“Brincando
pode-se dizer de tudo, até mesmo a verdade”. Sigmund Freud
Susto é um sentimento biológico que ocorre quando uma pessoa vê ou ouve algo inesperado em sua vida cotidiana. Ela vem do Latim surctus, alteração de surrectus, “surgido, levantado subitamente”, de sugere, “levantar-se, erguer-se”. É uma reação do corpo humano contra possíveis ameaças, que resulta no lançamento do hormônio adrenalina na corrente sanguínea. A adrenalina gera vários efeitos no corpo humano, como redirecionamento da corrente sanguínea do sistema intestinal para os músculos e a descarga de adrenalina provoca uma série de efeitos. O primeiro deles é a aceleração dos batimentos do coração e a elevação da pressão arterial. O ritmo frenético aumenta o fluxo sanguíneo nos músculos. O intuito do susto é, biologicamente, preparar o corpo humano a reagir contra a ameaça, mesmo quando esta ameaça de fato não existe como ocorre por exemplo com a exibição de filmes de horror. Mas do ponto de vista clínico, o susto pode causar parada cardíaca e causar tremedeiras, dilatação da pupila e/ou dores corporais, que podem ser os sinais do início da parada cardíaca em alguns casos.
O “pulo de susto” (Jumpscare) é uma técnica frequentemente
usada em filmes de terror e jogos eletrônicos com intuito de assustar o
público, surpreendendo-o com uma mudança abrupta de imagem ou evento,
geralmente ocorrendo com um som alto e assustador. A técnica foi descrita como “um
dos blocos de construção mais básicos dos filmes de terror”. O jumpscare
pode surpreender o espectador ao surgir em um ponto do filme em que a trilha
sonora está quieta e o público não está esperando nada alarmante acontecer, ou
pode ser a recompensa súbita de um longo período de suspense. Alguns comentaristas
descreveram o recurso como um modo preguiçoso de assustar os telespectadores, e
acreditam que o gênero de terror sofreu um declínio nos últimos anos após uma
excessiva confiança no tropo, estabelecendo-o como um clichê dos filmes de
terror modernos.
A enguia caracteriza-se pelo seu corpo serpentiforme, cilíndrico na parte anterior e comprido na parte posterior, estreitando-se na região caudal. A cabeça é larga e no focinho evidenciam-se orifícios nasais em forma de tubo, olhos pequenos e redondos. Possui escamas pequenas, quase imperceptíveis a olho nu, embebidas no tegumento, bem como barbatanas peitorais, dorsal e anal, mas não possui barbatanas pélvicas. Do ponto de vista anatômico seu maxilar inferior é mais longo do que o maxilar superior, contrariamente ao safio, se for comparado, com o qual se costuma confundir. Deslocam-se na água ondulando o corpo com o auxílio da barbatana dorsal que se liga à anal, formando uma única barbatana. Os indivíduos adultos têm o dorso verde-acastanhado e o ventre amarelado, constituindo o grupo das chamadas “enguias douradas”. Estas características morfológicas alteram-se para negro e prateado, com a aproximação da maturidade sexual, sendo designadas por “enguias prateadas”.
Atingem
os 150 centímetros de comprimento e os 10 Kg de peso. Os dentes são pequenos,
dispondo-se em várias filas nas maxilas e no palato. As fêmeas crescem, de modo
geral, até aos 150 centímetros de comprimento. Os machos atingem apenas os 50 centímetros. É uma espécie
difícil de confundir quando em água doce. No entanto, durante a metamorfose social
que sofre ao percorrer as regiões do oceano, pode confundir-se com as seguintes espécies: Anguilla
rostrata (enguia americana), Anguilla interioris, Anguilla
obscura, Anguilla megastoma, Anguilla mossambica, Muraena
helena (moreia), Conger conger (safio). Durante o dia as enguias
permanecem em abrigos naturais, enterradas no sedimento de rochas ou raízes de
árvores, onde estão protegidas da luminosidade e dos predadores. curiosamente tornam-se
ativas ao entardecer. A Anguilla anguilla é uma representação biológica da espécie
carnívora. Os adultos alimentam-se de peixes, crustáceos, larvas de insetos e cadáveres de outros seres marinhos. Com o desenvolvimento da maturidade sexual, o tubo
digestivo regride e cessa a atividade alimentar.
A aflição representa um sentimento de agonia, sofrimento intenso, preocupação ou desassossego por alguma causa ou alguma coisa em que vá afetar a vida direta, ou indiretamente. Aflição é ainda a sensação de que algo “não está certo”, ou de que alguma coisa errada ou traumática possa vir acontecer. Em 1668, o dramaturgo grego Ésquilo, reconhecido frequentemente como o pai da tragédia, é o mais antigo dos três trágicos os outros dois são Sófocles e Eurípedes gregos cujas peças ainda existem; já afirmava de forma extremamente atual que “os sofrimentos humanos têm facetas múltiplas: nunca se encontra outra dor do mesmo tom”. Segundo Paula Cassel, o sofrimento “é um estado de aflição severa, associado a acontecimentos que ameaçam a integridade de uma pessoa. Sofrimento exige consciência de si, envolve as emoções, tem efeitos nas relações pessoais do indivíduo ou da pessoa, e tem um impacto no corpo”. Sigmund Freud de forma mais fatídica dizia, em 1930, que “o mal-estar é inerente à condição humana”. Em sua vasta obra teórica e clínica produtiva ele não demonstra soluções para tal angústia. A famosa definição da Organização Mundial da Saúde (OMS) nos traz o desafio: - “Cuidado paliativo é uma abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes e seus familiares, que enfrentam doenças que ameacem a continuidade [social] da vida, através da prevenção e alívio do sofrimento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento da dor e outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual”. A partir de tais definições sociais e/ou culturais, em última análise, podemos inferir que o objeto de estudo do cuidado paliativo é a aflição humana.
Os
objetivos sociais são o controle de sintomas, a alocação adequada de recursos, a
realização de diretrizes avançadas e o não prolongamento artificial de vida.
Importante ter atenção para não subestimar sintomas: não se quantifica dor
através de exames laboratoriais ou tomógrafos, o que não pode de maneira alguma
deslegitima-la. Jacques Salomé de forma provocativa afirma que qualquer
sofrimento pode ser entendido como um sinal, um convite para mudar algo em
nosso modo de vida. Neste trecho, sofrimento aparece como sinônimo de conflito
psicológico. Incontáveis são os convites dos enfermos às equipes médicas de
saúde, a maioria deles ignorados. Somatizações que podem ser representadas por
invites inconscientes, angústias e medos são diversas vezes vistos como supérfluos
quando comparados ao que se pode mensurar ou palpar. Oportunidades de
metamorfoses épicas podem ser perdidas se esta dimensão do sofrimento não
emergir. Medo de morrer, raiva, tristeza, barganha, aceitação, culpas, não aceitação social da morte, ausência de significado de vida,
conflitos familiares, conspiração do silêncio e reconhecimento no âmbito do trabalho e risco de luto
patológico são levados à superfície da boa comunicação.
Acompanhamento familiar, encaminhamento externo, psicoterapia de apoio permanente ou breve são essenciais para uma condução adequada do caso. Por fim, não podem faltar reuniões familiares. Quantas forem necessárias para desmistificar pensamentos mágicos ou conceitos médicos irreais. Cuidar dos familiares se torna tão importante quanto cuidar do paciente. Saber em qual ambiente e circunstâncias sociais está inserido o indivíduo socialmente redimensiona expectativas e reduz suas dificuldades de acesso à terapêutica. Alguns complicadores sociais podem ser o abismo entre a indicação do profissional de saúde e a concretização dela. A saber ausência de cuidador, baixa renda familiar, dificuldade de atendimento médico, conflitos familiares, estresse do cuidador, pendências legais ou financeiras, rede de suporte insuficiente, dificuldade de emissão de atestado de óbito, local para sepultamento ou cremação. Alguns pontos podem não parecer relevantes e provocarem sofrimento no doente. A necessidade de resolução de pendência legal contratual ou uma dívida. A ausência de rede de suporte traz consequências objetivas não apenas emocionais. Há muito o que se caminhar nesta direção.
