quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Pacote Anticrime - Justiça & Polícia de Estado no Brasil.


                                                                                                     Ubiracy de Souza Braga

As propostas dividem a opinião de especialistas. Há os que o consideram uma licença para matar”. Afonso Benites

          
           
          Marcelo Ribeiro Freixo nasceu na cidade de São Gonçalo, no estado do Rio de Janeiro em 12 de abril de 1967. É professor e político brasileiro, filiado ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) e atualmente deputado federal pelo Rio de Janeiro. Filho de Aroudo Ribeiro Freixo, um inspetor escolar, e Alenice Ribeiro Freixo, uma secretária, Marcelo Freixo nasceu em São Gonçalo, mas foi criado no subúrbio de Niterói, no bairro do Fonseca. Ingressou no curso de Economia, mas acabou optando pela transferência, formando-se em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Pelo mesmo estado foi deputado estadual por três mandatos consecutivos e presidiu a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ). Ganhou notoriedade nacional quando presidiu a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das milícias no Rio de Janeiro, tendo inspirado um personagem do filme Tropa de Elite 2 (2010), de José Padilha.

Nas eleições de 2014, foi o deputado estadual mais votado do Brasil. Foi candidato à prefeitura do Rio de Janeiro nas eleições municipais de 2016 pela coligação “Mudar é Possível”, formada pelo seu partido, o PSOL, e pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), tendo como vice a advogada e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro Luciana Boiteux. Freixo foi também colunista na Folha de S. Paulo até julho de 2016, escrevendo periodicamente textos de opinião sobre a conjuntura política, econômica e as questões sociais no Rio de Janeiro, no Brasil e no mundo. Além disso, foi membro da Fundação Lauro Campos, um think tank sem fins lucrativos criado pelo PSOL, com o objetivo de ensejar um “pensamento crítico comprometido com os valores do socialismo e da liberdade”, e que busca promover discussões sobre o país e a América Latina. No segundo turno Freixo obteve 1.163.662 votos (40,64%), perdendo para Marcelo Crivella do Partido Republicano Brasileiro (PRB), que alcançou 1.700.030 votos (59,36%). Nas eleições de 2018, foi eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro com 342.491 votos, sendo o segundo mais votado do estado.

Marcelo Crivella é um político carioca, escritor e religioso pentecostal brasileiro. Ocupa o cargo de bispo (licenciado) da denominação neopentecostal Igreja Universal do Reino de Deus, da qual é o principal representante no campo político-ideológico. É Senador da República pelo Partido Republicano Brasileiro (PRB) representando o estado do Rio de Janeiro. É um partido político brasileiro em organização recente desde 2003. O registro definitivo foi emitido em 25 de agosto de 2005. É presidido por Marcos Antônio Pereira desde dia 9 de maio de 2011. Até o início de 2006, o partido chamava-se Partido Municipalista Renovador (PMR), fundado por partidários do vice-presidente da República José Alencar Gomes da Silva, então presidente honorário do Partido Liberal, anteriormente reconhecido como Partido da República (PR), é um partido político brasileiro de direita fundado e registrado oficialmente em 2006. Atualmente detém a 3ª maior bancada na câmara dos deputados, atrás apenas do Partido Social Liberal (PSL) e do Partido dos Trabalhadores (PT). Como membro do chamado Centrão, o partido é base de apoio do governo do presidente Jair Bolsonaro, como também foi dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer. Com a crise política no Brasil e tendo como resultado o golpe de Estado de 2016, o Partido Republicano Brasileiro deixa a base aliada e passa a se tornar um partido independente.  

A bancada do Partido Republicano Brasileiro (PRB) na Câmara ganhou três parlamentares, na quarta-feira (9), com as filiações dos deputados Lincoln Portela (MG), Lindomar Garçon (RO) e Silas Câmara (AM), durante evento no gabinete da Liderança do PRB. A legenda passa a contar agora com 21 deputados federais. O líder do PRB, deputado Márcio Marinho (BA), e o presidente nacional do partido, Marcos Pereira, destacaram a importância de receber deputados experientes. “É um prenúncio do que podemos fazer. São parlamentares experientes e estamos abertos para conversar. Sabemos respeitar os deputados e as peculiaridades de cada região”, ressaltou Marinho. - “Já vínhamos conversando com o Silas Câmara há muito tempo. O Lindomar Garçon era para ter sido eleito pelo PRB em 2014, mas só agora, por circunstâncias da política. Lincoln Portela, no quinto mandato, vinha sendo convidado a vir para o PRB desde 2011, mas também trouxe o filho Leonardo, deputado estadual em Minas, para o PRB”.

