sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Parque Semuc Champey - Guatemala & A Natureza Sob as Rochas.

                                                   Guatemala tiene un río pensativo y otro que se tiñó de sangre”. Luis Alfredo Arango

              Um rio (do latim rivus) é um curso de água, usualmente de água doce, que flui por gravidade em direção a um oceano, um lago, um mar, ou um outro rio. Em alguns casos, um rio simplesmente flui para o solo ou seca completamente antes de chegar a um outro corpo d`água. Pequenos rios também podem ser chamados por outros nomes, incluindo córrego, canal, riacho, arroio, riachuelo ou ribeira. Não existe uma regra geral que define o que pode ser chamado de rio, embora em alguns países ou comunidades, um fluxo pode ser definido pelo seu tamanho. Muitos nomes de rios de pequeno porte são específicos para a sua localização geográfica. Um exemplo é o termo “burn”, usado na Escócia e no Nordeste da Inglaterra. Às vezes um rio é considerado maior do que um afluente, mas isso nem sempre é o caso, por causa da imprecisão na linguagem.  O rio faz parte do ciclo hidrológico que se inicia a partir da energia emanada pelo Sol. A água de um rio é coletada através de escoamento superficial, recarga das águas subterrâneas, nascentes, e a liberação da água armazenada em gelo natural como por exemplo, das geleiras. Muitos rios com utilidade de uso econômica são utilizados como meio de trabalho e processo de comunicação para transporte, chamado transporte fluvial. No seu curso, dependendo do tamanho e volume das águas, e profundidade, navegam navios, barcos, barcaças e outras embarcações menores.

Ressalte-se que há rios com corredeiras e quedas d`água que impedem a navegação, bem como há rios navegáveis em apenas parte de seu curso d`água. A travessia aérea dos rios dá-se por intermédio de pontes, construídas sob os mais diferentes estilos arquitetônicos. Mas na água, a travessia dá-se através de “feri boats” ou balsas, jangadas, caiaques e outras pequenas embarcações. Em rios de baixa profundidade, somente é possível navegação com lanchas com hélices aéreas, chamadas de “aerobarcos”. Com o aumento da população mundial e ocupação desenfreada para industrialização e moradia de terrenos ribeirinhos, surgiu um problema grave no meio ambiente: a poluição fluvial, que pode provocar danos irreversíveis ao rio, provocando a morte e até a extinção por completo de espécies de peixes. Isso somado à clássica iniciativa nociva de aterrar pântanos e banhados gera a cada temporada de chuvas, nas margens de rios e próximo a elas, o problema da enchente, que desabriga famílias a cada ano. Quanto às águas, os rios podem ser de três tipos: rios de águas brancas, rios de águas claras e rios de águas pretas. Os rios de águas brancas são aqueles cujas águas carregam grandes quantidades de sólidos em suspensão, como magnésio e cálcio, o que os deixa com a água com um aspecto esbranquiçado ou barrento, e baixa visibilidade.

Muitos desses rios com parte do curso presente no Brasil têm origem nas nascentes da Cordilheira dos Andes. Em suas margens, existem áreas de várzeas férteis, propícias para a agricultura. Os rios de águas pretas são os que nascem em áreas de sedimentos terciários. Esses rios têm geralmente água ácida devido às grandes quantidades de substâncias orgânicas dissolvidas, provenientes de solos arenosos cobertos por vegetação. O rio Negro, localizado em três países: Venezuela, Colômbia e Brasil, é um exemplo de rio de água preta. Os rios de águas claras, ou águas azuis, são os rios com pouca quantidade de sólidos em suspensão e aspecto cristalino, o que lhes permite uma grande visibilidade. Exemplos desses rios são os que correm na Região Centro-Oeste do Brasil e na região das Guianas. O rio pode ser perene, quando há sempre água fluindo em seu leito, ou seja, não seca durante o ano, ou intermitente (ou temporários), que durante a época de chuva (ou “cheias”), geralmente no inverno, apresenta bastante água em seu curso e durante a estiagem (ou período das “secas”), normalmente no verão, desaparece temporariamente. Apesar de cobrirem apenas 1% da superfície da terra, os rios e os lagos, albergam 17 000 espécies de peixe, o que representa um quarto de todos os vertebrados.

             Semuc Champey é um monumento natural no Departamento de Alta Verapaz, que representa um dos vinte e dois Departamentos da Guatemala, país da América Central. Sua capital é a cidade de Cobán, perto da cidade Q`eqchi` Maya de Lanquín. É consertado por uma ponte natural de calcário de 300 metros, sob a qual passa o rio Cahabón. No topo da ponte há uma série de piscinas naturais turquesas escalonadas, uma atração popular para natação extraordinária. A melhor e mais acessível maneira de ver Semuc Champey em toda a sua glória é do ponto de vista ecológico El Mirador, um sítio arqueológico pré-colombiano Maia, muito extenso, localizado no norte do departamento de El Petén, na Guatemala. O sítio foi descoberto em 1926, e fotografado a partir do ar em 1930, mas este sítio remoto num recanto da selva não receberia grande atenção até Ian Graham aqui ter passado 10 dias elaborando o primeiro mapa do local em 1962. Em 1978, foi iniciada uma investigação detalhada, num projeto coordenado por Bruce Dahlin da Universidade Católica de Washington e Ray Matheny da Universidade de Brigham Young. El Mirador cobre cerca de 26 km². Existem várias estruturas que consistem de uma grande plataforma artificial de altura reduzida em cima da qual se encontram três pirâmides em escada. 

             As mais notáveis dentre estas são três enormes complexos: El Tigre, La Danta e Los Monos. A pirâmide mais alta de El Tigre tem cerca de 60 metros de altura. La Danta, com 75 metros de altura, é a mais alta estrutura Maia, e uma das maiores do mundo em volume se incluída a grande plataforma em que assenta a pirâmide e que cobre 18 000 m² com um volume total de 2 800 000 m³. As paredes da maioria das estruturas estavam originalmente revestidas com blocos talhados em pedra e decoradas com caras de grande dimensão pintadas sobre estuque retratando as divindades da mitologia maia. Carlos Morales-Aguilar, um arqueólogo guatemalteco que obteve Ph.D. em Arqueologia pela Universidade de Paris 1 Panthéon-Sorbonne, sugere a existência de alinhamento entre os variados grupos arquitetônicos, templos principais e monumentos esculpidos, relacionado com as trajetórias do Sol e da Lua.  Este estudo reflete o planejamento urbano e os sagrados desde a chegada dos povoadores de El Mirador. 

            Richard D. Hansen, é um reputado arqueólogo da Universidade de Idaho, e diretor do Projeto da Bacia de Mirador, de acordo com os seus achados, pensa que os mais de vinte e sete sítios da bacia de Mirador, formavam o primeiro Estado político das Américas, e que o Norte de El Petén dá à Guatemala o direito de intitular-se “berço da civilização maia”. É uma caminhada quente de aproximadamente 45 minutos na selva a partir da área de encontro, as vistas do vale são incomparáveis. É um sítio natural no departamento de Alta Verapaz, Guatemala. A cidade de Cobán possui um clube no Campeonato Guatemalteco de Futebol, o Cobán Imperial, que joga de mandante no Estádio José Ángel Rossi e o Estadio Verapaz de futebol. Seu nome oficial é Estádio Verapaz José Angel Rossi. Foi construído em 1936 e sua capacidade de público é de 15.000 torcedores. É a residência do clube de futebol da Liga Nacional Coban. Os Maias de El Petén, que esgotaram o solo pela pressão agrícola e amor à opulência, deveria nos levar a considerar as consequências da relação técnico-metodológica do binômio produção-consumo exagerado, afirma em entrevista concedida em Paris ao arqueólogo Richard Hansen (2011). 

- As últimas descobertas arqueológicas na bacia guatemalteca de El Mirador reforçam a teoria de que os Maias, antiga civilização construtora de cidades formidáveis, desapareceram por “causas ambientais como o desmatamento”. A exposição “Maias: do Alvorecer ao Crepúsculo”, no Musée du Quai Branly, em Paris, apresenta 150 peças de arte e cerâmica procedentes de El Mirador, Norte da Guatemala, e ilustra a complexidade científica e artística da civilização mesoamericana. As peças são vasos, esculturas, pedaços de monólitos (pedras talhadas) e de relevos, foram encontradas no sítio arqueológico do Departamento de El Petén, no Norte do país, perto da fronteira com o México. As obras pertencem aos períodos pré-clássico e clássico Maia, aproximadamente entre o ano 1000 a. C e 900 d. C. A civilização Maia se desenvolveu ao longo de aproximadamente três mil anos desde o estabelecimento das primeiras aldeias na extensa área compreendendo, respectivamente, o extremo Sudeste do México de Yucatán, Campeche, Quintana Roo, e partes de Tabasco, localizado no Sudeste do país, com 2. 395. 232 habitantes e a capital é a cidade de Villahermosa. Suas origens remontam a 1519, quando Hernán Cortés, depois de estar perto do Malinche, fundada na margem esquerda do enclave do rio Grijalva, deram o nome de Santa María de la Victoria.