Os
problemas sociais de cura dos doentes merecem uma propedêutica de solução:
providenciar cuidador, orientação legal e orientação financeira, acompanhamento
individual, acompanhamento familiar, orientação sobre óbito,
institucionalização e reunião familiar. Os objetivos são: organizar testamentos
e benefícios; regularizar questões financeiras; providenciar funeral e atestado
de óbito; ser cuidado por alguém; amparar o cuidador e a família; definir local
de óbito. Não somente de carne nós somos feitos. Mesmo os ateus
apresentam questões espirituais a serem tratadas, que não se limitam ao cunho
religioso. Conflitos com Deus, conflitos religiosos com familiares,
proselitismo, restrição ao culto, destruição de valores, ritos ou sacramentos
pendentes, promessas e obrigações pendentes, ausência de sentido espiritual,
expectativas miraculosas e culpa religiosa devem ser investigados por um
capelão. Busca-se estar em paz com o Criador, receber o perdão de Deus,
receber ritos de sua tradição, sentimento de transcendência, síntese de vida e
legado. Isso acontece através da instrumentalização de orientação
disciplinar espiritual e religiosa, estímulo de espiritualidade, contato com
sacerdote da tradição e orientações familiares. Depois de trabalho minucioso e
multidisciplinar as chances de um fim de vida sofrido reduzem, mas não se
esgotam em perseverança diante da complexidade humana.
Sobre
este aspecto da dimensão abstrata espiritual humana é preciso ascender à
consciência transcendental à consciência pura. Se René Descartes (1596-1650)
foi um filósofo e matemático francês, criador do pensamento cartesiano, sistema
filosófico que deu origem à Filosofia Moderna, foi um tímido que precisava ir
muito mais longe, pois precisamos fazer da consciência o próprio absoluto.
Nesse mundo cartesianamente concebido e conduzido, o ideal narcísico de uma
consciência idêntica a si mesmo é plenamente atingido. Nele para lembrarmos
como disse Louis Althusser (1918-1990), os nascimentos teóricos estão
perfeitamente regulados: - “O pré-natal é institucional. Quando nasce uma nova
ciência, está já o círculo de família preparado para o espanto, o júbilo e o
batismo”. Acontece, porém, que não há dominação que consiga subjugar a
totalidade do ser humano e não há controle que consiga ser absoluto. E o saber
continuou produzindo filhos naturais. Muitos foram aceitos apenas pelos
próprios pais e por um círculo restrito de amigos; outros foram abandonados e
viveram uma amarga solidão, mas outros ainda se tornaram, por assim dizer: “filhos
sem pais na teoria”. O próprio Freud, segundo Garcia-Roza, no ensaio: Freud
e o Inconsciente (2008), apontou a psicanálise como “a terceira grande
ferida narcísica sofrida pelo saber ocidental ao produzir um descentramento
da razão e da consciência, pois, as outras duas consciências foram as
produzidas por Copérnico e por Darwin”. Ipso facto, a psicanálise
produziu uma derrubada da razão e da consciência do lugar sagrado que se
encontravam. Ao fazer da consciência um mero efeito de superfície do
Inconsciente, Freud operou uma inversão do cartesianismo que dificilmente pode
ser negada, mas depois aprendemos a ser cautelosos.
Freud
revela uma mente dividida contra si mesma, com falta de autoconhecimento e
governada por impulsos instintivos incontroláveis. Por causa de suas
implicações perturbadoras, Freud comparou suas descobertas às do astrônomo
Nicolau Copérnico, o primeiro a descobrir que o Sol não girava em torno da Terra.
Quando Nicolau Copérnico ao demonstrar racionalmente que a Terra gira em torno
do sol, sendo, portanto, apenas “mais um” planeta e Charles Darwin que mostrou
que o homem na forma em que o reconhecemos é resultado de uma evolução natural,
sendo apenas “mais uma” espécie, deram um forte golpe no antropocentrismo. Para
o biólogo Edward Manier, certamente a teoria darwiniana enfraquece o
antropocentrismo que compreende a existência das espécies vivas e do planeta
como estando à disposição dos seres humanos. Edward Manier contestaria a
expressão “nos destronou de nosso antropocentrismo”, com a genética diante das possibilidade científicas e éticas, porque ela toma por certos
os contextos polêmicos em que Darwin usou essa retórica que
nossos chamados “poderes superiores” da razão científica, estética e moral não
exigiam uma intervenção divina especial, isto é, que eles poderiam ser
plausivelmente vistos como o resultado genealógico de um continuum natural
desses poderes existente no reino animal.
Ele sustentou que a questão da tradição da teologia natural inglesa arrogantemente “entronizou” os seres humanos como se estivessem especialmente ligados ao divino, e se opôs e, de modo geral, minou essa tradição específica e seu correlato filosófico dualista. Darwin não fez nada para diminuir a importância ou o status desses “poderes superiores”, ou seja, a questão no plano da razão e os sentimentos morais. Quando jovem, ele achava que suas concepções apontariam o caminho para uma nova síntese das concepções de David Hume que não prescinde a visão do empirismo e de Immanuel Kant sobre o papel da “razão pura” na ciência e na moralidade. Sua compreensão de Kant era mínima, mas sua posição se encontra na linhagem ancestral de esforços analíticos consideráveis para encontrar as raízes dos sentimentos morais humanos numa única natureza humana como por exemplo, de James Q. Wilson, no ensaio The Moral Sense (Free Press Paperbacks, 1997). A teoria de Darwin efetivamente enfraquece qualquer “antropocentrismo” que implique que a Terra e todas as coisas vivas nela tivessem sido colocadas aqui para o benefício dos seres humanos e apenas deles. O darwinismo só foi apoiado por amplo consenso entre os cientistas no segundo quartel do século XX. Ocorreu com o desenvolvimento da “nova síntese” que associava o darwinismo, o mendelismo e as teorias sofisticadas e empiricamente bem sustentadas da hereditariedade e mutação humana.
Reconhecido
pelo padrão de que não há ideias inatas e que todo o conhecimento vem da
experiência rigorosamente ao nexo de causalidade e necessidade, David Hume em
vez de tomar a noção de causalidade, como concedido, desafia-nos a considerar o
que a experiência nos permite saber sobre a relação estabelecida entre causa e
efeito, pois nada é mais usual e natural, para aqueles que pretendem oferecer
ao mundo novas descobertas filosóficas e científicas que insinuar elogios ao
seu próprio sistema. O homem de discernimento e de sabedoria percebe facilmente
a fragilidade do fundamento, até mesmo daqueles sistemas bem aceitos e com
maiores pretensões de conter raciocínios precisos e profundos. Isto é, alguns
princípios acolhidos em torno da confiança; consequências deles deduzidas de
maneira defeituosa; falta de coerência entre as partes, e de evidência no todo
– tudo isso se pode encontrar nos sistemas dos mais eminentes filósofos, e
parece cobrir de opróbrio a própria filosofia, pois mesmo “a plebe lá fora é
capaz de julgar, pelo barulho e vozerio que ouve, que nem tudo vai bem aqui
dentro”.
Neste
âmbito tampouco é necessário um conhecimento muito profundo para se descobrir a
distância e imperfeição e que de fato, não há nada que não seja objeto de
discussão e sobre o qual os estudiosos não manifestam opiniões contrárias. Se
por um lado multiplicam-se as disputas, como se tudo fora incerto; e essas
disputas são conduzidas da maneira mais acalorada, como se tudo fora certo. É
daí que surge na opinião de Hume, o preconceito comum contra todo tipo de
raciocínio metafísico. Mesmo por parte daqueles que são doutos e que costumam
avaliar de maneira justa todos os outros gêneros da literatura. E realmente
nada, a não ser o mais determinado ceticismo, juntamente como um elevado grau
de indolência, pode justificar tal aversão à metafísica. Pois se a verdade está
ao alcance da capacidade humana, é certo que ela deva esconder em algum lugar
muito profundo e abstruso. Não por acaso, devemos reunir nossos experimentos
mediante a observação cuidadosa da vida. Tomando-os tais aspectos como aparecem
no curso habitual do mundo, no comportamento dos homens em suas ocupações e
prazeres. E reunidos e comparados, podemos estabelecer, com
base neles, uma concepção condicionada de ciência, que não será inferior
em certeza, mas superior em utilidade, a qualquer outra que esteja ao
alcance da compreensão humana.
