Ricardo Vélez - Antipetismo & Afinidades Fascistas na Política.
Ubiracy de Souza Braga*
“Há a ilegitimidade pelo título e a ilegitimidade pelo exercício”. Raymundo Faoro
Autoridade é uma prática que um indivíduo tem por possuir determinado conhecimento, que está ligado à liderança, compostura e comando. Representa a base social de certos tipos de organização hierarquizada. Refere-se à prática social que tem como objetivo levar as pessoas a perceberem e respeitarem as normas, julgando sua legitimidade e avançando no desenvolvimento da democracia, no estabelecimento do bem maior. Sociologicamente, Max Weber em uma passagem de seu ensaio de 1904, sobre a objetividade do conhecimento científico-social, reconhece (com reservas) a existência de uma Wahlverwandtschaft (“afinidade eletiva”) entre as visões de mundo e os interesses de classe, mas esta hipótese não é prosseguida, segundo Löwy (1985), aprofundada ou levada em consideração em seus escritos metodológicos. Os valores sociais compreendidos na sociedade e os pontos de vista (“Gesichtspunkte”) são para ele condicionantes para o aprimoramento nos níveis de análise.
Na esfera da vida social a luta política é uma das questões que sempre marcaram a dialética entre capital e trabalho. Mas a esfera social onde a ideologia manifesta mais explicitamente seu poder de enviesamento é, com certeza, o campo da atividade intelectual. O autoritarismo, ao contrário, está ligado às práticas antidemocráticas e antissociais. Representa a imposição condicionada pelo uso da força bruta da política, e geralmente as decisões se restringem às vontades do próprio indivíduo ou de pessoas estritamente ligadas a ele, decerto no âmbito pessoal, profissional, acadêmico, enfim, governamental. Quando existe autoridade, as pessoas agem motivadas afetivamente pelo líder que a detém, visualizando o alcance conspícuo do que objetiva. Quando é o autoritarismo que prevalece, de mil formas e jeitos, as pessoas também agem, porém não existe motivação pessoal; existe sim, medo, terror de Estado, censura e ameaças constantes em nível individual (sonho) e coletivo (os ritos).
O sujeito da ação política é alguém que quer conhecer o quadro em que age; que quer poder avaliar o que pode e o que não pode fazer. Mas, ao mesmo tempo, é um sujeito que depende, em altíssimo grau, de motivações particulares, sua e dos outros para agir. A política é levada a lidar com duas referências contrapostas, legitimando-se através da universalidade dos princípios e viabilizando-se por meio das motivações particulares. Mas vale lembrar que os caminhos trilhados na política e na universidade em geral evitam a opção por uma dessas linhas extremadas: o doutrinarismo, o oportunismo crasso, o cinismo ostensivo ou a completa e absurda indiferença. São frequentes as combinações de elementos de tais direções, porém combinados em graus e dimensões diversas. E é nessa combinação hábil que se enraíza a ideologia política. Sua atividade interpretativa também pode ser criativa, de modo que ao interpretar um caso, determinado ator social aplicaria e criaria um direito novo, praticamente legislando. No Brasil desde a queda da ditadura do Estado Novo, em 1945, e a ascensão do populismo nos governos que se sucederam hic et nunc até o golpe de Estado de 1964, a sociedade havia mudado, tornando-se complexa e diversificada em politica.
A industrialização e o crescimento da população urbana, somados
à legislação trabalhista varguista e ao fortalecimento de sindicatos, partidos
políticos e movimentos sociais rurais e urbanos, favoreceram a mobilização e a
radicalização em torno de propostas nacionalistas, anti-imperialistas, e de
reformas de base, tais como a urgentíssima reforma agrária no Brasil. Os
processos de transição política e consolidação democrática no Brasil podem ser
considerados um excelente laboratório de Ciência Política, tanto pela longue
durée, como pela variedade dos eventos que marcam tal período da história
brasileira recente. Em 1945, o debate intelectual girava em torno da
democratização. A nação estava
constituída em torno de seus interesses econômicos, de sua cultura e vontade
política. Ela se experimenta a si mesma, afirmando-se dia a dia contra as
nações dominantes. O sentimento de identidade é substituído pelo de confronto;
o avento do povo como sujeito político liga-se à sua mobilização a serviço da
soberania nacional. Dois episódios marcam simbolicamente a conjunção do
nacionalismo com a participação popular: a campanha que culminou na criação da
Petrobrás, a companhia nacional de petróleo, em outubro de 1953, e a emoção
desencadeada pelo suicídio de Getúlio Vargas. A campanha “O petróleo é nosso” propiciou a convergência de diversos setores nacionalistas que
se colocavam contra o projeto inicial apresentado por Vargas. A morte selou,
assim, a fusão do povo com a nação. O getulismo torna-se um mito (pessoa)
quanto ideário fundador. Estes foram os anos articulados economicamente no amálgama do chamado desenvolvimentismo.
