“Um fogo devora um outro fogo. Uma dor de angústia cura-se com outra”. William Shakespeare
O ponto de partida para a constituição do sujeito é o desejo, mas não um desejo dirigido a uma coisa ou mercadoria no mundo consumista. O homem se torna humano quando “deseja outro desejo”. Abre-se assim, ao homem, um novo espaço de liberdade, que se manifesta antes de tudo como um desejo de reconhecimento e produz uma luta de morte por puro prestígio – o ato fundante da história, o ato antropogênico por excelência. Mas para que haja história, é preciso que haja relação social entre homens vivos. A luta não pode terminar com a aniquilação de um dos lados. Um deles deve abdicar do combate, colocar a liberdade acima de sua vida, fora da relação entre “senhor-escravo”. Nela se concentrando outra atividade essencial ao projeto do homem: o trabalho intelectual como princípio de liberdade. A dialeticidade que assim se estabelece é um dos pontos culminantes do pensamento humano em todas as épocas, e sua conclusão é surpreendente e magistral: o homem integral, livre, satisfeito com o que é; o homem que se aperfeiçoa, não é o senhor nem o escravo, mas o que consegue suprimir sua sujeição. Na linguagem teórica, abstrata acadêmica, entendemos que as palavras e expressões, ou as palavras e as coisas, funcionam como representação de conceitos teóricos, mas em sua periodização histórica as palavras e expressões funcionam sempre de forma distinta, porque se referem a concepção pontual de formação de uma teoria da história.
A dificuldade própria da terminologia teórica consiste, pois, neste sentido em que, por detrás do significado usual da palavra, é preciso sempre discernir o seu significado conceptual, que é sempre diferente do significado usual empírico e casual contido na representação das fontes, nas atas, nos documentos oficiais etc. Na sua significação mais geral deve nos permitir a compreensão histórica e sociológica que tem por efeito social o conhecimento de um objeto: a narrativa da história. É assim que a história abstrata ou a história em geral não existem, no sentido exato do termo, mas apenas a história real, ou “como efetivamente ocorreu, desses objetos que enformam a experiência acumulada da humanidade. A determinação mais simples e primeira que o espírito pode estabelecer é o Eu, a faculdade de poder abstrair todas as coisas, até sua própria vida. Chama-se idealidade, idealização, precisamente esta supressão da exterioridade. Entretanto, o espírito não se detém na apropriação, transformação e dissolução da matéria em sua universalidade, mas, enquanto consciência religiosa, por sua faculdade representativa, penetra e se eleva através da aparência dos seres até esse poder divino, uno, infinito, que conjunta e anima interiormente todas as coisas, enquanto pensamento filosófico, isto é, como seu princípio universal, a ideia eterna que as engendra e nelas se manifesta.
O espírito finito, dialeticamente, segue um passo a passo e se encontra numa união imediata com a natureza, a seguir em oposição com esta e finalmente em identidade com esta, porque suprimiu/subsumiu a oposição e voltou a si mesmo e, per se, o espírito finito é a ideia, que girou sobre si mesma e que existe por si em sua realidade. Todo conhecer, todo aprender, toda visão, toda ciência, inclusive toda atividade prática, não possui nenhum outro interesse além do aquilo que “é em si”, no interior, manifestar-se desde si mesmo, produzir-se, transformar-se objetivamente. Nesta diferença se descobre toda a diferença na história do mundo. Os homens são todos racionais. O formal desta racionalidade é que o homem seja livre. Esta é a sua natureza. Isto pertence à essência do homem. O europeu sabe de si, é objeto de si mesmo. A determinação que ele conhece é a liberdade. Ele se conhece a si mesmo como livre. O homem considera a liberdade como sua substância. Se os homens “falam mal de conhecer é porque não sabem o que fazem”. Conhecer-se, converter-se a si mesmo no objeto (do conhecer próprio) na realidade o fazem relativamente poucos. Mas o homem é livre, hegelianamente, somente se sabe que o é. Pode-se também em geral falar mal do saber, como se quiser. Mas somente este saber libera o homem. O conhecer-se é no espírito a existência. Esta é a única diferença da existência (Existenz), a diferença do separável. O Eu é livre em si, mas também por si mesmo é livre e eu sou livre somente enquanto existo como livre. O conceito de figuração - mutatis mutandis - distingue-se de outros conceitos teóricos da sociologia por incluir expressamente os seres humanos em sua formação social.