Assim Hume sustenta que nossas ideias são imagens de nossas impressões, assim também podemos formar ideias secundárias, que são imagens das primárias. Não se trata de uma exceção à regra, mas de uma explicação. As ideias produzem as imagens de si mesmas em novas ideias; mas como supomos que as primeiras são derivadas de impressões, continua sendo verdade que todas as nossas ideias simples procedem, mediata ou imediatamente, de suas impressões correspondentes. Esse é o primeiro princípio que Hume estabelece na ciência da natureza humana. Pois cabe notar que a presente questão, a respeito da anterioridade de nossas impressões ou ideias, é a mesma que produziu tanto barulho sob outra formulação, quando se discutiu se haveria ideias inatas, ou se todas as ideias derivam da sensação e da reflexão. A fim de provar que as ideias de extensão e de cor não são inatas, os filósofos nada mais fazem que demonstrar que elas são transmitidas por nossos sentidos. Para provar que as ideias de paixão e desejo são inatas, eles observam que experimentamos previamente em nós mesmos essas emoções. A faculdade pela qual repetimos nossas impressões da primeira maneira se chama conceitualmente memória, e a outra, de forma distinta per se de imaginação. Mas se examinarmos esses argumentos, veremos que eles nada provam, senão que as ideias são precedidas por outras percepções mais vívidas, das quais derivam e as quais elas representam.
Melhor
dizendo, que as ideias da memória são muito mais vivas e fortes que as da
imaginação, e que a primeira faculdade pinta seus objetos em cores mais
distintas que todas as que possam ser usadas pela última. Ao nos lembrarmos de
um acontecimento passado, sua ideia invade nossa mente com força, ao passo que,
na imaginação, a percepção é fraca e lânguida, e apenas com muita dificuldade
pode ser conservada firme e uniforme pela mente durante todo o período
considerável de tempo. Temos aqui uma diferença sensível entre as duas espécies
de ideias. Mas há uma outra diferença, não menos evidente, entre esses dois
tipos de ideias. Embora nem as ideias da memória nem as da imaginação, nem as
ideias vívidas nem as fracas possam surgir na mente antes que impressões
correspondentes tenham vindo abrir-lhes o caminho, a imaginação não se
restringe à mesma ordem na forma das impressões originais, ao passo que a
memória está de certa maneira amarrada quanto a esse aspecto, sem nenhum poder
de variação. É evidente que a memória preserva a forma original sob a qual seus
objetos se apresentaram. A principal função da memória não é preservar as
ideias simples, mas sua ordem e posição. Esse princípio se apoia nas relações comuns e vulgares na experiência do dia a dia que podemos nos poupar o
trabalho de continuar insistindo.
Como
a imaginação pode separar todas as ideias simples, e uni-las novamente da forma
que bem lhe aprouver, nada seria mais inexplicável que as operações dessa
faculdade, se ela não fosse guiada por alguns princípios universais, que a
tornam, em certa medida, uniforme em todos os momentos e lugares. Fossem as
ideias inteiramente soltas e desconexas, apenas o acaso as ajuntaria; e seria
impossível que as mesmas ideias simples se reunissem de maneira regular em
ideias complexas se não houvesse algum laço de união entre elas, alguma
qualidade associativa, pela qual uma ideia naturalmente introduz outra. Esse
princípio de união entre as ideias não deve ser considerado uma conexão
inseparável, tampouco devemos concluir que, sem ele a mente não poderia juntar
duas ideias – pois nada é mais livre que essa faculdade. Devemos vê-lo apenas
como uma força suave, que comumente prevalece, e que é a causa pela qual, entre
outras coisas, as línguas se correspondem de modo tão estreito umas às outras:
pois a natureza de alguma forma aponta a cada um de nós as ideias simples mais
apropriadas para serem unidas em uma ideia complexa que dão origem a tal
associação, e dessa maneira, de uma ideia a outra, são três, a saber:
semelhança, contiguidade no tempo e no espaço e causa e efeito.
Em primeiro lugar, precisamos nos encontrar entre os dois extremos quando o filósofo Garcia-Roza demonstra inicialmente a articulação de certos fatores dos séculos XVIII e XIX que constituíram a precondição para o surgimento da psicanálise. Além disso, ele demonstra que o cogito cartesiano apresenta o Eu como o lugar da verdade, o cogito freudiano nos revela que ele é sobretudo o lugar do ocultamento. Pensando assim, não se trata, para o fundador da psicanálise, de apontar uma nova dimensão da consciência como algo que pudesse ser visto como sua face oculta, mas de revelar a constituição de um novo objeto de interpretação da realidade humana – o inconsciente. Dessa forma ele admite termos aprendido que inversão não é diferença; em segundo lugar, aprendemos também que revolução não é guerra. Enquanto a primeira é disfarçadamente cartesiana, implicando promessas, planos, programas e realizações futuras, enquanto implica uma continuidade (ainda que dialética), a guerra é realmente produtora de rupturas. Se a psicanálise não há de ser localizada no lugar de análise cartesiano, se ela é prevaricadora, se ela ofende a razão e os bons costumes, se aponta a consciência não como lugar da verdade, mas da mentira, do ocultamento, da distorção e da ilusão, se ela coloca a consciência e a razão sob suspeita, não por um procedimento análogo ao da dúvida cartesiana que visava recuperar a consciência em toda a sua pureza racional, mas por considerar que ela é essencialmente farsante, então a psicanálise só pode ser vista coo um “filho natural”. Em segundo lugar, poder afirmar de outra forma que a psicanálise foi abandonada e que viveu numa amarga solidão também não acreditamos ser verdadeiro.
Uma
coisa foi a solidão teórica de Freud, às voltas com um descobrimento que às
vezes parecia escapar-lhe pela importância e pelo alcance que insinuava ter,
outra coisa é terem a teoria e a prática psicanalíticas sido projetadas “numa
marginalidade solidária e amarga”. Em pouco tempo a psicanálise foi
transformada numa das mais prestigiosas práticas clínicas encontradas pela
burguesia para recuperar os seus resíduos; assim, como, teoricamente,
transformou-se num dos objetos privilegiados de análise e de crítica do saber
contemporâneo. Poucas foram as teorias que gozaram da popularidade desfrutada
pela teoria psicanalítica. Em terceiro lugar, resta a última hipótese: a adoção
por parte da “comunidade científica”, dessa criança que aparecia ser tão
ameaçadora ao nascer, mas que, por ter-se mostrado dócil, comportada e
eficiente, transformou-se rapidamente em objeto de disputa de várias famílias
que reivindicavam o direito de adoção. As correntes da fenomenologia,
as filosofias da existência, a antropologia, o culturalismo norte-americano, a
biologia, a linguística e a psicologia foram alguns desses saberes que exigiram
o “direito de adoção”, sendo que alguns deles chegaram mesmo “a se declarar
pais legítimos”. Mas essa criança, que chegava a apresentar semelhanças
acentuadas com esses candidatos a pais, segundo Garcia-Roza, escapava às
exigências que lhe eram feitas e se recusava a submeter-se ao reducionismo
simplista que lhe era imposto.
Em
terceiro lugar, no que se refere à questão das subjetividade culturais, a
psicanálise representa uma mudança de esfera significativa em face da filosofia
moderna. Esta, com suas concepções excessivamente generalizantes, ignorava o
indivíduo. Mesmo quando apontava o Eu como um de seus objetos privilegiados,
metafísica moderna se recusava a concebê-lo como uma singularidade concreta.