Em
1953, os cariocas do grupo Itatiaia fundaram um instituto particular, Instituto
Brasileiro de Economia, Sociologia e Política, o IBESP, tendo como
secretário-geral Hélio Jaguaribe e do qual fizeram parte os economistas e
sociólogos. Em 1955, a ele se agregaram Juvenal Osório Gomes e Nelson Werneck
Sodré, militar de carreira, ligado à corrente nacionalista do general Newton
Estillac Leal. Dos paulistas do grupo Itatiaia, só Roland Corbisier entrou para
o novo Instituto. Esta irá publicar a revista Cadernos de Nosso Tempo entre
1953 e 1956 que irá elaborar um diagnóstico da sociedade brasileira. A morte de
Getúlio Vargas e sua substituição provisória por Café Filho, sustentado pelos
antigetulistas, transformou-se, com o novo nome do ISEB, num instituto oficial
plenamente autônomo, mas vinculado ao Ministério da Educação e Cultura, graças
ao apoio do titular desse Ministério, Cândido Motta Filho, sem ter jamais
aderido ao Integralismo, foi um simpatizante deste movimento reacionário, tendo
participado em 1932 da Sociedade de Estudos Políticos de São Paulo, primeira
etapa para a origem da Ação Integralista. No ISEB se reencontra a maioria dos
membros do IBESP. Hélio
Jaguaribe continuou como o verdadeiro dinamizador do Instituto, ainda que,
devido às suas responsabilidades no setor privado, não ocupasse a sua direção,
atribuída a Roland Corbisier. Foram criados os departamentos de filosofia,
história, economia, sociologia e ciência política, colocados sob a
responsabilidade de Álvaro Vieira Pinto, Cândido Mendes, Ewaldo Correia Lima,
Guerreiro Ramos e Hélio Jaguaribe. Foi instituído um Conselho de Tutela, no
qual participava professores tais como: Anísio Teixeira, Ernesto Luiz de Oliveira Júnior, Hélio Burgos
Cabral, Hélio Jaguaribe, José Augusto de Macedo Soares, Nelson Werneck Sodré,
Roberto Campos e Rolando Corbisier.
Com a eleição de Juscelino Kubitschek,
pareciam reunidas as circunstâncias “para fazer do ISEB uma peça essencial da
nova administração”. Como é sabido, Roland Corbisier era pessoalmente ligado ao
Presidente da República, e diversos membros do ISEB participaram
individualmente da campanha. Porém o ISEB, segundo Daniel Pécault (1990) estava
longe de ser homogêneo. Compreendia intelectuais que continuavam a tradição da
década de 1930: Roland Corbisier, Guerreiro Ramos e Cândido Mendes; filósofos
de formação, Álvaro Vieira Pinto; economistas, como Roberto Campos e Ignácio
Rangel; um militar-historiador marxista Nelson Werneck Sodré; um cientista
político como Hélio Jaguaribe, pari passu homem de negócios no cargo
responsável pela página econômica do Jornal do Comércio. Foram
muito diferentes as suas carreiras políticas: Roland Corbisier originou-se do
integralismo, próximos do qual também estiveram Álvaro Vieira Pinto e Guerreiro
Ramos durante certo período; Nelson Werneck Sodré, que colaborou na revista
Cultura Política durante o Estado Novo, inseriu-se na corrente nacionalista do
exército e iria tornar-se um dos intelectuais mais destacados do Partido
Comunista Brasileiro (PCB). Hélio Jaguaribe era antes de tudo, um
“desenvolvimentista”.
A projeção social do ISEB não advinha apenas de seus membros
permanentes, mas decorreu também do prestígio e honra de numerosos
conferencistas eventuais como Celso Furtado. Enfim, o ISEB provocou a
desconfiança não só de muitos intelectuais paulistas que nele viam, à
semelhança do grupo de Itatiaia, um ressurgimento do Integralismo (cf.
