sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Analítica do Poder & Vigilância - Cinema & Dispositivos da Crítica.

Ubiracy de Souza Braga

      O poder possui uma eficácia produtiva, uma riqueza estratégica”. Michel Foucault

      
             
            No estudo da relação entre genealogia e poder, observava Michel Foucault que a primeira característica do que ocorria de forma nebulosa dizia respeito ao caráter local da crítica, uma espécie de produção teórica autônoma, não centralizada, isto é, que não tem necessidade, para estabelecer sua validade, da concordância de um sistema comum. Esta crítica local se efetuou através do que se poderia chamar de “retorno do saber”. Em um caso como no outro, no saber da erudição como naquele desqualificado, nestas duas formas de saber sepultado ou dominado, se tratava na realidade de saber histórico da luta. Nos domínios especializados da erudição como nos saberes desqualificados das pessoas jazia a memória dos combates, exatamente aquela que até então havia sido subordinada. Delineou-se o que se poderia chamar uma genealogia, ou, pesquisas genealógicas múltiplas: a redescoberta exata das lutas e memória bruta dos combates. E esta genealogia, como acoplamento do saber acadêmico e do saber das pessoas, só será possível se for eliminada a tirania dos colegiados (cf. Mitzman, 1976), com suas hierarquias e os privilégios de sua posição que permeia o discurso religioso/científico em saberes regionais.  
           Trata-se de ativar saberes, descontínuos, desqualificados, não legitimados, contra a instância teórica unitária que pretenderia depurá-los, hierarquiza-los, ordená-los em nome de um conhecimento verdadeiro, em nome dos direitos de uma concepção de ciência detida por alguns. insurreição dos saberes não tanto contra os conteúdos, os métodos e os conceitos de uma ciência, mas de uma insurreição dos saberes antes de tudo contra os efeitos de poder centralizadores que estão ligados à instituição e ao funcionamento de um discurso científico organizado no interior da sociedade. Pouco importa que esta institucionalização do discurso científico se realize em uma universidade ou, de modo mais geral, em um aparelho político com todas as suas aferências, pois são os efeitos de poder próprios a um discurso considerado como científico que a genealogia deve combater, seja diante do processo de gentrificação do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, objeto de pesquisa de pós-doutoramento em curso em análise comparada da degradação do Centro Poliesportivo da Universidade Estadual do Ceará. Não se trata de estudos de caso, mas com a pesquisa efetiva, torna-los capazes de oposição e de luta contra a coerção de um discurso teórico, unitário, formal e científico. Poderíamos lançar o desafio: - “Tentem colonizar-nos”. 
         A burocracia moderna engendrou o intelectual específico nas universidades públicas, através das atividades regulares necessárias aos objetivos da estrutura governada burocraticamente, que por sua vez são distribuídas de forma fixa como deveres oficiais que contém uma orientação, mas podem mudar de forma e sentido. A autoridade de dar ordens necessárias à execução desses deveres oficiais se distribui de forma estável, sendo rigorosamente delimitada pelas normas relacionadas com os meios de trabalho e de coerção, físicos, sacerdotais ou outros, que possam ser colocados à disposição dos funcionários ou autoridades. O princípio da autoridade hierárquica de cargo encontra-se em todas as organizações burocráticas. Não importa, para o caráter da burocracia, que sua autoridade seja compreendida como privada ou pública. É o que tenta demonstrar,  de forma hilária, o escritor gaúcho Luís Fernando Veríssimo em uma série de ensaios temáticos. Quando o cargo está plenamente desenvolvido, a atividade oficial exige a plena capacidade de trabalho do funcionário, a despeito do fato de ser rigorosamente delimitado o tempo de permanência na repartição, que lhe é exigido. O desempenho do cargo segue regras gerais, mais ou menos estáveis, mais ou menos exaustivas, e que podem ser apreendidas. O conhecimento dessas regras representa um aprendizado técnico especial, a que se submetem esses funcionários. Envolve jurisprudência, ou administração pública e privada. A redução do cargo a regras está profundamente arraigada à sua própria natureza.

                 

 
O funcionário se prepara para uma carreira por concurso público, o que não impede que ocorra por determinado tempo a vigilância hierárquica para o cargo no serviço público. Foi esse tipo específico de poder que Michel Foucault chamou de “disciplina” ou “poder disciplinar”. E é justamente esse aspecto que explica o fato de que tem como alvo o corpo humano, não para supliciá-lo, mutilá-lo, mas para aprimorá-lo, adestra-lo. O que lhe interessa não é expulsar os homens da vida social, impedir o exercício de suas atividades, e sim gerir a vida dos homens, controla-los em suas ações para que seja possível e viável utilizá-los ao máximo, aproveitando suas potencialidades e utilizando um sistema de aperfeiçoamento gradual e contínuo de suas capacidades. É um objetivo ao mesmo tempo econômico e político: aumento do efeito de seu trabalho, isto é, tornar os homens força de trabalho dando-lhes uma utilidade econômica máxima; diminuição de sua capacidade de revolta, de resistência, de luta, de insurreição contra as ordens do poder, neutralização dos efeitos sociais de contrapoder, isto é, tornar os homens dóceis politicamente. 
A teoria da moderna administração pública, sustenta que a autoridade para ordenar certos assuntos através decretos não dá à repartição o direito de regular o assunto através de normas expelidas em cada caso, mas na prática, converte-se em relações através dos privilégios individuais e concessão de favores, que domina de forma absoluta as relações entre indivíduos no âmbito do patrimonialismoA ocupação de um cargo é  profissionalização ou estágio, com a exigência de um treinamento rígido, que demanda toda a capacidade de trabalho durante um longo período de tempo e nos exames especiais que, em geral, são pré-requisitos para o emprego. A posição de um funcionário tem a natureza de um dever, sendo a lealdade dedicada a finalidades impessoais e funcionais. Sua posição social é assegurada pelas normas que se referem à hierarquia ocupada. A posse de diplomas educacionais está habitualmente ligada à qualificação técnica para o cargo. O tipo puro sociológico de funcionário burocrático é nomeado por uma autoridade superior. Mas uma autoridade eleita pelos governados não é como tal, uma figura exclusivamente burocrática. A nomeação independe dos estatutos legais, mas da forma pela qual funciona o sistema. Em todas as circunstâncias, a designação de funcionários por meio de uma eleição entre os governados modifica o rigor da subordinação hierárquica. 

Aumentar a utilidade econômica e diminuir os inconvenientes, os perigos políticos; aumentar a força econômica e diminuir expressivamente a sua força política. Situemos as suas características básicas. Em primeiro lugar, a disciplina é um tipo de organização do espaço. É uma técnica de distribuição dos indivíduos através da inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. Isola em um espaço fechado, esquadrinhado, hierarquizado, capaz de desempenhar funções diferentes segundo o objetivo específico que deles se exige. Mas, como relações de poder disciplinar não necessitam de espaço fechado para se realizar, é essa sua característica menos importante. Em segundo lugar, e mais fundamentalmente, a disciplina é um controle do tempo. Isto é, ela estabelece uma sujeição do corpo ao tempo, com o objetivo de produzir o máximo de rapidez e o máximo de eficácia. Em terceiro lugar, a vigilância é um dos seus principais instrumentos de controle. Não uma vigilância que reconhecidamente se exerce de modo fragmentar e descontínuo; mas que é ou precisa ser vista pelos indivíduos que a ela estão expostos como forma contínua, perpétua, permanente; que não tenha limites, penetre nos lugares mais recônditos, esteja presente em toda extensão do espaço. 
Olhar invisível que permite impregnar quem é vigiado de tal modo que este adquira de si mesmo a visão panóptica de quem o olha. A disciplina implica um registro contínuo de conhecimento. O olhar que observa para controlar não é o mesmo que transfere as informações para os pontos mais altos da hierarquia do poder? Seu objetivo econômico e político é tornar o homem útil e dócil. A grande importância estratégica que as relações de poder disciplinar desempenham nas sociedades modernas depois do século XIX, vem justamente do fato delas não serem negativas. Mas positivas, quando tiramos desses termos qualquer juízo de valor moral ou político e pensarmos unicamente na tecnologia empregada. É então, que, segundo Foucault, surge uma das teses fundamentais da genealogia: “o poder é produtor de individualidade”. O indivíduo é uma produção do poder e do saber. Atuando sobre uma massa confusa, desordenada e desordeira, o esquadrinhamento disciplinar faz nascer uma multiplicidade ordenada no seio da qual o indivíduo emerge como alvo do poder. O nascimento da prisão em fins do século XVIII, não representou uma massificação com relação ao modo como anteriormente se era encarcerado. O nascimento do hospício não destruiu a especificidade da loucura. É o hospício, ao contrário, que produz o louco como doente mental. Um personagem individualizado a partir das relações disciplinares.
E antes da constituição das ciências humanas, no século XIX, a organização das paróquias, a institucionalização do exame de consciência e da direção espiritual e a reorganização do sacramento da confissão, que aparecem como importantes dispositivos de individualização. Em suma, o poder disciplinar não destrói o indivíduo; ao contrário, ele o fabrica. O indivíduo não é o outro do poder, realidade exterior, que é por ele anulado; é um de seus mais importes efeitos. O objetivo é neutralizar a ideia que faz da ciência um conhecimento em que o sujeito vence as limitações reais ou imaginárias de suas condições particulares de existência instalando-se na neutralidade objetiva do universal e da ideologia um conhecimento em que o sujeito tem sua relação com a verdade perturbada, obscurecida, velada pelas condições reais de existência. Todo conhecimento, seja ele científico ou ideológico, só pode existir a partir de condições políticas que são as condições para que se formem tanto o sujeito quanto os domínios do saber. A investigação do saber não deve remeter a um sujeito de conhecimento que seria a sua origem, mas a relações de poder que lhe constituem. Não há saber neutro. Todo saber é político.