Diante do sabe dos séculos XVII e XVIII, a psicanálise se apresenta como uma
teoria e uma prática que pretendem falar do homem enquanto ser singular, mesmo
que afirme a clivagem inevitável a que esse indivíduo é submetido. Antes do
advento da psicanálise, o único lugar institucional onde o discurso individual
tinha acolhida eram como demonstrara Michel Foucault os confessionários
religiosos. A psicanálise ocupa no decorrer do século XX este lugar de
escuta. Claro que isso não correu independentemente das condições sociais e
políticas que tornaram urgente o aparecimento das ciências do homem: a
necessidade de controle social e de distribuição potencial das forças de
trabalho na sociedade. O surgimento da psicanálise é coetâneo ao
surgimento do conceito de homem, e este com o desenvolvimento da economia globalizada
e sua exigência de controle dos corpos e dos desejos.
Em
quarto lugar, mesmo em se descartando de qualquer inocência quanto aos
comportamentos da psicanálise, o fato é que ela se constituiu como uma das
práticas mais eficazes de escuta discursiva individual. A subjetividade
cultural, identificada com a consciência, devia se fazer clara e distinta para
que o modelo analítico fizesse seu aparecimento. Nessa transparência, o desejo
era visto como perturbação da Ordem, que modificava o pensamento tornando-o
inadequado à realidade que pretendia representar. Se a alma fosse puramente
passiva, isto é, cognitiva, não haveria erro. Este surge apenas porque o desejo
introduz deformações no material adquirido pelo conhecimento humano. É esse sujeito
que a psicanálise vai desqualificar como sendo o referencial privilegiado a
partir do qual a verdade aparece. Melhor ainda: a psicanálise não vai colocar a
questão do sujeito da verdade, mas contrariamente a questão da verdade do sujeito.
Ela vai perguntar exatamente por esse sujeito do desejo que o racionalismo
recusou. Contra a unidade do sujeito defendida pelo racionalismo, a psicanálise
vai nos desvelar um sujeito fundido: aquele que faz uso da palavra e diz “eu
penso”, “eu sou”, que é identificado por Jacques Lacan como sujeito do enunciado (ou
sujeito do significado), e aquele outro, sujeito da enunciação (ou sujeito do significante),
e se coloca como excêntrico em relação ao sujeito.
Paralelamente à clivagem da subjetividade em Consciente e Inconsciente, dá-se uma ruptura entre o enunciado e a enunciação, o que implica admitir-se uma duplicidade de sujeito na mesma pessoa. Essa divisão do saber não se faz em nome de uma unidade, uma espécie de Gestalt harmoniosa do indivíduo, mas produz uma fenda entre o dizer e o ser, pois entre o “eu falo” o “eu sou”. Daí a reconhecida inversão lacaniana da máxima de Descartes: - “Penso onde não sou, portanto sou onde não penso”. O que essa fórmula denuncia, é a pretensa transparência do discurso perseguida pelo cartesianismo e a suposta unidade do sujeito sobre a qual ela se apoia. O sujeito do enunciado não é aquele que nos revela o sujeito da enunciação, mas aquele que produz o desconhecimento deste último. Dito de outra maneira: o cogito não é o lugar da verdade do sujeito, mas o lugar do seu desconhecimento. Apesar da marca hegeliana de que a psicanálise é portadora, não há para a Selbsbtbewusstsein ser de toda forma consciente na teoria psicanalítica. Os Alpes suíços estão localizados na parte da cordilheira dos Alpes. Um país sem costa marítima cujo território é dividido geograficamente entre o Jura, o Planalto Suíço e os Alpes, somando uma área de 41 285 km².
A população suíça é de 8,5 milhões de habitantes e concentra-se principalmente no
planalto, onde estão localizadas as maiores cidades do país. Entre elas estão
as duas cidades globais e centros econômicos de Zurique e Genebra. A Suíça é um
dos países mais ricos do mundo relativamente ao Produto Interno Bruto (PIB) per
capita calculado em 75 835 dólares americanos em 2011. Zurique e Genebra
foram classificadas como as cidades com melhor qualidade de vida no mundo,
estando em segundo e terceiro lugar e a Suíça como o melhor país para nascer em
2013. A Confederação Suíça tem uma longa história de neutralidade, não estando
em estado de guerra internacionalmente desde 1815. O país é sede de muitas
organizações internacionais tais como o Fórum Econômico Mundial, a Cruz
Vermelha, a Organização Mundial do Comércio, a União Postal
Universal, a Organização Internacional para Padronização e do
Escritório das Nações Unidas. Em nível europeu, foi um dos fundadores da Associação
Europeia de Comércio Livre e é parte integrante do Acordo de Schengen. Esta
parte é por vezes chamada de Alpes Centrais. O ponto culminante é o Dufourspitze,
com 4634 metros, na fronteira suíço-italiana. A montanha mais baixa é o monte
Dom, com 4545 metros de altitude no maciço dos Mischabel.
O
acordo de Schengen, denominado em alusão ao espaço Schengen, localidade
luxemburguesa situada às margens do rio Mosela e próxima à tríplice fronteira
entre Alemanha, França e Luxemburgo, este último representando o Benelux, onde
já havia a livre circulação. Em junho de 1985, foi firmado o acordo de livre
circulação envolvendo cinco países, abolindo-se seus controles de fronteiras,
de modo que os deslocamentos entre esses países passaram a ser tratados como “viagens
domésticas”. Posteriormente, o Tratado de Lisboa, assinado em 13 de dezembro de
2007, modificou as regras jurídicas do espaço Schengen, reforçando a noção de
um “espaço de liberdade, segurança e justiça”, que prossegue além da cooperação
policial e judiciária e visa a implementação de políticas comuns no tocante a
concessão de vistos, asilo e imigração, mediante substituição do método
intergovernamental pelo uso do método comunitário. Embora teoricamente não haja
mais controles nas fronteiras internas ao espaço Schengen, esses controles “podem
ser reativados temporariamente caso sejam considerados necessários para a
manutenção da ordem pública ou da segurança nacional”. Os países signatários
reforçaram os controles das fronteiras externas ao espaço Schengen, mas, os cidadãos
estrangeiros que ingressem como turistas ou que obtenham um visto de longo
prazo para qualquer um dos países membros podem circular livremente.
O Château de Chillon é um dos castelos da Suíça reconhecidos em todo o mundo ocidental globalizado, além
de ser o monumento suíço mais visitado e um dos bem preservados da Europa,
estando classificado como monumento histórico. Situa-se numa das margens do
Lago Léman, em Veytaux, a três quilómetros de Montreux. De forma oblonga, mede
110 metros de comprimento por 50 de largura, culminando com uma torre de
menagem de 25 metros de altura. Foi construído sobre um rochedo, um ponto de
proteção natural e estratégico para controlar a passagem entre o sul e o norte
da Europa. De um lado, representa uma magnífica residência à beira do lago e,
do outro, uma imponente fortaleza de guerra em frente às montanhas. O
arqueólogo Albert Naef (1862-1936) descobriu que o castelo foi ocupado desde a chamada
Idade do Bronze, um período da civilização no qual ocorreu o desenvolvimento
desta liga metálica, resultante da mistura de cobre com estanho, e que,
atualmente, é resultado histórico de muitos séculos de renovações, reconstruções
e restaurações. Não é possível datar o ano inicial de
construção, mas os primeiros registos escritos estão em torno de 1150. Foi
sucessivamente ocupado pela Casa di Savoia, uma das mais antigas
famílias nobres europeias, presentes desde o século X no território do Reino da
Borgonha. Lá fundou um condado no século XI que passou a ducado no século XV, extinguindo-se
a Casa de Lusinhão, com a coroa titular dentre os Estados cruzados, de Chipre,
Jerusalém e Armênia, obtendo aumento de prestígio das cortes
europeias, seguido pelos bernenses, de 1536 a 1798, que então
pertence ao Estado de Vaud.
