade, mudar o curso da história. Assim, o conhecimento está ligado, por todos os lados, à estrutura da cultura, à organização social, à práxis histórica. Sempre por toda parte, o conhecimento científico transita pelos espíritos individuais, que dispõem de autonomia potencial, a qual pode em certas condições sociais e políticas atualizarem-se e tornar-se um pensamento pessoal crítico. Sobre a aquisição do conhecimento pesa um formidável determinismo. Ele nos impõe o que se precisa conhecer, como se deve conhecer, o que não se pode conhecer. Comanda, proíbe, traça os rumos, estabelece os limites, ergue cercas de arame farpado e conduz-nos ao ponto onde devemos ir. E também que conjunto prodigioso de terminações sociais, culturais e históricas é necessário para o nascimento da menor ideia, da menor teoria. Não bastaria limitarmo-nos a essas determinações que pesam do exterior sobre o conhecimento. É necessário considerar, também, os determinismos intrínsecos ao conhecimento, que são muito mais implacáveis. Em primeiro lugar, princípios iniciais, comandam esquemas e modelos explicativos, os quais impõem uma visão de mundo e das coisas que governam e controlam de modo imperativo e proibitivo a lógica dos discursos, pensamentos, teorias. Ao organizar os paradigmas e modelos explicativos associa-se o determinismo organizado dos sistemas de convicção e de crença que, quando reinam, impõem a força imperativa do sagrado, normalizadora do dogma, proibitiva do tabu. As doutrinas e ideologias dominantes dispõem também da força imperativa e coercitiva que leva a evidência aos convictos e o temor inibitório aos desalmados.
Bibliografia Geral Consultada.
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