 E isso não porque cai nas malhas do Estado, é apropriado por ele, que dele se serve como instrumento de dominação, descaracterizando seu núcleo essencial. Mas porque todo saber tem sua gênese em relações de poder. O fundamental da análise teórica é que saber e poder se implicam mutuamente; não há relação de poder sem constituição de um campo de saber, como também, reciprocamente, todo saber constitui novas relações de poder. Todo ponto de exercício do poder é, ao mesmo tempo, um lugar de formação de saber. É assim que o hospital não é apenas local de cura, mas também instrumento de produção, acúmulo e transmissão de saber. Do mesmo modo que a escola está na origem da pedagogia, a prisão da criminologia, o hospício da psiquiatria. Mas a relação ainda é mais intrínseca: é o saber enquanto tal que se encontra dotado estatutariamente, institucionalmente, de determinado poder. O saber funciona dotado de poder. E enquanto é saber tem poder. A configuração do que Foucault denomina de “intelectual específico” se desenvolveu na 2ª grande guerra, e talvez o físico atômico tenha sido quem fez a articulação entre intelectual universal e intelectual específico. É uma relação direta e localizada com a instituição e o saber que o físico atômico intervinha; mas já que a ameaça atômica concernia todo o gênero humano e o destino do mundo, seu discurso podia ser ao mesmo tempo o discurso do universal.
Sob a proteção deste protesto que dizia respeito a todos, o cientista atômico desenvolveu uma posição específica na ordem do saber. E admite Foucault, pela primeira vez o intelectual foi perseguido pelo poder político, não mais em função do seu discurso geral, mas por causa do saber que detinha: é neste nível que ele se constituía como um perigo político. Mas o intelectual específico deriva de uma figura muito pobre e diversa do “jurista-notável”. O “cientista-perito”. O importante é que a verdade não existe fora do poder ou sem poder. A verdade é deste mundo, produzida nele graças a múltiplas coerções que produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de verdade, seus tipos de discursos que faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados, sob nosso olhar, para a obtenção da verdade. Quem está de fora do poder, mas tem a capacidade analítica de interpretar o estatuto que delimita o seu campo de saber, percebe os efeitos de poder do que funciona como verdadeiro.  É preciso repensar os problemas políticos dos intelectuais não mais em termos exclusivos da relação entre ciência e ideologia, mas sem abandoná-la, tendo em vista que a universidade pública é um domínio de casta, “a forma natural pela qual costumam socializarem-se as comunidades étnicas que creem no parentesco de sangue com os membros de comunidades exteriores e o relacionamento social.

Essa situação de casta é parte do fenômeno de povos párias e se encontra em todo o mundo” (cf. Weber, 1982; pp. 449-470), a análise pode ser religada na medida em que a questão da profissionalização do intelectual, da divisão entre trabalho manual e intelectual, na esfera pública pode ser retomada. A verdade está circularmente ligada a sistemas de poder que a produzem e apoiam, e a efeitos de poder que ela induz e a reproduzem. Ipso facto, o problema político essencial para o intelectual não é apenas criticar os conteúdos ideológicos que privilegiam grupos no sistema educacional que estariam ligados à ciência ou fazer com que sua prática científica seja acompanhada por métodos de inclusão democráticos. O que está em jogo num sistema de castas, que tomou o poder na universidade pública  nos últimos 20 anos, é se podemos constituir uma nova arena política da verdade. Mas não se trata de libertar a verdade do sistema de poder, mas de desvincular o poder da verdade das formas com as quais ele legitima suas formas de saber. A genealogia exige a minúcia do saber, evidenciando um grande número de materiais acumulados.
Na universidade estes materiais se esgueiram como sombras. Fazer a genealogia dos valores, da moral, do ascetismo, do conhecimento não será, portanto, partir em busca do que lhe é originário, mas ao contrário, se demorar nas meticulosidades e nos acasos dos projetos interrompidos pelos predecessores, prestar uma atenção escrupulosa à sua derrisória maldade; esperar vê-los surgir, máscaras enfim retiradas, com o rosto do outro, num trabalho de escavação incessante no campus, nos arquivos, sem deixar-lhes o tempo emascular o labirinto onde nenhuma verdade as manteve jamais sob a guarda. É preciso saber reconhecer os acontecimentos da história, seus abalos, suas surpresas, as vacilantes vitórias, as derrotas mal digeridas que dão conta dos atavismos e das hereditariedades. A história, com suas intensidades, seus desfalecimentos, seus furores secretos, suas grandes agitações febris como suas síncopes, é o próprio corpo do devir. É preciso ter um espírito metafísico para encontrar na alma a idealidade distinta. A pesquisa da proveniência não funda, muito pelo contrário: ela agita o que se percebia imóvel, ela fragmenta o que se pensava unido; ela mostra a heterogeneidade do que se imaginava em conformidade consigo mesmo. Façamos a análise genealógica dem sua atenção “desinteressada”, em sua ligação à objetividade.

Longe de ser uma categoria de semelhança, tal origem permite ordenar, para coloca-las a parte, todas as marcas diferentes. O genealogista parte em busca do começo, esta marca quase apagada que não saberia enganar um olho, por pouco histórico que seja; a análise da proveniência permite dissocia o Eu e fazer pulular lugares e recantos de sua síntese vazia, entre acontecimentos aparentemente perdidos. A proveniência permite também reencontrar sob o aspecto único de um caráter ou de um conceito a proliferação dos acontecimentos através dos quais eles se formaram. Metodologicamente a genealogia não pretende recuar no tempo para restabelecer uma grande continuidade para além da dispersão do esquecimento; sua tarefa não é a de mostrar que o passado ainda está lá, bem vivo no presente, animando-o ainda em segredo, depois de ter imposto a todos os obstáculos do percurso uma forma delineada desde o início. Seguir o filão complexo da proveniência é, ao contrário, manter o que se passou na dispersão que lhe é própria: é demarcar os acidentes, os ínfimos desvios, os erros, as falhas na apreciação, os maus cálculos que deram nascimento ao que existe e tem valor para nós; é descobrir que na raiz daquilo que nós conhecemos e daquilo que nós somos – não existem a verdade e o ser, mas a exterioridade do acidente. Na universidade basta o que ficou da gestão passada para compreendermos o presente. Na vã política em geral e particularmente na gestão acadêmica o passado nos condena. 
A cena pública da verdade é sempre a mesma em que repetem indefinidamente os dominadores e os dominados. Homens dominam outros homens e é assim que nasce a diferença de valores; classes dominam classes e é assim que nasce a ideia de liberdade, homens se apoderam de coisas das quais eles têm necessidade para viver, eles lhes impõem uma duração que elas não têm, ou eles as assimilam pela força – e é o nascimento da lógica. Nem a relação de dominação é mais uma relação, nem o lugar onde ela se exerce é um lugar. E é por isto precisamente que em cada momento da história a dominação se fixa em um ritual; ela impõe obrigações e direitos; ela constitui cuidadosos procedimentos. Ela estabelece marcas, grava lembranças e até nos corpos; ela se torna responsável pelas dívidas. Universo de regras que não é destinado a adoçar, mas ao contrário a satisfazer a violência. A regra é o prazer calculado da obstinação, é o sangue prometido. Ela permite reativar sem cessar o jogo da dominação; ela põe em cena uma violência meticulosamente repetida. A humanidade não progride lenta de combate em combate, ela instala cada uma de suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim num processo ad infinitum de dominação em dominação. É justamente a regra que permite que seja feita a violência à violência e que uma outra dominação possa dobrar aqueles que dominam. Em si mesmas as regras são vazias, violentas, não finalizadas; elas são feitas para servir a isto ou aquilo; elas podem ser burladas ao sabor da vontade de uns e outros. 
O grande jogo da história será, segundo Foucault, de quem se apoderar das regras, de quem tomar o lugar daqueles que as utilizam, de quem se disfarçar para perverte-las, utilizá-las ao inverso e volta-las contra aqueles  que as tinham imposto; de quem, se introduzindo no aparelho complexo, o fizer funcionar de tal modo que os dominadores encontrar-se-ão dominados por suas próprias regras. As diferenças emergenciais que se podem demarcar não são figuras sucessivas de uma mesma significação; são efeitos de substituição, reposição e deslocamento, conquistas disfarçadas, inversões sistemáticas. Se interpretar eras colocar lentamente em foco uma significação oculta na origem, apenas a metafísica poderia interpretar o devir da humanidade. Mas se interpretar é se apoderar por violência ou sub-repção, de um sistema de regras que não tem em si significado essencial, e lhe impor uma direção, dobrá-lo a uma nova vontade, fazê-lo entrar noutro jogo e submetê-lo a novas regras, então o devir da humanidade é uma série de interpretações. E a genealogia dever ser a sua história: história das morais (lei Maria da Penha), dos ideais (uma universidade de verdade), dos conceitos metafísicos, história do conceito de liberdade ou da vida ascética, como emergências de interpretações diferentes. Trata-se de fazê-las aparecer como acontecimentos reais no teatro dos procedimentos.
Mas a demagogia deve ser hipócrita. Na história social da universidade pública os edifícios que estão sendo construídos na entrada da Universidade Estadual do Ceará e mesmo do novo prédio da reitoria, esconde a perversidade com que foi tratado o Centro Poliesportivo da instituição, seguindo a tradição fascista na política brasileira de desconstrução do legado de gestão anterior. É um aspecto extremamente negativo, mas agora bisado pela gestão dos colegiados de curso que apoiam a corrupção nesta gestão. Mas a corrupção administrativa não para neste episódio. Há o envolvimento de pró-reitores da gestão (e negação) de documentos de afastamento de pesquisadores em projetos de pesquisa de pós-doutoramentos, mesmo os que ocorrem no mesmo estado na Universidade Federal do Ceará, deixando claro o assédio moral de “pareceristas”, enfim, da pró-reitoria de pós-graduação e pesquisa da instituição. O genealogista sabe o que é necessário pensar desta história mascarada. Não que ele a rechace por espírito de seriedade; ele quer leva-la ao extremo: porque quer por em cena um grande carnaval (cf. DaMatta, 1981) do tempo em que as máscaras reapareçam incessantemente.   
Não queremos perder de vista que a disciplina é, antes de tudo, a análise do espaço. É a individualização pelo espaço, a inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. A disciplina exerce seu controle, não sobre o resultado de uma ação, mas sobre seu desenvolvimento. No século XVII, nas oficinas de tipo corporativo, o que se exigia do companheiro ou do mestre era que fabricasse um produto com determinadas qualidades. A maneira de fabricá-lo dependia da transmissão de geração em geração. Do mesmo modo, se ensinava o soldado a lutar, a ser mais forte do que o adversário na luta individual da batalha. A partir do século XVIII, se desenvolve uma arte do corpo humano. Observa-se de que maneira os gestos são feitos, qual o mais eficaz, rápido e melhor ajustado. Nas oficinas aparece o famoso e sinistro personagem do contramestre, destinado não só a observar se o trabalho foi feito, mas como é feito, como pode ser mais rapidamente realizado e com gestos melhor adaptados. O famoso Regulamento da Infantaria Prussiana, que assegurou as vitórias de Frederico da Prússia, consiste em mecanismos de gestão disciplinar dos corpos.  
A disciplina é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos. Não basta olhá-los às vezes ou ver se o que o que fizeram é conforme à regra. É preciso vigiá-los durante todo o tempo da atividade e submetê-los a uma perpétua “pirâmide de olhares”. Mas a disciplina implica um registro contínuo. Anotação do indivíduo e transferência da informação de baixo para cima, de modo que, no cume da pirâmide disciplinar escape a esse saber. No sistema clássico o exercício do poder era confuso, global e descontínuo, do soberano sobre grupos constituídos por famílias, cidades, paróquias, isto é, por unidades globais, e não um poder contínuo atuando sobre o indivíduo. A disciplina é o conjunto de técnicas pelas quais os sistemas de poder vão ter por alvo e resultado os indivíduos em sua singularidade. O exame é a vigilância permanente, classificatória, que permite distribuir os indivíduos, julgá-los, medi-los, localizá-los e, por conseguinte, utilizá-los ao máximo. Através do exame, a individualidade torna-se um elemento de uso pertinente para o exercício do poder.