Em 1557 devido aos contínuos ataques piratas, um grupo de espanhóis abandonam Santa María de la Victoria e para trás do río Grijalva chegando a um lugar onde havia três montes e se estabeleceram lá, nomeando San Juan Bautista, por terem chegado justamente no dia no santo. Villahermosa é a capital do Estado de Tabasco, no México. Localiza-se no Sudeste do país. Tem cerca de 335 mil habitantes. Foi fundada em 24 de junho de 1564 pelo espanhol Diego de Quijana no final do século XVI, designando-se San Juan Bautista, em homenagem ao santo até 1915. Seu gentilício é villahermosino ou capitalino. O nome colonial original foi “Villa Hermosa de San Juan Bautista”, que depois da Revolução Mexicana, fico somente “Villahermosa” ou “Cidade de Villahermosa”. Concentra a maior população urbana do Estado de Tabasco. A cidade se destaca como um centro de negócios e administração da indústria petrolífera e do Sudeste do México. Villahermosa é uma cidade moderna com uma grande abundância de recursos naturais e goza de realizar a conexão entre a Cidade do México (880 km) e as mais importantes cidades da região Sudeste como Cancun a (900 km), Mérida a (500 km) Campeche (390 km), Tuxtla Gutiérrez (298 km) e Ciudad del Carmen a (168 km). Assim mesmo, se encontra próxima à fronteira da Guatemala, com acesso pela rodovia internacional Villahermosa-Tenosique-Flores em Tikal. É uma antiga cidadela Maia nas florestas tropicais do Norte do Guatemala. Possivelmente datada do século I d.C., Tikal floresceu entre os anos 200 e 850 d.C. e foi abandonada por razões climáticas e de desertificação provavelmente. As icónicas ruínas de templos e palácios incluem a gigante e cerimonial Pirâmide do Mundo Perdido e o Templo do Grande Jaguar. A 70 metros, o Templo IV é a estrutura pré-colombiana mais alta das Américas e proporciona vistas deslumbrantes.

            Não queremos perder de vista posto que achamos necessário indicar pistas sobre um tema relativamente pouco estudado, que aponta na relação entre informação e história.  Como já se observou alhures, essa indagação leva-nos mais uma vez a seguinte questão: o problema da história é a história do problema e inversamente.  Conquanto tenha-nos advertido Montálban, na conclusão de seu importante ensaio: História y Comunicación Social (Montálban, 1985). Este livro tem cumprido e cumpre seu papel, fomentando a curiosidade dos estudantes de ciências da informação por um delineamento historicista de sua disciplina fundamental, que está contra o saber dominante nas atuais faculdades de ciências da informação. E igualmente contribui a ocupar um lugar na consciência de qualquer um que pense que o saber não ocupa um lugar. Isto quer dizer que a cultura, a sociedade, vem articular-se a uma estrutura de relações sociais. No processo de produção estão inseridas as bases de produção e da reprodução da existência. O escravagismo antigo, distingue do processo de produção, o escravo agricultor independente do proprietário privado. O que os distingue é a relação com o trabalho. 

          Se um se conduz como proprietário das condições materiais da reprodução de sua existência material, no outro aso é o mestre que se conduz como proprietário das condições naturais da reprodução de sua existência material de escravo. Pode-se fazer a mesma comparação e a mesma distinção entre o escravo moderno, do século XIX, e o trabalhador agrícola no mesmo sistema técnico de trabalho, ao qual se articulam relações sociais diferentes. A interligação dos processos de trabalho é primeiramente técnica, na medida em que está contida nos meios de trabalho e envolve imediatamente trabalhadores em situações específicas de trabalho.  Em seguida é de ordem social, basicamente quanto à escala e quanto ao sentido de conjunto, no sentido de satisfazer necessidades sociais. É finalmente, de ordem tecnológica na medida em que a produção, circulação, uso, dos produtos resultantes do processo de trabalho interligados, são o próprio sistema social no âmbito de determinada cultura ou sociedade. Produzindo e consumindo determinados produtos de forma como o fazem, os homens primeiro tecnologicamente produzem sua sociedade e todas as relações sociais nela existentes. 

Um sistema de trabalho representa uma estrutura de relações sociais onde o que está em jogo é o próprio processo de trabalho. O trânsito que realmente efetuam no circuito produtivo permanece sendo o de um movimento entre forças que se encontram objetivadas num sentido preciso de trabalho e no processo de trabalho com o objetivo de transformar um produto com valor de uso. Nesse fluxo que o conclui enquanto movimento tecnicamente orientado, o valor-de-uso inerente aos produtos que entram no processo de trabalho é também e necessariamente, valor-trabalho qualificado que noutro lugar nomeamos informação. Sabemos além disso, que todo processo de trabalho é, simultaneamente, um processo de comunicação, embora nem todo processo de comunicação sea necessariamente um processo de trabalho. A concepção “meios de comunicação de massa” só responde ao sentido a comunicação moderna a partir da existência de meios e das “massas” intercomunicadas. A existência de fontes de notícias, um sistema de transmissão, uns polos de recepção e transmissão e receptores que tenham estabelecido uma demanda de informação.  Este processo só se alcança a partir da imprensa no século XV, com o comércio e do correio coincidente com a expansão da burguesia renascentista. 

Considera-se assim, de um ponto de vista americanista e eurocentrista, que a partir do século XV até o XIX seguiremos assistindo a uma comunicação social embrionária, que em muito pouco responde a atual concepção assumida em sua diversidade. A condição significativa da mensagem, é o que passa a ser o leitmotiv e o objeto de conhecimento dos estudos chamados de comunicação. Tal como se as práticas sociais, produto das relações sociais e de produção se reduzissem à sua dimensão de mensagem ou, como querem Marshall McLuhan e Quentin Fiore (2002), com a expressão o meio é a mensagem, à sua dimensão significativa, como produtores ou consumidores, mas sem encontrarem-se envolvidos. A necessidade de comunicar-se foi a démarche de todo tipo específico de codificações expressivas, sendo a linguagem e a escrita instrumentos de comunicação oral e escrita sujeitos as limitações de espaço e lugar e a sua transmissão através da distância entre o emissor e o receptor. Pode-se dividir em quatro fases a história comunicativa da codificação de signos e fonemas aos serviços da relação inter-humana: mnemônica, pictórica, ideográfica e fonética.  A primeira, mnemônica, se caracterizou pelo emprego de objetos reais como dados ou mensagens entre pessoas que viviam alheias e não pertenciam ao mesmo sistema convencional de comunicação. Os antigos peruanos, escreve Albert A. Sutton, os chineses, e inclusive tribos primitivas mais recentes, utilizavam com muita frequência o quipo. 

  Cada um dos cordões nodosos usados pelos peruanos, no tempo da monarquia dos Incas, que formavam um método mnemônico, fundado nas cores e ordens dos cordões, número e disposições dos nós, etc., ou a série de cordas atadas para comemorar acontecimentos felizes, para servir como instrumentos de cálculo ou guardadas recordações dos mortos das tribos. Na segunda, pictórica, a comunicação social se transmite mediante a pintura, a representação dos objetos. Estas gravuras aparecem não só na pintura rupestre, e também sobre objetos variados: utensílios, armas ou artigos de valor empregados para o intercâmbio comercial. Na terceira, ideográfica, resulta de uma associação de símbolos pictográficos com objetos e ideias. Nesta fase, os signos se empregam cada vez mais na representação de ideias, numa progressiva separação da estrutura do objeto a comunicar e uma modelação cada vez mais simbólica que aproximará no signo alfabético, na estrutura. A expressão ideográfica serviu para as formas primitivas de relatos etnográficos, tal como podemos valorar na escritura ideográfica das culturas colombianas ou mesopotâmicas, ainda que o máximo tipo cultural deste sistema de comunicação foi a escrita hieroglífica dos egípcios. A última, last but not least, fonética, se estabelece quando o signo representa um som, fora das palavras inteiras, de sílabas ou do que hoje chamamos letras, como unidade fonética menor. A invenção do alfabeto foi o ponto máximo da codificação da comunicação e foi propiciada precisamente por aqueles povos de maior desenvolvimento social e de maior interrelação comercial com outros povos. O alfabeto é chave de intercomunicação e aríete de penetração dos povos da antiguidade criadores das rotas de comércio marítimo e terrestres.

O Estado está localizado no Sudeste do México, fazendo fronteira com os estados de Campeche, Chiapas e Veracruz, com o Golfo do México ao Norte e o país da Guatemala ao Sul e Leste. O Estado cobre 24.731 km², o que representa 1,3% do total do México, e Chiapas, um estado no Sul do México, situado geografiacamente na fronteira com a Guatemala. Os planaltos montanhosos e a densa floresta tropical estão repletos de sítios arqueológicos Maias e cidades coloniais espanholas. Na cidade colonial de San Cristóbal de las Casas, o complexo Templo y ex-convento Santo Domingo abriga uma igreja barroca e um museu que exibe artefatos regionais. Em torno dela está localizado um mercado que vende itens como tecidos coloridos. E, de fato, ainda existem, pois mais de quatro milhões de pessoas continuam falando as múltiplas línguas Maias historicamente contituídas na Mesoamérica. A bacia de El Mirador foi um sofisticado complexo urbano, com numerosas cidades de grande extensão, entre elas El Mirador, Nakbé, El Tintal, Wakná e a recém-descoberta arqueológica de Xulnal, unidas por estradas de até 50 metros de largura e várias centenas de quilômetros de comprimento. O sítio inclui edifícios de até 70 metros de altura e volumes superiores a dois milhões de metros cúbicos, maiores do que as pirâmides do Egito. Ao mesmo tempo que ilustram sobre o alto grau de desenvolvimento humano e técnico-científico e artístico dos Maias, a cerâmica, e sobretudo a arquitetura, sugerem que o colapso civilizatório foi “causado pela degradação ambiental da região”, afirma o arqueólogo Richard Hansen, diretor do projeto de pesquisa da bacia de El Mirador e assessor científico da exposição.

