sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Amor em Verona – Humanismo, Cinema & Comédia Romântica.

 O amor não vê com os olhos, vê com a mente; por isso é alado, e cego e tão potente”. William Shakespeare

        Amor em Verona (Love in the Villa) tem como representação social um filme de comédia romântica norte-americano de 2022, escrito, dirigido e produzido por Mark Steven Johnson, nascido em 30 de outubro de 1964 é cineasta norte-americano. Johnson começou sua carreira escrevendo os filmes da Warner Bros Entertainment, Grumpy Old Men (1993), e sua sequência Grumpier Old Men (1995). É uma empresa de mídia norte-americana com sede na Warner Bros. Studios em Burbank, município na Califórnia, Estados Unidos da América, subsidiária da Warner Bros. Discovery. O escritor e cineasta também escreveu e dirigiu dois filmes baseados em extraordinárias histórias sociais em quadrinhos, Demolidor (2003) e Motoqueiro Fantasma (2007), assim como o filme Simon Birch (1998). É uma forma de arte que conjuga texto e imagens com o objetivo de narrar histórias dos mais variados gêneros e estilos, geralmente publicadas no formato de revistas, livros ou em tiras veiculadas dentro de revistas e jornais. Steven Johnson também escreveu a história do filme Christopher Robin (2018) e dirigiu o filme da Netflix Love, Guaranteed (2020). Mais recentemente Johnson escreveu e dirigiu Love in the Villa também para a Netflix. É estrelado por Kat Graham, Tom Hopper e Raymond Ablack. Julie Hutton segue seu sonho de visitar a romântica Verona, na Itália, logo após um término, apenas para descobrir que sua vila está com reservas duplicadas, então ela tem que dividi-la com um britânico aparentemente cínico. O filme foi lançado na Netflix em 1º de setembro de 2022.

            Love in the Villa é um filme de comédia romântica norte-americano de 2022, escrito, dirigido e produzido por Mark Steven Johnson. É estrelado por Kat Graham, Tom Hopper e Raymond Ablack. Julie Hutton segue seu sonho de visitar a romântica Verona, na Itália, logo após um término, apenas para descobrir que sua vila está com reservas duplicadas, então ela tem que dividi-la com um britânico cínico. Historicamente entre os séculos XIII e XIV, a cidade foi governada pela família della Scala. Sob o governo da família, em particular de Cangrande I della Scala, a cidade experimentou grande prosperidade, tornando-se rica e poderosa e sendo cercada por novas muralhas. A Era della Scala é preservada em vários monumentos ao redor de Verona. Duas das peças de William Shakespeare (1564-1616) se passam em Verona: Romeu e Julieta que também apresenta a visita de Romeu a Mântua e Os Dois Cavalheiros de Verona. Não se sabe se Shakespeare já visitou Verona ou a Itália, mas suas peças atraíram muitos visitantes para Verona e cidades vizinhas. Verona também foi o local de nascimento de Isotta Nogarola (1418-1466), que é considerada a primeira grande humanista feminina da história social e uma das mais importantes humanistas do Renascimento. Em novembro de 2000, a cidade foi declarada Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), uma agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU) fundada em 1946 para promover a paz através da colaboração internacional em educação, ciência, cultura e comunicação, estabelecendo normas e protegendo o patrimônio cultural e natural para um futuro mais equitativo e pacífico por causa de sua estrutura urbana e arquitetura.

       William Shakespeare nasceu e foi criado em Stratford-upon-Avon, chamada na Era elizabetana, época especialmente estimulante para os artistas. Aos 18 anos casou-se com Anne Hathaway, com quem teve três filhos: Susanna e os gêmeos Hamnet e Judith. Entre 1585 e 1592 William começou uma carreira bem-sucedida em Londres como ator, escritor e um dos proprietários da companhia de teatro chamada Lord Chamberlain`s Men, mais tarde reconhecida como King`s Men. Acredita-se que ele tenha retornado a Stratford em torno de 1613, morrendo três anos depois. Restaram poucos registros da vida privada de Shakespeare, e existem muitas especulações sobre assuntos como a sua aparência física, sexualidade, crenças religiosas, e se algumas das obras que lhe são atribuídas teriam sido escritas por outros autores. Shakespeare produziu a maior parte de sua obra entre 1590 e 1613. Suas primeiras peças eram principalmente comédias e obras baseadas em eventos e personagens históricos, gêneros que ele levou ao ápice da sofisticação e do talento artístico ao fim do século XVI. A partir de então escreveu apenas tragédias até por volta década de 1606, Rei Lear, incluindo Hamlet (1623), e Macbeth (1623), consideradas algumas das obras literárias mais importantes na língua inglesa.  Na sua última fase literária produtiva, escreveu um conjunto de peças classificadas como tragicomédias ou romances, e colaborou com outros dramaturgos. Diversas peças foram publicadas, em edições com variados graus de qualidade e precisão durante sua vida. Em 1623, John Heminges e Henry Condell, dois atores amigos de Shakespeare, publicaram o First Folio, uma coletânea das obras dramáticas que incluía quase todas as peças reconhecidas como de sua autoria. Shakespeare foi um poeta e dramaturgo respeitado em sua própria época, mas sua reputação só viria a atingir o nível em que se encontra no século XIX.                                      


Os românticos, especialmente, aclamaram a genialidade de Shakespeare, e os vitorianos idolatraram-no como um herói, com uma reverência que George Bernard Shaw chamava de bardolatria. No século XX sua obra foi adotada e redescoberta repetidamente por novos movimentos, tanto na academia quanto na performance. Suas peças permanecem muito populares, são estudadas, encenadas e reinterpretadas constantemente, em diversos contextos culturais e políticos no mundo globalizado. A professora da terceira série Julie Hutton é fascinada por Verona, cenário de Romeu e Julieta, de William Shakespeare. Na tentativa de explicar por que está tão animada com a viagem, ela tenta, sem sucesso, expor seus alunos à história de amor centenária. Julie repassa detalhadamente o itinerário que planejou para a tão esperada viagem a Verona com seu namorado Brandon, com quem está casada há quatro anos. Arrasado, ele termina abruptamente o relacionamento. Julie, então, se vê viajando sozinha para o que esperava ser uma semana de romance. Após um voo desconfortável na classe econômica, suas malas são perdidas e ela tem uma corrida estressante de táxi com a Uberto. Ao chegar à vila, Julie descobre que ela foi reservada duas vezes, pois havia sido anunciada em dois sites diferentes de compartilhamento de apartamentos. O proprietário, Silvio, sugere que ela divida o lugar com Charlie, o outro inquilino e especialista em vinhos, já que a feira europeia que anualmente de vinhos Vinitaly está monopolizando a disponibilidade de acomodações. Ele descarta isso como se fosse o destino deles. Julie se apressa para seguir seu roteiro lotado, mas logo é forçada a abandoná-lo. Desanimada, ela retorna à vila e descobre que Charlie leu seu diário pessoal. Ele compara voltar para uma “ex” a vestir uma calcinha suja depois do banho. Julie desliga na cara de Brandon.

Charlie explica seu trabalho com uma importadora de vinhos do Reino Unido, na qual precisa obter direitos de exclusividade sobre vinhos a preços baixos para maximizar seus lucros. Logo depois, Julie descobre suas alergias extremas quando gatos de rua entram em grande número ao quebrar uma janela. Quando ela reclama dele ao telefone com seu amigo Rob, ele sugere que ela o expulse. Julie compra muitas azeitonas verdes, um conhecido atrativo para gatos, envolve Charlie com elas e abre a janela. Ele acorda coberto de vergões e dor, e imediatamente “declara guerra” contra ela. Ao sair do apartamento, Charlie encontra as malas dela sendo entregues pela companhia aérea. Ele as devolve, dizendo que ela estava internada em uma instituição e quer que sejam doadas. Julia se vinga trocando as fechaduras e, em seguida, entra em contato com a polícia para denunciar Charlie como ladrão. Após ser libertado da prisão, ele volta ainda mais furioso. Ele cria um santuário público com trechos do diário de Julie sobre seu término com Brandon. Charlie faz uma trégua e se oferece para compartilhar uma refeição com ela. Ele prepara pastissada de caval, um prato típico de Verona. Quando Julie descobre que é de cavalo, eles acabam em uma “guerra de comida”. A polícia é acionada quando a comoção chega à praça abaixo. Avisado de que poderá passar a noite na prisão se perturbar a paz novamente, Charlie pede desculpas a Julia. 

Ele admite que substituiu o cavalo por cogumelos portobello, e eles passam a noite se embebedando com vinho. Caminhando pela cidade, Julie faz um pedido na Fontana Madonna Verona e, em seguida, leva-os à estátua de bronze de Julieta, onde ambos fazem seus pedidos. No dia seguinte, ela leva Charlie para o passeio de Julieta, para que ele possa vê-la com os olhos de um romântico. Julie revela que seus pais excessivamente românticos a levaram a estabelecer padrões elevados; ele explica que cresceu com quatro irmãos e sem mãe. Naquela noite, no evento da Vinitalia, Julie conta a Carlo Caruso como seu vinho é maravilhoso, bloqueando inadvertidamente a oferta da empresa de Charlie. Charlie a convida para dançar e eles quase se beijam. Ao retornar à vila, sua noiva Cassie está lá para surpreendê-lo, o que o deixa surpreso, pois estavam de folga. Brandon aparece de manhã. À noite, ele e Julie acabam sendo convidados para dividir uma mesa com Cassie e Charlie. Julie fica muito bêbada e eles vão embora. Charlie termina com Cassie, segue os outros e, inadvertidamente, vê Brandon pedi-la em casamento. Charlie não percebe a rejeição de Julie. Silvio convence Charlie a procurar Julie. Quando ele o faz, ambos percebem que se apaixonaram.