A invenção dessa nova anatomia política não deve ser entendida como uma descoberta súbita. Mas como uma multiplicidade de processos muitas vezes mínimos, de origens diferentes, de localizações esparsas, que se recordam, se repetem, ou se imitam, apoiam-se uns sobre os outros, distinguem-se segundo seu campo de aplicação, entram em convergência e esboçam aos poucos a fachada de um presunçoso método geral. Não se trata de fazer aqui a história das diversas instituições disciplinares no que podem ter cada uma de singular: 1) ambas, neste caso, são instituições públicas gerenciadas por uma casta no poder (cf. Weber, 1982; Dumont, 1992); 2) Existe uma série de exemplos de algumas das técnicas essenciais empregadas que, de uma a outra, se generalizaram mais facilmente. Pequenas astúcias dotadas de um grande poder de difusão, arranjos sutis, de aparência inocente, mas profundamente suspeitos, são dispositivos que obedecem a economias inconfessáveis, ou que procuram coerções sem grandeza (assédio moral), são eles, entretanto que levaram à mutação do regime punitivo contemporâneo; 3) Descrevê-los metodicamente, nominalmente, implicará a demora sobre o detalhe da corrupção do pensamento e a atenção às minúcias: para procurar entender não um sentido, mas uma precaução; recoloca-las não apenas na solidariedade de um funcionamento, mas na coerência de uma tática; 4) Astúcias, não tanto de grande razão que trabalha até durante o sono, no sentido freudiano, e dá coerência ao insignificante quando da atenta malevolência que de tudo alimenta. 
A disciplina é uma anatomia política do detalhe. O que nos interessa é a racionalização utilitária do detalhe na contabilidade moral e no controle político. A regra das localizações funcionais vai pouco a pouco codificar um espaço que a arquitetura deixava geralmente  livre e pronto para vários usos. Lugares determinados se definem para satisfazer não só à necessidade de vigiar, de romper as comunicações perigosas, mas também de criar um espaço útil. Temos assim, um dispositivo que asfixia e quadricula; tem que realizar uma apropriação sobre toda essa mobilidade e esse formigar humano, decompondo a confusão da ilegalidade e do mal. Essa gente, através do impedimento de elementos intercambiáveis, conquistados a duras penas, quer através da vigilância e punição, da prevaricação e do ressentimento acadêmico, quer individualizar corpos por uma localização que não os implanta, mas os distribui e os faz circular numa série de relações. O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e a sua combinação num procedimento que lhe é específico. A vigilância se torna um operador decisivo, na medida em que é ao mesmo tempo uma peça interna no aparelho de produção e uma engrenagem especial do poder disciplinar.    
A arte de punir, no regime de poder disciplinar, não visa nem a expiação, nem mesmo exatamente a repressão. Põe em funcionamento cinco operações bem distintas: relacionar os atos, os desempenhos, os comportamentos singulares a um conjunto, que é ao mesmo tempo campos de comparação, espaço de diferenciação e princípio de uma regra a seguir. Diferenciar os indivíduos em relação usn aos outros e em função dessa regra de conjunto – que se deve fazer funcionar como base mínima, como média a respeitar ou como o ótimo de que se deve chegar perto. Medir em termos quantitativos e hierarquizar em termos de valor as capacidades, o nível, a natureza humana dos indivíduos. Fazer funcionar, através dessa medida valorizadora negativamente, a coação de uma conformidade a realizar. E por último, traçar o limite que definirá a diferença em relação a todas as diferenças, a fronteira externa do “anormal”. A penalidade que atravessa todos os pontos e controla todos os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza, homogeniza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza.  Bibliografia geral consultada.

DUMONT, Louis, Homo Hierarchicus. O Sistema de Castas e suas Implicações. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992; KEHL, Maria Rita, Ressentimento. São Paulo: Editor Casa do Psicólogo, 2007; HEGEL, Friedrich, Fenomenologia do Espírito. 4ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2007;  FOUCAULT, Michel, Arqueologia do Saber. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 1971; Idem, El Orden del Discurso. Barcelona: Ediciones Tusquets, 1973; Idem, Hermeneutica del Sujeto. Madrid: Ediciones de la Piqueta, 1987; Idem, Nietzsche, Marx, Freud. Buenos Aires: Ediciones Anagrama, 2010; Idem, Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão. 42ª edição. Petrópolis (RJ): Editoras Vozes, 2014; CHAUI, Marilena, “Carta Aberta de Chauí: Vigiar e Punir Foucault?”. In: https://outraspalavras.net/25/06/2015BACH, Augusto, Michel Foucault e a História Arqueológica. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia e Metodologia das Ciências. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2016; RODRIGUES, Alexandre Amaral, Ambiçao e Prudência: Os Sistemas Econômicos de Adam Smith. Tese de Doutorado. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017; RAGO, Margareth; GALLO, Sílvio, Michel Foucault e as Insurreições. É Inútil Revoltar-se. São Paulo: Editora Intermeios, 2017; FOUCAULT, Michel; BENEDETTI, Ivone Castilho, Malfazer, Dizer Verdadeiro. São Paulo: Editora WMF; Martins Fontes, 2018; PEREIRA, Karoline Machado Freire, Governamentalidade, Vigilância e Heterotopia na Sociedade Banóptica: Análise Discursiva de Propagandas de Condomínios Residenciais Fechados da Alphaville Urbanismo. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Linguística. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba, 2019; MELCHIOR, Stela Candioto, Vigilância Pós-Comercialização de Produtos para Saúde, Questões sobre Organização, Gestão e Implantação no Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz, 2020;  entre  outros.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Um Dia Lindo Na Vizinhança – Cultura Ocidental & Razão Observadora.

                                                                     “Essa morada é para si a noite da substância”. Friedrich Hegel                                

                   

         O indivíduo privatista é o mesmo que pensa ser justificada a existência do espaço público apenas na medida em que satisfaz os interesses dos indivíduos privados. O mesmo indivíduo que tolera, admite e recomenda a privatização da vida pública em que seus representantes aparentemente se constituam em modelos de probidade. Na esfera pública da cidadania, comparativamente, não obstante, quase sempre confunde princípios políticos com metas econômicas e está disposto a abrir mão da aparente moralidade e pudor quando um representante demonstra ser um bom administrador. O mesmo que exige probidade moral e pública e desrespeita as regras mínimas da convivenciabilidade em nome da satisfação de interesses privados. A distorção entre o campo social e o político decorre da moderna concepção da sociedade, a qual encara a política como um espaço de regulação da esfera privada. Arendt defendia um conceito de pluralismo no âmbito político. Graças ao pluralismo, o potencial de uma liberdade e igualdade política seria gerado entre as pessoas. O que significa o juízo? Organização e subsunção do individual e particular ao geral e universal, procedendo-se então a uma avaliação ordenada com a aplicação de parâmetros pelos quais se identifica o concreto e de acordo com decisões. 