Cerca do ano 700 ocorreu a reocupação em pelo menos parte de El Mirador envolvida por uma muralha em que se reutilizou alguma pedra das estruturas mais antigas. Tornou-se também a única fonte de “cerâmica de estilo códex”, um tipo de cerâmica finamente pintada. El Mirador é ainda o centro de variegadas antigas sacbeob, ou “estradas brancas”, caminhos de pedestres elevados cerca de 4 metros acima do nível do solo, pavimentados com pedra, com 40 metros de largura, um dos quais liga El Mirador a Nakbé, a cerca de 12 km de distância. Sacbé, plural sacbeob, “caminhos brancos”, são estradas pavimentadas elevadas construídas pela civilização maia pré-colombiana. A maioria destes caminhos liga templos, praças e grupos de estruturas no interior de centros cerimoniais de cidades, mas são também reconhecidos alguns caminhos mais longos entre cidades. Sacbé é o termo iucateque para designar a estrada branca; isto é, branca porque as pedras e os materiais de enchimento originalmente eram cobertos com estuque de cal. Iucateque ou Iucateco é uma das línguas indígenas da América do tronco Maia, falada na Península do Iucatão no México, no Norte do Belize e em partes da Guatemala. Permanece como a primeira língua de muitos habitantes dos estados mexicanos de Quintana Roo, Campeche e Iucatão. É comumente reconhecida como Maya (ou Maia) e muitos linguistas usam o termo Maya yucateco para distingui-la comparativamente de outras línguas Maias.

Os Maias foram uma civilização mesoamericana desenvolvida pelos povos maias e reconhecida pelo seu logossilabário, sendo o mais sofisticado e desenvolvido sistema de escrita da América pré-colombiana, bem como por sua arte, arquitetura, matemática, calendário e sistema astronômico. A civilização Maia se desenvolveu em uma área que abrange o Sudeste do México, toda a Guatemala e Belize e as partes ocidentais de Honduras e El Salvador. Essa região consiste nas planícies do Norte, que abrangem a Península de Iucatã, e as montanhas da Sierra Madre, que partem do Estado mexicano de Chiapas, atravessam o Sul da Guatemala e seguem para El Salvador e as planícies do Sul da planície litoral do Pacífico. O termo abrangente “Maia” é um termo coletivo moderno que se refere aos povos constitutivos da região; no entanto, o historicamente não era usado pelas próprias populações indígenas, pois nunca houve um senso comum de identidade ou unidade política entre essas populações distintas. As primeiras cidades Maias se desenvolveram por volta de 750 a.C. A partir do ano 500 a.C. essas cidades passaram a possuir arquitetura monumental, como grandes templos com elaboradas fachadas de estuque. A escrita hieroglífica já estava sendo usada na região maia no século III a. C. 

Chiapas é um Estado do México. A sua capital é Tuxtla Gutiérrez. Situa-se no Sudeste do país, limitando com o Estado de Tabasco a Norte, de Veracruz a Noroeste e de Oaxaca a Oeste. A Leste limita-se com a Guatemala, e ao Sul com o Oceano Pacífico. Tem cerca de 5,5 milhões de habitantes (2020). Um terço de sua população é descendente dos Maias, sendo que a grande maioria são bilíngues com o espanhol, idioma nacional, “falado por nada menos que 99% dos habitantes do país, além de, um número reduzido menor que 1% que não falam o idioma”. O nome do Estado vem da palavra “Chiapan” ou Tepechiapan, o nome pelo qual designou o antigo povo indígena de Chiapas e que significa “monte de chia” ou “água sob a colina”, a partir do nahuatl “tepetl” colina, “chi”, abaixo, “atl”, água, “pan” lugar do rio. Os espanhóis, ao invadir e fundar duas cidades da região: Chiapas dos Índios e Chiapas dos espanhóis, adotaram para ambas o mesmo nome de “Província de Chiapas”. Então, com o plural Las Chiapas, se identificou no momento da Independência, ao conjunto de regiões administrativas com as que formariam o novo Estado. No período pré-clássico tardio, várias grandes cidades se desenvolveram na Bacia de Petén, a cidade de Kaminaljuyú ganhou destaque nas terras altas da Guatemala.

A partir do ano 250 a.C., o período clássico é amplamente definido como quando os Maias estavam erguendo monumentos esculpidos com datas de contagem longa. Nesse período, a civilização Maia desenvolveu muitas cidades-Estado ligadas por uma complexa rede comercial. Nas planícies maias, as cidades de Tikal e Calakmul, tornaram-se poderosas e duas grandes rivais. No período clássico também houve a intervenção intrusiva da cidade de Teotihuacan, no México central, na política dinástica Maia era dominada por um sistema fechado de patrocínio, embora a composição política exata de um reino variasse em cada cidade-Estado. No final da Era Clássica, a aristocracia havia aumentado bastante, resultando na redução correspondente no poder exclusivo do rei divino. No século VIII, houve um colapso político generalizado na região central dos Maias, resultando em guerra internacional, abandono de cidades e mudança de população para o Norte. O período pós-clássico viu a ascensão de Chichén Itzá, no Norte, e a expansão do agressivo reino Quiché, nas terras altas da Guatemala. No século XVI, o Império Espanhol colonizou a região mesoamericana e uma longa série de campanhas viu a queda de Nojpetén, a última cidade em 1697. O domínio político durante o período clássico estava centrado no conceito do “rei divino”, que agia como mediador entre os mortais e o reino sobrenatural. O reinado era patrilinear e o poder era herdado pelo filho mais velho. Também se esperava que um possível Rei fosse um líder bem-sucedido em guerras. A política Maia era dominada por um sistema fechado de patrocínio, embora a política variasse em cada cidade-Estado. 

No final da chamada Era clássica, a aristocracia havia aumentado bastante, resultando na redução correspondente no poder exclusivo do rei divino. A civilização Maia desenvolveu formas de arte altamente sofisticadas e as criou usando a combinação de materiais perecíveis e não perecíveis, como madeira, jade, obsidiana, cerâmica, monumentos de pedra esculpida, estuque e murais finamente pintados. As cidades maias tendiam a se expandir aleatoriamente e o centro delas era ocupado por complexos administrativos e cerimoniais, cercados por uma expansão irregular de bairros residenciais. Diferentes partes de uma cidade eram frequentemente ligadas pelos “caminhos brancos”. A principal arquitetura da cidade consistia em palácios, templos-pirâmides, quadras cerimoniais e estruturas alinhadas para observação astronômica. A elite social era alfabetizada e desenvolveu um sistema complexo de escrita hieroglífica que era a mais avançada nas Américas pré-colombianas. Registraram sua história e conhecimento ritual em livros de tela, dos quais apenas três exemplos incontestados permanecem, sendo que o restante foi destruído pelos espanhóis. Também existem muitos exemplos de texto maia encontrados em estelas e cerâmicas. Também desenvolveram uma série complexa de calendários rituais interligados e empregaram Matemática que incluía uma das primeiras instâncias do zero no mundo. Como parte de sua religião, os Maias praticavam sacrifícios humanos.

Muitos sacbeob podem ser vistos pelos visitantes modernos dos sítios maias; talvez o mais conhecido seja o de Chichén Itzá que se estende desde o grupo principal próximo de El Castillo até ao Cenote Sagrado, e que todos os dias é percorrido por milhares de turistas. Poucas das estradas mais longas existem ainda na totalidade da sua extensão. Um Sacbé bem conhecido liga as cidades de Uxmal e Kabah, encontrando-se as suas duas extremidades assinaladas com arcos falsos. A estrada que liga as antigas cidades de Cobá e Yaxuna, com 100 km de extensão, foi durante décadas a mais longa daquelas conhecidas pelos arqueólogos. Os restos de um caminho ainda mais longo tornaram-se recentemente objeto da atenção dos arqueólogos. Este longo Sacbé aparentemente ligava a Ti`ho, atual Mérida, Yucatán ao Mar das Caraíbas, próximo de Puerto Morelos, passando por sítios como Ake e Izamal numa distância total próxima dos 300 km. Ainda que as estradas mais longas pudessem ser usadas no comércio e nas comunicações, todos os sacbeob tinham aparentemente significado ritual e religioso. Vale lembrar que apesar dos sacbeob de Iucatã serem os melhores conhecidos, encontram-se documentados por toda a área física e geográfica Maia. Alguns terão sido construídos no período pré-clássico e vários foram encontrados em redor de El Mirador

John Lloyd Stephens (1805-1852) representou um explorador, escritor e diplomata norte-americano que relatou que alguns povos maias de Iucatã ainda recitavam uma curta oração ritual quando cruzavam um Sacbé no início da década de 1840, ainda que os sacbeob tivessem sido cobertos pela selva alguns séculos. Stephens foi uma figura central na redescoberta da civilização maia na América Central e no planejamento do A ferrovia do Canal do Panamá ou Ferrocarril de Panamá é uma linha ferroviária que liga os oceanos Atlântico ao Pacífico na América Central. A rota se estende por 76,6 km através do istmo do Panamá, de Colón (Atlântico) a Balboa (Pacífico), perto da Cidade do Panamá). Por causa das difíceis condições físicas e geográficas da rota e do estado da tecnologia, a construção da ferrovia foi reconhecida como uma conquista internacional da engenharia, tendo custado ao Estado 8 milhões de dólares e a vida de cerca de 5 mil a 10 mil trabalhadores. Inaugurada em 1855, a ferrovia precedeu o Canal do Panamá em meio século; o canal foi posteriormente construído paralelo à ferrovia. Reconhecida como Panama Railroad Company quando foi fundada no século XIX, a linha hoje é operada como Panama Canal Railway Company. Desde 1998, é propriedade conjunta da Kansas City Southern e da Mi-Jack Products e alugada ao governo do Panamá. A Ferrovia do Canal do Panamá atualmente oferece tanto serviços de carga como de passageiros.