O senador Marcelo Crivella (RJ) elogiou a qualidade política dos novos integrantes do PRB. - “Tenho visto mudanças de partido por interesses diversos. Aqui a mudança é ideológica, o que engrandece o PRB”. O deputado Lindomar Garçon explicou que já vinha querendo há algum tempo se filiar ao Partido Republicano Brasileiro e comentou a dificuldade de votar determinadas matérias na Câmara em função das questões regionais. Ex-líder da bancada, o deputado Celso Russomanno (SP) explicou que há espaço para divergências na legenda: - “O nosso partido é diferente, pois sabemos entender os companheiros. Tanto comigo, quanto com o Márcio Marinho, quem tem dificuldade para votar alguma matéria nos fala e nós sempre entendemos”.   Silas Câmara disse estar muito feliz com a filiação ao PRB: - “Conheço como funcionam a Casa e os partidos políticos, e nada me dá mais prazer do que saber que estou numa legenda que respeita princípios que eu valorizo. Todos temos uma visão estratégica e crítica sobre o Brasil atual, mas, sabemos que o PRB sempre terá um comportamento racional para discernir o certo do errado”. Lincoln Portela também expressou a satisfação de entrar no PRB e destacou sua ligação com o senador Crivella: - “Estou muito alegre de poder voltar para casa. Para mim, é o que vale”. A filiação dos novos parlamentares contou com uma apresentação do deputado Sérgio Reis (PRB-SP), que cantou a música “Menino da Porteira”.

Marcelo Crivella foi eleito senador em 2002, com cerca 3,2 milhões de votos. Em 2010 foi o primeiro senador reeleito no estado do Rio de Janeiro em 24 anos. Crivella foi eleito prefeito do Rio de Janeiro no segundo turno da eleição municipal de 2016, em disputa com Marcelo Freixo, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), fundado em 2004. Eleito com “folga” prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB) pode ser a grande aposta evangélica para a presidência da República. No “Painel”, da Folha de S. Paulo de terça-feira (1°11/2016), uma candidatura de Crivella nacionalmente funcionaria como uma espécie de “test drive”. - “Chegará o momento em que o Brasil terá um presidente evangélico. É natural”, diz o bispo Robson Rodovalho, presidente da Confederação dos Conselhos de Pastores do Brasil. Ele coordena as candidaturas pentecostais e neopentecostais pelo território nacional. A ideia político-ideológica aludida naquela conjuntura era a de chegar à representação de um rebanho em torno de 150 parlamentares evangélicos em 2018. Crivella obteve 59,37% dos votos contra 40,63% do opositor Marcelo Freixo, professor e político brasileiro, filiado ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e atualmente deputado federal pelo Rio de Janeiro. Pelo mesmo estado foi deputado estadual por três mandatos consecutivos e presidiu a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.