Trindade, 1971) de intelectuais de direita (cf. Bobbio, 1999), que percebiam
nele a aproximação entre getulistas e membros comunistas. O ISEB conservou-se,
sobretudo até 1958, mais como um centro de estudos. Na visão do ministro
Cândido Motta Filho, tratava-se de um Instituto Civil que devia, da mesma
maneira que a Escola Superior de Guerra consagrar-se às ciências sociais “afim
de aplicar as categorias e os dados dessas ciências à análise e compreensão
crítica da realidade brasileira, buscando a elaboração de instrumentos teóricos
que permitam estimular e promover o desenvolvimento nacional”. A
construção da capital Brasília (DF), de um lado, e o lançamento da indústria
automobilística confiada a firmas estrangeiras, de outro, revelam as oscilações
de um governo que, lança as bases do que logo foi batizado como “capitalismo
associado”. A partir de 1959-60, a cisão vai se exacerbando. Frente aos
nacionalistas que, durante o governo João Goulart, acreditaram vencer com a
concretização das “reformas de base”, a maior parte dos industriais,
exportadores e fundiários se organizam para influir sobre
a opinião pública.
Apoiados pela maioria dos grandes jornais estão na origem da
criação, em 1959, de fundações ideológicas como o IBADE - Instituto Brasileiro
de Ação Democrática e a ADEP - Ação Democrática Popular que propagavam o
anticomunismo e financiavam as campanhas eleitorais de candidatos “confiáveis”.
Na linguagem analítica da esquerda, a oposição entre os “nacionalistas” e “entreguistas”
comandava então o sentido nacional da vida política. Tudo o que pretendiam os
intelectuais orgânicos do ISEB era formular o “sentimento de massas”. A
tese central do “nacionalismo desenvolvimentista” tem como representação social
o desenvolvimento econômico e a consolidação da nacionalidade constituindo dois
aspectos do mesmo processo emancipatório. O desenvolvimento dependeria, assim,
de uma consciência nacional mobilizada em torno de uma vontade no plano global
de desenvolvimento. Na esfera cultural, a retórica do início dos anos 1960,
tanto de “direita” como de “esquerda”, para lembrarmo-nos da ciosa
interpretação de Norberto Bobbio, foi demarcada pelo uso corrente das
categorias sociais “povo” e “nação”, ou nacional-popular. Os movimentos sociais no caso emblemático do Centro Popular de Cultura, além do
discurso anti-imperialista adotaram postura vanguardista, baseada na
premissa de que a cultura é aquela produzida
por artistas e intelectuais que optaram pelo povo - enquanto a cultura do povo
era considerada arcaica e atrasada.
A coleção Cadernos Brasileiros e a Revista
Civilização Brasileira, editadas por Ênio Silveira, e a História Nova,
organizada por Nelson Werneck Sodré, sugerem a intensa colaboração entre o ISEB
e o CPC. Do
ponto de vista técnico o quadro administrativo do ISEB era formado por três
órgãos: o Conselho Consultivo, de orientação geral composto por 50 membros,
designados pelo MEC; o Conselho Curador, órgão de direção, com a assistência do
Conselho Consultivo e composto por oito membros, também designados pelo MEC; a
Diretoria Executiva, exercida por um Diretor eleito pelo Conselho Curador, além
de cinco Departamentos. Com o golpe de 1964 é aberto um Inquérito Policial Militar
do ISEB. Desse IPM foram destacados dois pontos que, na visão dos militares
participantes do golpe, comprometiam politicamente o ISEB tomado como uma
“organização determinada por Moscou”. Por um lado, publicou-se no Instituto
folheto esclarecedor acerca da vigência do regime parlamentarista com o
plebiscito realizado em 1961, a partir da renúncia de Jânio e que veio limitar
os poderes decisórios de João Goulart (1919-1976). Por outro lado, o ISEB cometeu o erro de
ter realizado cursos e conferências em entidades estudantis e sindicais -
leiam-se subversivas. O primeiro ato de Ranieri Mazzilli foi sua extinção pelo
Decreto n° 53. 884 de 13 de abril de 1964 (cf. Sodré, 1978).
A
totalidade concreta instituição já é, portanto, fruto de um trabalho de
abstração ou, se se prefere, fruto de um trabalho de produção de um objeto de
pensamento. Mas a constituição de uma totalidade concreta é muito pouco para um
trabalho teórico, segundo determinantes da própria teoria. Isto significa que,
se se quiser fugir de uma terminologia essencialista, será necessário entender
que uma proposição do tipo a escola é um sistema de reprodução da ideologia
dominante refere-se à totalidade empírica escola, não mais a este ou aquele
estabelecimento, totalidade esta cuja pertinência interpretativa se à sua
análise em termos de aparelho ideológico de Estado – uma entidade teórica
designa sempre uma propriedade que, se é observável, pode ser interpretada em
termos de propriedades empíricas de uma totalidade, jamais em termos de
totalidades enquanto tais. O engano de nomeá-las, multiplicando suas
propriedades exaustivamente, levaria no máximo à elaboração de um extenso
catálogo de nomes, uma confusão entre o plano de análise (teoria) e o plano da
realidade, jamais à produção de conhecimento. Por onde surge a categoria da
totalidade, desaparece o rigor científico.