            A obra de Isotta Nogarola atesta a sua extraordinária erudição, as suas capacidades literárias e a profundidade do seu pensamento, tendo imposto um modelo que seria seguido pelas mulheres letradas que nos séculos seguintes se debateram para poder expressar as suas ideias. Na sua obra mais reconhecida, “De pari aut impari Evae atque Adae peccato” (1451), ou “Diálogo sobre Adão e Eva”, ela discute o “mito de Eva”, ou o “mito do pecado original”, inaugurando um debate filosófico que se arrastou durante vários séculos na Europa a respeito do gênero e da natureza da mulher. Os rapazes estudavam as disciplinas do movimento que viria a ser conhecido como o humanismo, que começou em Florença no século XIV, e se espalhou pela Itália, e que constituía o estilo de aprendizagem clássica seguido pelas famílias nobres. Ao focar os seus interesses nas culturas romana e grega clássicas, os eruditos acreditavam que a educação humanística produziria pessoas mais capacitadas e uma melhor compreensão do conhecimento. As escolas estavam preparadas para ensinar poesia, gramática, retórica, história e filosofia moral, o que ajudaria qualquer jovem no seu futuro político. Um verdadeiro humanista costumava escrever cartas para um grupo já respeitado e reconhecido, e esperar por uma resposta. Se a resposta trouxesse apoio e louvor ao aprendiz em potencial, essa notícia iria se espalhar, ganhando terreno para a construção da sua carreira. 

Muitas das famílias mais poderosas providenciavam para que as suas filhas recebessem igualmente a mesma educação literária e filosófica que era dada aos rapazes que estudavam as disciplinas do movimento que viria a ser reconhecido como o humanismo, que começou em Florença no século XIV, e se espalhou extraordinariamente pela Itália, e que constituía o estilo de aprendizagem clássica seguido pelas famílias nobres. Ao centralizar os seus interesses nas culturas romana e grega clássicas, os eruditos acreditavam que a educação humanística produziria pessoas decerto mais capacitadas e uma melhor compreensão do conhecimento em torno da existência humana. As escolas estavam preparadas para ensinar poesia, gramática, retórica, história e filosofia moral, o que ajudaria qualquer jovem ao investimento no seu futuro político. Um verdadeiro humanista costumava escrever cartas para um grupo já respeitado e reconhecido, e esperar por uma resposta. Se a resposta trouxesse apoio e louvor ao aprendiz em potencial, essa notícia iria se espalhar, ganhando terreno para a construção da sua carreira. Muitas das famílias mais poderosas providenciavam para que as suas filhas recebessem igualmente a mesma educação literária e filosófica que era dada aos rapazes. Isotta Nogarola nasceu no seio de uma família nobre de Verona, que partilhava um interesse comum pela cultura e que mantinha uma forte tradição de educação das suas filhas, tendo produzido mulheres letradas ao longo de várias gerações. Ângela Nogarola (1360-1420), irmã do pai de Isotta, Leonardo, foi uma poetisa com alguma notoriedade. Isotta Nogarola teve dez irmãos, sete dos quais sobreviveram à idade adulta. Durante a sua vida, a Itália passava pelo Renascimento do século XV. Uma nova forma de apreciar a arte, a educação e o enriquecimento da cultura sombreavam, ipso facto, a cultura italiana. Politicamente, a Itália estava dividida entre cidades-estados governadas por famílias extremamente ricas e Gênova, Florença e Veneza são alguns exemplos.

É próprio da concepção de teoria per se admitir a crítica externa, conforme as regras aceita pela continuidade que cuida, suscita e critica as teorias. O campo de existência das teorias é recente e frágil. Constituiu-se pela primeira vez há vinte séculos em Atenas, onde a instauração da filosofia abriu uma esfera livre de debate de ideias sem sanção, exclusão, nem liquidação dos participantes. Depois, a ciência europeia criou o seu próprio campo, onde toda teoria deve obedecer às regras empíricas, regras lógicas limitadoras e aceitar a verificabilidade que poderiam desmenti-las. Um sistema de ideias permanece teoria enquanto aceita a regra do jogo competitivo e crítico, enquanto manifesta maleabilidade interna: capacidade de adaptação e modificação na articulação entre seus subsistemas, assim como a possibilidade de abandonar um subsistema e de substituí-los por outro. Uma teoria é capaz de modificar as suas variáveis que se definem nos termos do seu sistema de pensamento. Em consequência, as características fechadas dela são contrabalanceadas pela busca de concordância entre a coerência e dos dados que evidencia: é isso que constitui a racionalidade. Depende da interpretação daqueles que habitam o mundo onde se aplica. A teoria sobrevive das trocas simbólicas, linguísticas e científicas com o mundo real da imaginação humana. Enquanto teoria metaboliza o real para sobreviver. O tipo aberto é ligado às regras pluralísticas estruturais que alimenta.

As esferas filosófica e científica são de existência democrática em geral para as teorias da sociedade. Dizer concepção de abertura teórica necessita de condições externas favoráveis significa dizer que todas as formas de sistema de ideias tendem a fechar-se por si mesmo. O dogmatismo e a ortodoxia não são tendências naturais, contrabalançadas somente por condições sociais exteriores. Racionalidade e racionalização têm um mesmo tronco comum, a busca de coerência. Mas, enquanto a racionalidade está aberta ao que resiste à lógica e mantém o diálogo com o real, a racionalização integra à força o real na lógica do sistema e crê, então, possuí-lo. Essa tendência racionalizadora equivale aqui à profunda tendência idealista de todo sistema de ideias a absorver a realidade que nomeia, designa, descreve, explica. Sob certo ponto de vista noológico, os sistemas de ideias não se alimentam somente de energias e paixões humanas, evidenciadas pela tradição do empirismo lógico. Ipso facto no âmbito da formação da complexidade centrifugam e esvaziam o real que evidenciam. Desvelando as “leis” que governam o mundo, as teorias da ciência aspiram à soberania dessas leis. 

A inveterada tendência a tomar o mapa pelo território, a palavra pela coisa, a ideia pela realidade, depende do espírito humano, de sua aptidão crítica e autocrítica, favorecida pelas situações culturais pluralistas e abertas. O “remédio” só pode estar na abertura do sistema, o qual depende da abertura do espírito humano. A partir do ideário do Renascimento, o mundo é requestionado (cf. Hale, 2003); depois que Cristóvão Colombo (1451-1506) do chão aumentou a Terra e Copérnico e Galileu diminuíram-na no céu. Deus é requestionado, assim como o homem; a interdependência dessas reflexões determina uma problematização generalizada, de fato alongada. A perda dos antigos fundamentos de inteligibilidade e de crença suscita a procura incessante de novos fundamentos e a formação ininterrupta de novos sistemas filosóficos, os quais levantam mais questões do que fornecem respostas, o que relança em constante permanência a busca. E, assim, a noosfera filosófica europeia desenvolve-se com uma intensidade prodigiosa apresentando duas faces opostas e atreladas: de um lado, uma atividade critica, que já não se exerce apenas, nem principalmente, sobre a religião, mas sobre os próprios sistemas racionais (racionalizadores), sobre as ideias dominantes, os princípios, os fundamentos; por outro lado, a elaboração ininterrupta de sistemas, até o maior de todos, Friedrich  Hegel; a partir dele a história da filosofia será um corpo a corpo sem tréguas entre o pensamento antissistemático. A cultura serve como laboratório noológico, onde se pode poder observar a formação, o florescimento dos sistemas, seus conflitos, suas simbioses, suas trocas, suas corrupções, suas escleroses, as suas mutações, os seus rejuvenescimentos, mas também as suas agonias.

Na história social e da técnica do Renascimento não existia o que se poderia chamar de “economia italiana”. Havia muitas economias, algumas diversas de âmbito regional e outras de âmbito internacional, localizadas todas elas na unidade geográfica e espacial da península. Duas cidades à beira de rios e duas às margens dos mares, Milão e Florença, Genova e Veneza, formavam o quadrilátero da prosperidade da Itália durante a Renascença. Nenhuma delas possuía população superior a 100 mil habitantes. Mas, em contrapartida, tinham energia e disposição suficiente para capitanear a liderança econômica da península, como tino para estenderem seus interesses tanto para o coração da Europa em direção às cidades alemãs, francesas a flamengas como para Constantinopla e o restante do Levante. Dedicavam-se como atividade econômica ao comércio de luxo: seda, brocados, âmbar, especiarias, ouro e prata, como às atividades que atendiam o consumo cotidiano, como têxteis, tendo em vista que em Florença, além da Casa dos Médici (cf. Abreu e Lima, 2012), foi um poderoso centro lanífero. Veneza também acolheu uma formidável indústria naval para dar sustento ao seu império de comunicação marítimo que se estendia pelas ilhas gregas e alcançava vários portos do mar Negro. A comunicação marítima gerou uma burguesia pródiga, sequiosa de ostentar posição de mando e desejosa de preservar-se através da cultura e do patrocínio das artes.

A competição entre as diversas cidades fez a glória dos artistas de seu tempo histórico e social, muitos deles foram cobiçados por várias cortes que os prodigalizavam com recursos monetários, promoção e prestígio. Não por acaso, em geografia urbana, hinterlândia corresponde a uma área geográfica que pode se tratar de um município ou um conjunto de municípios servida por um porto e a este conectada por uma rede de transportes, através da qual recebe e envia mercadorias ou passageiros do porto ou para o porto. Trata-se, portanto, da área de influência pragmático de uma cidade portuária que, por concentrar significativa atividade econômica, pode engendrar uma rede urbana, constituída por centros urbanos menores. Posteriormente, o conceito passou a ser utilizado também no caso de cidades não portuárias que são “cabeças-de-rede”. O termo pode ser aplicado à área que circunda um centro de comércio, ou de setor de serviços e da qual provêm os seus clientes. O conceito foi aplicado à área de ex-colônias na África, apesar de não serem parte da colônia, eram por ela influenciadas. A mãe de Isotta, Bianca Borromeo, viúva e iletrada, pois seu marido havia morrido entre os anos 1425 e 1433, providenciou para que ela e as suas irmãs Ginevra e Laura tivessem uma boa educação, tendo aprendido latim e grego numa idade precoce, primeiro sob a orientação de Matteo Bosso e mais tarde de Martino Rizzoni (1404-1488), um dos mais brilhantes alunos de Guarino da Verona (1370-1460), sendo um dos mais respeitados poetas, humanistas e pensadores italianos.