           Por trás de todos esses juízos há um prejulgamento, um preconceito. Somente o caso individual é julgado, não o próprio parâmetro ou a questão de ele ser ou não uma medida adequada do objeto que está sendo medido. Num dado momento, emitiu-se um juízo sobre o parâmetro, mas agora esse juízo foi adotado, tornando-se, por assim dizer, um meio para se emitirem futuros juízos. Mas juízo pode significar algo totalmente diferente e sempre significa de fato quando nos confrontamos com algo que nunca vimos e para o que não temos nenhum parâmetro à disposição. Esse juízo que não conhece parâmetro só pode recorrer à evidência do que está sendo julgado, e seu único pré-requisito é a faculdade de julgar, o que tem muito mais a ver com a capacidade de discernir do que com a capacidade de organizar e subordinar. Tais juízos sem parâmetros nos são bastante familiares quando se trata de questões de estética e gosto, que, como observou Immanuel Kant, não se podem discutir, mas de que se pode, seguramente, discordar e concordar. Na vida cotidiana, como sabemos isso se verifica “em face de uma situação desconhecida, que fulano ou beltrano fez um juízo correto ou equivocado”.

Melhor dizendo, em toda crise histórica, são os preconceitos os primeiros a se esboroar e deixar de ser confiáveis, ipso facto, é essa pretensão de universalidade que distingue muito claramente ideologia de preconceito (sempre parcial por natureza). A ideologia afirma peremptoriamente que não devemos mais nos fiar em preconceitos - declarados como literalmente inapropriados. A falta de padrões no mundo moderno - a impossibilidade de formar novos juízos sobre o que aconteceu e o que acontece todos os dias com base em padrões sólidos, reconhecidos por todos, e de subsumir esses eventos a princípios gerais bem conhecidos, assim como a dificuldade estreitamente associada, de se proverem princípios de ação para o que deve acontecer agora, tem sido frequentemente descrita como niilismo inerente à nossa época, como desvalorização de valores, uma espécie de “crepúsculo dos deuses”, para lembramos de Nietzsche, uma catástrofe na ordem moral do mundo. Todas essas interpretações pressupõem tacitamente que só se pode esperar dos seres humanos juízos se tiverem parâmetros, que a faculdade de julgar não é, mais do que a habilidade de consignar casos individuais aos seus lugares corretos e adequados dentro de princípios gerais aplicáveis e sobre os quais estão todos de acordo.

                                    


O ponto de partida para a constituição do sujeito é o desejo, mas não um desejo dirigido a uma coisa qualquer no mundo. O homem se torna humano quando “deseja outro desejo”. Abre-se assim, ao homem, um novo espaço de liberdade, que se manifesta antes de tudo como um desejo de reconhecimento e produz uma luta de morte por puro prestígio – o ato fundante da história, o ato antropogênico por excelência. Mas para que haja história, é preciso que haja relação social entre homens vivos. A luta não pode terminar com a aniquilação de um dos lados. Um deles, provavelmente, deve abdicar do combate, colocar a liberdade acima de sua vida, fora da relação entre “senhor-escravo”. Nela se concentrando outra atividade essencial ao projeto do homem: o trabalho intelectual como princípio de liberdade. A dialeticidade que assim se estabelece é um dos pontos culminantes do pensamento humano em todas as épocas, e sua conclusão é surpreendente e magistral: o homem integral, livre, satisfeito com o que é; o homem que se aperfeiçoa, não é o senhor nem o escravo, mas o que consegue suprimir sua sujeição. Na linguagem teórica entendemos que as palavras e expressões funcionam como representação, mas em sua periodização histórica as palavras e expressões funcionam sempre de forma distinta, porque se referem a concepção pontual de uma teoria da história.

 A dificuldade própria da terminologia teórica consiste, pois, neste sentido em que, por detrás do significado usual da palavra, é preciso sempre discernir o seu significado conceptual, que é sempre diferente do significado usual empírico e casual contido na representação das fontes, nas atas, nos documentos oficiais etc. Na sua significação mais geral deve nos permitir a compreensão histórica e sociológica que tem por efeito social o conhecimento de um objeto: a narrativa da história. É assim que a história abstrata ou a história em geral não existem, no sentido exato do termo, mas apenas a história real, ou “como efetivamente ocorreu, desses objetos que enformam a experiência acumulada da humanidade. A determinação mais simples e primeira que o espírito pode estabelecer é o Eu, a faculdade de poder abstrair todas as coisas, até sua própria vida. Chama-se idealização esta supressão da exterioridade. O espírito não se detém na apropriação, transformação e dissolução da matéria em sua universalidade, mas, enquanto consciência religiosa, por sua faculdade representativa, penetra e se eleva através da aparência dos seres até esse poder divino, uno, infinito, que conjunta e anima interiormente todas as coisas, enquanto pensamento filosófico, isto é, como seu princípio universal, a ideia eterna que as engendra e nelas se manifesta. Portanto, que o espírito finito dialeticamente segue um passo a passo e se encontra inicialmente numa união imediata com a natureza.

A seguir em oposição com esta e finalmente em identidade com esta, porque suprimiu/subsumiu a oposição e voltou a si mesmo e, per se, o espírito finito é a ideia, que girou sobre si mesma e que existe por si em sua realidade. Todo conhecer, todo aprender, toda visão, toda ciência, inclusive toda atividade prática, não possui nenhum outro interesse além do aquilo que “é em si”, no interior, manifestar-se desde si mesmo, produzir-se, transformar-se objetivamente. Nesta diferença se descobre toda a diferença na história do mundo. Os homens são todos racionais. O formal desta racionalidade é que o homem seja livre. Esta é a sua natureza. Isto pertence à essência do homem. O europeu sabe de si, é objeto de si mesmo. A determinação que ele conhece é a liberdade. Ele se conhece a si mesmo como livre. O homem considera a liberdade como sua substância. Se os homens “falam mal de conhecer é porque não sabem o que fazem”. Conhecer-se, converter-se a si mesmo no objeto (do conhecer próprio) e o fazem relativamente poucos. Mas o homem é livre somente se sabe que o é. Pode-se também em geral falar mal do saber, como se quiser. Mas somente este saber libera o homem. O conhecer-se é no espírito a existência. Esta é a única diferença da existência (Existenz), a diferença do separável. O Eu é livre em si, mas também por si mesmo é livre e eu sou livre somente enquanto existo como livre.

Um Lindo Dia na Vizinhança tem como representação social um filme biográfico dramático norte-americano de 2019 sobre o apresentador de TV Fred Rogers, dirigido por Marielle Heller e escrito por Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster, inspirado no artigo de 1998 “Você Pode Dizer... Herói?” de Tom Junod, publicado na Esquire. É estrelado por Tom Hanks, Matthew Rhys, Susan Kelechi Watson e Chris Cooper. O filme retrata Lloyd Vogel (Rhys), um jornalista problemático da Esquire que é designado para escrever um perfil do ícone da televisão Fred Rogers (Hanks). O filme estreou no Festival Internacional de Cinema de Toronto em 7 de setembro de 2019 e foi lançado nos cinemas dos Estados Unidos da América em 22 de novembro de 2019 pela Sony Pictures Releasing. Arrecadou US$ 68 milhões no mundo globalizado. Os críticos elogiaram as atuações de Tom Hanks e Matthew Rhys, a direção de Heller e as mensagens comoventes. Foi escolhido pela revista Time como um dos dez melhores filmes do ano. Por sua atuação, Hanks foi indicado a Melhor Ator Coadjuvante no Oscar, bem como no Globo de Ouro, Critics` Choice, Screen Actors Guild Awards e BAFTA Awards, entre outros.

           O filme começa com uma refilmagem da sequência de abertura de Mister Rogers` Neighborhood. Fred Rogers mostra ao seu público televisivo um painel com retratos de alguns de seus amigos, incluindo o Rei Friday e o Sr. McFeely. Em seguida, ele apresenta um novo amigo, Lloyd Vogel, que, segundo ele, foi magoado e está tendo dificuldades para perdoar a pessoa que o feriu. Lloyd, jornalista da revista Esquire reconhecido por sua escrita cínica, reluta em ir ao terceiro casamento de sua irmã Lorraine porque seu pai, Jerry, com quem não tem contato há anos, estará presente. No entanto, ele comparece com sua esposa, Andrea, e o filho recém-nascido, Gavin. Quando Jerry faz um comentário insensível sobre a falecida mãe de Lloyd, Lila (a quem ele traiu e abandonou quando ela estava morrendo de câncer vinte anos antes), Lloyd fica furioso e dá um soco no pai, iniciando uma briga caótica na qual outro convidado quebra o nariz de Lloyd. A editora de Lloyd, Ellen, o designa para entrevistar Rogers nos estúdios da WQED em Pittsburgh para um artigo de 400 palavras sobre heróis. Lloyd sente que a tarefa é indigna dele, mas é informado de que nenhum dos outros heróis estava disposto a falar com ele devido à sua reputação. Ao conhecer Lloyd, Rogers se mostra indiferente à sua fama e demonstra principalmente preocupação com o ferimento no nariz de Lloyd.                  

