“Na vida, ao
contrário do xadrez, o jogo continua após o xeque-mate”. Isaac Asimov
A
ficção científica é uma dimensão literária desenvolvida no século XIX que reúne
a imaginação individual e coletiva e o impacto da ciência na extrapolação sobre
fatos e princípios científicos. Os primeiros clássicos do gênero foram
Frankenstein, de Mary Shelley (1818), e a obra de Robert Louis Stevenson, O
médico e o monstro (1886). Júlio Verner, reconhecido como o pai desse gênero
literário em suas famosas histórias de aventura, narrava descobertas
científicas muito antes delas se tornarem realidades descrevendo viagens
espaciais (Viagem ao redor da lua, de 1869) e mundo submarino (Vinte mil léguas
submarinas, de 1870). Mais recentemente esse gênero literário tem sido
representado por escritores notáveis como Herbert G. Wells, Isaac Asimov e
Arthur Clarke, que anteciparam inventos e descobertas que indicam que não
estamos muito longe de um mundo cheio de robôs. Isaac Asimov (1920-1992) foi um
escritor e bioquímico norte-americano, nascido na Rússia, autor de obras de
ficção científica e divulgação científica. Asimov é considerado um dos mestres
da ficção científica e, junto com Robert A. Heinlein e Arthur C. Clarke, foi
considerado um dos três grandes intérpretes dessa literatura. A obra mais
famosa é a Série da Fundação, também reconhecida como Trilogia da
Fundação, faz parte do Império Galáctico e que logo combinou com a Série
Robôs.
Também
escreveu obras na dimensão de mistério e fantasia, assim como uma grande
quantidade de não-ficção. No conjunto de sua obra literária, escreveu ou editou
mais de 500 volumes, aproximadamente 90 000 cartas ou postais, e tem obras em
cada categoria importante do sistema de classificação bibliográfica de John Dewey,
exceto em filosofia. A maioria de seus livros mais populares sobre ciência,
explicam conceitos científicos de uma forma histórica, voltando no tempo o mais
longe possível, quando a ciência em questão estava nos primeiros estágios. Ele
providencia, muitas vezes, datas de nascimento e falecimento dos cientistas que
menciona, também etimologias e guias de pronunciação para termos técnicos.
Alguns exemplos incluem, “Guide to Science”, os três volumes de “Understanding
Physics” e a “Chronology of Science and Discovery”, e trabalhos sobre
Astronomia, Matemática, a Bíblia, escritos de William Shakespeare e Química. Em
1981, um asteroide recebeu seu nome em sua homenagem, o 5020 Asimov. O robô humanoide
ASIMO da Honda, também pode ser considerada uma homenagem indireta a Asimov,
pois o nome do robô significa, em inglês, Advanced Step in Innovative
Mobility, além de também significar, em japonês, “também com pernas” (ashi
mo), em um trocadilho linguístico em relação à propriedade inovadora de
movimentação deste robô.
O
xadrez, empiricamente, é classificado como jogo de mesa, classificação dada por
aspectos visíveis, posto que é jogado em uma superfície plana. A formação do
conceito teórico é decorrente do processo de investigação da gênese e
desenvolvimento do objeto, que possibilitará a expressão da relação essencial.
Para investigarmos o conteúdo teórico
do conceito de xadrez, segundo (Meneghel, 2019), necessitamos acessar elementos
teóricos referentes à essência e
manifestação do objeto estudado, neste caso, o xadrez. A essência de um objeto
se dá por formações a partir de conjuntos de relações sociais e históricas. Se o alvo está relacionado ao
objetivo, podemos concluir que uma peça do xadrez, por exemplo, não pode ser o
alvo dessa relação essencial. Dessa forma, a peça age como instrumento
intermediário, pois o verdadeiro alvo é a conquista de território ou espaço. A
estrutura do jogo é formada por quatro elementos: as regras, a dinâmica de
ataque e defesa, a percepção e análise nas situações de jogo e os conhecimentos
estratégicos e táticos. O controle da ação corporal do outro é a estrutura do
xadrez desde seu surgimento como atividade lúdica, em jogos que o precederam
ainda que não totalmente desenvolvidos. O jogo como manifestação do xadrez é o
ponto de partida para a investigação da especificidade de nosso objeto de
pesquisa. Partindo das relações sociais derivadas dessa compreensão, temos como
finalidade, nesta produção de âmbito acadêmico, responder ao seguinte questionamento:
quais elementos específicos compõem o conteúdo teórico do conceito de xadrez? Para responder ao nosso questionamento
sobre quais são os elementos que os
jogadores necessitam operar em suas ações durante o jogo de xadrez, de forma
geral, reportamo-nos a sua gênese e desenvolvimento, buscando no jogo
contemporâneo tal resposta.
Embora
diversas civilizações antigas tenham sido descritas ou caracterizadas como havendo
sido o berço do xadrez, tais como o Antigo Egito e a China dinástica, na
contemporaneidade a maioria dos pesquisadores concorda que o jogo tenha se
originado na Índia por volta do século VI d. C., na forma de uma concepção
antiga xadrez com regras diferentes das atuais e denominados Chaturanga em sânscrito. Posteriormente
o Chaturanga difundiu-se na Pérsia durante o século VII, recebendo o nome persa
de Shatranj, provavelmente com regras
diferenciadas comparativamente em relação ao jogo indiano. O Shatranj, por sua vez, foi assimilado
pelo Mundo Islâmico após a conquista da Pérsia pelos muçulmanos, porém as peças
se mantiveram durante muito tempo com os seus nomes persas originais. Dentre os
praticantes de Shatranj, aqueles que mais se notabilizaram foram al-Razi,
al-Adli e o historiador al-Suli e seu discípulo e sucessor al-Lajlaj. Diversos
estudos foram feitos por al-Suli com o objetivo de compreender os princípios
das aberturas e os finais de partida, além de “classificar
os praticantes de Shatranj em cinco categorias em razão de sua força de jogo”. Na
passagem do primeiro milênio da nossa era, o jogo já havia se difundido por grande
toda a Europa e atingido a Península Ibérica no século X, sendo citado no
manuscrito do século XIII, o Libro de los
juegos, que discorria sobre o Shatranj, dentre outros jogos.
Os jogos de tabuleiro são reconhecidos desde a Antiguidade, mas foi durante a
Idade Média que a maioria deles recebeu as regras e a imagem com que são reconhecidos.
Xadrez, Dama, Gamão e Moinho possuem praticamente as mesmas regras e tabuleiros
que tinham na Era Medieval. Quando surgiram, os jogos de tabuleiro estavam
restritos aos membros da nobreza e do clero. As pessoas comuns que formavam os
gentios não tinham acesso a este tipo de entretenimento. A explicação para isso
pode ser encontrada na complexidade técnica de interpretação da regra de alguns
destes jogos. Outro fator estava no elevado preço que estes produtos tinham, como
mercadoria, o que afastava a maior parte dos consumidores. Entre todos os jogos
de tabuleiro surgidos, destacou-se o Xadrez. Mas ao contrário do que se possa
imaginar, o Xadrez não foi criado na Europa. Apesar das peças do jogo estarem
relacionadas a sociedade medieval europeia: rei, rainha, bispo, cavalo, torre e
peões, o jogo surgiu no oriente. Mais precisamente na Índia, onde o jogo é reconhecido
como Chaturanga. Com isso as peças do
jogo estão associadas a cultura e religião deste povo: Raja (espécie de rei), Mantri
(conselheiro do rei), Ratha
(carruagem), elefante, cavalo e infantaria.
Um dos ancestrais dos jogos de
tabuleiro contemporâneos é o Jogo real de
Ur. Estima-se que era jogada em torno de 2.500 a. C. na cidade Suméria de
Ur, atualmente Iraque. O jogo foi descoberto entre 1922 e 1934, durante as
escavações lideradas pelo arqueólogo inglês Sir Leonard Woolley. Em meio a
tumbas, Leonard encontrou joias, armas, e também vários tabuleiros, trabalhados
em madeira e adornados com madrepérola e lápis-lazúli. O curador do Museu
Britânico e especialista em escrita cuneiforme Irving Finkel, trabalhou na
decifração das regras do jogo, sendo um trabalho complexo, realizado durante
sua vida. Finkel e outros especialistas do Museu Britânico encontraram uma
tabuinha que se permitiu concluir que os jogos eram utilizados por essas atividades
divinatórias. A arte divinatória era muito importante para os sumérios,
utilizada como uma forma de se comunicar com os deuses, e para isso poderia ser
usada além dos jogos, como a interpretação de sonhos e a observação de vísceras
de animais. Os egípcios se interessavam por jogos de tabuleiro,
um deles era o Senat, ou Senet, também conhecido como “Jogo de
passagem da alma para outro mundo”. Fragmentos e hieróglifos encontrados em
escavações indicam que o jogo de Senat
teria por volta de 5.500 anos. Na tumba do faraó Tutancâmon foi encontrado
quatro tabuleiros, um deles constituído de ébano e marfim, com peças em ouro. O faraó detinha o poder religioso,
administrativo, judicial e militar. Podia ter diversas esposas e grande número
de amantes. A endogamia era comum não somente entre os faraós, mas também nas
outras frações de classes sociais. A sociedade do antigo Egito era dividida em
diversos estratos sociais. A primeira era constituída pelos membros da família
real. Depois, os sacerdotes, os nobres, os escribas, os guerreiros, os
mercadores e os artesões. Os lavradores, operários e servos faziam parte da
classe baixa da população. As classes privilegiadas eram as classes dos nobres
e dos sacerdotes. Os nobres eram funcionários que administravam, em nome do
faraó, os nomos, antigas divisões
territoriais. Os sacerdotes faziam parte da elite intelectual de grande poder
social, em virtude de serem considerados intermediários entre os homens e os
deuses. Os escribas eram fiscais e contabilistas da produção das terras do
faraó e constituíam uma classe prestigiada, pois era a única que dominava a
complicada escrita hieroglífica.