As primeiras construções remontam ao
século X, embora seja provável que esse espaço já fosse uma localização militar
privilegiada antes dessa data. Objetos que remontam à época romana foram descobertos
durante escavações no século XIX, assim como vestígios datados da Idade do
Bronze. A partir duma dupla paliçada em madeira, os romanos haviam fortificado
o local antes de lhe ser acrescentada uma torre de menagem quadrada no século
X. Fontes documentais do século XIII ligam a posse do sítio de Chillon ao Bispo
de Sion. Uma carta datada de 1150, na qual o conde Humberto III de Saboia
concede aos cistercienses de Hautcrêt a livre passagem em Chillon, atesta o
domínio da Casa de Saboia sobre Chillon. Ficamos a saber que o proprietário do
castelo é um certo Gaucher de Blonay. Mas, este senhor de Blonay é mais um
vassalo do Conde que um dos seus oficiais. Trata-se dum domínio senhorial dos
Saboia no quadro duma sociedade feudal e não dum domínio administrativo. A Casa
de Saboia transformou a fortaleza, então Castrum Quilonis, e ampliou-a
durante o século XIII. A antiga cripta do século XI, dedicada a São Triphon, é
abandonada no século XIII, aquando da construção da capela na parte superior do
castelo. Os saboias queriam estender a sua supremacia sobre o País de Vaud e a
zonas limítrofes. O primeiro castelão saboiano é atestado por Chillon em 1198.
O castelo não é dedicado apenas a um fim militar, servindo também de
residência para os condes. O edifício é, com efeito, uma das etapas das viagens
da corte itinerante, efetuadas aquando das deslocações regulares do conde pelo
seu território.
Aquando
da ausência do conde, a parte noroeste do castelo, onde se situavam os seus
aposentos, estava vazia e fechada. Tomás I de Saboia esteve ali por volta do
ano 1230. Ele e o seu filho, Pedro II de Saboia, “o Pequeno Carlos Magno”,
reorganizariam a região, construindo burgos, dominando o Chablais vaudois e
criando a Pátria Vuaudi. Uma portagem é instalada, em 1214, em Villeneuve de
Chillon, a atual aldeia de Villeneuve. San Trifone in Posterula ou também
chamada Igreja de São Trifão em Posterula era uma igreja de Roma, localizada no
rione Campo de Marte, localizada na esquina da Via dei Portoghesi com a via
della Scrofa, demolida em 1746. Era dedicada a São Trifão. A igreja
provavelmente foi construída para abrigar as relíquias de São Trifão, antes
mantidas numa igreja fora das muralhas da cidade. O nome in Posterula é
uma referência às poternas (posterulæ) que existiam na região, pequenas
aberturas na muralha que permitiam o acesso ao Tibre. A primeira referência
desta igreja é sua reconstrução em 1006 com fundos doados por João Crescêncio,
como relatado em uma bula do papa João XVIII. Mais de cem anos depois, em 1127,
uma bula do papa Honório II menciona um certo Leonardo como seu arcipreste e
outra, de 1222, nomeia Ângelo como presbítero da igreja. Uma série de bulas
datando de 1181 a 1188 relatam uma disputa espacial entre San Trifone,
juntamente com San Salvatore de Sere, San Nicola de Praefectis e San
Biagio de Monte Acceptabili, contra o mosteiro de Santa Maria in Campo
Marzio.
O papa Honório IV (1210-1287), consagrado o 190º Papa da Igreja Católica com um decreto de 20 de fevereiro de 1287, concedeu a igreja aos agostinianos, que acrescentaram ao seu nome original o do seu padroeiro, Santo Agostinho, que nasceu Aurélio Agostinho, em 354 d.C. Em 11 de abril de 1424, os agostinianos transferiram solenemente as relíquias de Santa Mônica, a mãe de Santo Agostinho, de seu túmulo anterior, em Óstia Antiga, para lá. O declínio da igreja começou em 1484 com a construção da basílica de Sant`Agostino bem ao lado, o que levou os monges a deixarem San Trifone. A igreja permaneceu à sombra da gigantesca nova igreja e continuou existindo mesmo depois da construção do enorme complexo monástico agostiniano que a envolveu completamente em 1537. A sua existência material é comprovada por uma menção em um catálogo de igrejas de 1555 e por uma xilogravura da igreja feita por Girolamo Francino em 1588. Ela foi novamente mencionada em 1625 como oratório da “Confraria do Santíssimo Sacramento de Santo Agostinho”. Em 1746, apesar de suas origens e proeminência histórica passada, foi demolida quando Luigi Vanvitelli (1700-1773) foi contratado para ampliar o Convento de Santo Agostinho e, atualmente, algumas ruínas da igreja ainda estão visíveis em partes específicas do complexo agostiniano.
A igreja e convento de Santo Agostinho (séc. XVI-XVIII) representa um conjunto de edifícios localizado na Rua Tenente Valadim, Largo da Infantaria, Leiria, Portugal. A igreja e convento foram mandados construir pelo bispo D. Gaspar do Casal, durante a segunda metade do século XVI (1577-79) e até à primeira metade século XVII. O complexo fora construído sobre a primeira fábrica de papel, restando apenas parte da fábrica a Este da igreja até aos dias de hoje. A igreja é constituída por uma nave central e é de estilo essencialmente barroco, como se pode observar na fachada central ladeada pelas duas torres. Tem a típica forma de cruz, com 3 corpos divididos por 3 pilares. Podemos ainda encontrar o escudo do bispo fundador sobre a porta principal da igreja. No convento existem ainda alguns azulejos do século XVII e XVIII, destacando-se os claustros do convento de estilo barroco. No decênio de 1950 a 1960 a igreja sofreu obras de restauração, sendo o altar-mor remodelado por Ernesto Korrodi (1870-1944). Nascido Ernst Korrodi foi um arquiteto de origem suíça que se naturalizou português. Foi um dos pioneiros e dos mais bem sucedidos arquitetos da Arte Nova em Portugal, tendo recebido o Prêmio Valmor por duas vezes. É autor de cerca de 400 projetos em Portugal.
Neste
aspecto, segundo Giddens (1991) se os Estados-nação são os “atores” principais
dentro da ordem política global, as corporações são os agentes
dominantes dentro da economia mundial. Em suas relações comerciais entre si e
com Estados e consumidores, as companhias (corporações fabris, firmas
financeiras e bancos) dependem da produção para ter lucro, evidenciando em sua
passagem uma extensão global de mercados de bens e capitais. Ipso facto,
todos os Estado-nação, capitalistas e Estados socialistas, dentro dos setores
“desenvolvidos” do mundo, confiam em primeiro lugar na produção industrial para
a geração social da riqueza na qual se baseiam seus ganhos. A influência de
qualquer Estado específico na ordem política global é fortemente condicionada
pelo nível e sua riqueza e a conexão entre esta e a força militar. Entretanto,
os Estados fazem derivar seu poder das capacidades de soberania. Eles não
operam como “máquinas econômicas”, mas como atores ciosos de seus direitos
territoriais, preocupados com a promoção de culturas nacionais, e tendo
envolvimentos geopolíticos estratégicos com outros Estados ou alianças
comerciais e políticas de Estados. O
sistema de Estados-nação participa há muito tempo da característica de
reflexividade da modernidade.
Uma especificidade da natureza dialética da globalização é o “empurra e puxa” entre tendências voltadas à centralização, inerente à reflexividade do sistema de Estados por um lado e a soberania de Estados específicos por outro. Assim, a ação planejada entre países a respeito de algumas coisas diminui a soberania individual das nações envolvidas, embora ao combinar seu poder de outras maneiras, ela aumenta sua influência dentro do sistema de Estados. O mesmo vale para os antigos congressos que, em conjunção com a guerra, definiam e redefiniam as divisas dos Estados – e para agências realmente globais como as Nações Unidas. A influência geral da Organização das Nações Unidas ainda limitada pelo fato de não ser territorial e ter acesso significativo aos meios de violência, não é obtida apenas através de uma diminuição da soberania. Por fracas que algumas das novas nações possam ser econômica e militarmente, sua emergência como Estados-nação assinala um ganho líquido em soberania e a questão da territorialidade em comparação com as circunstâncias anteriores.