         O conceito de Polizeistaat (“Estado de polícia”) foi cunhado pela historiografia liberal alemã da segunda metade do século XIX, aludindo em particular à Prússia de Frederico II, o Grande. No século XVIII, o conceito tinha uma conotação positiva, como uma primeira forma de ordenamento constitucional personalista. Do ponto de vista instrumental, era geralmente aceito que os atos provenientes da autoridade e voltados à manutenção da ordem e da segurança estivessem “acima do controle dos tribunais”. Ampliou-se tanto quanto possível, o campo de ação da polícia. O Estado policial representa um ersatz do típico Estado absolutista monárquico, baseado no “ius politiae”, um direito calcado em alguns princípios jusnaturalistas, voltado à promoção do bem-estar dos súditos e à satisfação dos seus interesses, os quais eram, porém, determinados pela autoridade, confundindo-se então com os interesses gerais do tipo patrimonial. Assim, o bem-estar social dos súditos, a prosperidade do Estado e a ordem pública não seriam assegurados pela dinâmica das forças sociais, mas por um rigoroso e correto controle administrativo, de caráter autoritário, vertical e paternalista.
Segundo teóricos do absolutismo, como o filósofo prussiano Christian Wolff, a extensão dos poderes do Estado seria moralmente justificável por sua finalidade, que seria a de trazer bem-estar e felicidade aos indivíduos; e só o Estado absoluto poderia dispor do poder e dos meios necessários, inclusive a coação física, à realização de tal finalidade, por não estar sujeito às suas próprias leis. Tal concepção resulta em uma confusão entre fins - a felicidade dos súditos, e meios - o poder do Estado. É essa distorção que fundamenta o surgimento do Polizeistaat - o Estado de polícia ou Estado policial. Após a morte de Frederico II, em 1794, foi publicado o código: “Allgemeines Landrecht für die Preussischen Staaten” que, pela primeira vez, no âmbito dos Estados alemães, estabeleceu o princípio segundo o qual a lei obriga também aquele que a promulgou. Desta forma, ao Estado policial sucede o Estado de direito (“Rechtstaat”). Nas democracias constitucionais contemporâneas, o conceito assume uma conotação negativa - como um Estado marcado pelo uso intenso das forças da ordem ou polícia secreta. A ideia de Estado policial aparece ligada ao totalitarismo e sua ideologia.



O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro (PSDB), apresentou  seu “pacote de leis anticrime”. Em 34 páginas, o documento propõe 19 alterações em trechos de 14 leis diferentes, editadas entre os anos de 1940 durante os anos de repressão do Estado Novo e 2018 com a nomeação para o ministério. Ele apresentou o pacote numa reunião em Brasília, com os governadores de 12 Estados brasileiros - os governos estaduais possuem algumas das principais responsabilidades na área de segurança, como a manutenção das polícias civil e militar e da maioria dos presídios. Na visão do advogado criminalista Fernando Castelo Branco, as medidas de Moro, na prática, trata basicamente de um recrudescimento de penas e piorar as condições de progressão de regime. - “Tudo é coerente com um juiz federal recém-alçado à condição de ministro da Justiça. Mas que, talvez até por esse enfoque, não tenha tido uma visão um pouco mais ampla e necessária”. Um ponto mais criticado refere-se ao tratamento de um crime cometido por um policial pode ser considerado legítima defesa.
Um policial que matar um indivíduo e alegar que agiu sob “escusável medo, surpresa ou violenta emoção” pode ficar sem nenhuma punição, caso um projeto de lei proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro (PSDB), seja aprovado pelo Congresso Nacional. É o chamado “excludente de ilicitude”, que foi tão propalado pela campanha eleitoral do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). O Projeto  de Lei Anticrime dá mais poderes aos policiais, pois os inclui com status especial nos chamados excludentes de ilicitude. Ou seja, certas situações previstas na lei em que uma pessoa que comete crime não é punida pela Justiça. Por dia, estatisticamente, 14 pessoas são assassinadas após intervenção policial no país, conforme dados apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No total o chamado “pacote anticrime” altera 14 legislações e endurece o combate à corrupção, ao chamado “crime organizado” e a crimes do dia a dia praticados com violência. As propostas dividem a opinião de especialistas. Há os que o consideram uma “licença para matar”. E os que entendem ser um passo para combater a corrupção, mas é superficial em temas como segurança pública e a questão prisional. - “A proposta do ministro legitima execuções e extermínios praticados por policiais. Uma verdadeira lei do abate de jovens pobres”, afirma Ariel de Castro Alves, do Conselho de Direitos Humanos de São Paulo.
Após a divulgação do projeto de lei anticrime do governo federal elaborado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, diversas entidades da sociedade civil se posicionaram sobre o teor do texto. As reações variaram de elogios a críticas, passando pela defesa de debates profundos sobre as mudanças propostas na matéria, que seguirá para avaliação política do Congresso Nacional. A Ordem dos Advogados do Brasil  informou que irá realizar um “estudo profundo e abrangente” de cada uma das medidas previstas no pacote. O presidente da entidade, Felipe Santa Cruz, defendeu que a análise do projeto deve ser realizada observando a Constituição, preservando o devido processo legal e com grande debate no conjunto da sociedade. - “Tão forte quanto o desejo de conter a escalada da violência e da impunidade é o desejo de realizarmos tal tarefa como sociedade justa, democrática e moderna que reconhece a importância dos direitos fundamentais e o respeito ao devido processo legal. Não podemos cair no equívoco de supor que será possível resolver os complexos problemas da segurança pública apenas com uma canetada. É fundamental que um projeto dessa abrangência seja debatido a luz da Constituição Federal”, afirmou Cruz no site da Ordem dos Advogados. 