O
jogo de Senat tinha profunda ligação com a mitologia egípcia, sendo citado no Livro dos Mortos e textos religiosos.
Quando havia apenas um jogador, entendia-se que ele enfrentava o seu próprio
destino, representado pela imagem do deus dos mortos, Osíris. Se vitorioso, o jogador
receberia a benção da vida eterna. Vencer o jogo
de Senat significa triunfar sobre o mal e renascer com sucesso na vida após
a morte. O Senet era utilizado como entretenimento pelos antigos egípcios,
assim como podemos perceber em várias cenas apresentadas em papiros. Apesar de
ter um fim de entretenimento, apresentava um profundo significado religioso por
representar a alma em sua árdua trajetória no mundo dos mortos. Segundo o arqueólogo
norte-americano Peter Piccione (1980, p. 58) o jogo indica que os antigos
egípcios acreditavam que eles poderiam influenciar a sua pós-vida. Até o final
da décima oitava dinastia em 1293 a. C., o Senet
foi transformado em uma simulação das viagens ao submundo. Isso porque os jogos
foram encontrados em tumbas e inscrições mostram que o jogo poderia em alguns
momentos ser jogado por apenas uma pessoa. Então o autor acredita em duas
formas simultâneas de uso do jogo Senet. Quando se faz uso por duas pessoas, em
forma de entretenimento, e por uma pessoa, em um ritual divinatório da vida
após a morte.
Xadrez
é um esporte, também considerado uma arte e uma ciência. O xadrez é um esporte
intelectual, que se joga entre duas pessoas, ou equipes, que dispõem de forças
iguais, seja em quantidade seja em qualidade, denominadas peças, e que têm cores diferentes, geralmente brancas e pretas. As
peças se movimentam segundo leis convencionais, e o jogo tem o motivo de, após
um número variável de movimentos, também chamados lances ou jogadas, ganhar a
partida do adversário, o que se consegue levando o Rei contrário, a peça mais
importante, a uma posição especial, que se denomina mate. O movimento do Rei é
o movimento da Dama, contudo, reduzido á unidade,
isto é, o Rei poderá mover-se somente para qualquer das casas contíguas à casa
que ele ocupa. Colocado em casa angular, o Rei dispõe, apenas de três casas.
Ocupando casa da primeira horizontal, ou então da casa de coluna marginal, com
exceção das casas angulares, o Rei tem a sua disposição cinco casas. Afastado
das colunas marginais e das horizontais extremas, o Rei pode mover-se a oito
casas.O objetivo do jogo é dar mate ao
adversário. O tabuleiro representa a designação de um lugar quadrado dividido
em 64 casas, pintadas alternadamente de cores brancas e pretas,
ou fora das grandes competições de cores convencionais: é o tabuleiro de
xadrez.
Pode
ser classificado como um jogo de tabuleiro de natureza competitiva para dois
jogadores, sendo reconhecido como Xadrez
Ocidental ou Xadrez Internacional
para distingui-lo dos seus antecessores e de outras variantes coetâneas. A
forma atual do jogo surgiu no sudoeste da Europa na segunda metade do século
XV, durante o Renascimento, depois de ter se desenvolvido a partir de suas
antigas origens persas e indianas. A partida de xadrez é disputada em um
tabuleiro de casas claras e escuras, sendo que no início, cada enxadrista
controla dezesseis peças com diferentes formatos e características. Joga-se
xadrez sobre um tabuleiro quadrado, formado por 64 casas quadradas que formam
oito colunas e oito horizontais. Denomina-se Diagonal qualquer conjunto de
casas da mesma cor, que cruza em linha reta o tabuleiro, formando com as
colunas e as horizontais um ângulo de 45°. As casas claras são chamadas de
brancas e as escuras de pretas. O tabuleiro, na posição de jogo, tem a casa
inferior direita na cor branca. Na terminologia enxadrística, designam-se com
nome próprio os grupos de casas que têm alguma característica comum.
Distinguem-se três tipos dentre as que se dispõem em filas, em colunas ou
diagonais. Fila é o agrupamento de casas adjacentes posicionadas
horizontalmente. O objetivo da partida é dar xeque-mate. Teóricos do enxadrismo
desenvolveram várias táticas e estratégias para atingir este objetivo.
Os jogadores em desvantagem ou percepção factual da derrota têm a
opção de abandonar, desistindo da partida, antes de receberem o desfecho de
xeque-mate.
A
tática é a arte do fraco. Carl
Phillip Gottlieb von Clausewitz, militar do Reino da Prússia que ocupou o posto
de general é considerado um grande estrategista militar e teórico da guerra por
sua reconhecida obra Da Guerra (“Vom
Kriege”). Foi diretor da Escola Militar de Berlim nos últimos treze anos de sua
vida, período em que escreveu a obra publicada postumamente. Nela ficou
maculada a tese materialista da política em que ele define a associação metodológica
entre guerra e política: - “A guerra é a continuação da política por outros
meios”. Especificamente, Clausewitz considerava fundamental que a guerra
estivesse sempre submetida à política. Isso porque nenhuma guerra pode ser
vencida sem a compreensão precisa dos objetivos e da disponibilidade dos meios¸
enquanto estratégia, em primeiro lugar, ou sem o cálculo racional das
capacidades e das oportunidades, assim como o estabelecimento dos limites
éticos ao uso da força - sempre submetida aos objetivos políticos
estabelecidos. Suas lições de tática e estratégia vão, porém, além dos
exercícios militares propriamente ditos, para se constituírem, inclusive, numa
profunda reflexão sobre a filosofia da guerra e da paz.
Produtores
desconhecidos, poetas de seus negócios, inventores de trilhas nas selvas da
racionalidade funcionalista, consumidores produzem algo que se assemelha às
“linhas de erre”, traçando trajetórias indeterminadas, aparentemente
desprovidas de sentido porque não são coerentes com o espaço constituído,
escrito e pré-fabricado onde se movimentam. São frases imprevisíveis num lugar
ordenado pelas técnicas organizadoras dos sistemas. Não queremos perder de
vista que estratégias referem-se ao cálculo ou a manipulação das relações de
forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e
poder: uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição científica, pode
ser isolado. A estratégia postula um lugar suscetível de ser circunscrito como
algo próprio e ser a base de onde se podem gerir as relações com uma
exterioridade de alvos ou ameaças. Gesto cartesiano, quem sabe: circunscrever
um próprio num mundo enfeitiçado pelos poderes invisíveis do Outro. Mas que
também pode ser interpretado analiticamente como gesto da modernidade
científica, política ou militar. Mas é preciso recorrer a outro modelo quando
interpretamos as imagens.
As
estratégias são, portanto, ações que, graças ao postulado de um lugar de poder,
elaboram lugares teóricos (sistemas e discursos totalizantes), capazes de
articular um conjunto de lugares físicos onde as forças se distribuem. Elas
combinam esses três tipos de lugar e visam dominá-los uns pelos outros.
Privilegiam, portanto, as relações espaciais. Ao menos procuram elas reduzir a
ess tipo as relações temporais pela atribuição analítica de um lugar próprio a
cada elemento particular e pela organização combinatória dos movimentos
específicos a unidades ou a conjuntos de unidades. O modelo para isso foi antes
o militar que o científico. As táticas são procedimentos que valem pela
pertinência que dão ao tempo – às circunstâncias que o instante preciso de uma intervenção
transforma em situação favorável, à rapidez de movimentos que mudam a
organização do espaço, ás relações entre momentos sucessivos de um golpe, como
na política, aos cruzamentos possíveis de durações e ritmos heterogêneos. As
estratégias apontam para a resistência que o estabelecimento de um lugar
oferece ao gasto do tempo; as táticas apontam para uma hábil utilização do
tempo, das ocasiões de um poder. Os métodos praticados pela arte da guerra
cotidiana jamais se apresentam sob uma forma nítida, nem por isso – last but not least – menos certo que
apostas feitas no lugar ou no tempo distinguem as maneiras estruturantes de
sentir, pensar e agir.
O
grande silêncio das coisas muda-se no seu contrário através da mídia. Ontem
constituído em segredo, observa Michel de Certeau (2000), agora o real
tagarela. Só se veem por todo o lado notícias, informações, estatísticas e
sondagens. Jamais houve uma história que tivesse falado ou mostrado tanto.
Jamais, com efeito, os ministros dos deuses os fizeram falar de uma maneira tão
contínua, tão pormenorizada e tão injuntiva como o fazem hoje os produtores de
revelações e regras em nome da atualidade. Os relatos do-que-está-acontecendo constitui a nossa ortodoxia. Os debates de
números são as nossas guerras teológicas. Os combatentes não carregam mais as
armas de ideias ofensivas ou defensivas. Avançam camuflados em fatos sociais,
em dados estatísticos e acontecimentos. Apresentam-se como os mensageiros de um
“real”. Sua atitude assume a cor do terreno econômico e social. Quando avançam,
o próprio terreno parece que também avança. Mas, de fato, eles o fabricam,
simulam-no, usam-no como máscara, e atribuem a si o crédito dele, criam assim o
que se diagnostica como a lei. A pessoa tem que se inclinar, e obedecer aquilo
que significam, como oráculo de Delfos. A fabricação de simulacros fornece o meio de produzir crentes e praticantes.
Esta
instituição do real representa a
forma mais visível de nossa dogmática contemporânea. É também a mais disputada
entre partidos. Ela não comporta mais um lugar próprio, nem cátedra ou
magistério. Código anônimo, a informação inerva e satura o corpo social. Desde
a manhã até a noite, sem pausa, histórias povoam as ruas e os prédios.