         A história técnica e social da televisão começou no início do século XX por meio de experimentos realizados por diferentes inventores sociais de seu tempo. Seu desenvolvimento se deu graças a uma série de outros avanços tecnológicos que se estendiam desde o século XIX. Na véspera da 1ª grande guerra (1914-1918) foi prometido ao patriarca Shimun XIX Benyamin (1887-1918) um “tratamento preferencial em antecipação à guerra”. Pouco depois do início da guerra, no entanto, assentamentos assírios e armênios ao Norte de Hakkari foram atacados e saqueados por irregulares curdos aliados ao exército otomano no genocídio assírio. Outros foram forçados a trabalhar em batalhões e posteriormente executados. O ponto de virada foi quando o irmão do patriarca foi feito prisioneiro enquanto estudava em Constantinopla. Os otomanos exigiram a neutralidade assíria e o executaram como advertência. Em troca, o patriarca declarou guerra aos otomanos em 10 de abril de 1915. Os assírios foram atacados por irregulares curdos apoiados pelos otomanos, levando a maioria dos assírios de Hakkari aos cumes das montanhas, pois aqueles que ficaram em suas aldeias foram mortos. Shimun Benjamin conseguiu mover-se despercebido para Urmia, que estava sob controle russo, e tentou persuadi-los a enviar uma força de socorro aos assírios sitiados. Quando os russos responderam que o pedido não era razoável, ele retornou a Hakkari e liderou os 50 mil assírios sobreviventes através das montanhas para a Urmia. Milhares morreram de frio e fome durante esta marcha.

Em 1924, a Turquia expulsou os últimos habitantes cristãos da região. Para turquificar a população local, em junho de 1927 foi aprovada a Lei 1164 que permitiu a criação de Inspetorias-Gerais (Umumi Müffetişlik). A província, portanto, foi incluída na chamada Primeira Inspetoria Geral, que abrange as províncias de Hakkâri, Siirt, Van, Mardin, Bitlis, Sanlıurfa, Elaziğ e Diyarbakır. A primeira (Umumi Müffetişlik) UM foi criada em 1º de janeiro de 1928 e centrada em Diyarbakır. A UM era regida por um Inspetor Geral, que governou com ampla autoridade sobre assuntos civis, jurídicos e militares. O escritório do Inspetor Geral foi dissolvido em 1952 durante o governo do Partido Democrata. Historicamente o Hakkari ainda era proibido para cidadãos estrangeiros até 1965. A região Olağanüstü Hâl Bölge Valiliği representou “uma super-região política criada na Turquia sob a legislação do estado de emergência, como parte inclusiva ao conflito social curdo-turco”. A partir de 1994, a super-região foi reduzido, as províncias rebaixadas para a “província vizinha” e depois removidas.                   

Com persuasão, Lloyd admite alguns dos problemas com seu pai, cujo pedido de desculpas e tentativa de reconciliação Lloyd rejeitou. Rogers conta a ele suas maneiras de lidar com a raiva, incluindo bater nas teclas de um piano. Enquanto Lloyd acompanha Rogers em uma visita a Nova York, ele o provoca com várias perguntas pessoais para expor a persona amigável de Rogers como uma farsa. Rogers esquiva-se da maioria das perguntas, mas aceita gentilmente a sugestão de Lloyd de que seus filhos podem ter tido algumas dificuldades na infância devido ao pai trabalhar demais. Usando seus fantoches, ele gentilmente incentiva Lloyd a compartilhar suas memórias de infância, levando Lloyd a se lembrar de um coelho de pelúcia que ele tinha. Lloyd encerra a entrevista quando Rogers começa a perguntar sobre seu pai. Mais tarde, ele volta para casa e encontra Andrea almoçando com Jerry, junto com sua nova esposa, Dorothy, o que leva a um tenso confronto entre pai e filho. Lloyd se recusa a aceitar que Jerry mudou, ainda ressentido por ele ter deixado sua mãe. Durante a discussão, Jerry sofre um ataque cardíaco e é levado para o hospital. Atordoado e buscando o conselho de Rogers, Lloyd abandona o pai, apesar das objeções de Andrea, e para Pittsburgh, interrompendo a gravação do “Mister Rogers` Neighborhood” ao desmaiar no estúdio.

Ele se imagina em um episódio da série, onde Rogers e Andrea (como Lady Aberlin) o encorajam a se abrir sobre sua tristeza. Em seguida, ele tem uma visão de sua mãe, que lhe diz que ele não precisa ficar com raiva em nome dela. Rogers e sua esposa Joanne levam Lloyd para casa para que ele se recupere. Rogers encoraja Lloyd a pensar nas pessoas que o amaram e o criaram, incluindo Jerry, e o incentiva a perdoá-lo. Lloyd volta para casa e pede desculpas a Andrea por tê-la deixado com Gavin no hospital, e visita Jerry e Dorothy em sua casa. Ele descobre que Jerry está morrendo de estenose cardíaca, daí suas tentativas de se reconectar com ele. Lloyd perdoa Jerry, prometendo ser um pai melhor. Mais tarde, Lorraine, seu marido Todd e Rogers visitam Jerry. Jerry morre pouco depois da visita, e o artigo de 10.000 palavras de Lloyd, “Can You Say... Hero?”, é publicado como matéria de capa da Esquire. Em seu estúdio, Rogers finaliza o episódio sobre Lloyd, mostrando a última foto em seu mural, que retrata Lloyd felizmente reunido com sua família. Ele se despede de sua audiência televisiva e as filmagens terminam. Enquanto a equipe se retira, Rogers permanece no estúdio, tocando piano sozinho. Ele para brevemente, toca algumas teclas para relaxar e retoma a música.

Em 29 de janeiro de 2018, foi anunciado que a TriStar Pictures, da Sony, havia adquirido os direitos de distribuição mundial do filme You Are My Friend, uma cinebiografia baseada em um artigo de 1998 da revista Esquire sobre o apresentador de televisão Fred Rogers, que seria interpretado por Tom Hanks. O roteiro de Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster figurou na Black List de 2013, lista dos melhores roteiros não produzidos. A direção seria de Marielle Heller; a produção ficaria a cargo de Marc Turtletaub e Peter Saraf, da Big Beach, juntamente com Youree Henley. Em julho de 2018, Matthew Rhys assinou contrato social de trabalho para interpretar o jornalista Lloyd Vogel, com a produção prevista para começar em setembro de 2018. Sendo galês, Rhys nunca tinha ouvido falar de Fred Rogers antes de lhe ser oferecido o papel. Em agosto de 2018, Chris Cooper foi adicionado ao elenco para interpretar o pai de Vogel; e em setembro, Susan Kelechi Watson foi adicionada. Em outubro de 2018, Enrico Colantoni, Maryann Plunkett, Tammy Blanchard, Wendy Makken, Sakina Jaffrey, Carmen Cusack, Harpster e Maddie Corman juntaram-se ao elenco. Em 2018, Nate Heller foi escolhido para compor a trilha sonora do filme. A diretora de cinema Marielle Heller afirmou publicamente que “o filme não era uma cinebiografia”, pois abordava a vida de Fred Rogers de forma mais limitada, concentrando-se principalmente em sua “filosofia e prática”.     

Heller afirmou que um documentário recente, na verdade, se aproximava mais de uma cinebiografia sobre Rogers. As filmagens principais começaram em 10 de setembro de 2018, em Pittsburgh, com vários cenários convertidos para representar a cidade de Nova York. As filmagens também ocorreram no Fred Rogers Studio da WQED (TV), onde o falecido apresentador de televisão gravava o programa Mister Rogers` Neighborhood, e no Centro Comunitário Judaico em Squirrel Hill. A equipe consultou membros da equipe original da série de televisão de Rogers e trouxe as mesmas câmeras e monitores usados ​​na produção fílmica original. O filme recebeu créditos fiscais de aproximadamente US$ 9,5 milhões, contra um orçamento de produção de US$ 45 milhões, para filmagens em Pittsburgh. A produção foi concluída em 9 de novembro de 2018. Em 12 de outubro de 2018, o técnico de som James Emswiller sofreu um ataque cardíaco e caiu de uma varanda do segundo andar enquanto estava no set de filmagem em Mt. Lebanon. Ele foi levado para o University of Pittsburgh Medical Center - Mercy, onde foi declarado morto. Um Lindo Dia na Vizinhança estreou no Festival Internacional de Cinema de Toronto em 7 de setembro de 2019. Originalmente, seria lançado em 18 de outubro de 2019 pela Sony Pictures Releasing, mas em maio de 2018, foi anunciado que o lançamento seria adiado em um mês, provvelmente para 22 de novembro de 2019.