A linha foi construída pelos Estados Unidos e o principal incentivo foi o grande aumento no tráfego de passageiros e carga do Leste dos EUA para a Califórnia após a corrida do ouro de 1849. O Congresso dos Estados Unidos forneceu subsídios a empresas para operar navios de correio e passageiros a vapor nas costas e apoiou alguns fundos para a construção da ferrovia, que começou em 1850; o primeiro trem rentável percorreu toda a extensão em 28 de janeiro de 1855. Referida como uma “ferrovia interoceânica” quando foi inaugurada, foi mais tarde também descrita por alguns como uma ferrovia “transcontinental”, apesar de atravessar apenas o estreito istmo que conecta os continentes da América do Norte e do Sul. Por um tempo, a Ferrovia do Panamá também possuía e operava navios oceânicos que forneciam correio e serviço de passageiros para algumas das principais cidades das costas Leste e Oeste dos Estados Unidos, respectivamente. A infraestrutura dessa ferrovia foi de vital importância para a construção do Canal do Panamá em uma rota paralela meio século depois. um canal artificial de navios com 77,1 quilômetros de extensão, localizado no Panamá e que liga o oceano Atlântico (através do mar do Caribe) ao oceano Pacífico. O canal atravessa o istmo do Panamá e é uma travessia chave para o comércio marítimo internacional. Há bloqueios e eclusas em cada extremidade da travessia para levantar os navios até o lago Gatún, um lago artificial criado para reduzir a quantidade de trabalho necessário para a escavação do canal e que está localizado 26 metros acima do nível do mar. 

Os bloqueios iniciais tinham 33,5 metros de largura. Uma terceira faixa de eclusas, mais larga, foi construída e entre 2007 e 2016. A França começou a construir o canal em 1880, mas teve que parar as obras devido a problemas de engenharia e pela alta taxa de mortalidade de trabalhadores por doenças tropicais. Os Estados Unidos assumiram o projeto em 1904 e levaram uma década para concluir o canal, que foi inaugurado oficialmente em 15 de agosto de 1914. Um dos maiores e mais difíceis projetos de engenharia já realizados, o Canal do Panamá reduziu muito o tempo de viagem para se cruzar os oceanos Atlântico e Pacífico de navio, o que permitiu evitar a longa e perigosa rota do cabo Horn, no extremo sul da América do Sul, através da passagem de Drake ou do estreito de Magalhães. O cabo Horn é o ponto mais meridional da América do Sul, excluídas as Ilhas Geórgia do Sul e Sandwich do Sul e as Ilhas Diego Ramírez. Encontra-se na Ilha de Hornos, no arquipélago da Terra do Fogo, na porção pertencente ao Chile. Dos grandes cabos, é o que se encontra mais ao Sul e compõe a parte Norte do estreito de Drake. Até a abertura do canal do Panamá, era passagem obrigatória da rota dos navios que viajavam ao redor do globo, indo para a costa Oeste dos Estados Unidos, China, Índia e toda a Ásia. Cabo Hornier é o nome que é dado ao marinheiro e à embarcação que passa o Cabo Horn. A passagem mais curta, mais rápida e mais segura para a Costa Oeste dos Estados Unidos e para os países banhados pelo Pacífico, permitiu que essas regiões se tornassem mais integradas à economia mundial. O tempo social aproximado para cruzar o canal varia entre 20 e 30 horas.

À época da construção civil, a posse do território onde está o canal era dos povos colombianos, depois, dos invasores franceses e dos invasores norte-americanos. Os Estados Unidos da América continuaram a controlar a Zona do Canal do Panamá até a assinatura dos Tratados Torrijos-Carter, em 1977, que passaram o controle da passagem ao Panamá. Esses dois tratados garantiam ao Panamá o controle do canal do Panamá - até então sob controle dos Estados Unidos - a partir de 1999. Os tratados são assim chamados em homenagem aos dois signatários, o presidente estado-unidense Jimmy Carter e o líder panamenho Omar Torrijos. Torrijos não fora eleito democraticamente, tendo tomado o poder através de um golpe de estado em 1968, mas considera-se, em geral, que teve um grande apoio no Panamá para a assinatura desses tratados. Após um período de administração conjunta entre Estados Unidos e Panamá, o canal foi finalmente assumido pelo governo panamenho em 1999 e, agora, é gerenciado e operado pela Autoridade do Canal do Panamá, uma agência do governo do país. O tráfego anual aumentou de cerca de 1 000 navios, quando o canal foi inaugurado em 1914, para 14 702 embarcações em 2008, sendo que a última medição registrou um total de 309,6 milhões de toneladas movimentadas. Até 2008, mais de 815 mil embarcações tinham passado pelo canal; os maiores navios que podem transitar através do canal são chamados  trânsito de porta-contêineres pós-panamax. A Sociedade Americana de Engenheiros Civis classificou o canal do Panamá como uma das sete maravilhas do mundo moderno.

Bibliografia geral consultada.

MARX, Karl, Formações Econômicas Pré-Capitalistas. Rio de Janeiro: Editoras Paz e Terra, 1975; ARGUEDAS, José Maria, Señores e Índios. Acerca de la Cultura Quéchua. Buenos Aires: Acalanto Editorial, 1976; LEHMANN, Henri, As Civilizações Pré-Colombianas. 2ª edição. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1979; SCORZA, Manuel, La Danza Inmovil. Barcelona: Editora Plaza e Janés, 1983; MONTÁLBAN, Manuel Vásquez, História y Comunicación Social. Madrid: Alianza Editorial, 1985; FRANCH, José Alcina, Mitos y Literatura Quechua. Madrid: Alianza Editorial, 1989; Idem, Mitos y Literatura Maya. Madrid: Alianza Editorial, 1989; Idem, Mitos y Literatura Azteca. Madrid: Alianza Editorial, 1989; DURAND, Gilbert, As Estruturas Antropológicas do Imaginário: Introdução à Arquetipologia Geral. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1997; SANT`ANNA, Sérgio Luiz Pinheiro, Do Mercosul à Unasul: As Estratégias Políticas do Brasil no Processo de Integração Regional Sul-americano. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciência Política. Instituto de Ciências Humanas e Filosofia. Departamento de Ciência Política. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2013; MONTEIRO, Felipe Antônio Dantas, A Espeleologia e as Cavernas no Ceará: Conhecimentos, Proteção Ambiental e Panorama Atual. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2014; PÉREZ, Marcelo Jorge, A Guerra Silenciosa de Manuel Scorza: Literatura e Denúncia. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Letras. Centro de Artes e Comunicação. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2015; AZEVEDO, Luciana Alves Vieira de; GENOVESE, Cinthia Leticia de Carvalho Roversi; GENOVESE, Luiz Gonzaga Roversi, “Educação Ambiental na Escola: Uma Prática Indispensável para Conscientização Ecológica”. In: Revista de Educação, Ciências e Matemática. Vol.4 nº2 mai./ago 2014; CARTER, John, Civilização Maia: A História Completa da Ascensão e Queda do Maior Império da Mesoamérica. Londrina: Editora‎ Book Brothers, 2020; LALLO, Pedro Gabriel Antonio, A Crise do Conhecimento Oficial: Uma Análise da Relação Vocabulário/Organização Social. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Faculdade de Filosofia e Ciências. Marília:  Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, 2022; entre outros.

sábado, 17 de dezembro de 2022

Édith Piaf – Carisma, Canto Estridente & Dramático de Canção.