 Nogarola e suas irmãs tiveram praticamente a mesma educação que um rapaz de uma família abastada teria recebido, com exceção da retórica, que era considerada irrelevante para a aprendizagem de uma mulher, pois supostamente ela nunca teria oportunidade de falar em público. Isotta e a sua irmã mais velha Ginevra Nogarola (1417-1464) tornaram-se suficientemente competentes nos Studia Humanitatis para que a sua reputação social se difundisse pela região e elas começassem a se corresponder em latim clássico com outros intelectuais. Isotta demonstrou ser uma estudante extremamente hábil, tendo criado obras literárias que começaram a conquistar reconhecimento por toda a região. Aos dezoito anos já era famosa. A sua eloquência em Latim era muito respeitada, e a sua fama não provinha apenas do grande volume de conhecimentos que ela parecia possuir, mas também da inovação do seu gênero. Em 1437, ela escreveu uma carta para Guarino de Verona o qual deixou a carta sem resposta, humilhando-a publicamente. Meses mais tarde Isotta decide enviar uma segunda carta queixando-se da sua falta de resposta que a tinha coberto de ridículo: “Toda a cidade se ri de mim, o meu gênero troça de mim, em nenhum lugar tenho um refúgio seguro, os burros [mulheres] mordem-me, os touros [homens] investem sobre mim com os seus cornos”, suplicando a sua ajuda para recuperar a reputação perdida, pondo cobro às “Scelestae linguae que me chamam torre de audácia e dizem que deveria ser enviada para os confins da terra pela minha ousadia”. E “já existem tantas mulheres no mundo”, lamentava-se, “por que então nascer mulher para ser desprezada pelos homens, tanto em palavras como por atos”. A resposta a segunda carta foi prontamente recebida. Na sua missiva, escrita em tom paternalista, Guarino aconselhava-a a ser forte em face dos ataques, mas também a abandonar uma atividade que não era adequada para o seu sexo e a casar-se. Segundo Veronese, Isotta deveria dissociar-se do seu sexo e cultivar a sua alma masculina – “tornar-se um homem” – para atingir os seus objetivos e ser estimada pelos homens, podendo assim participar no mundo acadêmico masculino.

Os detalhes precisos da história inicial de Verona permanecem um mistério, assim como a origem do seu nome. Uma teoria é que era uma cidade dos Euganei, que foram obrigados a cedê-la aos Cenomanos (550 a.C.). Com a conquista do Vale do Pó, o território veronês tornou-se romano por volta de 300 a.C. Verona tornou-se uma colônia romana em 89 a.C. Foi classificada como município em 49 a.C., quando seus cidadãos foram atribuídos à tribo romana Poblilia ou Publicia. A cidade tornou-se importante porque estava na intersecção de várias estradas. Estilicão, um comandante militar do exército romano, derrotou Alarico e seus visigodos aqui em 402. Mais tarde, Verona foi conquistada pelos ostrogodos em 489, e a dominação gótica da Itália começou. Diz-se que Teodorico, o Grande, construiu um palácio lá. Permaneceu sob o poder dos godos durante toda a Guerra Gótica (535–552), exceto por um único dia em 541, quando o oficial bizantino Artabazes fez uma entrada. As deserções dos generais bizantinos sobre o saque tornaram possível para os godos recuperarem a posse da cidade. Em 552, os romanos sob o general Valeriano tentaram em vão entrar na cidade, mas foi somente quando os godos foram totalmente derrubados que eles politicamente a renderam.

Em 569, foi tomada por Alboíno, rei dos lombardos, em cujo reino era, em certo sentido, a segunda cidade mais importante. Lá, Alboíno foi “morto por seu próprio povo com a conivência de sua esposa” em 572. Os duques de Treviso frequentemente residiam lá. Adalgiso, filho de Desidério, em 774 fez sua última resistência em Verona a Carlos Magno, que havia destruído o reino lombardo. Verona se tornou a residência ordinária dos reis da Itália, o governo da cidade se tornando hereditário na família do conde Milo, progenitor dos condes de São Bonifácio. De 880 a 951, os dois Berengários residiram lá. Sob o domínio do Sacro Império Romano e da Áustria, Verona era alternativamente conhecida em alemão como Berna, Welsch-Bern ou Dietrichsbern. Otto I cedeu a Verona o marquesado dependente do Ducado da Baviera, no entanto, a crescente riqueza das famílias burguesas eclipsou o poder dos condes e, em 1135, Verona foi organizada como uma comuna livre. Em 1164, Verona se juntou a Vicenza, Pádua e Treviso para criar a Liga Veronesa, que foi integrada à Liga Lombarda em 1167 para lutar contra Frederico I Barbarossa. A vitória foi alcançada na Batalha de Legnano em 1176, e o Tratado de Veneza foi assinado em 1177, seguido pela Paz de Constança em 1183.

Quando Ezzelino III da Romano foi eleito podestà em 1226, converteu o cargo público em um senhorio permanente. Em 1257, causou o massacre de 11 mil paduanos na planície de Verona (Campi di Verona).  Após sua morte, o Grande Conselho elegeu Mastino I della Scala como podestà, e ele converteu a “signoria” extraordinariamene em posse familiar, embora deixando aos burgueses uma participação no governo. Não conseguindo ser reeleito podestà em 1262, efetuou um golpe de estado e foi aclamado Capitano del Popolo, com o comando das tropas comunais. Longas discórdias internas ocorreram antes que ele conseguisse estabelecer este novo cargo, ao qual estava anexada a função de confirmar o podestà. Em 1277, Mastino della Scala foi morto pela facção dos nobres. O reinado de seu filho Alberto della Scala como capitano (1277–1302) foi um período de guerra incessante contra os condes de San Bonifacio, que foram auxiliados pela Casa de Este. De seus filhos, Bartolomeo, Alboino e Cangrande I della Scala (1291–1329), apenas o último compartilhou o governo (1308); ele foi grande como guerreiro, príncipe e patrono das artes; ele protegeu Dante, Petrarca e Giotto. Por guerra ou tratado, ele trouxe sob seu controle as cidades de Treviso (1308), Vicenza (1311) e Pádua (1328). Naquela época, antes da Peste Negra, a cidade abrigava mais de 40 mil pessoas. Cangrande foi sucedido por Mastino II (1329–1351) e Alberto, filhos de Alboino. Mastino continuou a política de seu tio, conquistando Bréscia em 1332 e levando seu poder além do Míncio. 

Ele comprou Parma (1335) e Lucca (1339). Depois do Rei da França, ele foi o príncipe mais rico de seu tempo. Uma poderosa liga foi formada contra ele em 1337 – Florença, Veneza, os Visconti, os Este e os Gonzaga. Após uma guerra de três anos, os domínios dos Scaliger foram reduzidos a Verona e Vicenza (a filha de Mastino, Regina-Beatrice della Scala, casou-se com Barnabé Visconti). O filho de Mastino, Cangrande II (1351–1359), era um tirano cruel, dissoluto e desconfiado; não confiando em seus próprios súditos, ele se cercou de mercenários brandenburgianos. Ele foi morto por seu irmão Cansignorio (1359-1375), que embelezou a cidade com palácios, dotou-a de aquedutos e pontes e fundou o tesouro do estado. Ele também matou seu outro irmão, Paolo Alboino. O fratricídio parece ter se tornado um costume familiar, pois Antônio (1375-1387), irmão biológico de Cansignorio, assassinou seu irmão Bartolomeu, despertando assim a indignação do povo, que o abandonou quando Gian Galeazzo Visconti, de Milão, o guerreou. Tendo esgotado todos os seus recursos, ele fugiu de Verona à meia-noite de 19 de outubro de 1387, pondo fim à dominação scaligeriana, que, no entanto, sobreviveu em seus monumentos. O ano de 1387 é o ano da Batalha de Castagnaro, travada entre Giovanni Ordelaffi, de Verona, e John Hawkwood, de Pádua. Este último saiu vitorioso. O filho de Antônio, Canfrancesco, tentou em vão recuperar Verona (1390). Guglielmo (1404), filho natural de Cangrande II, teve mais sorte; com o apoio do povo e dos Carraresi, expulsou os milaneses, mas morreu dez dias depois. Após um período de domínio Carrese, Verona submeteu-se a Veneza (1405).

Os últimos representantes dos Scaligeri viveram na corte imperial e tentaram repetidamente recuperar Verona com a ajuda de revoltas populares. De 1508 a 1517, a cidade esteve sob o poder do Imperador Maximiliano I. Houve numerosos surtos de peste e, em 1629-1633, a Itália foi atingida pelo seu pior surto dos tempos modernos. Cerca de 33 mil pessoas morreram em Verona mais de 60% da população em 1630-1631. Em 1776, um método de toque de sinos foi desenvolvido, chamado de arte de toque de sinos veronesa. Verona foi ocupada por Napoleão em 1797, mas na segunda-feira de Páscoa a população se revoltou e expulsou os franceses. Foi então que Napoleão pôs fim à República de Veneza. Verona tornou-se território austríaco quando Napoleão assinou o Tratado de Campo Formio em outubro de 1797. Os austríacos assumiram o controle da cidade em 18 de janeiro de 1798. Ela foi tomada da Áustria pelo Tratado de Pressburg em 1805 e tornou-se parte do Reino da Itália de Napoleão, mas foi devolvida à Áustria após a derrota de Napoleão em 1814, quando se tornou parte do Reino da Lombardia-Veneza, controlado pela Áustria. 