Contrasta, portanto, com um tipo amplamente dominante de formação de conceitos que se desenvolve sobretudo na investigação de objetos sem vida, portanto no campo da física e da filosofia para ela orientada. Há figurações de estrelas, assim como de plantas e de animais. Mas apenas os seres humanos formam figurações uns com os outros. O modo de sua vida conjunta em grupos grandes e pequenos é, de certa maneira, singular e sempre co-determinado pela transmissão de conhecimento de uma geração a outra, por tanto por meio do ingresso singular do mundo simbólico específico de uma figuração já existente de seres humanos. Às quatro dimensões espaço-temporais indissoluvelmente ligadas se soma, no caso dos seres humanos, uma quinta, a dos símbolos socialmente apreendidos. Sem sua apropriação, sem, por exemplo, o aprendizado de uma determinada língua especificamente social, os seres humanos não seriam capazes de se orientar no seu mundo nem de se comunicar uns com os outros. Um ser humano adulto, que não teve acesso aos símbolos da língua e do conhecimento de determinado grupo permanece fora de todas as figurações humanas, pois não é um ser humano. As definições de controle social são demasiado amplas e vagas, e, portanto, seria legítimo indagar, escolhendo-as mais ou menos ao acaso, para inferir que resultam em termos de um controle, isto é, qualquer estímulo ou complexo de estímulos que provoca uma determinada reação na atividade cognitiva humana. Assim, pois, todos os estímulos são controles, pois representam a direção do comportamento por influências grupais, estimulando ou inibindo a ação individual, ou certamente em grupo.
O controle social pode ser definido como a soma total ou,
antes, o conjunto de padrões culturais, símbolos sociais, signos coletivos,
valores culturais, ideias e idealidades, tanto como atos quanto como processos
diretamente ligados a eles, pelo qual a sociedade inclusiva, cada grupo
particular, e cada membro individual participante superam as tensões e os
conflitos entre si, através do equilíbrio temporário, e se dispõem a novos
esforços criativos. Ipso facto, em toda a dimensão da vida associativa
deverá haver algum ajustamento de relações sociais tendentes a prevenir a
interferência de direitos e privilégios entre os indivíduos. De maneira mais
específica, são três as funções do estabelecidas pelo controle social: a
obtenção e a manutenção da ordem social, da proteção social e da eficiência
social. O seu emprego hic et nunc na investigação sociológica contribuiu
consideravelmente para produzir uma simplificação ou redução na análise dos
problemas sociais, conseguida proporcionalmente, graças à compreensão positiva
da integração das contradições correspondentes no sistema de organização das
sociedades e da importância relativa de cada um deles, como e enquanto
expressão do jogo social. Embora obscuro
e equívoco, em sentido corrente, o conceito de controle social é necessário à
investigação sociológica na modernidade, encontraram um sistema de referências
propício à sua crítica científica, seleção lógica e coordenação metódica.
O termo “confiança” aflora com muita frequência na linguagem cotidiana. A questão para Giddens é: como estas mudanças afetaram as relações de intimidade pessoal e sexual? Pois estas não são apenas simples extensões da organização da comunidade ou do parentesco. A amizade, por exemplo, desde Simmel ou Nietzsche, foi pouco estudada pelos sociólogos, mesmo se considerarmos a intuição de Alain Touraine a respeito, mas ela proporciona uma pista importante para fatores de amplo alcance que influenciam a vida pessoal. Temos de compreender o caráter da amizade em contextos pré-modernos precisamente em associação com a comunidade local e o parentesco. A confiança nos amigos era frequentemente de importância central. Nas culturas tradicionais, com a exceção parcial de algumas vizinhanças citadinas em Estados agrários, havia uma divisão bem clara entre membros reconhecidos como “os de dentro e os de fora ou estranhos”. As amplas arenas de interação não hostil com outros anônimos, característica da atividade social moderna, não existia. Nestas circunstâncias sociais, a amizade era institucionalizada e vista como meio de criar alianças mais ou menos duradouras com outros contragrupos potencialmente hostis. Amizades institucionalizadas eram formas de camaradagem, assim como mormente ocorrem nas reconhecidas “fraternidades de sangue”, constituídas socialmente ou corporativamente dentre “companheiros de armas”. Institucionalizada ou não, quer dizer, quando a amizade era baseada em valores de sinceridade e honra.
A sinceridade é uma virtude valorizada em circunstâncias onde as divisórias entre “amigo” e “inimigo” eram geralmente distintas e tensas. A vasta extensão de sistemas sociais abstratos associada à modernidade contemporânea transforma a natureza da amizade. Não por acaso o sociólogo inglês percebe que a amizade é com frequência um modo de reencaixe, mas ela não está diretamente envolvida nos próprios sistemas abstratos, que superam explicitamente a dependência ligada a laços pessoais. Acompanhando esta transição, a honra é substituída pela lealdade que não tem outro apoio a não ser o afeto pessoal, e a sinceridade substituída pelo que podemos chamar de autenticidade: a exigência de que o outro seja aberto e bem intencionado. Embora estas conexões sociais possam envolver “intimidade emocional”, isto não é uma condição da manutenção da confiança pessoal. Laços pessoais institucionalizados e códigos de sinceridade e honra informais ou informalizados fornecem estruturas de confiança. É bastante errôneo, contudo, realçar a impessoalidade dos sistemas abstratos contra as intimidades da vida pessoal como a maior parte das explicações sociológicas correntes tendem a fazer.