Três
dias após o golpe político-militar de 1964, foi decretada a extinção do ISEB
seguido da instauração um inquérito policial-militar (IPM) para apurar suas
atividades. Diretores e professores do Instituto foram investigados
extrajudicialmente e alguns de seus pensadores, como Álvaro Vieira Pinto
tiveram que sair do país, compulsoriamente para o exílio. Entre o escol
composto pelos membros do Iseb estavam: Hélio Jaguaribe, Roland Corbisier, Alberto
Guerreiro Ramos, Nelson Werneck Sodré, Antonio Cândido, Wanderley Guilherme dos
Santos, Cândido Mendes, Ignácio Rangel, Álvaro Vieira Pinto e Carlos Estevam
Martins tendo como colaborador Celso Furtado, Gilberto Freyre e Heitor Villa
Lobos. Entre os seus membros ilustres, em oposição assimétrica, podemos citar
Miguel Reale e Sérgio Buarque de Holanda. Entre seus alunos mais destacados,
inclui-se o ativista afro-brasileiro Abdias Nascimento. O ISEB surgira em 1955,
por decreto do presidente da República, João Café Filho.
Criado
e regulamentado por Juscelino Kubitschek, o Instituto Superior de Estudos
Brasileiros (ISEB) projetou-se como centro formulador de uma ideologia
desenvolvimentista no país. Também sobressaiu enquanto concepção de cultura
como elemento impulsionador de transformações socioeconômicas e de fixação de
identidades nacionais. Este Centro de Altos Estudos nascia com liberdade de
opinião e de cátedra e se constituía, nos primeiros anos num quadro de
pensadores heterodoxos. Sua origem institucionalizava um debate sobre o
desenvolvimento econômico, político e social que já existia no Brasil desde a
década de 1940, mas que a universidade, incipiente, aparentemente não perfazia.
O instituto emergia dentro dos quadros orgânicos do Ministério da Educação, com
uma função e com um conteúdo de sentido claro: deveria produzir pesquisas e
análises que contribuíssem para a definição de um projeto nacional de
desenvolvimento econômico, político e social. Os isebianos, reunidos na Rua das
Palmeiras, no famoso bairro de Botafogo (RJ) promoveram vários cursos,
conferências, seminários, pesquisas, publicaram livros sob diversos temas etc.,
durante seus quase nove anos de existência como agremiação. Existiu um
pensamento isebiano e o Instituto realizou práticas
sociais em torno de intelectuais que não expressavam a mesma linguagem e nem
mesmo o “único receituário de orientação para suas opções políticas”.
O presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro (PSL), anunciou pelas redes sociais que o professor colombiano Ricardo Vélez Rodríguez é o ministro da Educação. Crítico do Enem escreveu no início de novembro que o órgão responsável pela aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio entende as provas “mais como instrumentos de ideologização do que como meios sensatos para auferir a capacitação dos jovens no sistema de ensino” (cf. O Globo, 23/11/2018) e com afinidade ao dístico “Escola sem Partido”, ele é professor-colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, um município brasileiro no interior do estado de Minas Gerais. Localiza-se na Zona da Mata mineira, a sudeste da capital do estado. - “Gostaria de comunicar a todos a indicação de Ricardo Vélez Rodríguez, filósofo, autor de mais de 30 obras, atualmente professor Emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, para o cargo de Ministro da Educação”. O professor é (des) conhecido na comunidade científica fora do meio militar.
Ele admite que foi indicado pelo didata Olavo de Carvalho a Bolsonaro para comandar a Pasta. A indicação do professor ocorre um dia depois da bancada evangélica vetar o educador Mozart Neves, diretor do Instituto Ayrton Senna. Ele era crítico do projeto “Escola sem Partido”, uma das principais armas do ex-militar eleito. O procurador regional do Distrito Federal, Guilherme Schelb era cotado para o ministério da educação. Schelb admitiu ter apoio “muito significativo” da bancada evangélica e reafirmou ser a favor do movimento “Escola Sem Partido”. Depois que saiu o anúncio de Vélez Rodríguez, Schelb “parabenizou” o presidente pela indicação. No texto, diz que é preciso “refundar” o Ministério da Educação no “contexto da valorização da educação para a vida e a cidadania a partir dos municípios” e que será o ministro da Educação para tornar realidade a proposta externada Jair Bolsonaro (PSL), de “Mais Brasil e Menos Brasília”. É critico de nomes que foram pensados para o Ministério da Educação e Cultura (MEC), como a da presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Maria Inês Fini. Para ela o Exame Nacional do Ensino Médio, que ela é responsável é “instrumento de ideologização”. Existe neutralidade axiológica na educação, na religião, na medicina, nos desportos, na ciência?