O Congresso de Verona, que se reuniu em 20 de outubro de 1822, fez parte de uma série de conferências ou congressos internacionais, iniciados com o Congresso de Viena em 1814-1815, que marcaram a continuação da aplicação do “Concerto da Europa”. Após a Terceira Guerra da Independência Italiana (1866), Verona, juntamente com o resto de Vêneto, tornou-se parte de uma Itália unida. Após a 2ª Guerra Mundial (1939-1945), com a adesão da Itália à Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN), Verona recuperou sua importância estratégica, devido à sua proximidade geográfica com a Cortina de Ferro. A cidade tornou-se sede das Forças Terrestres Aliadas do Sul da Europa e teve, durante toda a chamada Guerra Fria, uma forte presença militar, especialmente americana, que diminuiu desde então. (1947-1991) foi um período de tensão político-ideológica entre os blocos capitalista e comunista, liderados pelos Estados Unidos da América e pela União Soviética, respetivamente. Não houve confronto bélico direto entre as duas superpotências, mas ideológico, devido à ameaça nuclear, mas sim conflitos indiretos, corridas armamentista e espacial, espionagem e a criação de alianças militares como a Organização do Tratado Atlântico Norte e o Pacto de Varsóvia (1955). O conflito terminou, levando à predominância do capitalismo. As características da Guerra Fria foram: conflito ideológico e geopolítico entre o capitalismo, defendido pelos EUA, e o comunismo, apoiado pela URSS. 

O mundo foi dividido em dois grandes blocos político-ideológicos, cada um liderado por uma das superpotências, e cada bloco defendia a sua visão política e económica. Ausência de Confronto Direto: A ameaça de uma guerra nuclear impediu um conflito direto entre os EUA e a URSS, o que deu origem ao nome Fria. Alianças Militares: Foram formadas a OTAN, liderada pelos EUA, e o Pacto de Varsóvia, liderado pela URSS, para garantir a proteção mútua dos países membros. Corrida Armamentista e Espacial: As superpotências competiram para desenvolver novas armas e tecnologias, culminando numa corrida pelo domínio do espaço, incluindo a chegada do homem à Lua. Conflitos Indiretos: Os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialista Soviética apoiaram lados opostos em guerras como a da Coreia e a do Vietname, além de influenciarem a política e a economia de diversos países. Espionagem e Propaganda: A espionagem era uma ferramenta importante, e a propaganda era utilizada politicamente para desqualificar um sistema e promover o outro. Queda do Muro de Berlim: O Muro, símbolo da divisão entre o leste e o oeste da Europa, caiu em 1989, abrindo caminho para a reunificação da Alemanha e o fim da divisão de blocos. Colapso da União Soviética: Em 1991, a União Soviética desintegrou-se, marcando o fim definitivo da Guerra Fria e o fim da ordem geopolítica bipolar. Predomínio do Capitalismo: Com o fim da URSS, o sistema capitalista tornou-se o sistema hegemónico em grande parte do mundo contemporâneo.

Bibliografia Geral Consultada,

DEBUS, Allen George, El Hombre y la Naturaleza en el Renacimiento. México: Fondo de Cultura Económica, 1996; ARMELLA, Virginia Aspe, “Lo Maravilloso - To Thaumaston - Un Elemento Olvidado en la Poética”. In: Signos Filosóficos, (8) 51-70; 2002; HALE, John, La Civilisation de L´Europe à la Ranaissance. Sarthe-France: Éditions Perrin, 2003; CAROLA, Carlos Renato, “Pandora, Eva e Sofia: A Naturalização da Desigualdade de Gênero na História do Pensamento Ocidental”. In: Gênero e Trabalho Infantil na Pequena Mineração: Brasil, Peru, Argentina, Bolívia. Rio de Janeiro: CETEM/CNPq, 2006, pp.23-40; LAGO, Gustavo de Carvalho Pinheiro, Conectividade: Um Estudo sobre o Amor Pós-Moderno. Dissertação de Mestrado. Instituto de Psicologia. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2009; BLENKINSOPP, Joseph, Creation, Un-creation, Re-creation: A Discursive Commentary on Genesis 1-11. Londres: OCLC, 2011; ENNS, Peter, The Evolution of Adam: What the Bible Does and Doesn`t Say About Human Origins. Michigan: Editor Brazos Press, 2012; ABREU e LIMA, Fellipe de Andrade, A Ideia de Cidade no Renascimento. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012; LEONARDI, Evandro Marcos, Conflito Civil e Liberdade no Pensamento Republicano de Maquiavel. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2015; NOGUEIRA, Liliana Grubel, O Mercador no Livro de Arte do Comércio (1458), de Benedeto Cotrugli (1416-1469). Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2019; RIBEIRO, Raquel Ferreira, Macbeth e a Adaptação do Herói Trágico Shakespeariano no Cinema. Tese de Doutorado. Programa de Pós-graduação em Letras. Centro de Humanidades. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2022; BIONDO, Valéria, Franklin e seus Aforismos Educativos: Um Modo de Existência e de Conduta Moral e da Racionalização da Sexualidade. Tese de Doutorado em Educação Escolar. Faculdade de Ciências e Letras. Araraquara: Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, 2023; URBINA, Carlos, “¿Por qué Pacioli y no Cotrugli?”. In: Contaduría. Universidad De Antioquia, (86), 137–158, 2025; entre outros.           

O Julgamento – Dispositivo de Poder & Casuística Liberal Radical.

          A cólera prejudica o sossego da vida e a saúde do corpo, ofusca o julgamento e cega a razão. Denis Diderot                             

           A esfera vigilante da política é a da relação amigo-inimigo. Nesse sentido, a origem e de aplicação da política é o antagonismo nas relações sociais e sua função se liga à atividade de associar e defender os amigos e de desagregar e combater os inimigos. Há conflitos entre as pessoas e entre os grupos sociais, entre esses conflitos, há alguns notáveis pela intensidade que são os conflitos políticos. As relações entre os grupos instigadas por esses conflitos, agregando os grupos internamente ou os confrontando entre si, são as relações políticas. Em Dell’Arte della guerra (“A Arte da Guerra”), Maquiavel descreve sua estratégia militar (e política) de dividir para conquistar. O conflito mais amplo, entre grupos consubstanciados em Estados é a guerra, nesse sentido é “a continuação da política por outros meios”, no dizer de Clausewitz. A crise política sem fim e sem precedentes sugere algumas reflexões sobre o problema da ética na política. Nenhuma profissão é mais nobre do que a política porque quem a exerce assume responsabilidades só compatíveis com grandes qualidades morais e de competência. A atividade política só se justifica se o político tiver espírito republicano, ou, se as suas ações, além de buscarem a conquista do poder, forem dirigidas para o bem público, que não é fácil definir, mas que é preciso sempre buscar. Um bem público que variará de acordo com a ideologia ou os valores de cada político, mas o qual se espera que ele busque com prudência e coragem.

            O que poderia ser mais objetivo do que o funcionamento da ideologia? Embora se constitua uma surpresa para muitos, a verdade é que em nossa cultura liberal-conservadora, quer a percebamos ou não, o sistema ideológico socialmente estabelecido e dominante funciona de modo a representar ou desvirtuar suas próprias regras sociais de seletividade, preconceito, discriminação e distorção sistemática como as noções sobre normalidade, objetividade do conhecimento e a maldita imparcialidade científica presente comumente nas instituições públicas e nas universidades em geral. Compreensivelmente, a ideologia dominante tem uma grande vantagem na determinação do que pode ser considerado um critério legítimo de avaliação do conflito, já que controlam efetivamente as instituições culturais e políticas da sociedade, o sistema tem dois pesos e duas medidas, movidos pela ideologia e viciosamente tendencioso, é evidente em toda parte: mesmo entre aqueles que se orgulham em dizer que representam a nossa (sua) qualidade de vida capaz de medir as condições de sociais e políticas  de um ser humano representando as condições que contribuem para o bem físico e espiritual dos indivíduos em sociedade. Nas últimas décadas, os intelectuais se intimidaram em admitir a essência de classe em suas teorias e posturas ideológicas.  A ideologia não é ilusão nem superstição de mal-orientados, mas uma forma de consciência social, materialmente ancorada e sustentada. 

Não pode ser superada exclusivamente nas sociedades de classes. Sua persistência se deve ao fato social dela ser constituída objetivamente e constantemente reconstituída como consciência prática inevitável das sociedades de classe, relacionada com a articulação de conjuntos de valores e estratégias rivais que tentam controlar o metabolismo social em todos os seus principais aspectos. Mas que se entrelaçam conflituosamente e se manifestam no plano da consciência, na grande diversidade constituída de discursos teóricos e ideológicos relativamente autônomos, com influência sobre os processos materiais mais tangíveis. O “metabolismo social”, para Lembrarmos de Mészáros (2004) é um dado utilizado para a compreensão dos processos sociais e se nesse dado momento houve a existência da chamada sustentabilidade. Esse conflito tampouco será resolvido no domínio legislativo da “razão teórica” isolada, independentemente do nome da moda sociológica que lhe seja dado. É o mais importante conflito social e político, para manter ou, afastar o modo dominante sobre o metabolismo social dentro dos limites das relações de produção estabelecidas em que os homens se tornam conscientes desse conflito e o resolvem pela luta de interesses. Em outras palavras, as diferentes formas ideológicas de consciência social têm implicações práticas de longo alcance.                    