A vida pessoal dentro ou fora do trabalho, e os laços sociais que ela envolve estão entrelaçados com os sistemas abstratos de mais longo alcance como ocorre com o partido político. Alguns sentidos do termo, embora partilhem amplas afinidades eletivas, no sentido que Max Weber emprega, no âmbito da literatura e da sociologia, com outras utilidades de usos, são de implicação relativamente desimportante. Quer dizer, alguém que diz: “confio que você esteja bem”, normalmente quer dizer algo mais com esta fórmula de polidez do que “espero que você esteja com boa saúde” – embora mesmo aqui “confio” tenha uma conotação algo mais forte que “espero”, implicando algo mais próximo a “espero não ter motivos para duvidar”. A atitude de crença ou crédito que entra em confiança em alguns contextos mais significativos já se encontra aqui. Quando alguém diz: “confio em que X se comportará desta maneira”, esta implicação social é mais evidente, e não além do nível do “conhecimento indutivo fraco”. É reconhecido que se conta com X para produzir o comportamento em questão, dadas as circunstâncias normais. Eles não se relacionam aos sistemas perpetuadores de confiança, isto é, são designações referentes aos comportamentos; o indivíduo envolvido não é requisitado aquela “fé” religiosa que a confiança envolve em seus significados.
A
principal definição de “confiança” no Oxford English Dictionary é
descrita como “crença ou crédito em alguma qualidade ou atributo de uma pessoa
ou coisa, ou a verdade de uma afirmação”, e esta definição proporciona um ponto
de partida útil. “Crença” e “crédito” estão claramente ligados de alguma forma
à “fé”, da qual, seguindo Simmel, mas embora reconhecendo que a fé e confiança
são intimamente aliadas, Niklas Luhmann faz uma distinção entre as duas que é a
base de sua obra sobre o tema. A confiança, diz ele, deve ser compreendida
especificamente em relação ao risco, um termo que passa a existir apenas no
período moderno. A noção se originou com a compreensão de que resultados
inesperados podem ser uma consequência de nossas próprias atividades ou
decisões, ao invés de exprimirem significados ocultos de natureza ou intenções
inefáveis da Deidade. Mas “risco”, substitui em grande parte o que antes era
pensado como fortuna (fortuna ou destino) e torna-se separado das cosmologias.
A confiança pressupõe, segundo Giddens, consciência das circunstâncias de
risco, o que não ocorre com a crença. Tanto a confiança como a crença se
referem a expectativas que podem ser frustradas ou desencorajadas. A crença,
como Niklas Luhmann a emprega, se refere a atitude mais ou menos certa de que
as coisas similares permanecerão estáveis.
O
crescimento de um jovem convivendo e habitando comum em figurações humanas,
como processo social e experiência, assim como o aprendizado de um determinado
esquema de autorregulação na relação com os seres humanos, é condição
indispensável ao desenvolvimento rumo à humanidade. Socialização e
individualização de um ser humano, são nomes diferentes para o processo. Cada
ser humano assemelha-se aos outros, e é, ao mesmo tempo, diferente de todos os
outros. O mais das vezes, as teorias sociológicas deixam sem resolver o
problema da relação entre indivíduo e sociedade. Quando se fala que uma criança
se torna um indivíduo humano por meio da integração em determinadas figurações,
como, por exemplo, em famílias, em classes escolares, em comunidades aldeãs ou
em Estados, assim como mediante a apropriação e reelaboração de um patrimônio
simbólico social, conduz-se o pensamento por entre dois grandes perigos da
teoria e das ciências humanas: o perigo de partir de um indivíduo a-social,
portanto como que de um agente que existe por si mesmo; e o perigo de postular
um “sistema”, um “todo”, em suma, uma sociedade humana que existiria para além
do ser humano singular, para além dos indivíduos. Embora não possuam um começo
absoluto, não tendo nenhuma outra substância a não ser seres humanos gerados
familiarmente por pais e mães, as sociedades humanas não são simplesmente um
aglomerado cumulativo dessas pessoas. O convívio dos seres humanos em
sociedades tem sempre, mesmo no caos, na desintegração, na maior desordem
social, uma forma absolutamente determinada. É isso que o conceito de figuração
exprime. O termo “agorafobia”, por outro lado, tem origem no grego ἀγορά,
ágora, que significa praça pública, com o sufixo -φοβία, que significa “fobia”
ou “medo”. Existem persistentes críticas e debates a respeito do DSM.