Articulam nossas existências ensinando-nos o que elas devem ser. Cobrem o
acontecimento, fazem deles as nossas legendas daquilo que se deve ler e dizer.
Apanhado desde o momento em que acorda pelo jornal, rádio ou TV, a voz é a lei,
pois o ouvinte anda o dia inteiro pela floresta de narratividades
jornalísticas, publicitárias, televisionadas à noite ainda sob as portas do
sono. Esses relatos sociais têm o duplo e estranho poder de mudar o ver num
crer, e de fabricar a realidade com aparências. A fabricação que se quer
detectar é uma produção, uma poética, mas escondida porque el se dissemina nas
regiões definidas e ocupadas pelos sistemas de produção televisiva,
urbanística, comercial etc., e porque a extensão racionalizada, expansionista,
além de centralizada, barulhenta e espetacular, corresponde a outra produção,
qualificada de consumo. Esta é astuciosa, é dispersa, mais ao mesmo tempo ela se
insinua obliquamente, silenciosa e quase invisível, pois não se faz notar com
produtos próprios, mas nas maneiras de empregar os produtos impostos por uma
ordem dominante.
Dupla
inversão. De um lado, a modernidade, outrora nascida de uma vontade observadora
que lutava contra a credulidade e se fundava num contrato entre a vista e o
real, transforma agora essa relação e deixa ver precisamente o que se deve
crer. A ficção define o campo, o estatuto e os objetos da visão. Assim
funcionam os “mass media”, a publicidade ou a representação política. A ficção
pretende presentificar o real, falar em nome dos fatos e, portanto, fazer
assumir como referencial a semelhança que produz. Essa reviravolta do terreno
onde se desenvolvem as crenças resulta de uma mutação nos paradigmas do saber:
a invisibilidade do real, postulado antigo, cedeu o lugar à sua visibilidade. A
cena sociocultural da modernidade remete a um mito. Define o referente social
por sua visibilidade, e, portanto, por sua representatividade científica ou
política. Articula-se em cima deste novo postulado segundo o qual representa o
crer real e visível, e assim a possibilidade de nossos saberes, de nossas
observações, de nossas provas e nossas práticas. Nesta nova cena, campo
indefinidamente extensível das investigações óticas e de uma pulsão escópica,
subsiste ainda a estranha coalizão entre o crer e a questão tópica do real, do que é visto, do que é
observado ou do mostrado.
Cada
jogador inicia a partida com 16 peças. O rei é a peça principal do jogo e se
move para todos os lados de uma em uma casa. A dama movimenta-se em todas as
direções (coluna, fila ou diagonal) sendo uma peça muito poderosa pelo seu raio
de ação. O seu raio de ação diminui à medida que existam peças nas casas em que
ela ataque. Na posição inicial, por exemplo, a dama possui o seu caminho
bloqueado por suas próprias peças. Quando o rei está ameaçado por qualquer peça
adversária, diz-se que ele está em xeque. Nesta situação, deve-se dizer ao
adversário a palavra xeque. Para o jogador escapar do xeque basta movimentar o
rei para uma casa que não esteja sendo atacada pela dama branca. O xeque-mate é
o término da uma partida. Se o rei estiver em xeque e não existirem casas para
o rei ocupar que não estejam ameaçadas, então o rei está em xeque-mate. Quando
o rei não está em xeque e as casas que o cercam estão ameaçadas, a partida está
empatada, pois o rei está afogado. A torre movimenta-se em colunas e filas. Uma
torre situada no centro do tabuleiro pode atacar 14 casas.
O
bispo move-se pelas diagonais. Cada jogador começa a partida com um par de
bispos, um que percorre as casas pretas e outro pelas casas brancas. O bispo no
centro do tabuleiro ataca um total de 13 casas. O cavalo possui um movimento
particular bastante diferente das demais peças. Para simplificar, digamos que o
cavalo pula em L: duas casas na horizontal ou vertical, como uma torre, e
depois uma casa acima ou abaixo (se foi movido na horizontal), ou à direita ou
à esquerda (se foi movido na vertical). O cavalo é a única peça que salta sobre
as outras. Se o cavalo sair de uma casa branca irá parar em uma casa preta e
vice-versa.O peão só anda para frente
de casa em casa. Quando está na posição inicial, ele pode avançar duas casas.
Os peões não capturam as peças em seu movimento, como as demais.
A captura é feita em diagonal. Quando o peão atravessar o tabuleiro e chegar à
última casa do outro lado do tabuleiro deve obrigatoriamente ser trocado por
outra peça que pode ser uma dama, torre, bispo ou cavalo, independente
do jogador ter perdido ou não estas peças.
No
xadrez, a palavra peça tem três significados,
dependendo do contexto. Pode significar qualquer peça física do conjunto,
incluindo peões. Quando usada neste sentido, peça é sinônimo para peça de
xadrez. Durante a partida, o termo normalmente é utilizado excluindo os peões,
isto é, referindo-se apenas a dama, torre, bispo, cavalo ou rei. Neste
contexto, as peças podem ser divididas em três grupos: peça maior (dama e
torre), peça menor (bispo e cavalo) e o rei. Em frases como: “ganha uma peça”,
“perde uma peça” ou “sacrifica uma peça”, refere-se somente ao bispo e cavalo.
A dama, torre e o peão são especificados pelo nome nestes casos, como: “perde a
torre” ou “sacrifica um peão”. O contexto deve fazer a intenção do significado
clara. No âmbito da história comparada o desenvolvimento e forma das peças de
xadrez estimulou a imaginação de
artistas, artesãos e desenhistas em todos os países e culturas, do qual a
sociedade criou peças que refletiam o espírito e cultura do ambiente. A grande
maioria dos conjuntos de peças abstratas, porém mesmo estas singularidades têm
qualidade artística. Alguns trabalhos de artes representam conjuntos modernos
desenhos de conjuntos de peças de xadrez, tais como o conjunto modernista
criado pelo entusiasta do xadrez e dadaísta Man Ray (1890-1976), exibido no
Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.
Peças
de xadrez para o jogo são usualmente as figuras mais altas do que largas. Por
exemplo, o modelo do Rei no padrão Staunton, conjunto de oficial de peças a ser
utilizada em competições da Federação
Internacional de Xadrez (FIDE), fundada em 20 de julho de 1924, Paris.
Tendo Alexander Rueb como um de seus fundadores sendo eleito o seu primeiro
presidente (1924~1949), tendo sido presidida por H. E.Kirsan Ilyumzhinov, desde
1995 até 2018 quando passou a ser o seu presidente Arkady Dvorkovich. No xadrez
utiliza-se um sistema etnográfico para anotar as jogadas na partida chamada tecnicamente
Notação Algébrica. Os princípios da
notação algébrica respectivamente são: a) Cada casa é identificada por uma
letra e um número (e4). b) Um movimento é o desenho da peça que será
movimentada e a casa para onde se moverá em seu destino (¥h7 significa bispo
para h7). c) Se o movimento é uma captura, insere-se um x depois da peça. d) Se
duas peças do mesmo tipo podem ir para uma casa, insere-se uma coordenada de
partida (¤fe2, ¦8d7). e) Para movimento de peão, escreve-se a casa para onde o
peão vai (c4). f) Se o movimento for uma captura, procede-se como na
regra anterior, mas acrescenta-se a coluna de partida (cxd4). g) Se o movimento envolver uma promoção, a figura da peça promovida vai no final (gxf8£).
h) Os movimentos são numerados em pares com as peças brancas movendo por
primeiro. i) Outros símbolos: + é xeque; ++ é xeque-mate; 0-0 é roque pequeno;
0-0-0 é roque longo. j) Pontuação pode ser adicionada depois do lance da
seguinte forma: ! lance bom; !? lance interessante; !! lance muito bom; ? erro;
?? erro grave. k) Uma partida pode terminar em 1-0 (vitória das brancas), ½-½
(empate), ou 0-1 (vitória das pretas).
Historicamente
as competições enxadrísticas oficiais tiveram início no século XIX, sendo
Wilhelm Steinitz (1836-1900) um enxadrista judeu do Império Austríaco e
primeiro campeão celebrado no âmbito do mundial de xadrez. Um dos jogos mais
populares do mundo, o xadrez, é praticado por milhões de pessoas em torneios
entre amadores e profissionais, clubes, escolas, pela rede internet ou por
correspondência. Vale lembrar que o xadrez é oriental em sua origem, isto é,
indiano e difundido com a expansão mundial do Islã, o jogo foi introduzido e
praticado a partir do século X no Ocidente, onde suas peças sofreram uma
adaptação às realidades sociais. Do antigo “shah” que se tornou rei, e do vizir
metamorfoseado em rainha, acumulavam-se, nas sessenta e quatro casas do
tabuleiro: os condes substituindo os elefantes; os cavaleiros; os marqueses nas
margens, no lugar das carruagens; e uma tropa de soldados (peões) a pé na
primeira linha. O conjunto constituía dois povos (populi) que se afrontavam
seguindo regras, como testemunha os Versos sobre o xadrez (Versus de scachis)
dando nome às peças, descrevendo seu movimento, louvando o jogo como abstração
mental, sem risco físico e um falso juramento. O poema é a primeira descrição
européia do jogo e contém a primeira referência histórica da Dama. Essas peças
correspondiam aos atores do sistema feudal, de acordo com relações sociais de
dominação e de obrigações recíprocas ligando senhores e vassalos, homens livres na ordem escravocrata que juravam fidelidade e assistência militar, recebendo terras em feodum para
seu provimento e de sua casta.