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública também entendeu que a proposta merece uma “análise mais aprofundada”. O combate à chamada “lavagem de dinheiro” foi pontuado como necessário, mas insuficiente para “frear a escalada do crime organizado e, principalmente, da criminalidade violenta”. A entidade lamentou que propostas anteriores, como o Plano Nacional de Segurança Pública editado pelo governo federal no ano passado, não tenham sido consideradas. E apontou lacunas presentes no conteúdo da matéria. - “O projeto ignora temas importantes para o setor, como a reorganização federativa, o funcionamento das polícias – e suas carreiras e estruturas -, governança, gestão ou sistemas de informação, ou inteligência. Também não há clareza sobre ações dos governos estaduais e da União no enfrentamento da corrupção policial, que é um dos aspectos que contribui para o surgimento de milícias”.
O projeto propõe uma série de alterações no Código de Processo Penal, na Lei de Execução Penal e no Código Penal para garantir o início do cumprimento de pena logo depois da condenação em 2ª Instância, que passaria a ser a norma - embora possa haver exceções. No Brasil, o Tribunal do Júri só é convocado para casos de crimes dolosos contra a vida - quando há a intenção de matar. A proposta altera o Código Penal para garantir que as decisões tomadas neste julgamento sejam cumpridas imediatamente - eventuais recursos que o réu possa apresentar não interromperão o processo. A lei atual já isenta de culpa o policial que age “usando moderadamente os meios necessários” para defender-se de “agressão, atual ou iminente”, a si ou a outra pessoa. O projeto de Moro faz uma pequena alteração na redação deste parágrafo do Código Penal, para aumentar o número de hipóteses que se enquadram dentro da categoria de legítima defesa. Passará a ser isento de culpa o policial que “previne” a agressão a si ou a outros, ou que “previne agressão ou risco de agressão à vítima mantida refém”. 
O presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, constituiu um grupo de trabalho para análise do projeto de Lei Anticrime proposto pelo ministro da Justiça Sérgio Moro. O grupo será coordenado pelos presidentes da Comissão Especial de Direito de Defesa, conselheiro Federal Juliano Breda, e da Comissão Nacional de Acompanhamento Legislativo, conselheiro Federal Ticiano Figueiredo. É composto pelos conselheiros Federais Ademar Rigueira, Alex Sarkis, Alice Bianchini, Ana Karolina Souza de Carvalho Nunes, Aniello Aufiero, Daniela Teixeira, Luiz René Gonçalves do Amaral, Guilherme Batochio, Gustavo Badaró, José Alberto Ribeiro Simonetti Cabral, Olavo Hamilton, Rafael Braude Canterji e Ulisses Rabaneda. O grupo irá elaborar estudos específicos a respeito das propostas apresentadas pelo Ministério da Justiça e enviará consulta a advogados especializados e professores de Direito Penal, Processo Penal e Criminologia. Em 15 dias, eles devem enviar ao grupo de trabalho suas análises sobre o projeto. Após o recebimento das respostas,  também em um prazo aproximado de 15 dias, consolidará os estudos para o fim de apresentar um relatório final ao presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, indicando suas conclusões a respeito da constitucionalidade, oportunidade e conveniência das alterações propostas. O Relatório Final será apresentado, primeiramente, na sessão do Conselho Pleno do dia 19 de março de 2019 e, posteriormente, com institutos e associações da comunidade acadêmica, quando a entidade divulgará os estudos e debaterá o projeto de lei com professores e autoridades convidadas.
  No sistema brasileiro é básica a distinção entre o individuo e a pessoa como duas formas de conceber o universo social e nele agir. Um dos denominadores comuns de todas as situações, porém, é a separação ou diferenciação social, quando se estabelecem as posições das pessoas no sistema social. As noções de indivíduo e de pessoa são fundamentais na análise sociológica. A noção de pessoa surgiu claramente com Marcel Mauss (1974), sendo progressivamente individualizada até chegar à ideia da pessoa como “ser psicológico” e altamente individualizado. A ideia de Mauss de que a pessoa era de fato um ponto de encontro entre a noção de indivíduo psicológico e uma unidade social. Mas é importante observar que, para ele, a noção de pessoa desembocava na ideia de indivíduo. A noção de indivíduo é também social. Em seguida, deseja revelar que a noção de indivíduo pode ser posta em contraste com a ideia de pessoa, que exprime outro aspecto da realidade humana. As duas noções permitem introduzir na análise o dinamismo necessário para poder revelar a dialética do universo social que é aquilo que é tomado de empiricamente elaborado por alguma entidade, de modo que ela possa tomar uma posição ou criar uma perspectiva de interpretação.
Uma pessoa pode ser presa mesmo que ainda não tenha uma condenação definitiva, ou seja, quando ainda não estão esgotados todos os recursos e instrumentos de defesa em instâncias superiores? Essa é a pergunta chave que envolve o Supremo Tribunal Federal (STF), em um impasse que pode impactar ainda mais a superlotação do sistema carcerário brasileiro, além de agravar a atual crise política do país. Tema que está sendo debatido durante julgamento do habeas corpus preventivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A Constituição Federal (1988) determina que ninguém será considerado culpado precisamente “antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, até que sejam esgotados todos os recursos e instrumentos de defesa do acusado”. No entanto, em 2016, o pleno do STF consolidou entendimento de que “a prisão após uma condenação em segunda instância não seria ilegal”. Vale lembrar que o próprio STF dava anuência, com a queda da então presidenta da República Dilma Rousseff, ao golpe de Estado legal, ocorrido em 17 de abril de 2016.

O deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) criticou a proposta de projeto de lei elaborada pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, para fortalecer o combate à corrupção com mudanças em 12 leis e nos códigos Penal e de Execução Penal. Para o deputado, o ministro trata as milícias de forma superficial ao equipará-las às facções de narcotraficantes. - “Não se enfrenta as milícias da mesma forma que se combate o tráfico de drogas, são organizações distintas”, diz em nota. Entre outros pontos, Freixo critica especificamente o item 4 do pacote apresentado pelo ministro, intitulado: “Medidas Relacionadas à Legítima Defesa”, aspecto nevrálgico que trata de homicídios cometidos por policiais. - “Na prática, se aprovada, a medida dará salvo conduto jurídico a policiais que cometerem execuções”.
O juiz também poderá “reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la” ao policial se “o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. Este foi um dos pontos mais polêmicos do projeto. Contudo, Moro afirma que a alteração não representa “nenhuma licença para matar” (cf. Pires, 2018), e que a alteração apenas coloca na lei “o que os juízes já fazem na prática”.  Isto que dizer o seguinte: - “o policial não precisa esperar levar um tiro para ele poder tomar alguma espécie de reação, o que não significa que se está autorizando que se cometam homicídios indiscriminadamente”. Indivíduos  condenados a penas menores que oito anos não vão para a cadeia - isto é, só cumpre pena em regime fechado os condenados cujas penas sejam maiores. A proposta altera este ponto, depois da condução coercitiva  do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e passa a prever que os condenados pelo “crime de peculato” e de “corrupção passiva e ativa” comecem a cumprir pena em regime fechado – “salvo se de pequeno valor a coisa apropriada ou a vantagem indevida”.             
O projeto “Medidas para Endurecer o Cumprimento das Penas”, também propõe regras mais duras para a progressão de regime dos presos por crimes hediondos. – “A progressão de regime ficará também subordinada ao mérito do condenado e à constatação de condições pessoais que façam presumir que ele não voltará a delinquir”. Vale lembrar que o pacote originalmente reconhecido como “10 medidas contra corrupção”, foi apelidadas ironicamente como “desmedidas”, pela profunda ruptura na Constituição de 1988 e no modelo de acusação brasileiro, já tão encarcerador. As medidas trazem a admissão de provas ilícitas, testes de integridade nos moldes “pegadinha”, esvazia o “habeas corpus”, além de outras medidas aplicáveis a todos os crimes, não só à corrupção, como foi divulgado pelo marketing institucional. O projeto de Lei 4.850/106, que reúne as chamadas “dez medidas contra a corrupção”, constitui um “código da acusação”, na avaliação do juiz Marcelo Semer, que atua convocado na 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
Atualmente os membros integrantes das chamadas “organizações criminosas” não precisam ir necessariamente para presídios específicos de segurança máxima. Pela proposta esses indivíduos quando presos com uso de armas terão necessariamente de começar a cumprir penas em unidades deste tipo. Condenados por este crime também não terão direito à progressão de regime, e os líderes das facções criminosas poderão passar até três anos em presídios federais. A lei determina que pessoas condenadas só possam ter seus bens confiscados se ficar comprovado que estes têm relação com o crime. Pela proposta, crimes punidos com mais de seis anos de prisão já possibilitarão o confisco dos bens do criminoso, desde que estes sejam maiores do que os que seriam compatíveis com a renda lícita da pessoa. Obras de arte ou outros que tenham valor cultural poderão ser perdidos para museus públicos. Os órgãos de segurança também poderão usar os bens apreendidos - veículos, equipamentos, etc. - em seu trabalho.