Há um contínuo debate científico sobre a validade da construção e a confiabilidade prática das categorias diagnósticas e seus critérios, apesar de eles terem sido crescentemente padronizados ao aumento de profissionais em pesquisas controladas. É argumentado, entretanto, que os créditos científicos caraterísticos que foram empiricamente fundados são, em geral, exagerados. Apesar da oposição à introdução desta técnica, foi por muito tempo argumentado que esse sistema de classificação faz distinções categoricamente injustas entre as desordens e entre o normal e o anormal. É argumentado que critérios diagnósticos puramente baseados em sintomas falham em adequar a situação ao contexto em que a pessoa está vivendo, e se há real desordem interna de um indivíduo ou simplesmente uma resposta a uma situação em curso. É dito que o uso de aflição e desabilidade como critério adicional para muitos transtornos não tem resolvido problemas falso-positivos, porque o nível de afecção não é frequentemente correlacionado com sintomas relatados e pode se originar de vários fatores individuais e sociais. O contexto político é um tópico controverso, incluindo per se seu uso por indústrias farmacêuticas e seguradoras. O potencial conflito de interesses tem surgido porque aproximadamente 50% dos autores que previamente selecionaram e definiram as desordens psiquiátricas tiveram ou têm relacionamentos com indústrias farmacêuticas levantando expectativas do ponto de vista da neutralidade axiológica. Alguns argumentam que a “expansão dos transtornos” foi influenciada por motivos financeiros e representa um aumento da medicalização dos seres humanos, enquanto outros argumentam que problemas de saúde mental são subestimadas ou subtratadas.
A estratégia do passado recente que visava organizar novos espaços urbanos transformou-se meramente em artifícios políticos e muito pouco em torno de reabilitação de patrimônios. Depois de haver inconscientemente projetado a cidade futura, torna-se uma cidade frequentada por sua estranheza, muito mais elevada aos excessos que reduzem o presente, a nada mais que simples escombros como caixas d`água que deixam escapar seu domínio do tempo. Mas os técnicos se denunciam já no quadriculamento que atrapalhavam os planejadores funcionalistas que deviam fazer tábula rasa das opacidades contidas nos projetos de cidades transparentes. Afinal qual o urbanismo que não descontroem mais do que uma guerra a questão da memória e da história aldeã, operária, com casas desfiguradas, fábricas desativadas, universidades sem vida, cacos de histórias naufragadas que hoje formam as ruínas de uma cidade fantasma ou fantasmas da cidade, antes modernista, cidade de massa, homogênea, como os lapsos de uma linguagem que se desconhece, quem sabe inconsciente. Mas elas surpreendem. O imaginário individual (sonho) e coletivo (os mitos, os ritos, os símbolos), em primeiro lugar, são as coisas que o soletram. Eles têm uma função social que consiste em abrir uma profundidade no presente, mas não têm mais o conteúdo que provê de sentido a estranheza do passado. Suas histórias deixam de ser o que são para um final trágico.
O
Estado se constitui, portanto, em relação à forma de governo um duplo contexto:
de um lado, efeitos de poder político em
relação a outros Estados, atuais ou potenciais, isto é, os princípios
concorrentes – portanto, precisa concentrar “capital de força física” para
travar a guerra pela terra, pelos territórios; de outro lado, em relação a um
contexto interno, a contrapoderes, isto é, príncipes concorrentes ou classes
dominadas que resistem à arrecadação do imposto ou ao recrutamento de soldados.
Esses dois fatores favorecem a criação de exércitos poderosos dentro dos quais
se distinguem progressivamente forças propriamente militares e forças
propriamente policiais destinadas à manutenção da ordem interna. Essa distinção
exército/polícia, evidente hoje, tem uma genealogia extremamente lenta, as duas
forças têm sido por muito tempo confundido. O desenvolvimento do imposto está
ligado às despesas de guerra. O nascimento do imposto é simultâneo a uma
acumulação extraordinária de capital detido pelos profissionais da gestão
burocrática e à cumulação de um imenso capital informacional. É o vínculo
institucional entre Estado e estatística: o Estado está associado a um
conhecimento racional do mundo social e governamental. A estatística em como
representação o campo da matemática que relaciona fatos sociais e números em
que há um conjunto de métodos que nos possibilita coletar dados e analisá-los,
assim sendo possível realizar alguma interpretação deles.