Existem
diversas mitologias associadas à criação do xadrez, sendo uma das mais famosas aquela que atribui ao jovem brâmane
indiano Lahur Sessa. Segundo a lenda, narrada em O Homem que Calculava: Aventura de um singular calculista persa é
um romance infanto-juvenil do fictício escritor Malba Tahan, heterônimo do
professor brasileiro Júlio César de Melo e Souza, que narra as aventuras e
proezas matemáticas do calculista persa Beremiz Samir na Bagdá do século XIII.
Foi publicado pela primeira vez em 1938 alcançando a sua 90ª edição. A
narrativa, dentro da paisagem do mundo islâmico medieval, trata das peripécias
matemáticas do protagonista, que resolve e explica, de modo extraordinário,
diversos problemas, quebra-cabeças e curiosidades da matemática. Inclui, ainda,
lendas e histórias pitorescas, como, por exemplo, a lenda da origem do jogo de
xadrez e a história da filósofa e matemática Hipátia de Alexandria. Sem ser um
livro didático, tem, contudo, uma forte tonalidade moralista. Por isso, o livro
é indicado como um livro paradidático em vários países, tendo sido citado na
Revista Book Report e em várias publicações do gênero. A obra tem sido traduzida
para espanhol, inglês, italiano, alemão, francês, holandês e árabe. O rajá
estava em constante depressão e passou a descuidar-se de si e do reino. Certo
dia o rajá foi visitado por Sessa, que lhe apresentou um tabuleiro com 64 casas
brancas e pretas intercaladas e com diversas peças que representavam tropas do
exército: infantaria, cavalaria, carros de combate, condutores de elefantes, o
principal vizir e o próprio rajá. O sacerdote explicou ao rajá que a prática daria conforto espiritual e cura para a depressão. Agradecido,
ofereceu recompensa a Lahur Sessa pela invenção e o brâmane pediu um grão
de trigo para a primeira casa, dois para a segunda, quatro para a terceira,
oito para a quarta e assim até a última do tabuleiro.
Espantado
com a modéstia da explanação do pedido, o rajá ordenou que fosse pago
imediatamente a quantia em grãos de que fora pedida. Após os cálculos, os
sábios do rajá ficaram atônitos com a grandiosidade do resultado que a
quantidade de grãos atingiu. Impressionado com a inteligência do brâmane, o
rajá o convidou para ser seu principal vizir, sendo sua divida em trigo
perdoada. Na mitologia da criação do xadrez deve-se ao grego Palamedes, como um
passatempo para distrair os príncipes e seus soldados durante o período que
durou o cerco pelos gregos a cidade-estado de Troia. Os gregos foram os
primeiros a documentar a existência do jogo. O poeta Homero descreve no
primeiro livro da Odisseia uma
partida de xadrez entre os pretendentes da rainha Penélope, às portas da casa do
esposo Ulisses, em Ítaca. O dramaturgo Eurípedes, em sua tragédia Ifigênia em Áulis, apresenta Ajax e
Protesilau em uma partida de xadrez. Aqueles
que manipulavam as peças do xadrez, da forma como haviam sido tomadas de
empréstimo à cultura islâmica, podiam se imaginar em ações militares,
representando “casa a casa”, o desenrolar de um conflito entre povos, antes de
fazer desaparecer os protagonistas “um a um”, até o desfecho da partida.
O xadrez foi definido por Goethe como
ginástica da inteligência. O Sétimo Selo
(Det sjunde inseglet) é um filme
sueco de 1956, do gênero drama, escrito e dirigido por Ingmar Bergman, baseado
numa peça de teatro de autoria do diretor. Ao fazê-lo, Bergman reconstruiu a
Idade Média sueca não para lematizá-las em si, ainda que o trabalho de pesquisa
histórica e de reconstrução da sociedade de seu tempo tenha sido cuidadosamente
interpretado e descrito. Destarte, Bergman busca no mundo medieval o medo
apocalíptico, seja o temor de que o mundo pode acabar de repente, ou de que ele
seja dizimado gradualmente pela peste, o que acaba por expor a preocupação
própria do diretor com essa mesma questão. O filme foi lançado em 1956, período
em que os traumas da 2ª guerra mundial e da bomba atômica ainda marcavam a vida
dos europeus. As décadas de 1950 e 1960 encerram o período de maior temor pela
derrocada da guerra nuclear anunciada que destruísse o mundo em instantes.
Acresce-se a isto que os traumas do holocausto
e das consequências da mortandade desencadeados não haviam sido
esquecidos; pelo contrário, as pessoas pressentiam que tudo fora um presságio
de que o homem seria o grande responsável pelo apocalipse final.
A estratégia enxadrística consiste em definir (e atingir) objetivos
de longo prazo durante a partida, enquanto a tática se concentra em manobras imediatas no tabuleiro. Estas
partes do pensamento enxadrístico não podem ser completamente separadas. Os objetivos
estratégicos são atingidos principalmente por meio de táticas, sendo uma prévia
estratégia de jogo. É voltada para a avaliação de posições vitais no tabuleiro
e com o estabelecimento de metas a serem atingidas. Os enxadristas levam em
conta o domínio (valor) das peças, a estrutura de peões, a segurança do rei, a espacialidade
e o controle de casas-chave ou grupo de casas: colunas e diagonais abertas. A
avaliação é a contagem do valor total de peças dos dois lados. Os valores de
cada peça são estimados em 1 ponto para os peões, 3 pontos para os cavalos e os
bispos, 5 pontos para as torres e 9 pontos para a dama. O rei é mais poderoso
que uma peça menor entre o cavalo ou bispo. Menos forte que uma torre, sendo
estimado em 4 pontos. Alguns analistas afirmam que o rei possui valor absoluto,
pois sem ele perde-se a partida. Os valores podem ser alterados pela posição de um peão avançado, sobre a coordenação entre um par de bispos melhor
que e de um bispo e um cavalo, ou tipo
tático de posição, pois, geralmente cavalos são melhores em posições fechadas e bispos em posições abertas.
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“A história
caminha para frente, embora não em linha reta”. Astrojildo Pereira
Astrojildo
Pereira Duarte Silva nasceu na cidade de Rio Bonito, no estado do Rio de Janeiro, em 1890. Algumas informações
curiosas sobre sua infância e adolescência, segundo Leandro Konder, no artigo:
Astrojildo Pereira: O Homem, O Militante, O Crítico (1981) se acham nas respostas que deu a um questionário que
lhefoi
apresentado por Gilberto Freyre e utilizadas no livro Ordem e Progresso (1957) quando analisa o período de transição
conservadora da Monarquia à República correspondenteà desintegração do patriarcalismo na
sociedade brasileira. Quando estudava num colégio de jesuítas (o Colégio Anchieta,
de Nova Friburgo), Astrojildo – então com 13 anos – pensava em se tornar frade,
mas ao mesmo tempo redigia, juntamente com um colega, um jornal clandestino
pornográfico. Aos 16 anos, no Colégio Abílio, em Niterói, fez os seus primeiros
versos amorosos. Abandonou o curso ginasial no terceiro ano, tornando-se
antimilitarista e ateu. Optando pelos caminhos do autodidatismo, Astrojildo
começou a ler autores anarquistas e a se interessar pelas lutas operárias. As
condições de seu tempo lhe permitiam ter acesso menos restrito à literatura
filosófica e política de inspiração libertária, que se difundia mais audaciosamente
após a queda do Segundo Reinado (1840-89) e a proclamação tardia ou
retardatária da República. A nação desarticulada, deserta, paupérrima e inculta
pouco interessavam as rotações partidárias, excetuada a clientelasedenta em torno dos pequenos empregos
públicos. A reduzida e desenraizada elite que no Parlamento se esforçava por
copiar os figurinos ingleses, até na indumentária, não podia iludir-se sobre a
comédia em que eram, afinal, comparsas.
O fracasso da campanha civilista de
Rui Barbosa, a repressão à revolta do marinheiro João Cândido e o fuzilamento
do pedagogo anarquista Ferrer, na Espanha, dissiparam as últimas ilusões que
Astrojildo depositava no republicanismo liberal. Em 1911, Astrojildo partiu num
navio, como passageiro de 3ª classe, para a Europa, de onde regressou, com uma
mala de livros, mas completamente sem dinheiro, repatriado pela associação da
colônia brasileira em Paris, que lhe pagou a passagem de volta. Às leituras de Piotr
Kropótkin, Jean Grave, Gabriel Urbain Faure, Enrico Malatesta e Augustin Hamon,
acrescentou-se o estudo dos escritos de Mikhail
Bakunin. A partir de 1911, Astrojildo se
dedicou à idealização da difusão do anarquismo em regime de tempo integral. Trabalhou em vários pequenos jornais: A Voz do Trabalhador, Guerra Social, Spartacus,
O Cosmopolita e outros. Para suprir a
falta de colaboradores, desdobrou-se em numerosos pseudônimos: Aurélio Corvino, Pedro Sambê, Tristão, Cunhambebe,
Alex Pavel, Astper, etc. Para animar esses órgãos pioneiros da “imprensa
alternativa”, Astrojildo chegou até a polemizar consigo mesmo, enquanto meio de trabalho e processo social de
comunicação, usando os distintos colaboradores cujos nomes inventava criativamente. Apesar de sua limitadíssima
circulação, as folhas da imprensa operária irritavam as autoridades
conservadoras, que de vez em quando mandavam beleguins empastelarem as
instalações dos pequenos jornais e prenderem seus redatores. Num dado momento,
a polícia chegou a procurar Alex Pavel – um dos pseudônimos de Astrojildo –
supondo tratar-se de um perigoso agente subversivo russo.