Um Lindo Dia na Vizinhança arrecadou US$ 61,7 milhões nos Estados Unidos e Canadá e US$ 6,7 milhões em outros territórios, totalizando US$ 68,4 milhões em todo o mundo, contra um orçamento de produção de US$ 25 milhões. Nos Estados Unidos e no Canadá, foi lançado juntamente com Frozen 2 e 21 Bridges, e a previsão era de que arrecadasse cerca de US$ 15 milhões em 3.231 cinemas no fim de semana de estreia. Arrecadou US$ 4,5 milhões no primeiro dia, incluindo US$ 900.000 das pré-estreias de quinta-feira à noite. Estreou com US$ 13,3 milhões, terminando em terceiro lugar nas bilheterias. Caiu apenas 11% no segundo fim de semana, arrecadando US$ 11,8 milhões e terminando em quinto lugar, e permaneceu em quinto lugar no fim de semana seguinte com US$ 5,2 milhões. Tom Hanks foi elogiado pela crítica por sua atuação como Fred Rogers. No site agregador de críticas Rotten Tomatoes, o filme tem uma aprovação de 95% com base referenciada em 372 críticas, com uma classificação média de 8/10. O consenso crítico do site afirma o seguinte: “Assim como a amada personalidade da TV que o inspirou, Um Lindo Dia na Vizinhança oferece uma mensagem poderosa e comovente sobre aceitação e compreensão”. No Metacritic, o filme tem uma pontuação média ponderada de 80 em 100 percentual, com base em 50 críticas, indicando avaliações “geralmente favoráveis”. O público pesquisado pelo CinemaScore deu ao filme uma nota média de “A” em uma escala de A+ a F, enquanto o público do PostTrak deu uma média de quatro estrelas em cinco, com 66% dizendo que definitivamente o recomendariam.

Não só na sociologia, mas no conjunto das ciências socais, encontram-se as mais diversas explicações sobre como e por que se da a mudança, a evolução, o progresso, o desenvolvimento, a modernização, a crise, a recessão, o golpe de classe, a reforma, a revolução. Para explicar as transformações sociais, em sentido amplo, o sociólogo, antropólogo, economista, politólogo, psicólogo, historiador e outros têm buscado causas, condições, tendências, fatores, indicadores, variáveis, e assim por diante. Ao analisar as condições de formação, funcionamento, reprodução, generalização, mudança e crise do capitalismo globalizado, os cientistas sociais têm proposto explicações que nem sempre se excluem. Em umas implicam outras, ou as englobam. Em primeiro lugar, uma interpretação que se generalizou bastante, desde os arquétipos comparados da Revolução Industrial, estabelece que o progresso econômico é o resultado da “criatividade empresarial”. Toda mudança, inovação ou modernização econômica substantiva tende a consumar a capacidade de criação e liderança de empresários imaginosos, inventivos ou mesmo lúdicos, capazes de articular e dinamizar os fatores da produção preexistentes e novos. Essa interpretação tem os seus principais enunciados nos escritos de economistas clássicos, seus discípulos e continuadores no século XIX e XX. Historicamente os valores sociais relacionados aos self-made man ao tycoon, ao capitão de indústria, ao pioneirismo social, à identidade entre propriedade privada, livre empresa e sociedade aberta, ligam-se à tese de que a criatividade humana é a base do progresso capitalista global.

  A trivialização do conhecimento não faz produto do conhecimento apenas um produto determinado, faz também dele um produto qualquer. Mas as ideias podem tornar-se ideológicas na medida em que sua estrutura socialmente obedece às estruturas socioprofissionais, sua produção integra-se entre os outros processos de produção e a cultura torna-se cognoscível a partir das categorias econômicas do capital e do mercado. Mas nem a informação, nem a teoria, nem o pensamento abstrato, nem a cultura são produtos triviais, ainda que mais não seja pelo fato de serem, ao mesmo tempo, produtos/produtores e, mesmo comportando hologramaticamente a dimensão socioeconômica, não poderiam ser reduzidas a isso. A redução trivializante não teme exercer-se como sujeito sobre o conhecimento científico. Este nível abstrato como qualquer outro é apropriado pelo pensamento, como a religião e através da ciência, com suas relações de força e monopólios, suas lutas e suas estratégias, seus interesses e seus ganhos. Mas, por seu lado, os estudos de etnografias dos laboratórios, estes que parecem ter dinamismo, demonstram-nos como se estabelecem essas mediações dos pesquisadores, em função de posições, ou status, as lutas e a utilização de alguns truques diabólicos pelo reconhecimento per se, pelo prestígio ou pela glória, com as negociações necessárias ao estabelecimento de uma prova, os ritos de passagem na pesquisa e na universidade. A motivação primeira do cientista é a notoriedade.

Mas não se pode reduzir o interesse científico ao interesse econômico, a vontade de pesquisar ao desejo de prestígio, a sede de conhecimento à sede de poder, em alguns casos terrenos sim. A sociologia não pode ser considerada uma concepção que exclui o indivíduo ou que, no máximo, o tolera. É uma concepção humanista, mas que deve implicá-lo e explicitá-lo. Sobre a aquisição do conhecimento pesa um formidável determinismo. Ele nos impõe o que se precisa conhecer, como se deve conhecer, o que não se pode conhecer. Comanda, proíbe, traça os rumos, estabelece os limites, ergue cercas de arame farpado e conduz-nos ao ponto onde devemos ir. E também que conjunto prodigioso de determinações sociais, culturais e históricas é necessário para o nascimento da menor ideia, da menor teoria. Não bastaria limitarmo-nos a essas determinações que pesam do exterior sobre o conhecimento. É necessário considerar, também, os determinismos intrínsecos ao conhecimento, que são, segundo Edgar Morin, muito mais implacáveis. Em primeiro lugar, princípios iniciais, comandam esquemas e modelos explicativos, os quais impõem uma visão de mundo e das coisas que se governam/e controlam de modo imperativo e proibitivo a lógica dos discursos, pensamentos, teorias. Ao organizar os paradigmas e modelos explicativos associa-se o determinismo dos sistemas de convicção e de crença que, quando reinam em uma sociedade, impõem a todos a força imperativa do sagrado, a força normalizadora do dogma, a força proibitiva do tabu. As doutrinas e ideologias dominantes dispõem também da força imperativa e coercitiva que evidencia aos convictos e o temor inibitório aos desalmados.

A partir deste fundamento, compreendemos que ordem, desordem e organização são elementos essenciais para o entendimento da questão da complexidade, pois se desintegram e se desorganizam ao mesmo tempo. Nesse entendimento, constata-se que o sentido da realidade se dá por meio da relação do todo com as partes e vice e versa em uma análise integradora em que não é pertinente examinar o fenômeno a partir de uma única matriz de racionalidade. A desordem torna-se indispensável para a organização social da vida humana, pois a sociedade é dependente de acontecimentos/fatos que possam modificar a ordem já estabelecida para gerar novos meios de organização entre os sujeitos. Há um imprinting cultural, matriz que estrutura o conformismo, e há uma normalização que o impõe. O imprinting é um termo que Konrad Lorentz propôs para dar conta da marca incontornável pelas primeiras experiências do jovem animal, como o passarinho que, ao sair do ovo, segue como se fosse sua mãe, o primeiro ser vivo ao seu alcance. Há um imprinting cultural que marcam os humanos, desde o nascimento, com o selo da cultura, primeiro familiar e depois da escola, prosseguindo na universidade ou na profissão. Contrário à orgulhosa pretensão dos intelectuais e cientistas, o conformismo cognitivo não é de modo algum uma marca de subcultura que afeta per se as camadas fundamentalmene subalternas. Os subcultivados sofrem um imprinting e uma normalização atenuados e, nesta dimensão social há mais opiniões pessoais diante do balcão de café do que num coquetel literário.

Embora contrariados em contradição com seu desenvolvimento liberal intelectual que permite a expressão de desvios e de ideias e formas escandalosas, o imprinting e a normalização crescem paralelamente com a aquisição real da cultura. O imprinting cultural determina à desatenção seletiva, que nos faz desconsiderar tudo aquilo que não concorde com as nossas crenças, e o recalque eliminatório, que nos faz recusar toda informação inadequada às nossas convicções, ou toda objeção vinda de fonte técnica considerada ruim. A normalização manifesta-se de maneira repressiva ou intimidatória. Cala os que teriam a tentação de duvidar ou de contestar. A normalização, portanto, com seus subaspectos de conformismo, exerce uma prevenção contra o desvio e elimina-o, se ele se manifesta. Mantém, impõe a norma do que é importante, válido, inadmissível, verdadeiro, errôneo, imbecil, perverso. Indica os limites a não ultrapassar. As palavras que não devem proferir. Os conceitos a desdenhar, as teorias a desprezar. O imprinting assimila a perpetuação dos modos de conhecimento e verdades estabelecidas. Obedece a processos de tribunais: uma cultura produz modos de conhecimento entre os homens dessa própria cultura. Através do seu modo de conhecimento, reproduzem a legitimidade que produz esse conhecimento. As crenças que se impõem são fortalecidas pela fé que as suscitaram. Então, reproduzem não somente os conhecimentos, mas as estruturas e os modos reguladores que determinam a invariância desses conhecimentos.  

A liberdade intelectual não pode ser vista apenas como determinada possibilidade de expressão. É uma noção que se torna necessário sociologizar, culturalizar, complexificar, termodinamizar. Está ligada a um contexto cultural pluralista, dialógico, conflitual agitado. Necessita não apenas das condições que se tornam, de fato, permissivas, mas, também das condições dinâmicas irradiadas pelas crises, turbulências, conflitos nas ideias e visões de mundo. Comparativamente, como ocorre no mundo físico, a termodinâmica do mundo das ideias só é fecunda, produtiva ou criadora entre certos patamares, os quais não podem ser determinados a priori. Aquém desses limiares, não há “efervescência cultural” e, além, a turbulência torna-se dispersiva ou explosiva. Não se pode determinar uma temperatura intelectual ideal, ainda mais que não há nenhum termômetro ad hoc. Mas, para concordarmos com Edgar Morin, assim como a verdadeira vida do pensamento realiza-se na temperatura cotidianamente de sua própria destruição, a verdadeira vida de uma efervescência cultural desenrola-se quase na temperatura de sua própria ebulição. Neste sentido, não queremos perde de vista se podemos conceber o complexo das liberdades, então podemos compreender que a cultura enquanto representação seja tanto libertação quanto prisão para o conhecimento ou o pensamento.                              