Agorafobia tem como representação social comumente uma perturbação psíquica de ansiedade caracterizada por sintomas em resposta a situações que a pessoa percepciona como inseguras ou das quais é difícil escapar. Entre estas situações estão espaços abertos, tráfego rodoviário, centros comerciais ou qualquer outra situação social em que a pessoa se encontre fora do local próprio de sua residência. Quando a pessoa se depara com uma destas situações, o sintoma “mais comum é um ataque de pânico”. Para que seja diagnosticada agorafobia, os sintomas devem-se manifestar praticamente sempre que a pessoa se depara com a situação e os sintomas devem estar presentes durante pelo menos seis meses. As pessoas afetadas geralmente dão-se a um esforço significativo para evitar as situações. Nos casos mais graves, as pessoas sentem-se incapazes de sair da própria residência. Acredita-se que a agorafobia seja causada por uma combinação de fatores genéticos e ambientais. Em muitos casos, a condição agorafóbica é comum na família. A agorafobia pode ter origem em acontecimentos como a morte de um pai ou um ataque violento. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais foi publicado em 1952 pela Associação Americana de Psiquiatria (APA). Ele foi desenvolvido a partir do antigo sistema de classificação adotado em 1918 para reunir a necessidade do Departamento de Censo norte-americano de uniformizar estatísticas vindas pevalentemente de hospitais psiquiátricos; vindas de sistemas de categorização técnica usados pela disciplinarização técnica exército norte-americano; e vindas dos levantamentos dos pontos de vista de 10% dos membros da APA.
O manual contém 130 páginas, que mostram 106 categorias de desordens mentais. O DSM-II foi publicado em 1968, listando 182 desordens em 134 páginas. Esses manuais refletiam a predominância da “psicodinâmica psiquiátrica”. Sintomas não eram especificados com detalhes em desordens específicas, mas eram vistos como reflexos de grandes conflitos subjacentes ou reações de má adaptação aos problemas da vida, enraizados em uma distinção entre neurose e psicose, ou seja, ansiedade/depressão largamente associadas à realidade concreta, ou alucinações/desilusões aparentemente desconectadas da realidade. O conhecimento biológico e sociológico também foi incorporado, em um modelo que “não enfatizava um claro limite entre normalidade e anormalidade”. Em 1974, a decisão de se criar uma nova revisão do DSM se fez, e Robert Spitzer (1932-2015) foi selecionado dentre especialistas como chefe da força tarefa. O ímpeto inicial foi fazer uma nomenclatura consistente com a CID, publicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A revisão assumiu uma forma muito mais ampla de termos sob a influência e controle de Spitzer e seus membros escolhidos. Uma das metas era aumentar o leque de diagnósticos psiquiátricos. As práticas de profissionais em saúde mental, especialmente em diferentes países, não era uniforme. O estabelecimento de critérios específicos era também uma tentativa técnico-metodológica de facilitar a pesquisa em torno da saúde mental. O sistema multiaxial tenta mostrar um mais completo quadro do paciente, ao invés de apenas fornecer um simples diagnóstico.
O
conceito sociológico de nomeado neutralidade axiológica é ambíguo. A palavra
alemã correspondente, Wertfreiheit, significa, literalmente, “liberdade
em relação aos valores”. O tradutor francês dos Essais Sur la Théorie de la
Science, de Max Weber (1965), e especialista deste autor, Julien Freund,
optou corretamente pela expressão “neutralidade axiológica”. Com o
princípio da “neutralidade axiológica”, Max Weber quis demonstrar, por um lado,
que a ciência não podia excluir a intervenção dos valores nos seus
procedimentos, e, por outro, que estes deviam ficar circunscritos pela
utilização exclusiva que ela faz deles e pelo controle exclusivo que o
cientista exerce sobre eles, em suma, que ela se devia proteger da intrusão
ilegítima de valores, no âmbito da ciência, que implicariam avaliações práticas
de ordem política ou moral. No filme a cientista dá conta do recado em cenas
aparentemente inexequíveis, mas que fazem parte da mise-en-scène:
portando armas, correndo e na garupa de motocicleta. Essa, por sinal, é
exagerada, mas não pode ser reduzida sem prejuízo para o longa-metragem, na
medida certa, que passa a ganhar ritmo cinematográfico. Outro momento curioso é
o que envolve um lobo. Embora tenha rimado aqui no argumento, não desafina na
telona.