Como
parte do emprego de seu método
filosófico, inspirado por Sócrates e pelos diálogos socráticos, a obra de Søren
Kierkegaard foi escrita com vários pseudônimos
que representam, cada um deles os seus pontos de vista metodológicos
distintivos e que interagem socialmente uns com os outros em complexas formas
de diálogos. Este método de interpretação permitiu-lhe apresentar pontos de
vista distintos e interagir socialmente com os outros através de um diálogo complexo.
Ele explorou problemas religiosos a partir do entrecruzamento de diferentes
pontos de vista, cada um sob um pseudônimo diferente. O termo pecado, por exemplo, é utilizado em
contexto religioso para descrever qualquer “desobediência à vontade de Deus”;
mas em especial, qualquer desconsideração deliberada de leis divinas. Vale
lembrar desde sua fundação, que a igreja é vista como um local de auxílio aos
seus membros mais necessitados. O apóstolo Tiago, exorta para que a igreja
olhe, vele, assista às pessoas que estão carentes de assistência, de
ajuda, como os órfãos e as viúvas em suas necessidades sociais.
Historicamente
por trás de curiosos pseudônimos, o filósofo dinamarquês Kierkegaard
evitou o reconhecimento nominal usando os mais diversos pseudônimos por vezes com
inúmeros significados: Victor Eremita, Johannes de Silentio, Constantin
Constantio, Hilarius Bogbinder, Anti-Climacus. Reconhecido por levar uma vida
solitária e isolada, Kierkegaard foi um dos fundadores da filosofia
existencialista. A sua obra teológica incide sobre a ética cristã e as
instituições da Igreja. Ele escreveu muitos de seus Discursos de Edificação sob
seu próprio nome e os dedicou ao indivíduo único que pode querer descobrir o
significado de suas obras. Notavelmente, ele escreveu: - “A ciência e o método
escolar querem ensinar que o objetivo é o caminho. O cristianismo ensina que o
caminho é tornar-se subjetivo, tornar-se um sujeito”. Embora os cientistas
possam aprender sobre o mundo pela observação, Kierkegaard negou enfaticamente
que essa observação poderia revelar o funcionamento interno do mundo do
espírito. Na vertente psicológica explora o sentido e o significado das emoções
e sentimentos dos indivíduos quando confrontados com as escolhas pessoais que a
vida independente da vontade oferece. O
Desespero Humano é um livro escrito em 1849 sob o pseudônimo Anti-Climacus. Trata sobre o conceito de
desespero de Kierkegaard, analiticamente comparado ao conceito cristão de
pecado. Muitos destes termos utilizados demonstram uma conexão inegável com os
conceitos utilizados mais tarde em 1895 pelo inventor da psicanálise Sigmund Freud.
Astrojildo
Pereira iniciou militância política em organizações operárias de orientação anarquista, tendo
sido um dos principais promotores em 1913 do II Congresso Operário Brasileiro. Foi também na imprensa operária
que se iniciou no jornalismo, atividade a que se dedicaria durante a maior
parte de sua vida. No final de 1918, participou dos preparativos de uma
insurreição anarquista e, por conta disso, foi preso. A subestimação da
política e das questões de organização por parte dos anarquistas tinha
consequências negativas para o movimento operário, pois não conseguiam
consolidar nenhuma vitória. Solto em 1919, começou a afastar-se do anarquismo e
a defender os rumos tomados pela Revolução Russa Socialista de 1917. Em março
de 1922, participou do congresso de fundação do Partido Comunista do Brasil
(PCB) sendo eleito secretário-geral da organização político-partidária. Em
1924, fez sua primeira viagem à Moscou, na União Soviética revolucionária. No
ano seguinte, quando o PCB iniciou a publicação do jornal A Classe Operária, tornou-se, ao lado de Otávio Brandão, um de seus
principais redatores. Em 1927, encarregado pela direção do partido de buscar
contato com Luís Carlos Prestes, então exilado na Bolívia, entregou ao líder
tenentista diversos volumes de literatura corrente marxista. Em 1928, passou a
fazer parte do comitê executivo da Internacional Comunista, eleito no VI
Congresso da entidade realizado em Moscou.
O
nome Partido Comunista do Brasil
havia sido usado primeiramente pelo antigo PCB, fundado em 25 de março de 1922.
Enquanto o PCB abandonava em definitivo a figura de Stálin, o PCdoB manteve o
ex-líder soviético como uma de suas referências teóricas ao lado de Marx,
Engels e Lênin. Na mesma época, a crise entre a União Soviética e a China
atingiu o seu auge, quando o líder chinês Mao Tsé Tung criticou o processo de desestalinização em curso na União Soviética, e acusou Khrushchev
de desvios oportunistas e reformistas. Posteriormente o PCB alterou seu nome para
Partido Comunista Brasileiro, fundado com a presença de 9 delegados,
representando diversos grupos regionais e que somavam um total de 73 membros. Um
bom número deste militantes fundadores eram libertários. Dos nove membros que
fundaram o PCB somente o barbeiro Abílio de Nequette e Manoel Cendón são
socialistas, enquanto os restantes vinculam-se aquele movimento. Uma leitura
atenta da obra de Otávio Brandão, escrita em 1924 sob pseudônimo de Fritz
Mayer, Agrarismo e Industrialismo, as
revoluções pequeno-burguesas de 1922 e 1924, cometeram erros graves, anterior à
sua adesão afetiva ao PCB em 15 de outubro de 1922, verifica as fortes
influências anarquista e mística delineada nos ensaios e livros, que se
traduzem no predomínio do questionamento, esquemático e acentuadamente
ideológico, resistindo traços da doutrina anarquista mesmo considerado em
algumas de suas posições pós-adesão.
A
chamada “desestalinização” refere-se ao processo de ver como o culto da personalidade e do sistema
político stalinista criado pelo líder soviético Josef Stalin. A
desestalinização começou tecnicamente em 1953 após a morte de Stalin, mas não
era oficial até 1956, após o discurso secreto de Nikita Khrushchev, então
secretário do Comitê Central da União Soviética, e liberado após o XX Congresso
do PC da URSS. Com sua morte, Stalin foi sucedido por uma liderança coletiva.
Os homens fortes da central soviética na altura eram Lavrentiy Beria, a cargo
do Ministério do Interior, Nikita Khrushchev, Primeiro Secretário do Comitê
Central do Partido Comunista e Georgi Malenkov, Premier da União Soviética. O
processo de desestalinização começou com um fim ao papel do trabalho forçado em grande escala na
economia. O processo de libertar prisioneiros dos Gulags foi iniciado por Béria, mas ele foi logo retirado do poder.
Khrushchev, em seguida, emergiu como o mais poderoso político soviético. No
discurso “Sobre o Culto à Personalidade e suas Consequências” para a sessão
fechada do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética em 25 de
fevereiro de 1956, Nikita Khrushchev chocou seus ouvintes denunciando duplamente,
por um lado, o regime ditatorial e, por outro, o culto da personalidade de
Josef Stalin. Ele também atacou os crimes políticos cometidos pelos associados
de Lavrenti Pavlovitch Beria, político soviético e chefe da NKVD na Geórgia.
Beria. É lembrado como o executor do Grande Expurgo de Stalin na década de 1930, tendo-o presidido.
Não
poderíamos repetir o mesmo com Astrojildo Pereira, homem de leitura mais vasta,
bom conhecedor da literatura socialista europeia em geral, e em particular a
teoria da história e o método de análise materialista e dialético de Marx e Engels. Em 1929, publicou em A Classe Operária
o artigo “Sociologia ou apologética?”, estudo crítico da obra de Oliveira
Vianna, Populações Meridionais do Brasil,
em que eram contestadas as opiniões do autor, que negava a existência de luta
de classes na história do Brasil. O trabalho foi depois incluído nos livros Interpretações (1944) e Ensaios históricos e políticos (1979). Lembra
Vanilda Paiva no artigo: Oliveira Vianna:
Nacionalismo ou Racismo?(1978), que
a presença de Oliveira Vianna na vida intelectual brasileira é frequentemente
subestimada, especialmente entre os que passaram a viver os problemas políticos
e culturais de forma plenamente consciente a partir dos anos 1960. Sobre ele
são amplamente reconhecidos o ensaio de Nelson Werneck Sodré, Oliveira Vianna – o racismo colonialista
(1961) e o estudo de Astrojildo Pereira intitulado: Sociologia ou Apologética?, escrito em 1929 e reunido com outros
estudos em Interpretações (1944).
Ambos os autores se concentraram com muita justiça, sobre o caráter racista e
de apologia das classes dominantes que permeia a obra Populações Meridionais do Brasil que levou o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos a caracterizá-lo como “autoritarismo instrumental”.
Os fundadores do Partido Comunista Brasileiro: Manoel Cendon, Joaquim
Barbosa, Astrojildo Pereira, João da Costa Pimenta, Luís Peres e José Elias da
Silva (de pé, da esq. p/ dir.); Hermogênio Silva, Abílio de Nequete e Cristiano
Cordeiro (sentados, da esq. p/ dir.). Foto: João da Costa Pimenta (1922).