A maioria dos países socialmente avançados considera a cultura como um elemento fundante e insubstituível na construção da identidade nacional e, ipsofacto, sempre lhe conferem órgão de escalão mais elevado na estrutura do Estado, pois é por meio dele que se pode dar mais visibilidade aos processos de reconstituição histórica do passado e que se expõem ao mundo as realizações efetivadas por meio do espírito nacional, sem falar nas possibilidades de sua contribuição para a economia de uma nação. A Finlândia, por exemplo, é um país de 1° mundo muito bem colocado nas mais diversas análises comparativas socioeconômicas internacionais, cuja população usufrui de um altíssimo nível de desenvolvimento humano. A recente visita ao Brasil da diretora do Ministério da Educação e Cultura da Finlândia, Jaana Palojärvi, referendou os primeiros lugares no Programme for International Student Assessment (Pisa), que mede a qualidade de ensino. O segredo deste sucesso, segundo a diretora, “não tem nada a ver com métodos pedagógicos revolucionários, uso da tecnologia em sala de aula ou exames gigantescos como Enem ou Enade”. Pelo contrário: “a Finlândia dispensa as provas nacionais e aposta na valorização do professor e na liberdade para ele poder trabalhar”. A educação é gratuita, inclusive no ensino superior. As crianças só entram na escola a partir dos 7 anos. Não há escolas em tempo integral, pelo contrário, a jornada é curta, de 4 a 7 horas, e os alunos não têm longos e demorados exercícios de casa.
Para o novo ministro todos estão reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista travestida de “revolução cultural gramsciana” (cf. Rodríguez, 2006), com toda a corte de invenções deletérias em matéria pedagógica como a chamada “educação de gênero”. Para ele, essa educação atual estaria “destinada a desmontar os valores tradicionais da nossa sociedade, no que tange à preservação da vida, da família, da religião, da cidadania, em suma, do patriotismo”. Suas visões políticas são descritas por alguns analistas como de extrema-direita. Ricardo Vélez Rodríguez fez seus estudos básicos no Liceu de La Salle (Bogotá) e cursou o bacharelado em Humanidades no Instituto Tihamér Tóth, na mesma cidade. Licenciou-se em Filosofia pela Pontifícia Universidade Javeriana (Bogotá), em 1963. Entre 1965 e 1967, fez o curso de Teologia no Seminário Conciliar de Bogotá. Iniciou a sua vida docente em 1968, como professor de Literatura e Filosofia, na Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade Pontifícia Bolivariana (Medellín), e Ética Empresarial, na Escuela de Administración de Empresas e Instituto Tecnológico, na Colômbia, permanecendo em ambas as instituições até 1971. Em 1972-73, lecionou Filosofia e Humanidades na Universidade Externado de Colômbia e na Universidade do Rosário. Fez estudos de pós-graduação na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, obtendo o título de Mestre em Filosofia, em 1974.
De volta à Colômbia, exerceu o cargo acadêmico de Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade de Medellín, entre 1975 e 1978, uma instituição de educação superior, de carácter privado, sujeita a inspeção e vigilância por meio da Lei 1740 de 2014 e a Lei 30 de 1992 del Ministério de Educación de Colombia. A partir de janeiro de 1979, fixou residência no Brasil, inicialmente em São Paulo, onde trabalhou como pesquisador na Sociedade de Cultura Convívio, tendo sido redator da revista Convivium, publicação originalmente ligada ao Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES). Entre maio de 1979 e dezembro de 1980, foi conferencista da Universidade de São Paulo (USP), no curso de Estudo de Problemas Brasileiros. Em 1981, mudou-se para Londrina, onde se tornou professor do Departamento de Filosofia da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e criou, em 1982, o Curso de Pós-Graduação em Pensamento Político Brasileiro. Neste ano obteve o título de Doutor em Filosofia pela extinta Universidade Gama Filho (RJ), com a tese: “Oliveira Vianna e o Papel Modernizador do Estado Brasileiro”, sobre F. J. de Oliveira Vianna, defensor de ideias eugenistas. Em 1983 vinculou-se ao Programa de Pós-Graduação em Pensamento Brasileiro. É professor da Faculdade Positivo de Londrina, instituição vinculada e pertencente desde 2017 ao Grupo Positivo do Paraná, onde leciona História do Direito, Teorias da Justiça e Filosofia, nos cursos de graduação em Direito e Administração.