Ao
discernir aspectos gerais das coalescências entre o uso do poder militar e a
soberania dos Estados, encontramos o mesmo “puxa e empurra” entre tendências
opostas notadamente como antes. A globalização do poder militar não se
limita obviamente ao armamento e às alianças entre as forças armadas de Estados
diferentes: ela também diz respeito à própria guerra. Numa era de armamento
nuclear, a industrialização da guerra chegou a um ponto em que a obsolescência
da principal doutrina de Clausewitz tornou-se clara para todos. A única razão
para se manter armas nucleares, afora seu valor simbólico na política mundial é
impedir que os outros a tenham. Ao fim e ao cabo desta estratégia as duas
superpotências em particular se engajam no que pode ser chamado, segundo
Giddens (1991), de “guerras orquestradas” em áreas periféricas de força
militar. Para referir-se aos confrontos militares com os governos de outros
Estados ou com movimentos de guerrilha, ou ambos, nos quais as tropas da
superpotência não estão necessariamente engajadas, mas onde há força, é uma influência
organizadora principal.
O
Filme A Cura (A Cure For Wellness, EUA, 2017), dirigido por Gore Verbinski, apresenta o protagonista Dane De Haan
que interpreta Lockhart, um jovem operador de mercado financeiro (cf. Hilferding,
2011) que é enviado para buscar um executivo de sua empresa em um retiro remoto
nos Alpes Suíços, “local famoso entre milionários por suas fontes de águas
milagrosas”. Entre uma hidroterapia e outra, Lockhart descobre que o misterioso
Spa, assim como a técnica da “cura”, estão envoltos segredos sinistros.
As cenas iniciais do filme caracterizam o perfil do jovem executivo bem
sucedido Lockhart (Dane DeHaan) indo para uma clínica na Suíça atrás do figurão
da empresa por motivos corporativos. A sequência de imagens vistas como “paradoxo
de consequências não intencionais” é algo que gera uma insatisfação em quase
todas as cenas. Os elementos são bem sugeridos, como se fossem feitos por um Wes
Anderson em depressão, onde a relação com a natureza, por exemplo, não introduz
desordem, é outra forma de ordenar, de coreografar nova miniatura de efeitos. É
um cineasta norte-americano, produtor, roteirista e ator. Seus filmes são reconhecidos
pelos seus visuais excêntricos e pelo estilo de narrativa. Anderson foi
indicado na categoria de Melhor Roteiro Original em The Royal Tenenbaums
(2001), Moonrise Kingdom (2012) e em O Grande Hotel Budapeste em
2014. Ele recebeu sua primeira indicação como Melhor Diretor e ganhou o Globo
de Ouro de Melhor Filme - Comédia ou Musical pelo The Grande Budapest Hotel
em 2014. Aliás, a ter consequência alguma será a de tornar mais autoconsciente os
planos frontais e as formas panorâmicas do cinema de Wesley Wales Anderson, nascido
em 1969, que parece ter ficado aqui bastante mais desprotegido, e talvez destapado.
A vila próxima à clínica é bisonha e caracterizada pelo estereótipo de “aldeões
introvertidos” que se esgueiram pelos cantos das janelas, pois a clínica “é em
si um castelão à la Frankenstein”.
Dane
DeHaan nasceu em Allentown, Pensilvânia. Filho de Jeff DeHaan, um programador
de computador, e Cynthia, nascida Boscia, uma executiva da Knolls Móveis.
DeHaan estudou na Emaús High School (Emaús, Pensilvânia) por três anos, e transferiu-se
para a University of North Carolina School of the Arts (UNCSA) em seu
último ano. Ele se formou na University
of North Carolina School of the Arts em 2008. Fundada em 1963
como a Escola de Artes da Carolina do Norte pelo então governador Terry
Sanford, foi o primeiro conservatório público de artes nos Estados Unidos da
América. A ideia da Escola de Artes da Universidade da Carolina do Norte
foi iniciada em 1962 por Vittorio Giannini, um importante compositor norte-americano
e professor de composição na Juilliard, no Curtis Institute of Music e na
Manhattan School of Music, que se aproximou do então governador Terry Sanford.
e contou com a ajuda do autor John Ehle e William Sprott Greene, Jr. e Martha
Dulin Muilenburg de Charlotte, Carolina do Norte, “para apoiar seu sonho de um
conservatório de artes”. Fundos estaduais foram apropriados e um Comitê do
Conservatório da Carolina do Norte foi estabelecido.
A
Escola de Artes tornou-se uma instituição constituinte da Universidade da
Carolina do Norte em 1972. Em 2008, o conselho de administração da instituição
votou por unanimidade para mudar o nome da escola de “Escola de Artes da
Carolina do Norte” para “Escola de Artes da Universidade da Carolina do Norte”
para aumentar seu perfil. A mudança de nome e a melhor
adequação à realidade, foi posteriormente aprovada pelo Conselho de
Governadores da Universidade da Carolina do Norte, Senado da Carolina do Norte,
Câmara dos Representantes da Carolina do Norte e pelo governador Mike Easley. Vittorio
Giannini foi o fundador e primeiro presidente da Escola. Sua visão da educação
artística moldou a UNCSA em seu início e continua a influenciá-la hoje.
Giannini serviu como presidente da instituição incipiente até sua morte em
novembro de 1966. Uma resolução datada de 3 de dezembro de 1966 pelo Conselho
de Curadores e o Governador presta homenagem a Giannini como o fundador da
Escola, observando “Quando era um sonho, ele procurou um lar para ele e ajudou
a criá-lo. Quando era uma instituição infantil, ele lhe deu estrutura e design”.
O compositor vencedor do Prêmio Pulitzer, Robert Ward, tornou-se o segundo
presidente da UNCSA após a morte de Vittorio Giannini.
A
escola é proprietária e opera o Stevens Center no centro de Winston-Salem e é
credenciada pela Associação Sul de Faculdades e Escolas. A escola consiste em
cinco escolas profissionais: Escola de Dança, Escola de Design e
Produção, incluindo um Programa de Artes Visuais HS, Escola de Teatro, Escola
de Cinema e Escola de Música. E em 2012, casou com a atriz Anna DeHaan Wood. Dane
DeHaan começou sua carreira nos palcos como substituto de Haley Joel Osment no
renascimento de curta duração da Broadway American Buffalo. Em 2008, ele
fez sua estreia na televisão, convidado para um episódio de Law & Order
Special Victims Unit e sua estreia no cinema em 2010 John Sayles “Amigo”.
Ele estrelou como Jesse na 3ª temporada de In Treatment e interpretou
Timbo na 4ª temporada de True Blood. Em 2012, DeHaan estrelou o filme de
drama camcorder Chronicle, mas a opção por uma perspectiva originada
unicamente de câmeras subjetivas não é nova, e como Cricket em Lawless
(2012). Em 2013 como Lucien Carr, em Kill Your Darlings (2013), com Daniel
Radcliffe, um papel que teve considerável aclamação da crítica cinematográfica. Em 2014,
estrelou no filme The Amazing Spider-Man 2, como Harry Osborn.
A
Cure for Wellness é um filme de horror psicológico de 2016
dirigido por Gore Verbisnki e roteirizado por Justin Haythe, baseado na
história coescrita por Haythe e Verbinski, onde ambos foram inspirados pela
novela de Thomas Mann, The Magic Mountain, de 1924. Estrelando Dane DeHaan,
Jason Isaacs e Mia Goth, o enredo é sobre um jovem executivo que é enviado para
salvar um colega de trabalho de um misterioso centro de reabilitação nos Alpes
suíços. Com uma coprodução norte-americana, alemã e luxemburguesa, o filme foi rodado
em diversas localidades na Alemanha, incluindo o Castelo de Hohenzollern em
Baden-Württemberg. O filme foi lançado em 17 de fevereiro de 2017 pela 20th
Century Fox e recebeu diversos tipos culturais de críticas, que enquanto
elogiavam o visual, cinematografia, performance e a sua ambição,
criticavam a sua duração, o seu roteiro e estrutura. A trama é centrada em Lockhart
(Dane DeHaan), que trabalha em Nova York e recebe uma missão: ir até a um Spa localizado nos Alpes Suíços e trazer o Sr. Penbroke
(Henry Groener), Chief Executive Officer (CEO) importante o cargo que
está no topo da hierarquia operacional de uma empresa.