A neutralidade axiológica significa que o fundamento da ciência não reside numa objetividade pura de ordem ideal, mas que depende sempre das escolhas valorativas do cientista. O apelo aos valores integra plenamente todo o procedimento científico, tendo em vista que a criação de conceitos ou de tipos ideais, assim como o estabelecimento de relações causais, depende de opções subjetivas últimas que refletem as crenças, as convicções ou as ideologias de cada cientista. Os conceitos nunca gozam de uma imparcialidade intrínseca e nunca são neutros no sentido de exprimirem uma relação objetiva válida para todos os lugares e em todos os tempos, mas representam simples pontos de vista cientificamente informados. Estas construções não são, no entanto, arbitrárias e não constituem, de forma nenhuma, a finalidade da ciência. No domínio da economia política, Marx metodologicamente inferia que a livre investigação científica não só se defronta com o mesmo inimigo presente em todos os outros domínios, mas também a natureza peculiar do material com que ela lida convoca ao campo de batalha as paixões mais violentas, mesquinhas e execráveis do coração humano, as fúrias do interesse privado. – Segui il tuo corso, e lascia dir le genti! A inevitável subjetividade cultural que encontramos no princípio de qualquer ciência fica superada se reconhecermos a pluralidade de valores e de centros de interesse que presidem a cada um deles, se aceitarmos a legitimidade dos outros pontos de vista e se, no decurso do nosso estudo, nos mantivermos sempre fiéis aos nossos pressupostos de partida.
Robert Leopold Spitzer foi um psiquiatra e professor de psiquiatria na Universidade de Columbia, na cidade de Nova York. Ele foi um pesquisador importante no desenvolvimento do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM). Spitzer nasceu em White Plains, Nova York, em 1932. Ele recebeu seu diploma de bacharel em psicologia pela Universidade Cornell em 1953 e seu MD pela Escola de Medicina da Universidade de Nova York em 1957. Ele completou sua residência psiquiátrica no Instituto Psiquiátrico do Estado de Nova York em 1961 e se formou no Centro de Treinamento e Pesquisa Psicanalítica da Universidade de Columbia em 1966. Spitzer escreveu um artigo sobre as teorias de Wilhelm Reich em 1953, que o American Journal of Psychiatry se recusou a publicar. Spitzer passou a maior parte de sua carreira na Universidade de Columbia, na cidade de Nova York, como professor de psiquiatria até se aposentar em 2003. Ele fazia parte do corpo docente de pesquisa do Centro de Treinamento e Pesquisa Psicanalítica da Universidade de Columbia, onde se aposentou após 49 anos em dezembro de 2010. Ele foi chamado de um dos psiquiatras mais influentes do século XX. O obituário do The Lancet o descreveu como “teimoso, às vezes abrasivo e sempre ansioso, o trabalho de Spitzer foi guiado por um forte senso de justiça ética”. Um colega da Columbia o descreveu como um “iconoclasta” que “procurava por injustiça”. Spitzer foi um dos principais arquitetos da classificação moderna de transtornos mentais. Em 1968, ele co-desenvolveu um programa de computador, Diagno I, baseado em uma árvore de decisão lógica, que poderia derivar um diagnóstico a partir das pontuações em uma Escala de Status Psiquiátrico que ele co-publicou em 1970 e que o Comitê Diretor dos Estados Unidos para o Projeto de Diagnóstico Estados Unidos-Reino Unido usou para verificar a consistência de seus resultados. Spitzer foi membro do Comitê Diretor dos Estados Unidos, composto por quatro pessoas, para o Projeto de Diagnóstico Estados Unidos-Reino Unido, que publicou seus resultados em 1972.
Eles
descobriram que a diferença mais importante entre os países era que o conceito
de esquizofrenia usado em Nova York era muito mais amplo do que o usado em
Londres e incluía pacientes que teriam sido denominados maníaco-depressivos ou
bipolares. Ele desenvolveu métodos psiquiátricos que se concentravam em fazer
perguntas específicas em entrevistas para chegar a um diagnóstico, em oposição
ao questionamento aberto da psicanálise, que era a técnica predominante de
saúde mental. Ele co-desenvolveu o Questionário de Transtorno de Humor
(MDQ), uma técnica de triagem usada para diagnosticar o transtorno bipolar. Ele
também co-desenvolveu o Questionário de Saúde do Paciente (PRIME-MD),
que pode ser autoadministrado para descobrir se alguém tem uma doença mental.
As partes da enquete direcionadas à depressão desde então se tornaram aceitas
na medicina de atenção primária para triagem e diagnóstico de depressão grave,
bem como para monitorar a resposta ao tratamento. Em 1974, Spitzer tornou-se
presidente da força-tarefa da Associação Psiquiátrica Americana da terceira
edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o
chamado DSM-III, que foi lançado em 1980. Spitzer é um dos principais
arquitetos da classificação moderna de transtornos mentais, que envolve a
classificação de transtornos mentais em categorias discretas com critérios
diagnósticos específicos; no entanto, ele criticou o que viu, como
erros e excessos nas versões posteriores do DSM, embora tenha mantido sua
posição de que o DSM ainda é melhor do que as alternativas.