 

                                                        Minhas mágoas, meus prazeres, não preciso mais deles!”. Édith Piaf

            Édith Giovanna Gassion nasceu em 19 de dezembro de 1915, em Paris, filha de um acrobata normando e de uma cantora de café descendente de italianos. Sua infância pobre e difícil ocorreu ao lado da avó, que dirigia um bordel em Bernay, na Normandia. O nome Édith é homenagem a enfermeira britânica da 1ª grande guerra que foi executada por ajudar soldados franceses a escapar dos alemães. Piaf, um nome coloquial francês para um tipo de pardal, foi um apelido dado a ela 20 anos depois. A sua mãe, Annetta Giovanna Maillard (1895-1945), era pied-noir de ascendência franco-italiana por parte de pai e cabila-berbere por parte de mãe. Ela trabalhava com o pseudônimo de Line Marsa, tendo sido obrigada a deixar a profissão contra sua vontade após o casamento. Louis-Alphonse Gassion (1881-1944), o pai de Édith, era normando e acrobata de rua com um passado no teatro. Devido a dificuldades financeiras após a separação conturbada que tiveram em 1916, a mãe passou a sustentar a menina cantando em restaurantes, porém a abandonou em janeiro de 1918 com o ex-marido, quando Édith havia completado dois anos, pois decidiu ir embora de Paris para tentar seguir carreira artística como cantora. Louis Gassion nasceu em uma família bastante pobre. Sua mãe, Louise Léontine Deschamps, foi artista de circo, antes de se tornar a patrona de um bordel em Bernay, na Normandia, apelidado de “os sete grandes”, e seu pai, Victor Alphonse Gassion, nascido em Falaise, em 18 de dezembro de 1850, filho de um barbeiro, figura “o primeiro acrobata de uma família de agricultores, da vila de Castillon, na região de Bayeux, e que se estabeleceu em Falaise no século XVIII.  

       Annetta Giovanna Gassion (1895-1945) reconhecida como a mãe da cantora,  compositora e atriz de renome internacional Édith Piaf, considerada “a cantora nacional da França”. Annetta Gassion, foi anunciada profissionalmente sob o nome artístico de Line Marsa; foi cantora de cabaré e artista de circo, como artista equestre e corda bamba. Nascida Annetta Giovanna Maillard em 4 de agosto de 1895 em Livorno, Itália, filha de pais franceses que estavam em turnê como parte de uma trupe de circo itinerante. Seu pai, Auguste Eugène Maillard, veio da região do Loire, na França. Sua mãe, Emma, ​​era filha de Saïd ben Mohamed, de origem cabila, nascida em Mogador, Marrocos e Margherita (ou Marguerite) Bracco, que nasceu em Murazzano, Piemonte, Itália.  Marsa era cantora, artista de circo e equestre. Seu nome artístico, Line Marsa, foi inspirado em La Marsa, porto da Tunísia, segundo seu filho Herbert. Embora dissesse ter uma voz semelhante à de Piaf, ela não teve sucesso como cantora. Em 4 de setembro de 1914, ela se casou com Louis Alphonse Gassion, um cantor e contorcionista.

No ano seguinte, em 19 de dezembro, ela deu à luz sua primeira filha, Édith Giovanna, que se tornaria Édith Piaf. Em 31 de agosto de 1918, ela deu à luz seu segundo filho, Herbert. Édith foi criada pela mãe de Annetta, Emma,​​de 1915 a 1918, quando foi enviada para a mãe de Louis Gassion devido à negligência de Annetta e Emma. Annetta e Louis se divorciaram em 4 de junho de 1929, supostamente por causa de seu abuso de substâncias. Ela nunca se casou novamente. Line Marsa morreu de overdose de drogas em Paris em 6 de fevereiro de 1945. Ela não foi enterrada no Père Lachaise, ao contrário de Louis-Alphonse Gassion. Marsa foi retratada por Clotilde Courau na cinebiografia de Piaf de Olivier Dahan em 2007, La vie en rose. Em 2021, o Comitato Unesco Jazz Day Livorno (em português: Comitê do Dia do Jazz da Unesco da cidade de Livorno), uma organização voluntária sem fins lucrativos fundada em 2012 pelo músico Andrea Pellegrini, declarou 4 de agosto Giornata degli Artisti di Strada (em português: Dia dos Artistas de Rua) para lembrar Line Marsa. O grafiteiro livorense Mart fez uma pintura na parede do parque público Villa Fabbricotti e uma placa de pedra: “Linha Marsa/(Anita Maillard)/ nacque a Livorno/4 agosto 1805”.

Édith Piaf com seus pais, Louis Alphonse Gassion e Line Marsa. Manuais de instruções existem, sim, na trama simbólica que constitui a cultura, que nos designa lugares, posições, deveres, traços identificatórios. Isto é, a representação de “identidade feminina” e “identidade masculina” são composições significantes que procuram se manter distintas, nas quais se supõe que se alistem os sujeitos, de forma mais ou menos rígida, dependendo da maior ou da menor rigidez da trama simbólica característica de uma sociedade determinada. Mas tal trama é sempre furada. Por um lado, a partir da própria condição de “universo-menos-um” que constitui o simbólico. Por outro, por conta do furo que a inserção de cada sujeito faz nela. O manual de instruções não dá conta, repito, do destino das pulsões – ao menos em se tratando do sujeito moderno, que é o próprio sujeito da psicanálise. Não dá conta da tarefa de tornar-se homem ou mulher, tornar-se sujeito do próprio desejo em oposição à alienação inicial a um discurso de autoridade que deve, ao longo de uma análise, ser destituído da posição de verdade. Assim, “qualquer enunciado de autoridade não tem nele outra garantia senão sua própria enunciação, pois lhe é inútil procurar por esta em outro significante”. Esse é o sentido do enunciado básico característico a sobre o desamparo humano – “não há Outro do Outro”.

Neste aspecto, segundo Kehl (2008), na falta de um Outro que tome a forma imaginária de um ser de amor para responder ao “che vuoi?” (o que queres?), o sujeito está condenado a inventar os sentidos de sua existência. Invenção que não pode ignorar, entretanto, os modos de inscrição de cada sujeito no discurso do Outro (agora tomado na dimensão simbólica), que é o discurso da cultura a que pertence. A primeira dessas inscrições, que nos é dada assim que nascemos, é a marca da diferenciação sexual. A primeira definição de uma criança, dada mesmo antes que o feto complete sua evolução, graças aos métodos atuais de investigação ultrassonográfica, é que seja “menino” ou “menina”. Significantes que indicam não apenas uma diferença anatômica, mas o pertencimento a um de dois grupos identitários carregados de significações imaginárias. É assim que, entre outras coisas, foi tatuado em cada um de nós que somos “homem” ou “mulher” sem que nossa passagem pelo mundo seja acompanhada de nenhum manual de instruções que dê conta do ajuste entre este “ser homem” ou “ser mulher” e a ínfima singularidade de nosso desejo.

Maria Rita Kehl, nascida em Campinas, é uma psicanalista, jornalista, ensaísta, poetisa, cronista e crítica literária. Em 2010, venceu o Prêmio Jabuti de Literatura na categoria “Educação, Psicologia e Psicanálise” com o livro: O Tempo e o Cão - A Atualidade das Depressões e recebeu o Prêmio Direitos Humanos do governo federal na categoria “Mídia e Direitos Humanos”. Neta do escritor eugenista Renato Kehl (cf. Góes, 2015), formou-se em Psicologia pela Universidade de São Paulo, começou a escrever para o Jornal do Bairro enquanto ainda cursava a graduação. Fez parte do periódico por dois anos, na época dirigido por Raduan Nassar. Foi editora do noticioso Movimento, um dos mais importantes nomes do jornalismo alternativo durante o regime militar no Brasil, ao lado do Opinião e d’O Pasquim. Maria Rita também teve participação na fundação do jornal Em Tempo e já escreveu como jornalista freelancer para veículos de comunicação como Veja, Isto É e Folha de S. Paulo. Em 1979, cursou mestrado em Psicologia Social e elaborou a dissertação, intitulada: O Papel da Rede Globo e das Novelas da Globo em Domesticar o Brasil Durante a Ditadura Militar, de repercussão na área da comunicação. Em 1981, começou a atender pacientes diretamente e, desde então, não parou. Em 1997, concluiu o doutorado em Psicanálise pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,  com uma pesquisa que resultou no livro Deslocamentos do Feminino - A Mulher Freudiana na Passagem para a Modernidade (Imago Editora, 1998). Possui nove livros publicados. É psicanalista de membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).  Em 2012, foi convidada a integrar a Comissão Nacional da Verdade, instalada em 16 de maio daquele mesmo ano, para apurar as violações aos Direitos Humanos ocorridas no período entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988.

O vetor da pulsão, segundo Kehl, representa o objeto do desejo, os ideais, as identificações que vão fazer de cada um de nós não “homem” ou “mulher”, mas este homem ou esta mulher, podem estar disponíveis no campo simbólico, mas não estão organizados para cada um de nós. Essa concepção de sujeito, embora fundada em Ferdinand de Saussure e Jacques Lacan, questiona o modelo rigorosamente estruturalista do psiquismo: a possibilidade de cada analisando constituir, em final de análise, uma “estilística da existência” implica necessariamente a criação de novas perspectivas narrativas. Em Freud, todo neurótico é um narrador de sua “novela familiar” eternamente repetida, cheia de certezas imaginárias que justificam e dão sentido ao sintoma. Mas, nas narrativas neuróticas, o sujeito antes é falado – pelo Outro, pelos pais, pela estrutura em que se encontra – do que fala. Tais narrativas devem dar lugar, ao longo de uma análise, a outro enredo: este, o analisando vai escrever sozinho, tendo como primeiro interlocutor (leitor?) seu analista. A direção de uma cura, na expressão de Lacan, passa não por uma modificação da estrutura da linguagem que o sujeito habita, mas por uma modificação de suas práticas falantes. Dominar (relativamente) nossas práticas linguageiras, em vez de sermos  alienados a elas, eis uma possibilidade de cura vislumbrada pela psicanálise.