O projeto cria a figura do “denunciante de bem” (“whistleblower”) voltada para a pessoa que não está envolvida no crime do qual tem conhecimento. Na prática ressignifica o dedo duro, fofoqueiro, delator. Essa expressão teve origem na história em quadrinhos norte-americana, inicialmente publicadas em tiras de jornal, em 1934. O detetive “X-9” era um agente secreto que trabalhava numa agencia sem nome, que depois passou a ser denominada de FBI - Federal Bureau of Investigation uma unidade de polícia do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, durante um período em que esse órgão gozava de popularidade. Analogamente, X9 era também o nome dado aos presos do extinto presídio do Carandiru (SP), que ficavam no Pavilhão X9, que eram informantes da polícia, que recebiam “delação premiada”, e também os responsáveis por crimes hediondos, como sequestro e estupro, que se ficassem juntos com os outros presos poderiam ser mortos. Além de assegurar a proteção ao indivíduo, o “informante” também pode receber recompensa de até 5% do valor arrecadado, caso as informações dele, do ponto de vista econômico, resultem na recuperação de dinheiro desviado. Esta ideia já constava nas “Dez Medidas Contra a Corrupção”, apresentado por meio de um projeto de lei de iniciativa popular e desconfigurado pelo Congresso em 2016.
O levantamento nacional de informações penitenciárias - Infopen, 2017,  descortina a realidade concreta e crônica brasileira: com 726.712 indivíduos  privados de liberdade. O país detém o 3° lugar no ranking entre iguais como Estados Unidos, China e Rússia que mais acumulam “corpos dóceis” no sistema prisional no mundo. A crueldade não é mensurável em estatísticas, mas dois dados não podem passar despercebidos: (i) a taxa de presos sem condenação supera 40% e (ii) a taxa de ocupação nos presídios atingiu 197,4%. É assustador notar que no ano de 2002 representavam um total de 239.345 indivíduos presos (condenados e provisórios) e em 2016, menos de quinze anos depois, atingiu-se a marca de 292.450 presos provisórios. É fácil constatar estatisticamente que são mais de 700 mil presos para pouco mais de 350 mil vagas. O público alvo do sistema penal brasileiro é bem definido: jovens negros de baixa escolaridade, acusados de tráfico e “crimes patrimoniais”. A análise dos dados estatísticos, no entanto, revela proporcionalmente que 55% têm até 29 anos, fração que se eleva sobretudo a 74% se for considerado os casos em que os presos possuem idade até 34 anos. No total, 64% são negros. Se considerados apenas a população do sistema penitenciário federal, 73% são negros. Do total de presos, 80% não concluiu a educação formal equivalente ao Ensino Médio.
O embate entre o princípio da “presunção de inocência” e a “condenação em segunda instância” foi central para o julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que foi condenado a 12 anos e um mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre. O Tribunal, com sede na cidade de Porto Alegre, é o órgão de segundo Grau da Justiça Federal dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O ex-presidente da República responde a uma ação penal por suposta “prática de corrupção passiva e lavagem de dinheiro” no âmbito da chamada “Operação Lava Jato”, operacionalizada pelo então juiz Sérgio Moro (PSDB). O ex-presidente da República nega as acusações. Contra a decisão do TRF4, a defesa de Lula apresentou “embargos declaratórios”, um tipo de recurso proposto quando há omissão, contradição ou obscuridade na sentença. Os embargos foram julgados pelo TRF4 no dia 26 de março. Com o entendimento do STF, Lula foi condenado logo após o julgamento dos embargos. Em manifestações recentes, o ministro Celso de Mello, mais antigo membro da Corte, afirmou ser contrário à prisão antes de esgotados os recursos às cortes superiores. O ministro Gilmar Mendes, que havia votado a favor da prisão após 2ª instância, tem manifestado entendimento contrário. Outros membros da Corte deram ganhos de causa. Mas o que estava em jogo, naquela conturbada conjuntura, eram as eleições gerais de 2018 e segundo dados Lula tinha 70% de intenções de votos o que garantiria a imunidade parlamentar com a vitória das urnas.
Bibliografia geral consultada.