O
CEO tem a responsabilidade social de executar as diretrizes propostas pelo Conselho de
Administração, que por sua vez é composto por representantes dos acionistas da
empresa. Mas um CEO da empresa que simplesmente não quer mais deixar o local,
por se sentir “bem melhor”. Logo após chegar ao centro de saúde, administrado
pelo Dr. Volmer (Jason Isaacs), Lockhart sofre um acidente, que acaba por
prolongar sua estadia para tratar de seus ferimentos. Só que o rapaz começa a
desconfiar de que algo está errado por causa do estranho comportamento de
alguns funcionários e pacientes, a maioria deles como Penbroke: idosos que
estão em busca de uma cura prometida pelo médico Volmer. Suas suspeitas ficam
ainda maiores quando ele reconhece Hannah (Mia Goth), uma garota que guarda
misteriosos segredos sobre sua intimidade. Lockhart decide investigar o que
está acontecendo no SPA, mas à medida que tenta avançar em suas descobertas,
sua sanidade começa a ser seriamente questionada, que pode levá-lo a um caminho
sem volta.
A
sigla SPA advem do nome “Salus Per Aquam”, uma expressão latina que
significa “saúde pela água”. Tradicionalmente, os Spas eram estâncias
balneares ou hotéis, localizados fora das cidades, procurados por pessoas que “se
hospedavam por um período em busca de descanso e de cuidados com a saúde”. Outra
teoria, que não contradiz a primeira, é que o termo SPA provém da
Antiguidade, quando nos tempos da Roma Antiga, a aristocracia romana tinha o
hábito de frequentar a estância hidromineral da cidade de Spa, uma cidade e um
município da Bélgica localizado no distrito de Verviers, província de Liège,
região da Valônia. Está situada a cerca de 35 km a sudoeste da cidade de Liège
e a 45 km a sudoeste da cidade alemã de Aachen. A cidade é famosa pelas suas
termas desde os tempos da Roma Antiga, quando era chamada Aquae Spadanae,
denominação possivelmente relacionada com spargere (“lançar aqui e ali,
espalhar”). A afirmação de que a palavra “Spa”, seja um acrônimo da expressão
latina “Salus per aquam”, ou, “Sanitas per aquam” parece de bom fundamento
sociológico. Na Idade Média, as águas de Spa eram procuradas desde o século
XIV, quando ganharam fama por suas supostas propriedades medicinais, era
referida como Espa, fonte, em valão. Durante a carnificina da 1ª guerra mundial
o exército alemão lá estabeleceu o seu quartel-general.
Atração competitiva e turística da cidade é o circuito automobilístico de Spa-Francorchamps, onde se disputa o formalmente denominado Formula 1 Rolex Belgian Grand Prix, a 12ª etapa da temporada de 2021 da Fórmula 1. Foi disputado em 29 de agosto de 2021 no Circuito de Spa-Francorchamps, em Spa, Bélgica. Os antigos romanos e os otomanos usavam as termas, além de espaço terapêutico, também como um lugar praticado para relaxamento do corpo e também de socialização das ideias. Atualmente, nas cidades e na cultura do urbanismo o Spa é um estabelecimento comercial que dispõe de estrutura específica para oferecer aos clientes tratamentos de saúde, beleza e bem-estar social. Hoje em dia, além da hidroterapia, como banhos de imersão (ofurô), encontra-se também opções de massagens relaxantes, sauna, exercícios antiestresse, como meditação, yoga etc. Para redução do peso a hidroterapia, oferece a técnica de reeducação alimentar e treinamentos físicos, além de aparelhos de estética. Existem os chamados Spa Urbano, ou Day Spa, localizados nas cidades onde os clientes podem usufruir por algumas horas dos serviços e da tranquilidade de um verdadeiro Spa, porém sem hospedagem. Essa cidade está localizada na província de Liège, no leste da Bélgica. Suas águas termais eram reconhecidas pelas suas propriedades clínicas curativas.
Segundo Miguel Forlin, no artigo intitulado: A Cura - O Horror Literário e Cinematográfico (2017) “o filme te
deixa aflito o tempo todo”. Por isso segundo o analista uma palavra para
definir esse filme é: aflição. Lockart, que para conseguir uma promoção,
descumpre leis tributárias, que podem leva-lo à cadeia, foi enviado para
busca-lo, mas logo percebe que o tal Spa, está mais para o hospício com
tratamentos suspeitos e pessoas que apresentam uma certa demência. No caminho
até, de carro, ele descobre através do motorista uma espécie de lenda sobre o
terreno onde a instalação foi construída, que gera ódio dos habitantes do local contra a construção do
retiro. A presença de Hannah (Mia Goth),
uma jovem introspectiva que difere muito dos demais pacientes, em sua maioria
de idosos, é mais um impulso irradiado que faz Lockart querer desvendar os segredos do
lugar, mas ele encontra inúmeras barreiras argutas na equipe do Dr. Valmer (Jason
Isaacs), que está parecido com o personagem na Netflix. O problema
abstrato do conhecimento teórico e prático é que o mistério e background que dão à história, não
fazem parte do quebra-cabeça, pois é o próprio quebra-cabeça per se.
Escrito
por Justin Haythe, a partir de uma história autoral concebida por ele e Gore
Verbinski, o roteiro de A Cura (2017), se apoia em uma estrutura
simples: ao encontrar um lugar misterioso, o sujeito começa a investigar por contra
própria os segredos daquele ambiente. O primeiro desses elementos é o
protagonista, o típico anti-herói, aceitando ignorante o establishment,
inquestionável, alienado membro da sociedade. Ele luta para se conformar,
tentando se opor ao modus operandi ao mesmo tempo que, talvez, reúne-se a
outros estranhos com quem dará voz a suas questões. Mas é caracterizado pelo
outro como arrogante, excessivamente ambicioso, impaciente e egoísta. Porém,
ele é vulnerável emocionalmente. Essa dualidade é essencial para a existência
de uma conexão emocional entre o público e a percepção sobre o papel
desempenhado pelo protagonista, pois, ao passo que sentimos torpor dos seus
traumas e vulnerabilidades, também o admiramos pela sua expressiva coragem.
Outro elemento que merece ser mencionado é o comentário social que flutua
sutilmente: opulência material e sucesso profissional podem ser ilusórios
(cf. Hilferding, 2011). E ainda no terceiro ato, quando os mistérios são
solucionados, há uma rima temática brilhante que desvela a relação entre a promiscuidade financeira do “mundo corporativo” com a promiscuidade
sexual da antiga aristocracia.
Muito
mais poderia ser dito sobre o tema do entrelaçamento de confiança, tato e poder
em encontros com não íntimos, mas neste aspecto social a confiabilidade,
particularmente baseados num relacionamento de longo prazo, substanciam as
credenciais que tornam cada um fidedigno aos olhos do outro. A confiabilidade
relativa aos mecanismos de “desencaixe” é diferente, embora a fidedignidade
seja ainda central e as credenciais certamente estejam envolvidas. Em certas
circunstâncias, a confiança em sistemas abstratos não pressupõe encontro algum
com os indivíduos ou grupos que são de alguma forma “responsáveis” por eles.