Em
fevereiro de 1929, após o 3° Congresso do Partido Comunista Brasileiro,
realizado entre dezembro de 1928 e janeiro de 1929, no qual foi vencido o grupo
de oposição, denominado Dissidência,
chefiado por Joaquim Barbosa e Rodolfo Coutinho, Astrojildo Pereira, eleito durante
os trabalhos e debates do 6° Congresso para o Comitê Executivo da Internacional
Comunista, sob o pseudônimo de Américo Ledo, seguiu para Moscou, onde trabalhou
no Secretariado para a América Latina, regressou ao Brasil em janeiro de 1930. Em
artigo publicado em Autocrítica, n°6,
com o título: O Proletariado Perante a
Revolução Democrática Pequeno-Burguesa (1928), Otávio Brandão afirma que no Brasil trata-se de nossa aliança com os revoltosos pequeno-burgueses contra
os grandes proprietários rurais e feudais
e, em segundo lugar, contra todas as frações da grande burguesia: comercial,
industrial, burocrática, acrescentando “a revolução democrático-burguesa é uma
criadora de possibilidades”. À sua sombra preparar-nos-emos, afirma, para a
nossa verdadeira obra. Não podemos ser contrários a essa revolução”. E como
conclusão: “no Brasil, o problema da pequena-burguesia é urbano e não rural
como na Rússia”. Esta concepção da revolução brasileira e de suas forças
motrizes, elaborada durante tantos anos, recebeu sua consagração, por assim
dizer, no 3° Congresso do PCB, de dezembro de 1928, com a denominação de
“terceira revolta”, prevista como continuação histórica dos movimentos
tenentistas de 1922, 1924 e 1926, sucedida de fato, na luta armada vitoriosa da
Aliança Liberal do prócer Getúlio Vargas, na década de 1930 em que
ocorre a radicalização política.
A
tese do 3° Congresso, segundo Astrojildo: “Toda a tática do Partido Comunista
deve, portanto, subordinar-se a esta etapa estratégica de mobilização das
massas em vista do movimento que se prevê. Em tese o Partido deverá colocar-se
à frente das massas, a fim de conquistar, por etapas sucessivas, não só a direção
da facção proletária, mas a hegemonia
do todo o movimento”. Queremos dizer com isso que a analogia das palavras não
deve levar a confusões. Chamam-se igualmente partidos as facções que dividiam
as Repúblicas antigas, os clãs que se agrupavam em torno de um condottiere na
Itália da Renascença, os clubes onde se reuniam os deputados das assembleias
revolucionárias, os comitês que preparavam as eleições censitárias das
assembleias revolucionárias, bem como as vastas organizações populares que
enquadram a opinião pública nas democracias modernas. Essa identidade nominal
justifica-se por um lado, pois traduz certo parentesco profundo: todas essas
instituições não desempenham o mesmo papel, que é o de conquistar o poder
político e exercê-lo? Porém, sociologicamente, observamos que não se trata da
mesma coisa. De fato os verdadeiros partidos datam pouco mais de um século. Em
1850, nenhum país do mundo, salvo os Estados Unidos da América, conhecia
partidos políticos no sentido contemporâneo do termo: encontravam-se tendências
de opiniões, clubes populares, associações de pensamento, grupos parlamentares,
mas nenhum partido político propriamente dito. Em 1950, estes funcionavam na
maior parte das nações civilizadas, os outros se esforçavam por imitá-las, ou apenas transplantá-las.
O nascimento dos partidos políticos encontra-se,
portanto, ligado ao dos grupos parlamentares e comitês eleitorais. Não
obstante, alguns manifestam uma natureza mais ou menos aberrante em relação ao
esquema geral: sua gênese situa-se fora do ciclo eleitoral e parlamentar,
formando essa exterioridade, aliás, seu caráter comum mais nítido. Contudo, o
mecanismo geral dessa gênese é simples: criação de grupos parlamentares, de
início; surgimento de comitês eleitorais, em seguida; enfim, o estabelecimento
de uma ligação permanente entre esses dois elementos. Na prática, a pureza
desse esquema de análise teórica é modificada de diversas formas. Os grupos
parlamentares vem à luz antes dos comitês eleitorais: com efeito, houve
assembleias políticas antes que se realizassem eleições. Grupos parlamentares
são concebíveis no âmbito de uma Câmara autocrática bem como de uma Câmara
eleita: na realidade, voltamos ao ponto inicial da questão. A luta das facções
geralmente se têm manifestado em todas as assembleias hereditárias ou
cooptadas, quer se tratasse do Senado da Roma clássica, quer da Dieta da antiga
Polônia. Mas há ainda uma questão chave para seu entendimento político.
Certamente, quem diz “facção” ainda não diz “grupo parlamentar”: entre os dois,
existe toda a diferença que separa o inorgânico do organizado, este sim, que levaria mais tarde o italiano Antônio Gramsci desenvolver uma concepção original sobre o papel do intelectual revolucionário. O segundo
decorre da primeira, por uma evolução mais ou menos rápida.
Segundo
Heitor Ferreira Lima no artigo: Astrojildo Pereira e uma Mudança na Orientação
do PCB (1981), essa apreciação da dinâmica política entre nós era,
evidentemente, falsa e inadequada à realidade objetiva, que não sabíamos ver, e
ao papel revolucionário que o PCB deveria desempenhar. Recebeu, por isso, a
mais viva repulsa nas reuniões do Secretariado da Internacional Comunista para
a América latina, através de críticas contundentes. O PCB foi acusado de
orientar toda a sua tática e estratégia à espera da “terceira revolta”,
colocando-se, desse modo, à reboque da pequena burguesia, menosprezando as
reivindicações específicas do proletariado; de abandonar a questão camponesa,
esquecendo a reforma agrária e a aliança dos operários com os trabalhadores do
campos; de esconder o Partido atrás do Bloco Operário e Camponês; de não cuidar
suficientemente da formação do PCB independente, à altura das necessidades
nacionais; de não se ocupar com os problemas dos negros e dos índios; enfim, de
adotar uma orientação pequeno-burguesa, contrária ao leninismo e às
recomendações da Internacional Comunista.
Em resumo, um arrasamento na ideologia
e na prática seguidas no Brasil. Tal contestação em forma tão severa deixou os
membros brasileiros presentes perplexos, atônitos, quase que sentindo-se
aniquilados, pois, desmoronavam irremediavelmente, os esforços de tantos anos
de trabalho e sacrifícios.
Estes acontecimentos dentro do PCB
ocorreram no primeiro semestre de 1930, quando parte da nação republicana
atravessava um dos períodos mais agitados de sua história política pela
sucessão presidencial. Politicamente o PCB declarava ser “contra os golpes
fascistas, conspirações militares, complots de chefes tramados á revelia das
massas e a serviço do imperialismo”, apresentando seus próprios candidatos à
presidência da República, ao senado e à Câmara dos Deputados, sob a palavra de
ordem de “Votar no PCB é votar na Revolução”.Quando veio o “prélio das armas”, melhor dizendo, o movimento armado de outubro,
o PCB alheou-se da luta, dando margem a que as vastas camadas da classe média e
do proletariado engrossassem o entusiasmo das multidões que receberam os
vencedores de 1930, dirigidos pelos autoritários velhos caciques oligarcas,
como Arthur Bernardes, Epitácio Pessoa, Antônio Carlos, Borges de Medeiros. A
aparente derrota política do PCB imobilizou-o, paralisando-o quase que
completamente, embora fazendo crescer as disputas internas. Octávio Brandão,
após as contundentes críticas de Buenos Aires, foi afastado do Comitê Central
do partido, juntamente com o metalúrgico José Casini e o gráfico Ferreira da
Silva, considerados responsáveis pelos recentes reveses e erros de diagnóstico do
Partido. Em novembro de 1930, em reunião ampliada do Comitê Central, Astrojildo
Pereira foi destituído do cargo de secretário geral, que ocupava desde a
fundação do PCB, sob a acusação de permitir que a organização atingisse um
estado crítico e por resistência à proletarização.
Astrojildo Pereira e Paulo Lacerda
deveriam escrever cartas reconhecendo seus erros e foram encaminhados a São
Paulo, em busca de reabilitação, ocasião em que Astrojildo escreveu carta ao
Bureau Sul-americano informando sua intenção de afastar-se do partido.
Tratava-se de uma tática, pois não iria abandonar a luta política dentro e fora
do partido. Contudo, em São Paulo, Astrojildo, foi preso e deportado para o Rio
Grande do Sul, regressando logo, para casar-se com Inês Dias, a primeira filha
de seu velho amigo e companheiro de lutas, Everardo Dias, seguindo para Rio
Bonito, sua terra natal. Lá permaneceu algum tempo, dizendo achar-se
voluntariamente alheado de qualquer atividade política. Em verdade, mais tarde
acrescentava no prefácio de seu livro: URSS
– Itália – Brasil que tratava-se de autocrítica, em lugar adequado, como se
estivesse aqui encerrando uma fase da vida política sem perder de vista desde
1921, quando da criação do grupo comunista do Rio de Janeiro, celular-mater do Partido Comunista.
Everardo Dias aprendeu as primeiras letras com os pais, herdou o ofício paterno
e trabalhou como tipógrafo caixista no jornal O Estado de São Paulo enquanto fazia a Escola Normal da praça da
República. Chegou a frequentar a Faculdade de Direito do largo São Francisco,
mas abandonou-a por falta de recursos. Só mais tarde conseguiria o título de
bacharel, na Faculdade Livre de Direito do Rio. A partir de 1903, por mais de
dez anos, dirigiu o jornal O Livre
Pensador, que defendia a liberdade religiosa e de imprensa, cultuando a
razão contra o conservadorismo da Igreja Católica.