Victor Gassion torna-se um jovem cavalariço com a tropa equestre Louis Dianta em Sevilha; aos 11 anos, foi escudeiro do circo Napoléon Rancy, onde se juntou às quadrilhas com o nome de Gassion de Falaise, depois ao circo Ciotti com o qual viajou para a França e Suíça, para garantir compromissos de trabalho em circos mais famosos como Plège ou Rancy, incidentalmente fazendo o halterofilista, “o auguste ou o ato de equilíbrio”. Seu pai Louis Gassion tornou-se comerciante de vinhos e fabricante de limonada em Vaugueux, Caen, na esquina das ruas Portes au berger e Chanoine Ruel. A família montou um bazar denominado “La Grande Charbonnerie du Calvados”, depois com o Cirque de l`Impératrice. Originalmente com o nome Cirque d`Été (Summer Circus), representava um teatro equestre parisiense e  uma espécie de hipódromo coberto construído em 1841, com projetos do arquiteto Jacques Hittorff.  Era a casa de veraneio do Théâtre Franconi, trupe equestre do Cirque Olympique, cuja licença é vendida em 1836 a Louis Dejean por Adolphe Franconi, neto do fundador, Antonio Franconi (1738-1836) um habilidoso cavaleiro italiano. Ele começou como malabarista, profissionalmente, médico, mas também organizando touradas em cidades prósperas como Lyon e Bordeaux.

Em 1783, ele se associou ao cavaleiro inglês Philip Astley, que abriu uma escola de equitação em Paris e fundou um teatro equestre chamado Cirque Olympique, que adquiriu uma reputação impressionante. Seus filhos e netos continuaram a atrair o público com o talento de seus escudeiros e a perfeição de seu carisma em suas fantasias e peças militares. O último escudeiro famoso com este nome foi Laurent Franconi, que morreu em 1849. Certa vez, Napoleão comentou acidamente com seu marechal Joachim Murat, que estava alegremente vestido com um extravagante uniforme polonês após a Batalha de Heilsberg em 1807, que ele se parecia com Franconi – “Vous avez l`air de Franconi”.  Mais tarde, o circo também foi usado para outros fins, incluindo grandes concertos regidos por Hector Berlioz. O novo teatro localizava-se no lado Nordeste do Rond-Point da Champs-Élysées. Inicialmente chamado de Cirque National, também ficou reconhecido como Cirque des Champs-Élysées e Cirque Olympique des Champs-Élysées. Em 1853 foi renomeado para Cirque de l`Impératrice, em homenagem à nova Imperatriz Eugénie, um nome que manteve até a queda do império em 1870. A guerra, que teve início em julho de 1870, gerando derrotas francesas. Em agosto, Napoleão III já havia sido capturado pelas tropas prussianas. Louis Jules Trochu (1815-1896) foi um general e político francês. Ocupou o cargo de primeiro-ministro da França, entre 4 de setembro de 1870 a 18 de fevereiro de 1871. Além disso, Louis Trochu tentou comandar um “front” aparentemente de resistência política de um governo provisório, mas Paris foi cercada brutalmente pelos prussianos em 19 de setembro.  

Louis Alphonse teria sete irmãs, duas das quais morreram na infância. Filho do baile, iniciou sua carreira como contorcionista no circo Ciotti, circo equestre de origem italiana onde seu pai trabalhava, primeiro com a família e depois como solista. É um homem baixinho de corpo esguio que legará à filha Edith: pesa quarenta e quatro quilos por um metro e cinquenta ou cinquenta e quatro, o que aliado à sua flexibilidade o deixa pronto para a contorção acrobática. Depois do circo Ciotti, passou a fazer turnês com os circos Rancy e Beautour. Em toda parte, ele é apresentado como o antípoda, o homem que anda de cabeça para baixo, por um lado. No dia 4 de setembro de 1914, em Sens Yonne, ele teria se beneficiado de uma licença de três dias para se casar com Annetta Maillard, cantora conhecida pelo nome de Line Marsa. Esta união é selada na direção da Prefeitura, e o ato de casamento preservada nos arquivos municipais indica que a cerimónia teve lugar em 10 horas e 30 minutos, em 4 de setembro, enquanto a luta da 1ª grande guerra grassa no leste da França e os alemães ameaçam Paris. O escrivão de plantão naquele dia era Alphonse Dupêchez, deputado do senador-prefeito de Sens, uma comuna francesa administrativa de Borgonha-Franco-Condado, Lucien Cornet, e filho de Sylvain Dupêchez, ilustre prefeito da cidade, de 1872 a 1879. 

A presença de Louis Gassion e Annetta Maillard em Sens é explicada pela incorporação de Louis, o 11 de agosto de 1914 no 89º Regimento de Infantaria. Nesse período, ele estava lotado no quartel de Gémeau, local posteriormente ocupado pela Academia Nacional de Polícia. Em seu livro Piaf, a verdade (2008), o biógrafo Emmanuel Bonini confirma que a mobilização da “segunda classe” Gassion é o único vínculo do casal com Sens: - “Eles se casaram lá durante uma licença de três dias, então estavam domiciliados em Paris, rue du Château des Pensioners no XIIIº distrito. O autor acrescenta que “as quatro testemunhas do casamento - um tipógrafo de Vendôme, um gravador parisiense, um fazendeiro da comuna de Wissous e um vendedor de Savigny-sur-Orge, foram certamente todas mobilizadas em Sens, antes de se juntarem à frente”. Com sua esposa, ele tem uma filha, nascida em 19 de dezembro de 1915, Édith, a futura Edith Piaf, que confiou por volta dos dois anos à sua mãe Louise Léontine em Bernay na Normandia, Titine, que mal amava o filho, porque a sua mulher não tinha fibra materna e tem dificuldade em cuidar do filho. Eles também têm um filho: Herbert Gassion nascido em 31 de agosto de 1918 em Marselha e falecido em 22 de janeiro de 1997 em Clichy. 

Em 1922, Louis Gassion, que acabava de conseguir uma nomeação no circo Caroli, levou consigo a menina de 9 anos, para viver em seu trailer a vida de artistas de pequenos circos itinerantes. Com mão ágil e pouca ternura pela filha, ele coleciona amantes. Então Louis sai do circo, começa para eles a vida de artista de rua independente: é na frente de “espectadores de segunda mão” que Edith, ao lado do pai, canta pela primeira vez em público. Pai e filha hospedados várias vezes na pequena cidade de Garrison de Mourmelon-le-Grand uma comuna francesa na região administrativa do Grande Leste, no departamento de Marne, onde ficava o music hall “Alcazar”. O 4 de junho de 1929, ele se divorcia da mãe de Edith e, no ano seguinte, a garota de 15 anos deixa o pai para cantar um dueto na rua com a amiga Simone Berteaut, reconhecida como Momone. Em 1932, ele se casou novamente com Jeanne L`Hôte, com quem teve uma filha, Denise, nascida em 8 de março de 1931, meia-irmã de Édith Piaf. Louis Gassion morreu em Paris de câncer no pulmão em 1944. Sua filha Édith o enterrou no cofre da família de Père-Lachaise, onde já repousa sua filha Marcelle, falecida em 1935. 

Gassion nasceu em 10 de maio de 1881 em Falaise, departamento de Calvados, França, localizado na região da Normandia, filho de Victor Alphonse Gassion, era um cavaleiro do circo, e Louise Léontine (nascido Deschamps), a dona de um bordel em Bernay, na Normandia. Ele tinha sete irmãs, duas das quais morreram jovens. Iniciou a carreira com o circo Ciotti, tornando-se contorcionista-antipodista. Artista que tem um domínio grande sobre o seu corpo e é muito flexível. A princípio, ele se apresentava em família, depois, sozinho. Em 4 de setembro de 1914, se casou com Annetta Giovanna Maillard, cantora de café nascida na Itália reconhecida pelo nome artístico de Line Marsa. Em 19 de dezembro de 1915, ela deu à luz sua primeira filha, Édith Giovanna, que se tornaria Édith Piaf. Ele deixou Édith aos cuidados de sua mãe quando ela tinha dois anos, depois que Annetta e sua mãe Emma negligenciaram cuidados. Eles tiveram um segundo filho, Herbert (1918-1997). Em 1922, Louis iria se envolver no circo Caroli, mas decidiu se tornar ator independente, viajando com vários circos itinerantes. Louis fazia Édith cantar para a multidão depois que se apresentava. Foi quando ela percebeu seu talento para cantar. Em 4 de junho de 1929, Louis se divorciou de Annetta, “devido ao abuso de substâncias dela”. Em 1932, quando Édith partiu para morar com o namorado Louis Dupont e a amiga Simone Bertaut, casou-se com Jeanne Georgette L`Hôte, com quem teve uma terceira filha, Dénise, nascida em 1931. Gassion morreu de câncer em 3 de março de 1944 em Paris, aos 62 anos.