Ricardo Vélez Rodríguez chegou ao Brasil em 1979, fugindo da violência na Colômbia onde, no ano anterior, haviam sido assassinados dezoito (18) professores. Propôs à sua primeira esposa, uma brasileira, que se mudasse para o Rio de Janeiro, onde ele poderia fazer seu doutorado, e retornassem quando a onda de violência tivesse passado. – “Eu disse para minha esposa, que era brasileira, que a coisa estava ficando feia em Medellín e lhe propus que fôssemos para o Brasil. Lá, eu fazia um doutorado e retornávamos. Quase não aceita a ideia porque adorava Medellín”. Mas a violência não cessou, e Rodríguez acabou permanecendo no Brasil, obtendo a nacionalidade brasileira em 1997. Atualmente reside na cidade de Londrina, no norte do Paraná, com sua segunda esposa, Paula Prux, com quem tem um filho, nascido em 2012. Ela, natural de Apucarana, também no Paraná, é filha do ex-tenente do Exército, advogado e professor Oscar Ivan Prux. Em seu blog pessoal “Páginas Para os Meus Filhos”, Ricardo Rodríguez declara apreciar “música clássica, especialmente Bach, Beethoven, Chopin, Vivaldi, Haydn e Haendel, e canções românticas de origem latino-americanas”.
A Colômbia é uma República onde a presidência da República domina a estrutura de governo. O presidente, eleito por voto popular em conjunto com o vice-presidente para um único mandato de quatro anos, serve paripassu como chefe de Estado e de governo. O parlamento bicameral da Colômbia é o Congreso, que consiste de um senado com 102 lugares e de uma Câmara de Representantes com 166 lugares. Os membros de ambas as câmaras são eleitos por voto popular para mandatos de quatro anos. A Colômbia é um membro da Comunidade Sul-Americana de Nações. O sistema judicial da Colômbia sofreu reformas significativas na década de 1990. De acordo com a vigente constituição, de 1991, a Colômbia é um Estado Social, em forma de República Unitária. O poder público encontra-se dividido em três partes, o executivo, o legislativo e o judiciário. O presidente e seu vice-presidente são eleitos por voto popular para mandatos de quatro anos. O presidente só pode ser reeleito uma única vez e serve tanto como chefe de Estado como chefe de governo. O primeiro presidente a se reeleger depois de aprovada a Constituição foi Álvaro Uribe Vélez. O parlamento bicameral da Colômbia é o Congresso. A Casa de Nariño, na capital federal Bogotá, é a sede do governo. Os partidos que tem representação resultado das eleições para o Senado e a Câmara de Representantes de 8 de março de 1998.
É um dos dois partidos políticos tradicionais da Colômbia. Disputou o poder com o Partido Liberal Colombiano desde meados do século XIX até 2002, tempo em que prevaleceu um sistema bipartidário. Desde sua fundação até 1957, a disputa pelo poder foi marcada pela violência política das guerras civis. Dos anos de 1930-2002 manteve-se como a segunda força no Congresso, depois do Partido Liberal, recuperando essa posição em 2010. Atualmente faz parte da coalizão que apoia o governo do presidente Juan Manuel Santos: 1) Partido Liberal: Considerado como reformista moderado. Tendem para “a prática de uma política econômica liberal com conteúdo social”. Considera-se o partido político mais representativo dos interesses urbanos e industrial, ainda tem certo apoio nas zonas rurais; 2) Nova Força Democrática: fundada por Andrés Pastrana, também é uma força conservadora; 3) Movimento de Salvação Nacional: foi criado em 1990 e é de tendência conservadora, foi o partido mais votado na Assembleia Constituinte e tem representado a linha mais “doutrinária do conservadorismo”; 4) Aliança Democrática M-19 quando a organização guerrilha M-19 “largou as armas e aceitou a competência eleitoral para conseguir por em prática suas finalidades políticas, se considera de tendência de extrema esquerda”, e last but not least, a União Patriótica: partido de tendência marxista considera-se como o “braço político” das FARC.