Na década de 1910, acompanhou a
ascensão do movimento operário. Publicou textos como Jesus Cristo era
anarquista, editado em 1920 pelo grupo do jornal A Plebe, do qual foi colaborador. Participou da greve geral
paulista de 1917, quando redigiu o célebre “Manifesto aos soldados”,
convocando-os a aderir ao movimento. Segundo seu amigo Edgard Leuenroth,
reconhecido líder anarquista, a atuação seria ainda mais intensa na greve de
1919, embora Everardo argumentasse na época que seu vínculo com os grevistas
era de colaboração com a imprensa operária e de apoio à greve, sem desempenhar
papel relevante no movimento. De toda forma, por sua participação, foi preso,
castigado com 25 chibatadas e depois deportado junto com outros grevistas nascidos
no exterior. É essa história que relata no livro: Memórias de um exilado, de
1920. Entre os expulsos do país que seguiram a bordo do navio Benevente foi o
único a conseguir o perdão presidencial, graças às relações com ilustres
republicanos e maçons. O deputado federal Maurício de Lacerda liderou a
campanha contra sua deportação, que foi apoiada nacionalmente pela maçonaria,
alguns parlamentares e integrantes do movimento operário. Mas antes de obter o
perdão do presidente Epitácio Pessoa, teve seu pedido de habeas corpus negado pelo Supremo Tribunal Federal. Sendo casado
com brasileira e tendo cinco filhas nascidas no país, para onde viera ainda
pequeno, entre outros fatores alegados por advogados, sua deportação parecia
absolutamente ilegal. Por concordar com os argumentos do solicitante, o
ministro Edmundo Lins insurgiu-se contra a decisão do STF, liderada
pelo ministro Viveiros de Castro.
Conforme
observou Vamireh Chacon, no ensaio: História
da Ideias Socialistas no Brasil, editado dez dias após o golpe de Estado de 1°de abril de 1964: o socialismo não é uma ideia exótica no
Brasil. Em verdade tem suas raízes históricas, sociais e políticas com seus líderes
marcantes, seu acervo coroado de lutas e conquistas trabalhistas, embora quase
nunca registrados pela historiografia oficial em países do Oriente e Ocidente. Ipso facto, as reivindicações
nativistas, em favor da Independência brasileira, não foram sempre apenas
políticas. O nacionalismo andou associado ao igualitarismo, em movimentos como
a Conspiração dos Alfaiates, em 1798,
também chamada Inconfidência baiana,
já reivindicando a igualdade econômica, e não só a ideia em torno de liberdade.
E na Inconfidência Insurrecional de
Pernambuco, em 1817, havia igualitários rouseaunianos, Robespieres ou Marats
nativos, como o Padre João Ribeiro, não só anglófilos como Domingos José Martins
ou americanófilos como Cabugá. O
socialismo possui uma pré-história no Brasil das comunidades guaranis,
organizadas pelos jesuítas, principalmente no Paraguai, porém se estendendo ao
Rio Grande do Sul, em cidades como São Borja, de São Francisco de Borja e
outros, e ruínas das antigas missões. Comunidades que chegaram a impressionar o
genro anarquista de Marx, o bravo Paul Lafargue. Perdeu-se no tempo a lembrança
desta experiência. Só alguns estudiosos pós-marxistas desde a década de 1960 hic et nunc no continente europeu se
preocupam em ressuscitá-la.
Uma segunda observação metodológica,
é que a classe operária, e não classes trabalhadoras, pois é um termo
descritivo, tão esclarecedor quanto evasivo. Reúne vagamente um amontoado de
fenômenos descontínuos. Ali estavam alfaiates e acolá tecelãos, e juntos as
classes trabalhadoras. Por classesocial, conceitua Edward Thompson (1987),
entendo um fenômeno histórico, que unifica uma série de acontecimentos díspares
e aparentemente desconectados, tanto na matéria-prima da experiência como na
consciência. Ressalta que é um fenômeno histórico, distinto da ideia de
“estrutura”, nem mesmo como uma “categoria”, mas como algo que ocorre
efetivamente (e cuja ocorrência pode ser demonstrada) através das relações
humanas. Ademais, a noção de classe traz consigo a noção de relação histórica.
Como qualquer outra relação, é algo fluido que escapa à análise da imobilidade
da estrutura. Mas a classe não é uma coisa, seja
ela pré-capitalista ou caracterizada por um capitalismo desenvolvido, a
desigualdade social através da classe social está relacionada ao poder
aquisitivo, ao acesso à renda, à posição social, ao nível de escolaridade, ao
padrão de vida, entre outros.
A
relação precisa estar sempre encarnada
em pessoas e contextos reais. Além disso, não podemos ter duas classes
distintas, cada qual com um ser independente, colocando-as a seguir em relação recíproca. Não podemos ter
amor sem amantes, nem submissão sem senhores rurais e camponeses. A classe tem
como resultado experiências comuns (herdadas ou partilhadas), quando alguns
homens sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si, e contra
outros homens cujos interesses diferem (e geralmente se opõem) dos seus. A
experiência de classe é determinada, em grande medida, pelas relações de
produção em que os homens nasceram – ou entraram involuntariamente. A consciência de classe é a forma de
representação como essas experiências são tratadas em termos culturais:
encarnadas em tradições, sistemas de valores, ideias e formas institucionais.
Se a experiência aparece como determinadas, o mesmo não ocorre com a
consciência de classe. A consciência de classe surge da mesma forma gradativamente em tempos e
lugares diferentes, mas nunca exatamente da mesma forma.
Em
terceiro lugar, como afirmou Eric Hobsbawm (1975) “a história sem solução de continuidade do comunismo”, enquanto movimento social
moderno, tem início com a corrente de esquerda da Revolução Francesa. Uma direta
linha descendente liga a “conspiração dos iguais” de Babeuf, através de Felipe
Bounarotti, às associações revolucionárias de Blanqui dos anos 1830; e essas, por
sua vez, se ligam – através da Liga dos Justos, formada pelos exilados alemães
inspirados por eles, - e que depois se tornará Liga dos Comunistas, - a de Marx e Engels, que redigiram sob
encomenda da Liga o Manifesto do Partido
Comunista, em fevereiro de 1848 em Londres, o documento mais importante da
era moderna. Escrito em alemão por dois jovens pensadores praticamente
desconhecidos: Marx, com 30 anos de idade e Engels, com 28. Em junho de 1848
apareceu a primeira edição francesa; em 1850, as edições inglesa, polonesa e
dinamarquesa; em 1860, a russa, traduzida por Bakunin; em 1872, a norte-americana. É natural que a projetada
“Biblioteca” de Marx e Engels, de 1845, devesse iniciar com dois ramos de
literatura socialista: Babeuf e Buonarotti (seguidos por Morely e Mably), que
representavam a ala abertamente comunista, seguidos pelos críticos de esquerda
da igualdade formal da Revolução Francesa e pelos “raivosos” (o Cercle Social,
Herbert, Jacques Roux, Leclerc).
O interesse teórico do que Friedrich Engels definiria
como “um comunismo ascético que se inspirava em Esparta” não era obviamente muito
grande. O Manifesto foi publicado em
todas as línguas, em edições sucessivas, tornando-se um dos textos mais lidos e
mais influentes do mundo ocidental. E
tampouco escritores comunistas dos anos 1830 e 1840, enquanto analistas teóricos,
parecem ter impressionado favoravelmente Marx e Engels. Aliás, Marx afirmou que
– precisamente por causa do primitivismo e da unilateralidade de seus primeiros
escritores teóricos – “não foi por acaso que o comunismo viu surgir diante de
si outras doutrinas socialistas, como as de Fourier, Proudhon, etc.; foi por
necessidade”. Mesmo tendo lidos os seus escritos, inclusive os de figuras “menores”,
como Auguste-Richard Lahautière (1813-1882) e Jean-Jacques Pillot (1808-1877),
Marx devia bem pouco à análise social dos mesmos, que consistia sobretudo na
formulação da luta de classe como luta entre os “proletários” e os seus
exploradores. O primeiro comunismo que Marx e Engels conheceram tinham como
palavra-de-ordem a igualdade; e Rousseau era, precisamente, o seu teórico mais
influente. Na medida em que o socialismo e o comunismo dos primeiros anos da
década de 1840 do século XIX foram franceses em ampla medida, uma de suas
componentes originárias era precisamente um igualitarismo de marca rousseauniana.
Nem se deve esquecer o influxo dele à filosofia clássica alemã.
Lembra o filósofo marxista Leandro Konder que a opção afetiva e política de Astrojildo Pereira pelo
comunismo deixou mágoas profundas em alguns dos companheiros anarquistas que
não o acompanharam. Em José Oiticica, por exemplo, tais mágoas ainda estavam
vivas em 1956, quanto ele se referiu, num artigo, aos danos causados ao
movimento anarquista pela “intromissão sorrateira, venenosa, nefasta, do
bolchevismo, operada, sem nenhuma ciência minha nem dos militantes anarquistas
mais conscientes, pela cavilação manhosa de Astrojildo Pereira”. Oiticica
subestimava os diversos outros anarquistas que se tornaram comunistas,
considerando-os demasiadamente influenciáveis, desprovidos de motivações
próprias. Em certo sentido, porém, o combativo intelectual anarquista também
estava prestando uma homenagem a Astrojildo, quando atribuía à sua influência
pioneira o esvaziamento do anarquismo em 1921-1922. O próprio Astrojildo, com
sua natural modéstia, jamais se atribuiria um papel político demasiado
destacado, pois sempre primou pela discrição, pela modéstia. Quando o PCB
foi fundado, a maioria dos comunistas já o reconheciam como líder. Mas ele
preferiu ficar em segundo plano e apoiou Abílio de Nequete para o posto de
secretário-geral e só assumiu o comando da agremiação quando Nequete renunciou,
poucos meses depois.