            Sem recursos financeiros e sozinho com a filha, Louis-Alphonse, o pai de Édith a deixou aos cuidados de sua avó materna, Emma Aïcha Saïd ben Mohammed (1876-1930), que era negligente com Édith, “batendo na menina, deixando-a sozinha em uma saleta com fome, e também não cuidava da sua higiene”. Ela ficou dezoito meses com a avó, mas quando o seu pai soube desta situação, decidiu levar a filha consigo, mas não pôde ficar com ela, pois precisou se alistar na armada francesa, para lutar na guerra mundial. Seu pai, mesmo relutando, levou-a para que ficasse com a avó paterna de Édith. Sua avó e as demais prostitutas cuidaram da pequena Édith, em especial a meretriz Titine, que a criou por três anos como sendo sua própria filha. Dos cinco aos seis anos, Édith ficou parcialmente cega, devido a uma queratite. De acordo com uma de suas biografias, ela curou-se depois de sua avó tê-la levado em uma viagem “até a cidade de Lisieux, para que Édith pudesse orar no túmulo de Santa Teresa de Lisieux”. O túmulo é um local popular de peregrinação francês, onde oram para agradecer ou pedir alguma bênção. Uma semana após esse episódio voltou a enxergar. Esse episódio a fez tornar-se uma católica fervorosa lendo a Bíblia, orando de joelhos com seu terço, e usando seu crucifixo. Por toda a vida, Édith Piaf conservou grande devoção à Santa Teresinha, a quem atribuía todas as suas conquistas na vida cotidiana.

            Teresa de Lisieux nascida de nome Marie-Françoise-Thérèse Martin (1873-1897), reconhecida como Santa Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face, foi uma freira carmelita descalça francesa, e um dos mais influentes modelos de santidade para católicos e religiosos em geral, por seu “jeito prático e simples de abordar a vida espiritual”. Juntamente com São Francisco de Assis, é uma das santas mais populares da história da Igreja. São Pio X chamou-a de “a maior entre os santos modernos”. Teresa recebeu cedo seu chamado para a vida religiosa e, depois de superar inúmeros obstáculos, conseguiu, em 1888, com apenas quinze anos, tornar-se freira para juntar-se às suas duas irmãs mais velhas na comunidade carmelita enclausurada em Lisieux, na Normandia. Depois de nove anos, tendo ocupado funções como sacristã e assistente da mestra das noviças, Teresa passou seus últimos dezoito meses numa “noite de fé” e morreu de tuberculose com apenas vinte e quatro anos de idade. O impacto de sua “A História de uma Alma”, uma coleção de seus manuscritos autobiográficos publicados e distribuídos um ano depois de sua morte foi tremendo e ela rapidamente tornou-se um dos santos mais populares do século XX. Pio XI fez dela a “estrela de seu pontificado”, beatificando-a em 1923 e canonizando-a dois anos depois. Teresa foi também declarada co-padroeira das missões com São Francisco Xavier em 1927 e nomeada co-padroeira da França com Santa Joana d`Arc) em 1944. Em 19 de outubro de 1997, João Paulo II proclamou Teresa a trigésima-terceira Doutora da Igreja, a pessoa mais jovem e a terceira mulher a ter recebido o título. Além de sua autobiografia, Teresa deixou também cartas, poemas, peças religiosas e orações. Suas últimas conversas foram também preservadas por suas irmãs. Pinturas e fotografias, a maioria de sua irmã Céline, ajudaram na popularidade por todo o mundo.

         O papa Pio X assinou o decreto autorizando a abertura do processo de canonização de Teresa em 10 de junho de 1914. Bento XV, para acelerá-lo sine ira et studio “dispensou os costumeiros cinquenta anos requeridos entre a morte e a beatificação”. Em 14 de agosto de 1921, ele próprio promulgou o decreto das virtudes heroicas de Teresa e discursou sobre o “caminho de confiança e amor” de Teresa, recomendando-o a toda a cristandade. Teresa foi beatificada em 29 de abril de 1923 e canonizada em 17 de maio de 1925 por Pio XI, apenas 27 anos depois de sua morte. Sua festa foi incluída no Calendário Geral Romano em 1927 na data de 3 de outubro. Em 1969, o papa Paulo VI moveu a festa para 1º de outubro, o dia de seu “nascimento celeste” (dies natalis). Ela é padroeira dos aviadores, floristas, dos doentes e das missões. É considerada também padroeira da Rússia pelos católicos, mas a Igreja Ortodoxa Russa não reconhece nem sua santidade e nem o padroado. Em 1927, Pio XI nomeou Teresa padroeira das missões e, em 1944, Pio XII proclamou-a co-padroeira da França com sua heroína de infância, Santa Joana d`Arc. Através da carta apostólica Divini Amoris Scientia (“A Ciência do Amor Divino”), de 19 de outubro de 1997, João Paulo II (1920-2005) proclamou Teresa uma Doutora da Igreja, melhor dizendo, mais uma das quatro mulheres a terem recebido a honra até então. As outras eram Santa Teresa de Ávila, Santa Catarina de Siena e Santa Hildegarda de Bingen. Em algumas biografias de Édith Piaf, em 1922, a cantora, uma criança desconhecida de sete anos - foi curada de uma cegueira depois peregrinar aoo túmulo de Santa Teresinha ainda não havia sido canonizada.

Em 1922, quando tinha sete anos seu pai conseguiu reunir condições financeiras para tirá-la da companhia da avó, contra a vontade de Édith, que sofreu ao separa-se de Titine, a que mais lhe dava afeto onde convivia. Seu pai levou-a para viverem juntos no circo itinerante em que ele trabalhava. A companhia circense viajava por toda a França. No circo, Édith apaixonou-se pelo mundo artístico e decidiu que queria ser artista como o pai. Porém, ele saiu do circo três anos depois devido a constantes desentendimentos com o patrão. Em 1925, ele voltou para Paris com a filha, e a matriculou numa escola pública pela manhã, já que Édith não pôde estudar no período que morou no circo, sempre em trânsito em uma cidade diferente. Seu pai passou a trabalhar por conta própria fazendo acrobacias nas ruas parisienses. Ao término das aulas, Édith acompanhava o pai nas suas apresentações, recolhendo o dinheiro, mas o público sempre questionava qual número circense a menina fazia. Édith ficava calada, pois não sabia qual era seu talento. Um dia, a menina de dez anos, que, tentando improvisar alguma apresentação, decidiu cantar o hino nacional francês, A Marselhesa, sendo muito aplaudida pelo pequeno público que se aglomerava. Vendo o talento da filha, ambos mantiveram esse trabalho nas ruas de Paris: Seu pai fazia performances acrobáticas e Édith cantava.

Aos 15 anos, ela e o pai iniciaram diversas brigas. Ele temia que a jovem tivesse o mesmo destino da mãe, não aceitando a vocação artística da filha, não querendo que ela tentasse ter uma carreira profissional como cantora e se frustrasse, queria lhe arrumar um casamento. Sem o pai saber, Édith já escrevia as suas primeiras canções, e quando não estava se apresentando nas ruas, fazia pequenas apresentações em estabelecimentos locais e ganhava um pouco de dinheiro. Desesperada, e querendo lutar por seus sonhos, Édith fugiu de casa, deixando uma carta de despedida para seu pai, indo viver em um quarto alugado, no Grand Hôtel de Clermont, na rua Veron, 18, em Paris. Nesta época começou a se apresentar publicamente em restaurantes e bares nos bairros nobres de Quartier Pigalle e Ménilmontant, e bairros pobres do subúrbio de Paris. Juntou-se à atriz iniciante, que frequentava suas apresentações, Simone Berteaut (1916-1975), apelidada de Mômone e as duas tornaram-se amigas inseparáveis, tendo ido morar juntas em um pequeno quarto no subúrbio parisiense, para dividir o aluguel. Após um ano que Édith havia saído de casa, e seu pai tentava convencê-la a voltar, o que ela não queria. Estava com 16 anos quando se apaixonou pela primeira vez, por Louis Dupont (1915-1965), um rapaz três anos mais velho, e entregador de pães, o seu primeiro namorado.         

Após três meses de namoro, ela deixou o quarto que vivia com sua amiga e foi morar no quarto alugado que Louis Dupont vivia sozinho. Inicialmente, ela o ajudava com as despesas cotidianas, pois ele não se opôs a sua profissão de cantora, embora Édith Piaf fosse alvo de preconceito por ser, contraditoriamente, na sociedade classista, uma mulher financeiramente independente. Aos 17 anos, em 11 de fevereiro de 1933, em Paris, Édith deu à luz de parto normal no mesmo hospital em que nasceu, a sua única filha, Marcelle Léontine Gassion Dupont. A partir daí, o seu casamento entrou em crise, pois o marido passou a humilhá-la e agredi-la, impedindo que ela voltasse a cantar. Quando sua filha fez um ano de vida, ela decidiu sair de casa. Não queria deixar a menina, mas sabia que a noite não era um lugar saudável para uma criança frequentar. Assim, com as economias que tinha, voltou a morar sozinha, embora mais distante, se escondendo de seu ex-marido. A filha adoeceu após a sua partida. Estabelecida, mesmo ainda com pouco dinheiro, Édith voltou seis meses depois para buscá-la, mas seu ex-marido não a deixou vê-la, e a justiça nada fez para ajudar a jovem artista a recuperar a menina, pois a forte censura conservadora, sendo contra os artistas, era a favor da falsa moralidade dos bons costumes. Impedida de ver sua filha e sofrendo muito, não pôde mais voltar a procurá-la.