Em todas as suas variedades como na arte e na literatura, assim como na filosofia e na teoria social, independentemente de sua vinculação sociopolítica a posições progressistas ou conservadoras. É esta orientação prática que define também o tipo socialmente de racionalidade apropriado ao discurso ideológico e inscreve, por assim dizer, a questão da racionalidade ideológica como inseparável do reconhecimento das limitações objetivas dentro das quais são formuladas as estratégias alternativas a favor ou contra a reprodução de determinada ordem social. Não é questão de conformidade ou não conformidade a algum conjunto de regras predeterminado de normas lógicas. As ideologias são determinadas pela época em dois sentidos. A orientação conflituosa das várias formas de consciência social prática permanecer a característica mais proeminente dessas formas de consciência, na medida em que as sociedades forem divididas em classes. Em outras palavras, a consciência social prática de tais sociedades não podem deixar de ser ideológica – isto é, idêntica à ideologia – em virtude do caráter insuperavelmente antagônico de suas estruturas sociais. Segundo, na medida em que o caráter específico do conflito social fundamental, que deixa sua marca indelével nas ideologias conflitantes em diferentes períodos históricos, surge do caráter historicamente mutável – e não em curto prazo – das práticas produtivas e distributivas da sociedade e da necessidade correspondente de se questionar radicalmente a continuidade da imposição das relações socioeconômicas e políticas que, anteriormente viáveis, tornam-se cada vez menos eficazes no curso do desenvolvimento histórico.

Desse modo, os limites de tal questionamento social são determinados pela época, colocando em primeiro plano as novas formas de desafio ideológico em íntima ligação com o surgimento de meios de satisfação das exigências fundamentais sociais. Sem se reconhecer a determinação das ideologias como a consciência prática das sociedades de classe, a estrutura interna permanece completamente ininteligível. É neste sentido, sociologicamente, que devemos diferenciar três posições ideológicas fundamentalmente distintas, com sérias consequências para os tipos de conhecimento compatíveis com cada uma delas. A primeira apoia a ordem estabelecida com uma atitude acrítica, adotando e exaltando a forma vigente do sistema dominante – por mais que seja problemático e repleto de contradições – como o horizonte absoluto da própria vida social. A segunda, exemplificada por pensadores radicais como J.-J. Rousseau (1712–1778) um filósofo, escritor e teórico político suíço do século XVIII, considerado um dos pensadores do Iluminismo e precursor do Romantismo, famoso por suas teorias sobre o contrato social, a vontade geral e a natureza humana. Suas ideias, que defendiam um “estado de natureza ideal” e criticavam a “desigualdade social” causada pela propriedade privada, influenciaram a clássica Revolução Francesa e a formação das democracias modernas, com obras como “O Contrato Social” (1762) e “Emílio ou da Educação” (1762), revelam acertadamente as irracionalidades da forma específica de uma anacrônica sociedade de classes que ela rejeita a partir de um ponto de vista. Mas sua crítica é viciada pelas próprias contradições inerentes de sua própria posição e engajamento social – igualmente determinada pela classe social, ainda que seja evoluída ou emancipada.

E a terceira, contrapondo-se às duas posições sociais anteriores, questiona a viabilidade histórica da própria sociedade de classe, propondo, como objetivo central de sua intervenção prática consciente, a superação de todas as formas de antagonismo de classe. Apenas o terceiro tipo de ideologia pode tentar superar as restrições associadas com o conhecimento prático dentro do horizonte da consciência social dividida, sob as condições da sociedade dividida em classes. Entretanto, a questão prática, permanece a mesma. Mas sugere a maneira adequada como “resolver pela luta” o conflito fundamental relativo ao direito estrutural de controlar o “metabolismo social” como um todo. O quadro das discussões teóricas, de acordo com a história social e política não pode ser determinado significativamente por meio de escolhas arbitrárias. E nenhuma profissão é mais importante na vida em sua dimensão global, porque o político pode ter uma má influência sobre a vida das pessoas maior do que a de qualquer outra profissão. A ética da política não pode ser diferente da ética da vida pessoal. E além de observar os princípios gerais, como não matar ou não roubar, o político deve mostrar ao povo sua capacidade de defender o bem comum, e o bem-estar social, sem se preocupar com o exercício do poder. 

Além de não distinguir, de qualquer forma, os demais membros da sociedade, deve ser capaz de mostrar a esses membros que assume a responsabilidade pela consecução deste objetivo. Exerce assim, o que se convencionou chamar da “ética da responsabilidade. E a ética da responsabilidade leva em consideração as consequências das decisões que o político adota. Em muitas ocasiões, o político pode ser colocado frente a dilemas morais para tomar decisões. Mas, o político ciente, de sua obrigação com a ética da responsabilidade, sabe que não deve subverter seus valores e, muito menos aqueles que apresentou para seus eleitores. As motivações que ordenam os símbolos não apenas já não formam longas cadeias de razões, mas nem sequer cadeias. A explicação linear do tipo de dedução lógica ou narrativa introspectiva não basta para o estudo das motivações simbólicas. A classificação dos grandes símbolos da imaginação em categorias motivacionais distintas apresenta, com efeito, pelo próprio fato da não linearidade e do semantismo das imagens, grandes dificuldades. Metodologicamente, se se parte dos objetos bem definidos pelos quadros da lógica dos utensílios, como faziam as clássicas “chaves dos sonhos”, segundo as estruturas antropológicas do imaginário, cai-se rapidamente, pela massificação das motivações, numa inextricável confusão. Parecem-nos mais sérias as tentativas para repartir os símbolos segundo os grandes centros de interesse de um pensamento, certamente perceptivo, mas ainda completamente impregnado de atitudes assimiladoras nas quais os acontecimentos perceptivos não passam de pretextos para os devaneios imaginários. Tais são as formas de classificações mais profundas de analistas das motivações do simbolismo religioso ou da imaginação dialética de modo geral literária.  

No prolongamento dos esquemas explicativos, arquétipos e simples símbolos modernos podem-se considerar o mito. Lembramos, todavia, que não estamos tomando este termo na concepção restrita que lhe dão os etnólogos, que fazem dele apenas o reverso representativo de um ato ritual. Entendemos por mito, “um sistema dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico que, sob o impulso de um esquema, tende a compor-se na narrativa”. O mito é já um esboço de racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se resolvem em palavras e os arquétipos em ideias. O mito explicita um esquema ou um grupo de esquemas. Do mesmo modo que o arquétipo promovia a ideia e que o símbolo engendrava o nome, podemos dizer que o mito promove a doutrina religiosa, o sistema filosófico ou, como bem observou Bréhier, a narrativa histórica e lendária. O método de convergência evidencia o mesmo isomorfismo na constelação e no mito. Enfim, para sermos breves, este isomorfismo dos esquemas, arquétipos e símbolos no seio dos sistemas míticos ou de constelações estáticas pode levar-nos a verificar a existência de protocolos normativos das representações imaginárias, bem definidos e relativamente estáveis, agrupados em torno dos esquemas originais e que antropologicamente a literatura refere-se como estruturas.

O Julgamento tem como representação social um filme de drama de 2010 dirigido por Gary Wheeler e estrelado por Matthew Modine. É baseado no romance homônimo de Robert Whitlow e foi lançado em 10 de setembro de 2010, arrecadando US$ 19.753 nas bilheterias. Pete Thomason (Randy Wayne), respondendo por um assassinato de primeiro grau, sob pena de morte. Nada pode prevenir Mac das reviravoltas impressionantes do julgamento decorrente, à medida que o determinado advogado luta por justiça e busca um caminho para sua própria redenção. Após a terrível morte de sua esposa e, dois filhos, o suicídio parece ser a única saída para um advogado da pequena cidade de Kent, “Mac” McClain, até ele atuar num caso de pena de morte que começa a transformar a sua vida e a daqueles ao seu redor para sempre. Atores principais: Robert Foster, Matthew Modine, Larry Bagby.  É um cineasta, produtor e diretor norte-americano radicado na Carolina do Norte. Fundou a Level Path Productions em 2004 e, posteriormente, trabalhou atuando em diversos filmes, como “A Lista”, de 2007, e “Coração de Natal”, de 2011. Em 2014, ingressou na INSP Films. Nas últimas duas décadas, Gary Wheeler trabalhou em diversos filmes, em funções técnicas e sociais como roteirista, produtor e diretor. Isso incluiu a direção de diversos filmes natalinos, só para citarmos alguns, como “O Coração do Natal” (2011), “Natal nas Montanhas Fumegantes” (2015) e “Natal na Cordilheira” (2020). Nos últimos anos, trabalhou em filmes de ação/faroeste, incluindo a direção de “Far Haven”, de 2023. 

Atualmente, ele está trabalhando na série “Blue Ridge” (2024), da qual é showrunner, o principal responsável criativo e produtivo de uma série de televisão, supervisionando todos os aspetos técnicos e sociais do programa, desde a escrita criativa do roteiro e o desenvolvimento da história até a gestão do orçamento, filmagens e edição, garantindo a coerência geral da produção. Esta função social, comum nos Estados Unidos e Canadá, é geralmente ocupada pelo criador da série, que atua criativamente no projeto e coordena o trabalho de diferentes equipes e diretores. O conceito ainda é relativamente recente, com o termo sendo mais usado em cursos de formação e alguns projetos. Vale lembrar que o papel de autor-produtor de telenovelas pode ser visto como função semelhante.  Matthew Avery Modine, nascido em Loma Linda, em 22 de março de 1959 é um ator norte-americano. Nascido em uma família mórmon, Matthew é o mais jovem de sete irmãos. Depois de assistir um documentário sobre o filme Oliver! (1968), um musical dirigido por Carol Reed e com roteiro livremente baseado no romance Oliver Twist de Charles Dickens, decidiu que queria tornar-se ator. Mudou-se para Nova Iorque em 1979, onde conheceu sua esposa Cari. Casaram no ano seguinte e têm um casal de filhos.