Mas na grande maioria das instâncias tais indivíduos ou grupos que estão
envolvidos. São os encontros com eles por parte das relações estabelecidas
pelos outros que amarra os pontos de acesso aos sistemas abstratos que para
Giddens são o terreno comum dos compromissos “com rosto e sem rosto”. O
essencial da argumentação é que a natureza das instituições modernas está
profundamente ligada ao mecanismo da confiança em sistemas abstratos, especialmente
confiança em sistemas peritos. É uma questão crucial de cálculo de vantagem e
risco em circunstâncias onde o conhecimento perito simplesmente não proporciona
esse cálculo, mas na verdade cria (ou reproduz) o universo de eventos
como resultado contínuo desse próprio conhecimento.
Ninguém pode sair completamente do
plano de análise dos sistemas abstratos envolvidos nas instituições. É sempre
bom saber do que se fala. Os compromissos com rosto tendem a ser dependentes do
que pode ser chamado de “postura dos representantes ou operadores do sistema”.
Na maioria dos sistemas educacionais contemporâneos, o ensino da ciência começa
sempre pelos “princípios primeiros”, mas nem sempre vistos pela classe como conhecimentos
sendo mais ou menos indubitável. Se alguém permanece aprendendo ciência,
desenvolvendo per se por tempo excessivo poderá ser introduzido a
questões contenciosas, ou tornar-se plenamente cônscio da falibilidade
potencial de todas as reivindicações ao conhecimento como ciência. A ciência
tem assim por longo tempo mantido uma imagem de conhecimento fidedigno que se
verte numa atitude de respeito para com a maioria das formas de especialidade
técnica. Ao mesmo tempo, contudo, as atitudes leigas ocorridas na sociedade em
relação à ciência e ao conhecimento técnico são em geral tipicamente
ambivalentes. Trata-se de uma ambivalência que reside no âmago de todas as
relações de confiança, seja em sistemas abstratos, seja em experimentos
reais.
Pois
é tácito que só se exige confiança onde há ignorância – ou das reivindicações
de conhecimento de peritos técnicos ou das reivindicações de conhecimento de
peritos técnicos ou dos pensamentos e intenções de pessoas íntimas com as quais
se conta. A ignorância, entretanto, sempre fornece terreno para o ceticismo
ou pelo menos cautela. As representações populares da perícia técnica e
científica mesclam geralmente respeito com atitudes de hostilidade ou medo,
como nos estereótipos do técnico sem senso de humor com pouco conhecimento das
pessoas comuns, ou do cientista louco. Profissões cuja reivindicação a um
conhecimento especializado é vista sobretudo como um círculo fechado, tendo uma
terminologia aparentemente inventada para obstruir o leigo – como ocorre com
advogados e sociólogos – tendem a ser vistas com uma visão particularmente
deformada. O respeito pelo conhecimento
técnico existe comumente em conjunção com uma atitude pragmática para com sistemas
abstratos, baseada em atitudes de ceticismo ou reserva. Muitas pessoas, por
assim dizer, fazem uma “barganha com a modernidade” em termos de confiança que
concedem às fichas simbólicas e sistemas peritos.
A
natureza da barganha é governada por misturas específicas de deferência e
ceticismo, alívio e medo. Embora não possamos escapar completamente do impacto
das instituições modernas, dentro do amplo escopo de atitudes de aceitação
pragmática, muitas orientações possíveis podem existir (ou coexistir, em
verdadeira ambivalência). Um indivíduo pode escolher mudar-se para uma área
diferente, por exemplo, do que tomar água fluoretada, ou tomar água engarrafada
ao invés de água da torneira. Seria uma atitude extremada, contudo, recusar
completamente a água encanada. A confiança é diferente do “conhecimento
indutivo fraco”, mas a fé que ela envolve não pressupõe sempre um ato
consciente de compromisso. Em condições de modernidade, atitudes de confiança
para com sistemas abstratos são via de regra rotineiramente incorporadas à
continuidade das atividades da vida cotidiana e são em grande parte reforçadas
pelas circunstâncias intrínsecas das atividades do dia a dia. A confiança é
menos um “salto para o compromisso” do que uma aceitação nas quais outras
alternativas estão descartadas.
Atitudes
de confiança, assim como de “falta de confiança”, para com sistemas abstratos
específicos são passíveis de ser fortemente influenciadas por experiências em
pontos de acesso, por atualizações de conhecimentos que, através dos meios e
processos de comunicação e de outras fontes, são proporcionadas tanto para os
leigos como para os cargos técnicos. O fato de que pontos de acesso são locais
de tensão entre ceticismo leigo e perícia profissional faz deles reconhecidas “fontes
de vulnerabilidade para sistemas abstratos”. Antes de considerar mais
diretamente as circunstâncias em que a confiança é reforçada ou perdida, temos
que complementar a discussão com uma análise da confiança em pessoas ao invés
de sistemas. Isto nos leva a questões que têm a ver com a psicologia da
confiança. Há certos aspectos da confiança real e de processos de
desenvolvimento abstrato da personalidade que parecem se aplicar historicamente
a todas as culturas, pré-modernas e modernas. A segurança ontológica é
uma forma, mas uma forma muito importante, de sentimentos de segurança no sentido
amplo. A expressão se refere à crença que a maioria dos seres humanos tem na
continuidade de sua autoidentidade e na constância dos ambientes de ação
social e material. Uma sensação da fidedignidade de pessoas e coisas, tão
central à noção de confiança, é básica nos sentimentos de segurança
ontológica; daí os dois serem relacionados psicologicamente de forma tão íntima.
A
fé no amor de seus protetores é a essência daquele salto dialético ao compromisso que a
confiança básica e todas as formas de confiança pressupõe. Se fizermos a
ligação deste aspecto aos percursos históricos, a confiança, a segurança
ontológica, e um sentimento da continuidade das coisas e outras pessoas
permanecem intimamente ligados entre si na personalidade adulta. A confiança
nos outros é uma necessidade psicológica de um tipo persistente e recorrente.
Tirar segurança da fidedignidade ou integridade de outros é uma espécie de
ranhura emocional que acompanha a experiência de ambientes familiares sociais e
materiais. A segurança ontológica e a rotina estão intimamente
vinculadas, através da influência útil e difusa do hábito. Nos próprios
compromissos com rosto, a manutenção da confiança básica é realizada através do
monitoramento crônico do olhar, da postura corporal, da gesticulação e das convenções
da conversação ortodoxa. Há circunstâncias em que a ausência de confiança
poderia ser caracterizada adequadamente como desconfiança, tanto a respeito de
sistemas abstratos como de pessoas. O termo “desconfiança” se aplica mais
facilmente mediante o exame de relações quando falamos da conduta de um agente,
como um sistema, indivíduo ou tipo de indivíduo específico.
No
que toca aos sistemas abstratos, desconfiança significa ser cético a respeito,
ou ter uma atitude ativamente negativa para com as reivindicações de
perícia que o sistema incorpora. No caso pessoal significa duvidar ou
desacreditar das reivindicações de integridade que suas ações personificam ou
demonstram. A forja da confiança é a própria condição do reconhecimento da
identidade clara de objetos e pessoas. A “desconfiança” é um termo muito fraco
para expressar a antítese da confiança básica, o elemento focal num conjunto
generalizado de relações para com os ambientes social e físico. Em seu sentido
mais profundo, a antítese de confiança é, portanto, um estado de espírito que
poderia ser melhor sumariado como angst ou pavor existencial. Se existem traços da psicologia da confiança
que são universais, ou quase universais, há também contrastes fundamentais
entre as condições das relações de confiança que devemos considerar nas
culturas pré-modernas e modernas, pois não é apenas a confiança que devemos
considerar, mas amplos aspectos das conexões entre confiança e risco, e entre
segurança e perigo. O caráter abstruso e extenso das descontinuidades entre
instituições justifica a tentativa abstrata, embora inevitavelmente
envolvidas em simplificações excessivas. Isto porque como ocorre com a conexão inerente com
a ausência, a confiança como valor social está sempre vinculada a modos de organizar interações
fidedignas através do tempo-espaço, embora as conexões de parentesco sejam
frequentemente de tensão e conflito irremediável.
Bibliografia geral consultada.
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