CARVALHO, José Murilo, Desenvolvimiento de la Ciudadania en Brasil. México: Fondo de Cultura Económica, 1995; AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli, Tendências do Controle Penal na Modernidade Periférica: As Reformas Penais no Brasil e na Argentina na Última Década. Tese de Doutorado. Programa de  Pós-Graduação em Sociologia. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2003; BOBBIO, Norberto, Il Futuro della Democrazia. 1ª Edizione. Roma: Einaudi Editore, 2005; HERVIEUX-WANE, Fabrice, Les Nouveaux Rites de Passage. L`ivresse ici et Maintenent. Paris: L`Éditeur du Français Langue Étrangère, 2006; MISSE, Michel, “Le Movimento. Les Rapports Complexes entre Trafic, Police et Favelas à Rio de Janeiro”. In: Revue Déviance et Société. Editeur  Médecine & Hygiène. Volume 32, 2008; SOBREIRO, Rafael Soccol, Uma Nova Velha Polícia: Análise das Polícias Estaduais Brasileiras a partir das Estruturas Institucionais Historicamente Constituídas e das Transições Políticas Decorridas. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação - Mestrado Acadêmico em Ciências Criminais. Faculdade de Direito. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2016; AMBROSIO, Felipe Augusto Rodrigues, Desmilitarização da Segurança Pública e do Estado na Defesa da Democracia de Direito Brasileira. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídica. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Jacarezinho: Universidade Estadual do Norte do Paraná, 2017; WANDERLEY, Gisela Aguiar, Liberdade e Suspeição no Estado de Direito: O Poder Policial de Abordar e Revistar e o Controle Judicial de Validade de Busca Pessoal. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Direito. Faculdade de Direito. Brasília: Universidade de Brasília, 2017; Artigo: “Ao menos 9 dos 22 Ministros de Bolsonaro são Réus ou Investigados em Processos na Justiça”. In: https://www.revistaforum.com.br/13/12/2018; ECO, Umberto, O Fascismo Eterno. 1ª edição. Rio de Janeiro: Editora Record, 2018; KOHARA, Paulo Keishi Ichimura, Determinantes Inconscientes da Letalidade Policial. Tese de Doutorado. Instituto de Psicologia. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2019; CERIONI, Clara, “Lula Critica Lei Anticrime de Moro e Reforma da Previdência de Guedes”. In: https://exame.abril.com.br/6/02/2019; entre outros.

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