A cultura aprisiona-nos no seu etno-sócio-centrismo, seu hic et nunc, nos seus imperativos categóricos e proibições, nas suas normas e normalizações, nas suas limitações e encobrimentos, nos seus artigos de fé e também de desconfiança, nas suas verdades e nos seus erros. Mas, ao mesmo tempo, a cultura oferece-nos uma linguagem, um saber, uma memória, um processo comunicativo, uma possibilidade de trocas linguísticas, verificações e refutações. Quando comporta em si a pluralidade dialógica e a abertura para as outras culturas e os outros saberes exteriores, oferece-nos as condições e possibilidades de emanciparmos relativamente das suas limitações e dissimulações. Com o desenvolvimento da cultura crescem, naturalmente, o artificial e o frívolo na esfera do pensamento; além de pequenos imprinting locais e sofísticos multiplicam-se em outros tantos diaforismos e trissotinadas; um “alto cretinismo” instala-se nas esferas superiores; a proliferação da abstração e da matematização mascara o real concreto ou mesmo de análise, que deviam traduzir, mas, ao mesmo tempo crescem e multiplicam-se as brechas que permitem as autonomias e as liberdades, as possibilidades de acesso aos problemas essenciais e universais, mesmo se, sob a pressão das frivolidades culturais e dos “altos cretinismos”, usado para descrever uma pessoa de pouca inteligência e lunática, os problemas decisivos permanecem confinados a uma minoria tola, medíocre, desviante. 

Bibliografia Geral Consultada.

TOURAINE, Alain, La Produzione della Società. Bolonha: Il Mulino, 1973; LASCH, Christopher, A Cultura do Narcisismo: A Vida numa Era de Esperança em Declínio. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1983; DEBUS, Allen George, El Hombre y la Naturaleza en el Renacimiento. México: Fondo de Cultura Económica, 1996; HALE, John, La Civilisation de L´Europe à la Ranaissance. Sarthe-France: Éditions Perrin, 2003; BOUNANNO, Milly, L’Etat della Télévisione. Esperienze e Teorie. Roma: Edizionne Laterza, 2006; ALLEGRO, Luís Guilherme Vieira, A Reabilitação dos Afetos: Uma Incursão no Pensamento Complexo de Edgar Morin. Dissertação de Mestrado. Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2007; MORIN, Edgar, O Método 4 – As Ideias. 4ª edição. Porto Alegre: Editora Sulina, 2008; CARVALHO, Marçal Luis Ribeiro, A Questão Punitiva na Pós-modernidade: Desafios Contemporâneos à Luz da Ética da Alteridade. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2010; IANNI, Octavio, A Sociologia e o Mundo Moderno. 1ª edição. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2011; FREITAS, Francisco Augusto Canal, Habitar o Hábito: Reflexão e Origem da Cidade no Pensamento de Walter Benjamin. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2012; ABREU e LIMA, Fellipe de Andrade, A Ideia de Cidade no Renascimento. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2012; HELIODORA, Barbara, Shakespeare: O Que As Peças Contam. Rio de Janeiro: Edições de Janeiro, 2014; POSTONE, Moishe, Tempo, Trabalho e Dominação Social. São Paulo: Boitempo Editorial, 2015; AFTEL, Mandy, Essência e Alquimia. Belo Horizonte: Editor Laszlo, 2020; entre outros.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

A Questão do Operaísmo, Vida Nervosa & Dinâmica da Luta de Classes.

                                                                                                                           Ubiracy de Souza Braga
                                                                                                     
                                                                      Vincere, che brutta parola”. Mario Tronti

           
          A identidade exige vigilância. Para um olhar que individualiza as referencias é uma categoria vinculada á identidade pessoal. A percepção de que as unidades ou sujeitos da significação são construídos levando em conta a realidade biopsicológica, apenas para subordiná-la aos mais bem elaborados caprichos das culturas é fundamental para compreendermos o investimento simbólico e seus condicionamentos sociais.  Nervosismo pertence a um grupo de variações em torno do termo nervos, que cresceu e se generalizou na linguagem erudita e leiga no decorrer do século XIX. A palavra originalmente era de uso corrente e de apropriação da medicina filosófica clássica.  Tendo sofrido alteração relativamente brusca com a consolidação da representação do “sistema nervoso”, em meados do século XVIII. De elemento físico, entre outros da estrutura corporal animal, passaram os nervos a concentrar dimensões imaginárias fundamentais para a nova concepção de sujeito humano característica da modernidade.
            De elemento físico, entre outros aspectos da estrutura corporal animal, passaram os nervos a concentrar dimensões imaginárias individuais e coletivas fundamentais para a concepção de sujeito que enuncia. A característica de ser constituído de modo universalmente idêntico garantia que, simultaneamente processo de trabalho e forma social de comunicação fosse empiricamente fundada e tendente ao acordo geral. Esse modelo desenvolveu-se em formas culturais de grande importância, compondo um conjunto de práticas e saberes sociais que Duarte (2010) nomeou de “configuração nervosa” e que paulatinamente ocupou o lugar analítico de configuração anterior, de longa história, que se pode resumir sob o rótulo de humoral ou melancólica. Algumas das características prístinas da nova configuração foram sendo moduladas durante o século XIX, quando começaram a se confrontar com o modelo comparativo da configuração psicológica, embora continuem persistindo nitidamente e presentes nos desenvolvimentos mais recentes no âmbito das práticas neurológicas e psiquiátricas.
     Ponto nevrálgico dessas modulações consistiu na progressiva subversão do universalismo igualitário original por sucessivas teorias da diferença nervosa – a mais importante das quais afetou certamente a representação do gênero feminino (Fortunati, 2016). A teoria da degeneração construiu-se sobre um conjunto de critérios de diferenciação de raça, gênero, comportamento e civilização, e consolidou uma via de interpretação do humano que se tornaria onipresente da segunda metade do século XIX até a 2ª guerra mundial. Sua consolidação ocorre em paralelo com as preocupações atinentes à relação do corpo humano com o ambiente e da nutrição animal derivou-se essas preocupações, assim como saberes que vieram a se consolidar nas rubricas do sanitarismo e do higienismo. A configuração nervosa, constituída inicialmente por construção anátomo funcional, veio assim abrigar a passagem através das interpretações físicas e morais características tanto do utilitarismo de Jeremy Bentham assim como às implicações da analítica do poder de Michel Foucault.

                                       
            Está bem à vista o método através do qual o trabalho passado se transforma todos os dias em capital. Este é o motivo pelo qual os economistas cobrem de elogios os méritos do trabalho passado. De fato, é este que, sob a forma de meios de trabalho, colabora depois de novo no processo laborativo vivo: por isso a importância do trabalho é atribuída à figura do capital que ele assume. A forma capitalista de trabalho coincide neste caso com o meio de produção no qual o trabalho se objetivou a tal ponto que os agentes práticos da produção capitalista e os seus ideólogos “são incapazes de pensar o meio de produção destacado da máscara social antagonista de que se reveste”. Assim, o trabalho pretérito, como qualquer força natural humana, fornece um serviço gratuito ao capital: e quando é investido e posto em movimento pelo trabalho vivo, acumula-se e reproduz-se em larga escala como capital. Mais difícil é chegar a apreender o método pelo qual o trabalho vivo é completamente apanhado e englobado dentro deste processo, como parte necessária sobre o modo capitalista de pensar. O modo de produção  apresenta a si próprio a mais-valia e o valor da força-trabalho “como partes alíquotas da produção de valor”: é isso que esconde o carácter específico da relação capitalista, ou seja, a troca do capital variável por força-trabalho viva e a exclusão  no produto.
       O concreto é concreto, dizia Marx (2011: 248) por ser a síntese de múltiplas determinações, logo, unidade da diversidade. É por isso que ele é para o pensamento um processo de síntese, um resultado, e não um ponto de partida, apesar de ser o verdadeiro ponto de partida e portanto igualmente o ponto de partida da observação imediata e da representação. O primeiro passo reduziu a plenitude da representação a uma determinação abstrata; pelo segundo, as determinações abstratas conduzem à reprodução do concreto pela via do pensamento. Por isso Hegel caiu na ilusão de conceber o real, como resultado do pensamento, que se concentra em si mesmo, enquanto o método que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto é para o pensamento precisamente a maneira de se apropriar do concreto, de o reproduzir como concreto espiritual. Mas este não é de modo nenhum o processo da gênese do próprio concreto. O todo, na forma em que aparece no espírito como todo-de-pensamento, é um produto do cérebro pensante, que se apropria do mundo do único modo que lhe é possível, de um modo que difere da apropriação desse mundo pela arte, pela religião, pelo espírito prático. Antes, como depois, o objeto real conserva a sua independência fora do espírito; e isso durante o tempo em que o espírito tiver uma atividade meramente especulativa, meramente teórica. Por consequência, também no emprego do método teórico é necessário que o objeto, a sociedade, esteja constantemente presente no espírito como dado primeiro.   
            O trabalho torna-se, nesta base, a mediação necessária para que a força-trabalho se transforme em salário: a condição para que o trabalho vivo se apresente unicamente como capital variável, a força de trabalho unicamente como parte do capital. O valor, no qual se representa a parte retribuída da jornada de trabalho, de aparecer então como valor ou preço da jornada de trabalho em geral. No salário desaparece precisamente todo o traço de divisão da jornada de trabalho em trabalho necessário e mais-valia. Todo o trabalho surge como trabalho pago: é isto que, segundo Tronti (1976: 41), distingue o trabalho assalariado das outras formas históricas do trabalho. Quanto mais se desenvolve a produção capitalista e o sistema das suas forças produtivas, tanto mais a parte paga e a parte não paga do trabalho se confundem de modo inseparável. As diversas formas de pagamento do salário não são mais do que modos diversos de exprimir, a diversos níveis, a natureza constante deste processo. Por força-de-trabalho (Arbeitskraft) ou capacidade de trabalho (Arbeitsvermogen) entendemos o conjunto das atitudes físicas e intelectuais que existem na corporeidade, ou seja, na personalidade viva de um homem e que este põe em movimento quando produz valores de uso. Compreende-se então a decisiva fase que a metamorfose do valor e do preço da força-trabalho sob a forma de salário, ou seja, no valor e preço do próprio trabalho. Sob esta forma fenomênica que torna invisível a relação real e mostra precisamente o seu oposto, fundam-se todas as ideias jurídicas do operário e do capitalista, todas as mistificações do modo de produção, todas as suas ilusões sobre a liberdade. O salário nada mais é do que a representação do trabalho assalariado considerado praticamente de outro ponto de vista social.