Marcelle faleceu de meningite, com dois anos de idade, em 7 de julho de 1935, e foi enterrada no Cemitério do Père-Lachaise, onde posteriormente Édith também foi enterrada, ao lado de sua filha. A relação familiar conturbada de Édith com seu pai, que a artista voltou a procurar para uma reconciliação, porém sem êxito. As brigas com sua mãe, que reapareceu, mas só queria o dinheiro da cantora, aliado ao adoecimento e falecimento de sua única filha, causaram danos psicológicos profundos em Édith, que se culpava no momento, desenvolvendo uma profunda depressão, com diversas tentativas de suicídio. A cantora levou a dor imensurável da perda de sua filha até o fim de sua vida. O que levou a dedicar-se de corpo e alma a sua carreira, optando por nunca mais querer ter filhos. Após reencontrar sua amiga Mômone e voltarem a morar juntas, Édith começou a cantar em praças, boates, bares e também bordéis. Lá conheceu seu segundo namorado, um cafetão chamado Albert. A relação tornou-se abusiva com o tempo, onde ele passou a ameaçá-la: Em troca de não a forçar a se prostituir, “cobrava comissões sobre o dinheiro que ela ganhava cantando”. Ele passou a prendê-la no bordel, e impedir que ela cantasse em outros locais. Sua amiga tentou ajudar, mas a polícia sem formação, tratava cantoras como prostitutas. Após agressões, humilhações e abusos sexuais, conseguiu terminar definitivamente o relacionamento, quando fugiu do bordel, após descobrir que ele também era um assassino, e que uma colega que contavam na noite, chamada Nádia, cometeu suicídio, para não querer se tornar prostituta. Alguns autores sugerem que Hipócrates possa ter tido conhecimento da existência de meningite.

Alguns médicos pré-renascentistas, como Avicena, aparentam ter tido conhecimento do meningismo. A descrição da meningite tuberculosa, então denominada “hidropisia cerebral”, é geralmente atribuída ao médico escocês Sir Robert Whytt (1714-1766), tendo sido publicada num relatório póstumo revelado em 1768. No entanto, a associação da tuberculose com o seu patógeno só seria estabelecida no século seguinte. A meningite epidêmica aparenta ser um fenômeno relativamente recente na história da humanidade. A primeira grande epidemia documentada ocorreu em 1805 na cidade de Genebra. Nos anos seguintes foram descritas diversas epidemias na Europa e nos Estados Unidos. O primeiro relato de uma epidemia em África data de 1840. As epidemias no continente africano formam-se tornando muito mais comuns ao longo do século XX. Entre 1905 e 1908 ocorreu uma grande epidemia que varreu a Nigéria e o Gana. A primeira descrição da infeção bacteriana como causa subjacente da meningite foi feita pelo bacteriologista austríaco Anton Weichselbaum (1845-1920), que em 1887 descreveu o meningococo. Os primeiros relatórios da doença indicam que a mortalidade era muito elevada, com cerca de 90% dos pacientes a evoluir para morte. Em 1906, o cientista norte-americano Simon Flexner desenvolveu um antissoro produzido em cavalos que proporcionou uma diminuição acentuada da mortalidade da doença meningocócica. Em 1944 constatou-se que a penicilina era um fármaco eficaz no tratamento da meningite. Em finais do século XX, a introdução da vacina contra o Haemophilus influenzae do tipo B resultou numa queda acentuada nos casos de meningite associada a este patógeno.

Édith Piaf teve uma vida marcada por sofrimentos e tragédias, o que lhe rendeu uma série de biografias, criando diversas controvérsias e dúvidas acerca de alguns fatos reais de sua história. Devido a problemas de saúde, Piaf ficou cega com 3 anos de idade, recuperando a visão alguns anos mais tarde. No início da adolescência, Piaf passou a acompanhar o pai em algumas apresentações circenses. Aos 15 anos já cantava nas ruas de Paris, em cafés, feiras e praças. Neste período, apaixonou-se por um soldado da Legião Estrangeira, com quem teve uma filha, Marcelle, que morreu antes de completar dois anos de idade. Após tentar inutilmente mostrar seu trabalho a algumas gravadoras e editoras, foi descoberta por Louis Leplée, dono de um cabaré famoso. Foi ele quem a iniciou na vida artística e a batizou “Piaf” - passarinho. La vie en rose é uma canção francesa, que se tornou conhecida mundialmente na voz de Édith Piaf, considerada por muitos a maior cantora francesa de todos os tempos. Virou a canção-assinatura de Piaf após ter sido lançada em 1946 e fazer um estrondoso sucesso em todo o mundo. A letra foi escrita por Piaf em 1945 e a melodia por seu parceiro Louis Guglielmi. A sua versão single em discos, lançada em 1947, já vendeu milhões de cópias por todo o mundo, sendo sempre relançada em diversos discos da artista, como a favorita do público de Piaf. Reconhecida internacionalmente, Edith Piaf (1915-1963) se tornou um símbolo da canção francesa. Durante a 2ª guerra mundial (1939-1945), Edith Piaf era a cantora mais importante na França e apresentava-se para as tropas da França ocupada, muitas vezes acusada de traição pelos seus compatriotas. Além disso, ao que parece ela trabalhava como uma infiltrada da resistência francesa. Sua consagração aconteceu depois guerra, quando se tornou a musa de poetas e intelectuais da Paris existencialista e ganhou a admiração incondicional do público. Piaf voltou aos grandes cenários da França, da Europa e da América do Norte. 

Ficou amiga de Marlene Dietrich e se tornou a grande dama da canção francesa, ajudando talentos emergentes como Charles Aznavour, Georges Moustaki, Yves Montand e relacionando-se com intelectuais como Jean Cocteau. Em 1946, Piaf gravou a marcante canção La Vie en Rose, uma das músicas mais conhecidas do mundo. Após a morte do seu novo amor, Marcel Cerdán, devido a um acidente de avião, a cantora escreveu Hymne à l’Amour. Nos anos 1950, a dona de uma voz marcante conquistou uma projeção internacional e, enquanto tentava se livrar do vício na morfina, a cantora casou-se com o cantor Jacques Pills (1910-1970) e manteve relações amorosas com Charles Aznavour, um cantor francês de origem armênia, também letrista e ator, além de ser um dos mais populares e longevos cantores da França, ele foi também um dos cantores franceses mais reconhecidos no exterior e George Moustaki, nascido no Egito, de pais judeus gregos de Corfu, uma ilha grega do mar Jônico situada na costa da Albânia, de que é separada por estreitos variando em comprimento de 3 a 23 km, incluindo um perto de Butrint e outro perto de Tesprócia. A ilha é uma unidade regional da Grécia, pertencente a região das Ilhas Jônicas. Sua capital é a cidade de Corfu, a principal cidade da ilha, onde está a Universidade Jónica, ipso facto onde cresceu em um ambiente entre judeus, gregos, italianos, árabes, franceses e cedo se apaixonou pela literatura e pela canção francesas, particularmente por Édith Piaf. Transfere-se para Paris em 1951, onde trabalha como jornalista e depois barman em um piano-bar, o que o leva a personalidades, como Georges Brassens, que terá grande influência sobre sua carreira e de quem adota o nome. Em 1958, encontrará Édith Piaf. Para ela escreverá Milord e terá um rápido e intenso romance. Em 1974, em homenagem à Revolução dos Cravos, gravou a canção Portugal, versão do Fado Tropical de Chico Buarque e Ruy Guerra, composta dois anos antes para a peça Calabar.

Com o fim da segunda guerra, ela se tornou famosa no mundo todo e viajou a través da Europa, dos Estados Unidos e inclusive para a América do Sul. Na década do 1950 ficou ainda mais popular depois da sua aparição em programas de televisão como o show de Ed Sullivan, onde se apresentou por oito vezes e teve um impacto nunca antes visto no público da América. Dona de uma voz inconfundível, ficou famosa pelo modo quase teatral de interpretar suas músicas, como as clássicas La Vie en Rose (1946), de sua autoria e Non Je ne Regrette Rien (1956). Tornada clássica, La vie en rose já foi gravada por dezenas de cantores, inclusive uma versão do gênero fado em 1960, pela cantora portuguesa Amália Rodrigues, pop em 1977, na voz da cantora e atriz jamaicana Grace Jones, e depois usado na trilha sonora do filme Prêt-à-Porter, de 1994, que se passa durante a temporada das coleções de moda em Paris, mesclando o enredo com cenas reais dos desfiles e de seus bastidores. O filme, que tem a participação de dezenas de atores e atrizes em pequenos papéis, também conta com a presença de diversas celebridades do mundo da moda, como modelos e designers famosos em imagens reais. Robert Altman faz uma radiografia crítica e satírica do hedonismo, egocentrismo e futilidade existente no universo da moda. Aparece também no filme O Senhor das Armas em 2005, com Nicolas Cage no elenco. Em 1998, a canção deu título ao documentário feito sobre a vida de Édith Piaf e entrou para o Hall da Fama do Prêmio Grammy. Em novembro de 2003, foi gravada pela cantora Cyndi Lauper, em seu álbum de regravações clássicas At Last. No Filme Wall-E, 2008, é interpretada na voz de Louis Armstrong com a versão da música em inglês, que tinha sido escrita em 1950 por ele. Na série How I Met Your Mother, a personagem Tracy McConnell canta a versão realizada pelo extraordinário Louis Armstrong (1901-1971). No Filme A Star Is Born (2018), a personagem Ally interpretada pela fascinante Lady Gaga, canta a canção num bar drag queens no momento em que o seu personagem reconhece o par romântico.

Bibliografia geral consultada.

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