Seus principais filmes são, respectivamente: Private School (1983); The Hotel New Hampshire (1984), com Jodie Foster, Birdy (1984), de Alan Parker e com Nicolas Cage; Mrs. Soffel (1984), de Gillian Armstrong, com Diane Keaton e Mel Gibson; Full Metal Jacket (1987), de Stanley Kubrick; Married to the Mob (1988), Gross Anatomy - Futuros Médicos (1989) - Matthew Modine, Daphne Zuniga, Christine Lahti, Todd Field, John Scott Clough, Alice Carter, Robert Desiderio, Zakes Mokae, Clyde Kusatsu, John Petlock, de Jonathan Demme e com Michelle Pfeiffer; Memphis Belle (1990), de Michael Caton-Jones e com Eric Stoltz; Pacific Heights (1990), de John Schlesinger e com Melanie Griffith; Equinox (1992), de Alan Rudolph; Short Cuts (1993), de Robert Altman com grande elenco; Cutthroat Island (1995), onde protagonizou com Geena Davis; Fluke, como Tom, e Fluke (1995); The Blackout (1997), de Abel Ferrara; Any Given Sunday (1999), de Oliver Stone e com Al Pacino, e The Garden of Eden (2008). Foi membro do júri do Festival Sundance de Cinema em 1994. Entretanto, em 2016, Matthew interpretou o Dr. Martin Brenner na série de televisão Stranger Things, sendo um dos antagonistas da trama e seu papel de destaque mais famoso atualmente. É uma série de televisão via streaming dos gêneros pari passu ficção científica, terror, suspense e o chamado “drama adolescente”, criada, escrita e dirigida pelos irmãos Matt e Ross Duffer para a plataforma Netflix. Além disso, os irmãos Duffer, Shawn Levy e Dan Cohen são também os produtores executivos. 

 A série apresenta em seu elenco os nomes de Winona Ryder, David Harbour, Finn Wolfhard, Millie Bobby Brown, Gaten Matarazzo, Caleb McLaughlin, Noah Schnapp, Natalia Dyer, Charlie Heaton, Joe Keery, Cara Buono e Matthew Modine, enquanto Sadie Sink, Dacre Montgomery, Sean Astin, Paul Reiser, Maya Hawke, Priah Ferguson e Brett Gelman foram incluídos no elenco em temporadas posteriores. A primeira temporada da série estreou em 15 de julho de 2016, e se passa na cidade fictícia de Hawkins, Estados Unidos, durante a década de 1980, quando um menino de doze anos chamado Will Byers desaparece misteriosamente. Pouco depois, Onze, uma garota aparentemente fugitiva com poderes telecinéticos, conhece Mike, Dustin e Lucas, amigos de Will, e os ajuda na busca por Will. A segunda temporada estreou em 27 de outubro de 2017 e se passa um ano após os eventos da primeira temporada. É abordado as tentativas dos personagens de retornar à normalidade e das consequências que persistem desde o ano anterior, onde Will fica com sequelas do mundo invertido. A terceira temporada estreou em 4 de julho de 2019 e é ambientada sociologicamente  falando no verão norte-americano de 1985, onde os personagens precisam lidar com o início da adolescência e de novos eventos sobrenaturais após a abertura de um shopping na cidade e a chegada de uma perigosa equipe russa que planeja abrir o portal do mundo invertido. 

Em 30 de setembro de 2019, a Netflix renovou a série para uma quarta temporada, posteriormente a Netflix confirmou a estreia da quarta temporada, dividida em 2 volumes, que estrearam em 27 de maio 2022 e 1° de julho de 2022. Também foi confirmado que a quinta temporada será a última da série. No dia 31 de maio de 2025 a Netflix publicou as datas de lançamento da quinta e última temporada da série, que será dividida em 3 volumes. Os irmãos Duffer desenvolveram a premissa da série em meados de 2015, e no roteiro original, o projeto se chamaria Montauk, e seria ambientado na cidade de mesmo nome localizada em Nova Iorque, abordando as teorias da conspiração envolvendo os experimentos secretos do governo americano em uma base militar na cidade no início da década de 1980. Após a definição do roteiro, os irmãos Duffer incluíram várias referências aos elementos culturais daquela década, como filmes de ficção científica, terror sobrenatural e ação e aventura, bem como videogames, animes e música, além de inúmeras referências a obras de Steven Spielberg, John Carpenter e Stephen King, considerados as grandes inspirações dos irmãos Duffer para a realização do projeto. Eles também se inspiraram em estranhos experimentos que aconteceram durante a chamada Guerra Fria, um período de intensa rivalidade político-ideológica e tensões entre os Estados Unidos e a União Soviética, que durou de 1947 a 1991, e em “teorias da conspiração” do mundo real envolvendo experimentos secretos do governo. Após seu lançamento, Stranger Things recebeu aclamação do público e da crítica especializada, que elogiaram a caracterização, ritmo, atmosfera, atuações, trilha sonora, direção, roteiro e homenagens a filmes do gênero da década de 1980. Devido sua popularidade, a série acabou gerando alguns produtos, como livros, brinquedos, videogames e histórias em quadrinhos. 

A série também recebeu vários prêmios e extraordinárias indicações em torno de premiações globalizadas, tais como: Emmy Awards, Globo de Ouro, British Academy Television Award, entre outros. A importância estratégica que as relações de poder disciplinar desempenham nas sociedades modernas depois do século XIX, vem justamente do fato delas não serem negativas. Mas positivas, quando tiramos desses termos qualquer juízo de valor moral ou político e pensarmos unicamente na tecnologia empregada. É então, que, segundo Foucault, surge uma das teses fundamentais da genealogia: “o poder é produtor de individualidade”. O indivíduo é uma produção do poder e do saber. Atuando sobre uma “massa” confusa, desordenada e desordeira, o esquadrinhamento disciplinar faz nascer uma multiplicidade ordenada no seio da qual o indivíduo emerge como alvo do poder. O nascimento da prisão historicamente em fins do século XVIII, não representou uma massificação social com relação ao modo como anteriormente se era encarcerado. O nascimento do hospício não destruiu a especificidade da loucura. É o hospício que produz o louco como doente mental. Individualizado a partir da instauração de relações disciplinares. 

E antes da constituição das ciências humanas, no século XIX, a organização das paróquias, a institucionalização do exame de consciência e da direção espiritual e a reorganização do sacramento da confissão, que aparecem como importantes dispositivos de individualização. Em suma, o poder disciplinar não destrói o indivíduo; ao contrário, ele o fabrica. O indivíduo não é o outro do poder, realidade exterior, que é por ele anulado; é um de seus mais importes efeitos. O objetivo é neutralizar a ideia que faz da ciência um conhecimento em que o sujeito vence as limitações reais ou imaginárias de suas condições particulares de existência instalando-se na neutralidade objetiva do universal e da ideologia um conhecimento em que o sujeito tem sua relação com a verdade perturbada, obscurecida, velada pelas condições reais de existência. Todo conhecimento, seja ele científico ou ideológico, só pode existir a partir de condições políticas que são as condições para que se formem tanto o sujeito quanto os domínios do saber. A investigação do saber não deve remeter a um sujeito de conhecimento que seria a sua origem, mas a relações de poder que lhe constituem. Não há saber neutro. Todo saber é político. E isso não porque cai nas malhas do Estado, é apropriado por ele, que dele se serve como instrumento de dominação, descaracterizando seu núcleo essencial. Mas porque todo saber tem sua gênese em relações de poder. O fundamental da análise teórica é que saber e poder se implicam mutuamente; não há relação de poder sem constituição de um campo de saber, como também, reciprocamente, todo saber constitui novas relações de poder.  Todo ponto de exercício do poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber.

É assim que o hospital não é apenas local de cura, mas também instrumento de produção, acúmulo e transmissão de saber. Do mesmo modo que a escola está na origem da pedagogia, a prisão da criminologia, o hospício da psiquiatria. Mas a relação ainda é mais intrínseca: é o saber enquanto tal que se encontra dotado estatutária, e institucionalmente de determinado poder. O saber funciona dotado de poder. E enquanto é saber tem poder. A configuração do que Foucault denomina de “intelectual específico” se desenvolveu na 2ª grande guerra (1939-1945), e talvez o físico atômico tenha sido quem fez a articulação entre intelectual universal e intelectual específico. É porque tinha uma relação direta e localizada com a instituição e o saber científico que o físico atômico intervinha; mas já que a ameaça atômica concernia todo o gênero humano e o destino do mundo, seu discurso podia ser ao mesmo tempo o discurso do universal. Sob a proteção deste protesto que dizia respeito a todos, o cientista atômico desenvolveu uma posição específica na ordem do saber. Pela primeira vez o intelectual foi perseguido pelo poder político, não mais em função do seu discurso geral, mas por causa do saber que detinha: é neste nível que ele se constituía como um perigo político. Mas o intelectual específico deriva de uma figura pobre e diversa do “jurista-notável”: “cientista-perito”. O importante é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder.

A verdade é deste mundo, produzida nele graças a múltiplas coerções que produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, seus tipos de discursos que faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados, sob nosso olhar, para a obtenção da verdade. Quem está de fora do poder, mas tem a capacidade analítica de interpretar o estatuto que delimita o seu campo de saber, percebe os efeitos de poder do que funciona como verdadeiro.  É preciso repensar os problemas políticos dos intelectuais não mais em termos exclusivos da relação entre ciência e ideologia, mas sem abandoná-la, tendo em vista que a universidade pública é um domínio de casta, “a forma natural pela qual costumam socializarem-se as comunidades étnicas que creem no parentesco de sangue com os membros de comunidades exteriores e o relacionamento social. Essa situação de casta é parte do fenômeno de povos párias e se encontra em todo o mundo” (cf. Weber, 1982; pp. 449-470), a análise pode ser religada na medida em que a questão da profissionalização do intelectual, da divisão entre trabalho manual e intelectual, na esfera pública pode ser retomada. A verdade está circularmente ligada a sistemas de poder que a produzem e apoiam, e a efeitos de poder que ela induz e a reproduzem.