Vale lembrar - mutatis mutandis - que as sementes do IPES como também do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), e do Conselho Superior das Classes Produtoras, foram lançadas ao final da administração de Juscelino Kubitschek e durante a presidência de Jânio Quadros, em cujo zelo moralista eles depositavam grande esperanças. Embora interesses multinacionais e associados, individuais ou mesmo setoriais fossem devidamente articulados através da administração paralela, não havia nenhuma liderança política reconhecida e organizada ao final de 1960, exceto as associações de classe de cunho menos abrangente. O ISEB surgira em 1955 por decreto assinado pelo presidente da República, João Café Filho. Criado e regulamentado por Juscelino Kubitschek, o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) projetou-se como centro formulador do “desenvolvimentismo” de forma precípua na formação do país. Também sobressaiu enquanto concepção de cultura como elemento impulsionador de transformações socioeconômicas e de fixação de identidades nacionais.
Este Centro de Altos Estudos nascia com liberdade de opinião e de cátedra e se constituía, nos primeiros anos num quadro de pensadores heterodoxos. Sua origem institucionalizava um debate sobre o desenvolvimento econômico, político e social que já existia no Brasil desde a década de 1940, mas que a universidade, incipiente, aparentemente não perfazia. O instituto emergia dentro dos quadros orgânicos do Ministério da Educação, com uma função e com um conteúdo de sentido claro: deveria produzir pesquisas e análises que contribuíssem para a definição de um projeto nacional de desenvolvimento econômico, político e social. Os isebianos, reunidos na estreita Rua das Palmeiras, no bairro de Botafogo (RJ) promoveram vários cursos, conferências, seminários, pesquisas, publicaram vários livros etc., durante seus quase nove anos de existência. Existiu o pensamento isebiano e o Instituto pretendeu realizar um conjunto de práticas em torno de intelectuais que não expressavam a mesma linguagem e nem mesmo o “único receituário de orientação para suas opções políticas”.
O IPES passou a existir. Seus fundadores do Rio de Janeiro e de São Paulo, o núcleo do que se tornaria uma rede nacional de militantes grupos de ação, vieram de diferentes backgrounds ideológicos. Os canais de persuasão e as técnicas mais comumente empregadas compreendiam a divulgação de publicações, palestras, simpósios, conferências de personalidades famosas por meio da imprensa, debates públicos, filmes, peças teatrais, desenhos animados, entrevistas e propaganda no rádio e na televisão. O liame que os unificava, eram suas relações econômicas multinacionais e associadas, seu posicionamento anticomunista e a sua ambição de readequar e reformar o Estado. Esses empresários visavam a uma liderança compatível com sua supremacia econômica e ascendência tecnoburocrática, pois, como foi observado, “a direção do país não podia mais ser deixada somente nas mãos dos políticos”. A instituição foi recebida favoravelmente pelos diversos órgãos da imprensa, tais como o Jornal do Brasil, O Globo, o Correio da Manhã e a Última Hora. Contou também com o beneplácito do conservador Arcebispo do Rio Dom Jayme de Barros Câmara, enquanto outras figuras políticas, eclesiásticas e intelectuais aplaudiram da mesma forma o seu aparecimento.
Vélez Rodríguez defendeu em 2017 o movimento político reacionário “Escola Sem Partido”. – “Esta é uma providência fundamental. O mundo de hoje está submetido, todos sabemos, à tentação totalitária, decorrente de o Estado ocupar todos os espaços, o que tornaria praticamente impossível o exercício da liberdade por parte dos indivíduos”. Afirmou que: [os brasileiros estão] “reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de 'revolução cultural gramsciana', com toda a corte de invenções deletérias em matéria pedagógica como a educação de gênero”. Assim como Ernesto Araújo, manifesta-se “contra o globalismo politicamente correto”. Defende o regime militar instaurado em 1964 no Brasil e, segundo ele, o dia 31 de março de 1964, que marca o golpe militar no Brasil que ele chama de “revolução”, comparando-a à Revolução Gloriosa de 1688. No mesmo texto, de 2017, Vélez escreve: - “A malfadada Comissão da Verdade que, a meu ver, consistiu mais numa encenação para “omissão da verdade”, foi a iniciativa mais absurda que os petralhas tentaram impor”. Ele também ironiza sem razão o conceito universal de direitos humanos e o “patriótico papel” desempenhado pelos militares no período em que estiveram no poder.