Em 2003, Spitzer foi coautor de um artigo de posicionamento com o editor do DSM-IV, Michael First, afirmando que o “DSM é geralmente visto como clinicamente útil” com base em pesquisas de profissionais em atividade e feedback de estudantes de medicina e residentes, mas que os médicos de atenção primária consideram o DSM muito complicado para seu uso. Os autores enfatizaram que, dadas as limitações atuais na compreensão dos transtornos psiquiátricos, uma infinidade de códigos/diagnósticos do DSM possa se aplicar a alguns pacientes, mas que seria uma “especulação total” atribuir um único diagnóstico a um paciente. Os autores rejeitaram os apelos para adotar a CID-9 porque ela não tinha critérios diagnósticos e “[retrocederia] a psiquiatria 30 anos”, enquanto a CID-10 se assemelhava muito à classificação do DSM-III-R. Em 2013, uma autobiografia definitiva de Spitzer, The Making of DSM-III: A Diagnostic Manual`s Conquest of American Psychiatry, foi publicada pela autora e historiadora Hannah S. Decker. Spitzer foi brevemente apresentado na série de TV da BBC de 2007, The Trap, na qual afirmou que o DSM, ao operacionalizar as definições de transtornos mentais enquanto presta pouca atenção ao contexto em que os sintomas ocorrem, pode ter “medicalizado” as experiências humanas normais de um número significativo de pessoas. Em 2008, Spitzer criticou a revisão do DSM-5 por falta de transparência. Ele também criticou propostas específicas, como de introdução da síndrome de risco de psicose para os que apresentam sintomas leves encontrados em transtornos psicóticos.
Spitzer
liderou um esforço bem-sucedido, em 1973, para parar de tratar a
homossexualidade como uma doença mental. Foi em parte devido aos esforços de
Spitzer que a homossexualidade foi “removida”, ou seja, renomeada como
Distúrbio de Orientação Sexual no DSM-II de 1974: - “Ao retirá-la do manual, a
homossexualidade foi legitimada como uma diferença normal em vez de um
comportamento psiquiátrico. Esta declaração inicial e poderosa da psiquiatria
institucional de que isso é normal acelerou a confiança das pessoas no
movimento”. Em 2001, Spitzer apresentou
um artigo intitulado: “Alguns homens gays e lésbicas podem mudar sua orientação
sexual?” na reunião anual da APA de 2001; ele argumentou que é possível que
alguns indivíduos altamente motivados possam mudar com sucesso sua orientação
sexual de homossexual para heterossexual. Um artigo do Washington Post
indicou que Spitzer realizou entrevistas telefônicas de 45 minutos com 200
pessoas que alegaram que suas respectivas orientações sexuais haviam mudado de
homossexual para heterossexual. Spitzer disse que “começou seu estudo como
cético”, mas o estudo revelou que “66% dos homens e 44% das mulheres haviam
alcançado o que [Spitzer] chamou de bom funcionamento heterossexual”, como “estar
em um relacionamento heterossexual duradouro e amoroso no último ano, obter
satisfação suficiente no relacionamento emocional com o parceiro para obter uma
pontuação de pelo menos sete em uma escala de 10 pontos, ter relações sexuais
heterossexuais satisfatórias pelo menos uma vez por mês e nunca ou raramente
pensar em alguém do mesmo sexo durante o sexo heterossexual”.
Spitzer
também descobriu que “89% dos homens e 95% das mulheres disseram que eram
incomodados apenas um pouco, ou nada, por sentimentos homossexuais indesejados”,
mas que “apenas 11% dos homens e 37% das mulheres relataram uma ausência
completa de indicadores homossexuais, incluindo atração pelo mesmo sexo. [...] Cerca de 43% da amostra foi encaminhada
para Spitzer por 'ministérios ex-gays.
[...] Outros 23% foram encaminhados pela Associação Nacional de Pesquisa
e Terapia da Homossexualidade”. Spitzer declarou que sua pesquisa “mostra que
algumas pessoas podem mudar de gays para heterossexuais, e devemos reconhecer
isso”. Considerando o quão difícil foi encontrar 200 participantes e que eles
foram considerados os melhores casos de terapia de conversão, Spitzer concluiu
que, embora a mudança pudesse ocorrer, provavelmente era muito rara. A APA
emitiu uma rejeição oficial do artigo de Spitzer, observando que ele não havia
sido revisado por pares e afirmando: “Não há evidências científicas publicadas
que apoiem a eficácia da terapia reparadora como tratamento para mudar a
orientação sexual de alguém”. Dois anos depois, o artigo de Spitzer foi
publicado no Archives of Sexual Behavior. Dois terços das revisões foram
críticas, e a decisão de publicação gerou controvérsia, com um membro da
organização de apoio à publicação renunciando em protesto. O artigo foi
criticado por seus métodos de amostragem e critérios de sucesso. Em uma
entrevista de 2005, Spitzer declarou: - Muitos colegas ficaram indignados” após
a publicação do estudo. Spitzer acrescentou: - “Dentro da comunidade gay,
inicialmente houve uma tremenda raiva e um sentimento de que eu os havia traído”.