Ipso facto, o problema político essencial para o intelectual não é apenas criticar os conteúdos ideológicos que privilegiam grupos no sistema educacional que estariam ligados à ciência ou fazer com que sua prática científica seja acompanhada por métodos de inclusão democráticos. Mas não se trata de libertar a verdade do sistema de poder, mas de desvincular o poder da verdade das formas com as quais ele legitima suas formas de saber. A genealogia exige a minúcia do saber, evidenciando um grande número de materiais acumulados. O termo julgamento, em primeiro lugar, geralmente se refere a uma avaliação que considera uma série de fatores ou provas para a formação de uma decisão embasada. Esse termo possui diversas acepções, como a concepção psicológica, que é usada em referência à qualidade das capacidades cognitivas e adjudicação de particulares, normalmente chamado sabedoria ou discernimento, como por exemplo, um julgamento de uma exposição como miss, gado, cavalo, cães, etc.; a religiosa, que é utilizada no conceito de salvação para se referir ao julgamento decisivo de Deus na causa com recompensa ou punição para cada ser humano; e por fim, a mais reconhecida, jurídica, que geralmente se refere a uma decisão justificada proferida pelo juiz. O termo julgamento na acepção jurídica pode se referir a diversos atos, do ponto de vista social e político, por exemplo, o processo cognitivo realizado pelo juiz ao ponderar sobre os argumentos levantados pelas partes.

Neste sentido, funcionaria como sinônimo de interpretação, ou seja, uma operação mental que fixa sentido às normas jurídicas. Processo cognitivo realizado pelas partes: ao entrar com uma demanda, as partes geralmente devem fundamentar suas pretensões com argumentos jurídicos, realizando para tal um processo cognitivo/abstrato de seleção de argumentos.  Neste caso, uma pessoa deverá ponderar entre os fatos que levantará para explicar o caso ao juiz, e os argumentos de direito, baseados na lei, que darão apoio à sua pretensão, realizando assim um julgamento de valor para realizado esta seleção. Decisão proferida pelo magistrado após ponderação dos argumentos das partes: neste caso, sinônimo de sentença, a decisão judicial também é um julgamento na acepção jurídica, pois leva o magistrado a valorar os fatos e o direito e posicionar-se a respeito do caso concreto. Os juízes, embora estejam vinculados a uma norma hierárquica que lhes concede competência para proferir decisões, devem, na maioria dos ordenamentos, fundamentar suas decisões, mostrando à parte o raciocínio utilizado para chegar à uma conclusão. A argumentação jurídica é uma fusão de fatos do mundo real, que são trazidos pelas partes, com normas jurídicas, que comprovam o poder do magistrado de interpretação das leis. 

O julgamento seria assim uma forma de validação da norma jurídica, ou seja, quando o juiz aplica a norma, estaria validando e dando eficácia a ela. A pena de morte, em segundo lugar, é legal nos Estados Unidos da América, atualmente usada por 29 estados, o governo federal e os militares. Sua existência pode ser rastreada desde o início das colônias americanas. Os Estados Unidos da América são a única nação ocidental desenvolvida que aplica a pena de morte regularmente do ponto de vista disciplinar. É um dos 54 países em todo o mundo a aplicá-lo e foi o primeiro a desenvolver a injeção letal como método de execução, que já foi adotado por outros cinco países. As Filipinas aboliram as execuções e a Guatemala o fez por ofensas civis, deixando os Estados Unidos como um dos quatro países que na atualidade ainda usam esse método junto com China, Tailândia e Vietnã. Não houve execuções nos Estados Unidos entre 1967 e 1977. Em 1972, a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou os estatutos da pena de morte em Furman v. Georgia, reduzindo todas as sentenças de morte pendentes no momento em prisão perpétua. Posteriormente, a maioria dos estados aprovou novos estatutos de pena de morte, e o tribunal afirmou a legalidade da pena de morte no caso de 1976 Gregg v. Georgia. Desde então, mais de 7.800 réus foram condenados à morte; destes, mais de 1.500 foram executados. Um total de 165 condenados à morte na Era Moderna foram exonerados antes de serem executados. Em 1° de abril de 2018, 2.743 ainda estão no chamado corredor da morte.

Historicamente em vez de abandonar a pena de morte, 37 estados promulgaram novos estatutos de pena de morte que tentaram abordar as preocupações de Byron White e Potter Stewart em Furman. Alguns estados responderam promulgando estatutos obrigatórios de pena de morte que prescreviam uma sentença de morte para qualquer pessoa condenada por certas formas de assassinato. White sugerira que esse esquema atenderia às suas preocupações constitucionais em sua opinião de Furman. Outros estados adotaram procedimentos de julgamento e sentença “bifurcados”, com várias limitações processuais na capacidade do júri de pronunciar uma sentença de morte destinada a limitar a discrição do jurado. Em 2 de julho de 1976, a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu Gregg v. Georgia por 7 a 2 e manteve o procedimento na Geórgia no qual o julgamento de crimes capitais foi bifurcado em fases de inocência e sentença de culpa. No primeiro processo, o júri decide a culpa do réu; se o réu for inocente ou não for condenado por assassinato em primeiro grau, a pena de morte não será aplicada. Na segunda audiência, o júri determina se existem certos fatores agravantes estatutários, se existem fatores atenuantes e, em muitas jurisdições, pesa os fatores agravantes e atenuantes na avaliação da penalidade máxima, morte ou prisão perpétua, com ou sem liberdade condicional. No mesmo dia, em Woodson v. North Carolina e Roberts v. Louisiana, o tribunal anulou por 5 a 4 estatutos, fornecendo uma condenação de morte obrigatória. As execuções foram retomadas exatamente em 17 de janeiro de 1977, quando Gary Gilmore foi executado por um pelotão de fuzilamento em Utah.                  

A pena de morte por certos crimes ainda é possível para os membros da Guarda Nacional dos Estados Unidos no Título 32 do Código de Justiça Militar do Novo México (NMSA 20-12), e por crimes capitais cometidos antes da revogação do estatuto de pena de morte no Novo México. A legislatura de Nebraska também aprovou uma revogação em 2015, mas uma campanha de referendo reuniu assinaturas suficientes para suspendê-la. A pena de morte foi restabelecida por votação popular em 8 de novembro de 2016. No mesmo dia, o eleitorado da Califórnia derrotou uma proposta de revogação da pena de morte e adotou outra iniciativa para acelerar seu processo de apelação. Em 11 de outubro de 2018, o estado de Washington se tornou o 20º estado a abolir a pena de morte quando a Suprema Corte de Washington considerou a pena de morte inconstitucional com base no viés racial. Nova Hampshire se tornou o 21º estado a abolir a pena de morte em 30 de maio de 2019, quando o Senado de Nova Hampshire anulou o veto do governador Chris Sununu por 16 a 8. Desde Furman, 11 estados organizaram votos populares sobre a pena de morte por meio do processo de iniciativa e referendo. Todos resultaram em uma votação para restabelecê-lo, rejeitar sua abolição, expandir seu campo de aplicação, especificar na constituição estadual que não é inconstitucional ou acelerar o processo de apelação em casos capitais. 21 estados, além do Distrito de Columbia e Porto Rico, aboliram a pena de morte para todos os crimes. Michigan se tornou o primeiro território de língua inglesa do mundo a abolir a pena de morte em 1847. Embora a traição permanecesse um crime punível com a pena de morte em Michigan, apesar da abolição de 1847, ninguém jamais foi executado sob essa lei, e a Convenção Constitucional de Michigan de 1962 codificou que a pena de morte foi abolida.

Longe de ser uma categoria de semelhança, tal origem permite ordenar, para coloca-las a parte, todas as marcas diferentes. O genealogista parte em busca do começo, esta marca quase apagada que não saberia enganar um olho, por pouco histórico que seja; a análise da proveniência permite dissocia o Eu e fazer pulular lugares e recantos de sua síntese vazia, entre acontecimentos aparentemente perdidos. A proveniência permite também reencontrar sob o aspecto único de um caráter ou de um conceito a proliferação dos acontecimentos através dos quais eles se formaram. Metodologicamente a genealogia não pretende recuar no tempo para restabelecer uma grande continuidade para além da dispersão do esquecimento; sua tarefa não é a de mostrar que o passado ainda está lá, bem vivo no presente, animando-o ainda em segredo, depois de ter imposto a todos os obstáculos do percurso uma forma delineada desde o início. Seguir o filão complexo da proveniência é, ao contrário, manter o que se passou na dispersão que lhe é própria: é demarcar os acidentes, os ínfimos desvios, os erros, as falhas na apreciação, os maus cálculos que deram nascimento ao que existe e tem valor para nós; é descobrir que na raiz daquilo que nós conhecemos e daquilo que nós somos – não existem a verdade e o ser, mas a exterioridade do acidente. Na universidade como na esfera da sociedade, basta o que ficou da gestão passada para compreendermos o presente. Na vã política em geral e particularmente na gestão acadêmica o passado nos condena. 

A cena pública historicamente da verdade é politicamente sempre a mesma em que repetem indefinidamente os dominadores versus os dominados. Homens dominam outros homens e é assim que nasce a diferença de valores; classes dominam classes e é assim que nasce a ideia de liberdade, homens se apoderam de coisas das quais eles têm necessidade para viver, eles lhes impõem uma duração que elas não têm, ou eles as assimilam pela força – e é o nascimento da lógica. Nem a relação de dominação é mais uma relação, nem o lugar onde ela se exerce é um lugar. E é por isto precisamente que em cada momento da história a dominação se fixa em um ritual; ela impõe obrigações e direitos; ela constitui cuidadosos procedimentos. Ela estabelece marcas, grava lembranças e até nos corpos; ela se torna responsável pelas dívidas. Universo de regras que não é destinado a adoçar, mas ao contrário a satisfazer a violência. A regra é o prazer calculado da obstinação, é o sangue prometido. Ela permite reativar sem cessar o jogo da dominação; ela põe em cena uma violência meticulosamente repetida. A humanidade não progride lenta de combate em combate, ela instala cada uma de suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim num processo ad infinitum de dominação em dominação.  É justamente a regra que permite que seja feita a violência a violência e que uma outra dominação possa dobrar aqueles que dominam. Em si mesmas as regras são vazias, violentas, não finalizadas; elas são feitas para servir a isto ou aquilo; elas podem ser burladas ao sabor da vontade de uns e outros. O grande jogo da história será, segundo Michel Foucault, de quem se apoderar das regras, de quem tomar o lugar daqueles que as utilizam, de quem se disfarçar para perverte-las, utilizá-las ao inverso e volta-las contra aqueles que as tinham imposto; de quem, se introduzindo no aparelho complexo, o fizer funcionar de tal modo que os dominadores encontrar-se-ão dominados por suas próprias regras.     