Heitor
Ferreira Lima, que o conheceu em 1923, descreveu-o mais tarde, com simpatia:
“Calmo, sério, falando sem pressa, tinha prosa agradável e variada. Jovial e
simples, apreciava anedotas, bebendo às vezes cerveja, nos encontros de cafés
com os companheiros”. Polemizou com ex-companheiros de militância anarquista e
se esforçou para levar a insígnia do Partido Comunista do Brasil a ser
oficialmente reconhecido pela Internacional
Comunista para lhe assegurar a sobrevivência. Ao longo dos anos vinte, foi
gradualmente esboçando na orientação política do seu partido um movimento capaz
de tirá-lo do isolamento, capaz de lhe permitir pôr em prática uma política de
alianças um pouco menos estreita do que aquela que vinha sendo seguida. Fez um
acordo com o professor positivista Leônidas de Rezende para que os comunistas
utilizassem o jornal diário A Nação
em seu trabalho de propaganda. Organizou o Bloco
Operário e Camponês para participar das eleições. E procurou Luís Carlos
Prestes na Bolívia, levando-lhe literatura comunista, para tentar atrair o
comandante da Coluna Invicta. A
marcha da Coluna começou em 29 de abril de 1925. O objetivo era lutar contra o
governo de Artur Bernardes e percorrer o país para mobilizar os setores estratégicos da população do
interior nessa causa. Isidoro Dias Lopes, um dos participantes da Revolta
Paulista de 1924, foi enviado à Argentina para organizar uma cooperação
internacional para a Coluna. As tropas organizadas da Coluna percorreram, ao
todo, 25 mil quilômetros no interior do Brasil.
Num
dado momento, a vinculação com a Internacional Comunista, que na cabeça de
Astrojildo garantia a sobrevivência ao PCB, começou a ser fonte de graves
transtornos: um emissário da Internacional, o lituano August Guralski, veio
para o Uruguai e de lá passou a “enquadrar” os comunistas brasileiros.
Astrojildo foi chamado a Montevidéu para uma reunião, mas levou um “pito”, foi
obrigado a dissolver o Bloco Operário e
Camponês; em novembro de 1930, foi destituído de seu posto e mandado para
São Paulo: deram-lhe uma chance de se “reabilitar”, atuando nas bases do
partido. Por fim, em 1931, depois de muita humilhação, Astrojildo se retraiu,
afastou-se do partido que tinha fundado. Não abandonou em nenhum momento seus
princípios e suas convicções, porém deixou de ter militância. Foi um tempo
triste e sombrio para ele. Lembra Leandro Konder que felizmente, a vida
lhe proporcionou um consolo: casou-se com aquela que viria a ser a sua
companheira até o final da sua vida, dona Inês, filha de Everardo Dias, autor
do ensaio História das lutas sociais no
Brasil.
Astrojildo
se destacou em várias iniciativas políticas de grande importância na primeira
década de vida do PCB: a publicação do jornal A Nação de janeiro a agosto de 1927, o prócer dispôs-se a
preservar, dentro da unidade de ação, um espaço significativo para a
diversidade ideológica que sabia existir ente Leônidas de Rezende e os
comunistas, Leônidas que era o proprietário do jornal, cedia-o como simpatizante
à orientação do PCB, mas reivindicava a publicação do periódico de artigos nos
quais tentava realizar, ecleticamente, seu sonho: combinar Marx e Augusto
Comte. Otávio Brandão e Paulo de Lacerda, ou seja, os dois outros membros da
direção do PCB que integravam, pelo acordo, a direção do jornal, protestavam
contra a publicação dos artigos; e era Astrojildo quem contornava com
diplomacia os atritos e continha a irritação sectária de seus companheiros,
poupando o aliado precioso; o empenho na formação do Bloco Operário e logo em seguida na formação do Bloco Operário e Camponês; a publicação
da revista intitulada: Autocrítica,
no 2°semestre de 1928, para
promover ampla discussão preparatória do 3° Congresso do PCB; o primeiro
encontro e as primeiras conversas de um dirigente do PCB com Luiz Carlos
Prestes, exilado na Bolívia, em dezembro de 1927. Astrojildo como
secretário-geral do PCB, teve uma acentuada preocupação com a democracia
interna no partido, apesar da clandestinidade ligadas aos
aparelhos repressivos de Estado e à extrema dificuldade de atrair recursos financeiros
pela agremiação.
Entre
fevereiro de 1929 e janeiro de 1930 Astrojildo Pereira viveu em Moscou, de onde
voltou coma orientação de proletarizar
o Partido Comunista Brasileiro, ou seja, de promover a substituição dos intelectuais na direção do partido por membros operários
engajados. Em novembro de 1930, acabou sendo atingido, ele próprio, pelo
processo de proletarização e foi afastado da Secretaria-Geral do partido. No
ano seguinte, após breve período de atuação junto ao Comitê Regional de São
Paulo, desligou-se do PCB. A partir de então, dedicou-se durante muitos anos
aos negócios particulares herdados do pai e, já como crítico literário reconhecido,
colaborou no jornal carioca Diário de
Notícias e na revista Diretrizes.
Em 1942, por iniciativa de escritores contrários à falta de liberdade de
expressão imposta pelo regime autoritário do Estado Novo, foi fundada no Rio de
Janeiro a Associação Brasileira de
Escritores. Entre seus fundadores incluíam-se Otávio Tarquínio de Sousa
(presidente), Sérgio Buarque de Holanda, Astrojildo Pereira, Graciliano Ramos,
José Lins do Rego, Sérgio Milliet, Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Érico
Veríssimo. Em 1944, incentivada por Jorge Amado, Aníbal Machado, Oswald de
Andrade e outros, a associação resolveu realizar um congresso. No dia 22 de
janeiro de 1945, reuniu-se assim no Teatro Municipal de São Paulo o importantíssimo
I Congresso Nacional de Escritores.
A
reunião representou uma manifestação de oposição ao governo de Getúlio Vargas,
contribuindo para aprofundar a crise do regime. Participaram do I Congresso Brasileiro de Escritores
nomes expressivos da intelectualidade do país, além de convidados estrangeiros.
A Mesa Diretora era composta, entre outros, por Aníbal Machado (presidente),
Sérgio Milliet, Dionélio Machado, Murilo Rubião e Jorge Amado. Durante o
encontro foi redigido pelo coletivo manifesto exigindo a legalidade democrática como garantia da completa liberdade de
pensamento, e a instalação de um governo eleito pelo povo mediante sufrágio
universal direto e secreto. Contudo, a história política revela-nos que, no
Brasil elitista, nem tudo que é legal é legítimo. Em 1944, publicou Interpretações, obra que reune estudos
sobre literatura, com destaque ao artigo Machado
de Assis, romancista do Segundo Reinado. Em 1945, foi delegado do Estado do
Rio no I Congresso Brasileiro de
Escritores, realizado em São Paulo, e um dos redatores da Declaração de Princípios
do encontro, marcada por críticas à ditadura golpista de Getúlio Vargas. Neste ano retornou ao PCB e passou a colaborar intensamente da imprensa
partidária. Dirigiu as revistas Literatura,
Problemas da Paz e do Socialismo e Estudos Sociais, colaborando na Imprensa Popular e na revista Novos Rumos. Em outubro de 1964, foi
preso em decorrência do golpe civil-militar de 1° de abril que duraria
21 anos. Permaneceu na prisão carioca por meses, infelizmente em estado de saúde
precário. Morreu no Rio de Janeiro, em 1965.
Bibliografia geral consultada.
LIMA, Heitor Ferreira, “Astrojildo Pereira e
uma Mudança na Orientação do PCB”. In: Memória & História, n° 1. Astrojildo
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1981; RUBIM, Antonio Albino Canelas, Partido Comunista, Cultura e Política Cultural. Tese de Doutorado em Sociologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Depatamento de Ciências Sociais. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1986; CARONE, Edgard,
O Marxismo no Brasil: Das origens a 1964.
Rio de Janeiro: Editora Dois Pontos, 1986; RIBEIRO, Francisco Moreira, O PCB no Ceará: Ascensão e Declínio – 1922-1947.
Fortaleza: Universidade Federal do Ceará; Editor Stylus, 1989;GUIMARÃES,
Valéria Lima, O PCB Cai no Samba: Os Comunistas e a Cultura Popular (1945-1950).
Dissertação de Mestrado. Programa de Mestrado em História. Rio de Janeiro:
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2001; LENA JÚNIOR, Hélio de, A Idade da Revolução: Astrojildo Pereira e José Carlos Mariátegui na Construção do Marxismo Latino-americano. Tese de Doutorado em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Instituto de Ciências Humanas e Sociais. Seropédica - RJ: Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2007; KONDER, Leandro, “Astrojildo Pereira: o Homem, o Militante, o Crítico”. In: Memória & História, n° 1, Astrojildo Pereira. Documentos
Inéditos. São Paulo: Livraria Editora Ciências Humanas, 1981; Idem, Memórias de um Intelectual Comunista.
Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2008; CZAJKA, Rodrigo, Praticando
Delitos, Formando Opinião: Intelectuais, Comunismo e Repressão no Brasil
(1958-1968). Tese de Doutorado em Sociologia. Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, 2009; GOULART, Laryssa de
Souza, Astrojildo Pereira e a Formação do
Partido Comunista Brasileiro. Dissertação de Mestrado. Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras de Assis. Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, 2013; LEPERA, Luciano Patrice Garcia, Espaço e Política: O PCB e suas Ações no Território Brasileiro
(1922-1964). Dissertação de Mestrado em Ciências Humanas.Programa de
Pós-graduação em Geografia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia,
2015; SILVA, Michel Goulart da, Entre a
Foice e o Compasso: Imprensa, Socialismo e Maçonaria na Trajetória de Everardo
Dias na Primeira República. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em
História. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2016; ANDRETO, Lucas Alexandre, “Polo Norte do Comunismo? Os Primeiros Anos do Partido Comunista do Brasil (PCB) na Cidade de São Paulo”. In: Revista Hydra, volume 4, n° 8, setembro de 2020; FREITAS, Maria Cleidiane Cavalcante, Por uma Pedagogia da Práxis! A Pedagogia Soviética enquanto Alternativa Histórica. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Centro de Educação. Fortaleza: Universidade Estadual do Ceará, 2020; entre
outros.