– “O regime militar tinha um propósito, em que pese o viés autoritário evidentemente criticável”. Católico por formação é crítico da Teologia da Libertação. Em 17 de maio de 2014 durante o governo Dilma Rousseff (PT), Ricardo Vélez Rodríguez se demonstrou favorável ao regime monárquico, na sua conta na rede social chamada Facebook afirmando o seguinte: - “Nunca votei no PT nem apostei que a tal sigla moralizaria o Brasil. No restante do artigo, concordo com Dom Bertrand de Orleans e Bragança. Ele é uma brava voz que se levanta contra a podridão em que a petralhada ajudou a afundar o Brasil. Tivéssemos monarquia, não estaríamos às voltas com todas estas lambanças. O monarca, de há muito, teria dissolvido o parlamento e convocado novas eleições para renovação do elenco!”. Enfim, seu nome foi sugerido a Jair Messias Bolsonaro (PSL), para dirigir Ministério da Educação (MEC), pelo oportunista fascista Olavo de Carvalho. Em 2 de janeiro de 2019, durante a posse no ministério, declarou: - “Combateremos o marxismo cultural, hoje presente em instituições de educação básica e superior. Trata-se de uma ideologia materialista alheia aos nossos mais caros valores de patriotismo e de visão religiosa do mundo”.
De acordo com Fanjul (2019) as repercussões, preocupadas ou indignadas, no meio educacional, não têm sido poucas: o longo depoimento do ministro reafirma perspectivas de perseguição ideológica em todos os níveis da educação nacional e, particularmente, de elitização, redução e/ou abandono do ensino superior. Perguntado pela disciplina sobre “educação moral e cívica”, que considera necessária no ensino básico, Vélez explicou: - “Hoje, adolescente viaja. É necessário lembrar que existem contextos sociais diferentes e que as leis dos outros devem ser respeitadas. O brasileiro viajando é um canibal. Rouba coisas dos hotéis, rouba o assento salva-vidas do avião; ele acha que sai de casa e pode carregar tudo. Esse é o tipo de coisa que tem de ser revertido na escola”. A generalização claramente preconceituosa/racista de uma suposta conduta para todo um coletivo nacional resulta especialmente chocante na palavra de alguém que não apenas tem a função de educador, mas que erroneamente, está dando uma entrevista na qualidade de principal responsável pela gestão educativa do país. Não é casual, então, que sua fala conflua com as de brasileiros que almejam civilizar “de cima pra baixo” esse canibal que ainda não sabe se comportar em hotéis e em aviões, sem dúvida um problema prioritário para nossa educação básica pública. É que algum pudor nos impede enunciar a partir do Brasil que olha “de cima para baixo”, apesar de que, talvez, a reprovação pública não fosse tão estendida.
Bibliografia geral consultada.
URICOECHEA, Fernando, O Minotauro Imperial. São Paulo: Difusão Europeia doLivro, 1978; MEDEIROS, Jarbas,
Ideologia Autoritária no Brasil, 1930-1945. Prefácio de Raymundo Faoro.
Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1978; SODRÉ, Nelson Werneck, A
Verdade Sobre o ISEB. Rio de Janeiro: Editor Avenir, 1978; FAUSTO, Ruy, “Dialectique Marxiste, Humanisme, Anti-humanisme”. In: L’homme et la societe. Paris, 1985; pp. 133-147; LÖWY, Michael, Paysages de la Vérité: Introduction à une Sociologie Critique de la Connaissance. Paris: Éditions Anthropos, 1985; ARANTES, Paulo Eduardo, Extinção. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004; RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez, “O Marxismo Gramsciano, Pano de Fundo Ideológico da Reforma Educacional”. In: Ibérica. Juiz de Fora, 2006; pp. 50-64; LEÃO, Vicente de Paula, A Influência das Diretrizes Curriculares Nacionais do Ministério da Educação e Cultura para a Formação de Professores de Geografia para a Educação Básica em Nível Superior. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Geografia. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2008; BUÑEL, Luís, Mi Último Suspiro. Barcelona: Edicíon Debolsillo, 2012; HIDALGO, Yaremis Da Trinidade; CRUZ, Yenisey López, “La Hermenéutica en el Pensamiento de Wilhelm Dilthey”. In: Griot - RevistadeFilosofia. Santiago de Cuba, vol.11, n°1, junho/2015; MIGUEL, Luiz Felipe, “Da ‘doutrinação marxista’ à ‘ideologia de gênero’ – Escola sem Partido e as leis da mordaça no parlamento brasileiro”. In: Direito e Práxis. Rio de Janeiro, volume 7, n° 15, pp. 590-621, 2016; BELLI, Rodrigo Bischoff, O Irracionalismo como Ideologia do Capital: Análise de suas Expressões Ideológicas Fascistas e Pós-modernista. Tese de Doutorado em Ciências Sociais. Marília: Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais. Universidade Estadual Paulista, 2017; SCHWARCZ, Lilia Moritz, Sobre o Autoritarismo Brasileiro. São Paulo: Editora Companhia
das Letras, 2019; entre outros.
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