As diferenças emergenciais que se podem demarcar não são figuras sucessivas de uma mesma significação; são efeitos de substituição, reposição e deslocamento, conquistas disfarçadas, inversões sistemáticas. Se interpretar eras colocar lentamente em foco uma significação oculta na origem, apenas a metafísica poderia interpretar o devir da humanidade. Mas se interpretar é se apoderar por violência ou sub-repção, de um sistema de regras que não tem em si significado essencial, e lhe impor uma direção, dobrá-lo a uma nova vontade, fazê-lo entrar noutro jogo e submetê-lo a novas regras, então o devir da humanidade é uma série de interpretações. E a genealogia dever ser a sua história: história das morais, dos ideais metafísicos de uma universidade de verdade, dos conceitos metafísicos, história do conceito de liberdade ou da vida ascética, como emergências de interpretações diferentes. Trata-se de fazê-las aparecer como acontecimentos reais no teatro dos procedimentos. Não queremos perder de vista que a disciplina é, antes de tudo, a análise do espaço. É a individualização pelo espaço, a inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. A disciplina exerce seu controle, não sobre o resultado de uma ação, mas sobre seu desenvolvimento. No século XVII, nas oficinas de tipo corporativo, o que se exigia do companheiro ou do mestre era que fabricasse um produto com determinadas qualidades. A maneira de fabricá-lo dependia da transmissão de geração em geração. Do mesmo modo, se ensinava o soldado a lutar, a ser mais forte do que o adversário na luta individual da batalha.  

A partir do século XVIII, se desenvolve uma arte do corpo humano. Observa-se de que maneira os gestos são feitos, o mais eficaz, rápido e melhor ajustado. Nas oficinas aparece o famoso e sinistro personagem do contramestre, destinado não só a observar se o trabalho foi feito, mas como é feito, como pode ser mais rapidamente realizado e com gestos melhor adaptados. O famoso Regulamento da Infantaria Prussiana, que assegurou as vitórias de Frederico da Prússia (1794-1863), consiste em mecanismos de gestão disciplinar dos corpos.  A disciplina é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos. Não basta olhá-los às vezes ou ver se o que o que fizeram é conforme à regra. É preciso vigiá-los durante todo o tempo da atividade e submetê-los a uma perpétua “pirâmide de olhares”. Mas a disciplina implica um registro contínuo. Anotação do indivíduo e transferência da informação de baixo para cima, de modo que, no cume da pirâmide disciplinar escape a esse saber. No sistema clássico o exercício do poder era confuso, global e descontínuo, do soberano sobre grupos constituídos por famílias, cidades, paróquias, isto é, por unidades globais, e não um poder contínuo atuando sobre o indivíduo. A disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os sistemas de poder vão ter por alvo e resultado indivíduos em sua singularidade. O exame desde a sua origem e desenvolvimento é a vigilância permanente, classificatória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-los, localizá-los e, por conseguinte, utilizá-los ao máximo. Através do exame, a individualidade torna-se um elemento de uso pertinente para o exercício do poder.

A invenção dessa nova anatomia política não deve ser entendida como uma descoberta súbita. Mas como uma multiplicidade de processos muitas vezes mínimos, de origens diferentes, de localizações esparsas, que se recordam, se repetem, ou se imitam, apoiam-se uns sobre os outros, distinguem-se segundo seu campo de aplicação, entram em convergência e esboçam aos poucos a fachada de um presunçoso método geral. Não se trata de fazer aqui a história das diversas instituições disciplinares no que podem ter cada uma de singular: 1) ambas, neste caso, são instituições públicas gerenciadas por uma casta no poder (cf. Weber, 1982; Dumont, 1992); 2) Existe uma série de exemplos de algumas das técnicas essenciais empregadas que, de uma a outra, se generalizaram mais facilmente. Pequenas astúcias dotadas de um grande poder de difusão, arranjos sutis, de aparência inocente, mas profundamente suspeitos, são dispositivos que obedecem a economias inconfessáveis, ou que procuram coerções sem grandeza (assédio moral), são eles, entretanto que levaram à mutação do regime punitivo contemporâneo; 3) Descrevê-los metodicamente, nominalmente, implicará a demora sobre o detalhe da corrupção do pensamento e a atenção às minúcias: sob as mínimas figuras, procurar não um sentido, mas uma precaução; recoloca-las não apenas na solidariedade de um funcionamento, mas na coerência de uma tática; 4) Astúcias, não tanto de grande razão que trabalha até durante o sono, no sentido freudiano, e dá coerência ao insignificante quando da atenta malevolência que de tudo alimenta. A disciplina é uma anatomia política do detalhe. O que nos interessa é a racionalização utilitária do detalhe na contabilidade moral e no controle político. A regra das localizações funcionais vai pouco a pouco codificar um espaço que a arquitetura deixava geralmente livre e pronto para várias formas sociais de utilidade de uso. Lugares determinados se definem para satisfazer não só à necessidade de vigiar, de romper as comunicações perigosas, mas também de criar um espaço útil.

Temos assim, um dispositivo que asfixia e quadricula; tem que realizar uma apropriação sobre toda essa mobilidade e esse formigar humano, decompondo a confusão da ilegalidade e do mal. Essa gente, através do impedimento de elementos intercambiáveis, conquistados a duras penas, quer através da vigilância e punição, da prevaricação e do ressentimento acadêmico, quer individualizar corpos por uma localização que não os implanta, mas os distribui e os faz circular numa série de relações. O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e a sua combinação num procedimento que lhe é específico. A vigilância se torna um operador decisivo, na medida em que é ao mesmo tempo uma peça interna no aparelho de produção e uma engrenagem especial do poder disciplinar. A arte de punir, no regime de poder disciplinar, não visa nem a expiação, nem mesmo exatamente a repressão. Põe em funcionamento cinco operações bem distintas: relacionar os atos, os desempenhos, os comportamentos singulares a um conjunto, que é ao mesmo tempo campos de comparação, espaço de diferenciação e princípio de uma regra a seguir. Diferenciar os indivíduos em relação uns aos outros e em função dessa regra de conjunto – que se deve fazer funcionar como base mínima, como média a respeitar ou como o ótimo de que se deve chegar perto. Medir em termos quantitativos e hierarquizar em termos de valor as capacidades, o nível, a natureza humana dos indivíduos. Fazer funcionar, através dessa medida valorizadora negativamente, a coação de uma conformidade a realizar. E por último, traçar o limite que definirá a diferença em relação a todas as diferenças, a fronteira externa do “anormal”. A penalidade que atravessa todos os pontos e controla todos os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza, homogeneíza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza.

Bibliografia Geral Consultada.

ERNAUX, Annie, Ce Qu`ils Disent ou Rien. Paris: Éditions Gallimard, 1977; TOCQUEVILLE, Alexis de, De la Démocratie en Amérique. Paris: Éditions Flammarion, 1981; WEBER, Max, Ensaios de Sociologia. Org. e Introdução de Hans Gerth e Charles Wright Mills. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982; SIMMEL, Georg, Sociologia: Estudios sobre las Formas de Socialización. Madrid: Editorial Alianza. 1986; DELEUZE, Gilles, “Qu’est-ce qu’un Dispositif?” in Michel Foucault Philosophie. Paris: Rencontre Internationale, 9,10, 11, Janvier, 1988. Paris: Éditions Du Seuil, 1989; MEYER, Marlyse, As Surpresas do Amor: A Convenção no Teatro de Marivaux. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992; DUMONT, Louis, Homo Hierarchicus. O Sistema de Castas e suas Implicações. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992; DURAND, Gilbert, As Estruturas Antropológicas do Imaginário. Introdução à Arquetipologia Geral. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1997; MÉSZÁROS, István, O Poder da Ideologia. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004; DWORKIN, Ronald, O Império do Direito. 2ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2007; KEHL, Maria Rita, Ressentimento. São Paulo: Editor Casa do Psicólogo, 2007; HART, Herbert Lionel Adolphus, O Conceito de Direito. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009; MARTINS, Carlos Benedito, “A Contemporaneidade de Erving Goffman no Contexto das Ciências Sociais”. In: Rev. Bras. Cien. Soc. Vol. 26, n° 77. São Paulo, 2011; DURKHEIM, Émile, Il Suicidio. Studi di Sociologia. Biblioteca Univ. Rizzoli, 2014; BACH, Augusto, Michel Foucault e a História Arqueológica. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia e Metodologia das Ciências. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016; RAGO, Margareth; GALLO, Sílvio, Michel Foucault e as Insurreições. É Inútil Revoltar-se. São Paulo: Editora Intermeios, 2017; FOUCAULT, Michel, Nietzsche, Freud e Marx. Theatrum Phifosoficum. 4ª edição. São Paulo: Editor Princípio, 1987; Idem, Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão. 42ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2014; FOUCAULT, Michel; BENEDETTI, Ivone Castilho, Malfazer, Dizer Verdadeiro. São Paulo: Editora WMF; Martins Fontes, 2018; SETH, Sanjay, Humanidades, Universalismo e Diferença Histórica. Vitória: Editor Milfontes, 2021; SILVA, Gustavo Ruiz da, “Merleau-Ponty e Foucault: Algumas Aproximações e Afastamentos”. In: Problemata - Revista Internacional de Filosofia. PPGFIL-UFPB. Vol. 15, n° 1 (2024), pp. 97-109; Artigo: “Mostra Difusão Leva Cinema e Debate sobre Direitos Humanos a Mais de 24 Mil Pessoas em Todo o Brasil”. In: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/22/07/2025/; entre outros.