Quando questionado se consideraria um estudo de acompanhamento, Spitzer disse
que não e acrescentou que sentia “um pouco de fadiga de batalha”.
Embora
Spitzer tenha dito que não tinha como saber se os participantes do estudo
estavam sendo honestos, ele também indicou que acreditava que os entrevistados
estavam sendo francos com ele. O sistema de critério e classificação do DSM-III
foi baseado num processo de consultas e reuniões de comitês. Houve uma
tentativa de se construir uma base de categorização psicológica e socialmente em
descrição ao invés de pressupostos etiológicos, e a psicodinâmica foi facilmente
abandonada, talvez em favor do modelo biomédico, com clara distinção entre o
normal e o anormal. O DSM-5 classifica a agorafobia como uma fobia pertencente
ao grupo das fobias específicas e fobias sociais. Entre outras condições que
manifestam sintomas semelhantes estão a perturbação de ansiedade de separação,
perturbação de estresse pós-traumático, perturbação depressiva major. As
pessoas afetadas apresentam um risco acrescido de depressão e perturbação por
abuso de substâncias. É pouco provável que a agorafobia se resolva sem
tratamento. O tratamento consiste numa forma de aconselhamento psiquiátrico
denominada terapia cognitivo-comportamental. Esta terapia permite resolver
cerca de metade dos casos de agorafobia. A condição afeta 1,7% dos adultos. O
número de casos em mulheres é o dobro do de homens. A doença é rara em
crianças. A maioria dos casos têm origem no início da idade adulta, sendo cada
vez menos comum à medida que a idade avança.
Bibliografia
Geral Consultada.
MEZAN, Renato, Freud, Pensador da Cultura. 5ª edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1990; GAMA, Carlos Alberto Pegolo, “Agorafobia. Uma Tópica Evanescente”. In: Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 2(2), 72-85; 1999; RICOEUR, Paul, La Mémoire, l`Histoire, l`Oubli. Paris: Éditions Du Seuil, 2000; SILVA, Marcos Paulo do Nascimento, A Problemática do Mal em O Mal-Estar na Civilização. Dissertação de Mestrado. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Departamento de Filosofia. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2004; MAIGRET, Eric; MACÉ, Eric (Organizadores), Penser les Médiacultures. Nouvelles Pratiques et Nouvelles Aproches de la Represéntation du Monde. Paris: Éditeur Armand Colin, 2005; ELIAS, Norbert, Escritos & Ensaios (I): Estado, Processo, Opinião Pública. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006; MELLO PISETTA, Maria Angélica Augusto, “Angústia e Subjetividade”. In: Revista Subjetividades, 8(1), 73–88, 2008; SHAWN, Allen, Bem Que Eu Queria Ir: notas de uma vida fóbica. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2009; METZ, Christian, A Significação no Cinema. São Paulo: Editora Perspectiva, 2012; EHRLICH, André; DARRIBA, Vinicius Anciaes, “Medô Medo: investigação sobre a fobia em Freud, Lacan e autores contemporâneos a partir de um caso clínico”. In: Ágora: Estudos em Teoria Psicanalítica, (16), 59-76, 2013; GOIANA, Francisco Daniel Iris, Instinto e Civilização: A Sociologia Processual de Norbert Elias e Seu Encontro com a Psicanálise Freudiana. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2014; HALL, Stuart, Cultura e Representação. Rio de Janeiro: Editora Apicuri, 2016; DEJOURS, Christophe, Le Choix - Souffrir au Travail n`est pas une Fatalité. Paris: Bayard Éditions, 2015; MARTUCCELLI, Danilo, La Condition Sociale Moderne. L`Avenir d`une Inquiétude. Paris: Éditeur Gallimard, 2017; CARVALHO, Rone, “Por que o Brasil tem a população mais ansiosa do mundo”. In: https://g1.globo.com/saude/noticia/2023/02/27/; MEDEIROS, Nathássia Matias de; GOMES, Karla Marília Mota; MESQUITA, Leonardo; GABRIEL, Giovanna Carbone, “O Uso do Cinema na Educação em Psicologia: Uma Revisão Integrativa da Literatura”. In: Dossiê Temático “Diversidade Social e Educação Escolar”, Vol. 12 n° 30 (2025), entre outros.