            - Quando encontrei o operaísmo, afirma Fortunati (2016), tinha 19 anos de idade. Era uma militante de base do movimento estudantil da Universidade de Pádua. Eu era jovem, logo me calei e aprendi. Lembro-me de que em muitas reuniões eu queria dizer coisas, mas era tímida e insegura, então preferi ficar quieta. Os líderes do movimento eram, em geral, estudantes que já haviam aprendido política, porque já tinham uma experiência anterior de partido ou organizações políticas. Eu, por outro lado, só tinha minhas crenças sobre a necessidade de mudar o mundo para o triunfo da igualdade, liberdade e justiça. Minha única experiência política anterior tinha sido minha participação nas greves contra os testes nucleares franceses no Pacífico, quando eu tinha 14 anos. Nessa época eu estava no ginásio Tito Lívio, em Pádua, aonde haviam muito poucos estudantes em greve. Em um certo ponto, o diretor chegou e quando me viu tentou me pegar pela orelha, dizendo “venha pra dentro”. Eu me livrei dele e disse que ele não podia se dirigir a mim desse jeito. Os estudantes que entraram em greve foram todos punidos sendo atrasados em seu progresso escolar por causa de sua participação.
             - A segunda grande experiência que tive que me preparou para uma vida de envolvimento político foi quando me declarei ateia, quando tinha 19. Eu vivia com meus pais em Dolo, uma pequena cidade entre Pádua e Veneza, e minha família era muito religiosa (católica). Mas eu estava vendo muita pobreza e injustiça ao meu redor, contra os quais a igreja oficial estava fazendo muito pouco. Minha posição, que era contrária ao papel da hierarquia da igreja, foi um choque para meus pais, mas eles resistiram. Finalmente, quanto eu tinha 18 anos, decidi sair de casa para me sustentar enquanto estudava na universidade, embora meus pais tivessem dinheiro e pudessem pagar meus estudos. Eu queria ter o controle da minha vida e viver sem privilégios sociais. Trabalhei em muitos lugares, de vendedora assistente em uma livraria a ser uma representante comercial envolvida com obras de arte, e sendo bibliotecária na universidade. Dessa vez meus pais choraram muito: do seu ponto de vista, sua única filha (eu tinha três irmãos) era a mais rebelde e olhava a vida de uma maneira que sentiam que iria acabar em dificuldades.
No mais alto nível do desenvolvimento capitalista, a relação social torna-se um momento da relação de produção, toda a sociedade se torna uma articulação da produção, isto é, toda a sociedade vive em função da fábrica e a fábrica estende o seu domínio exclusivo a toda a sociedade. É nesta base que a máquina do Estado político tende cada vez mais a identificar-se com a figura do capitalismo coletivo, se torna cada vez mais propriedade do modo capitalista de produção e, portanto, função do capitalista. O processo de composição unitária da sociedade capitalista, imposto pelo desenvolvimento específico da sua produção, já não tolera que exista um terreno político, mesmo que este seja formalmente independente da rede das relações sociais. Em certo sentido, é verdade que as funções políticas do Estado começam a ser recuperadas pela sociedade, com a ligeira diferença de que se trata, aqui, da sociedade de classes do modo de produção. Considere-se isto como reação sectária contra quem vê no Estado político moderno o terreno neutro do enfrentamento entre capital e trabalho.   Um dos instrumentos que funcionam dentro deste processo é precisamente a relação mistificada que se estabelece, a determinado nível de desenvolvimento, entre a produção capitalista e a sociedade de classes, entre a relação de produção e a relação social – consequência das mutações que intervieram no seio da relação social de produção e premissa para que esta relação seja de novo conquistada como lei natural.
            O processo real crescente de proletarização apesenta-se como processo formal de terciarização. A redução de toda a forma de trabalho a trabalho industrial, de todo tipo de trabalho a mercadoria força-trabalho, apresenta-se como extinção da própria força-trabalho como mercadoria e, portanto, como depreciação do seu valor como produto. O pagamento de qualquer preço do trabalho em termos de salário apesenta-se como negação absoluta do lucro capitalista, como eliminação absoluta do sobre-trabalho operário. O capital, que desorganiza e reorganiza o processo de trabalho segundo as necessidades crescentes do processo de valorização, apresenta-se já como potência espontânea objetiva da sociedade que se auto-organiza e assim se desenvolve. O reingresso das funções políticas estatais na estrutura da sociedade civil apresenta-se como contradição entre Estado e sociedade; a funcionalidade cada vez mais estreita da política e da economia, como possível autonomia do terreno político relativamente às relações econômicas. A concentração do capital e, ao mesmo tempo, o domínio exclusivo do regime de fábrica, ambos os resultados históricos do capitalismo moderno, invertem-se, a primeira, na dissolução do capital, como relação social determinada, o segundo na exclusão da fábrica da relação específica da produção social.
            Por isso o capital aparece como riqueza como riqueza objetiva da sociedade em geral e a fábrica como modo particular de produção do capital social. É isto que surge aos olhos burguesmente grosseiros do sociólogo vulgar. Quando o próprio cientista é reduzido a operário assalariado, o trabalho extrapola os limites do conhecimento científico, ou melhor, torna-se campo de aplicação exclusivo daquela falsa ciência que é a tecnologia. É inútil acrescentar que tudo isto está por acontece e que só nos ocuparemos quando realmente acontecer. Ninguém procura esquecer à força a existência do mundo exterior à produção. Por o acento numa das partes significa reconhecer e reivindicar a essencialidade desta parte relativamente às outras, tanto mais que este aspecto particular como tal, se generaliza. A unilateralidade científica do ponto de vista operário não se confunde com uma mística reductio ad unum. Trata-se de olhar a distribuição, a troca e o consumo do ponto de vista da produção. E, dentro da produção, a dialeticidade entre o olhar o processo de trabalho do ponto de vista do processo de valorização e o processo de valorização do ponto de vista do processo de trabalho. Melhor dizendo, apreender a unidade orgânica do processo de produção, que fundamenta depois a unidade do processo de produção, distribuição, troca e consumo.             
            Com o fim de recompor continuamente a figura material do operário coletivo contra o capital que tenta desmontá-la; mas com o objetivo de começar a desmembrar a natureza íntima do capital nas partes potencialmente antagonistas que organicamente o compõem. Ao capitalista que tenta contrapor trabalho e força-trabalho no interior do operário coletivo, responde-se contrapondo força-trabalho e capital no interior do próprio processo de produção de capital. Neste aspecto, o capital tenta “desmembrar” o operário coletivo e operário tenta “desmembrar” o capital: não se trata já de direito contra direito, decidido pela força, mas diretamente, força contra força. Este é o último estágio da luta de classes no nível alto do desenvolvimento capitalista. O operário coletivo contrapõe-se não só à máquina, como capital constante, mas à própria força de trabalho, como capital variável. Tem de chegar a ter como inimigo o capital total; logo, ele próprio, como parte do capital. O trabalho deve ver a força de trabalho como seu inimigo, como mercadoria. É nesta base que a necessidade capitalista de objetivar no capital no capital todas as potências subjetivas do trabalho se pode tornar, por parte do operário, o máximo reconhecimento da exploração capitalista. A tentativa de integração coletiva e consciente da classe dentro dos sistemas é o que pode provocar a resposta decisiva da ruptura com o sistema, levando a luta de classe ao seu nível máximo. 
            O representante geral da sociedade é realmente o capital social. Na relação social de produção, o porta-voz da sociedade já não é a classe operária, mas diretamente o capital. O interesse social geral fica inteiramente nas mãos do capital. Aos operários não fica mais do que o seu interesse parcial de classe. Ipso facto, o autogoverno social do capital, de um lado, e a autogestão de classe dos operários organizados, de outro. O conceito de classe operária torna-se então, mas só a este nível, historicamente concreto, precisando-se na sua específica particularidade, desenvolvendo-se em toda a riqueza das suas determinações. Assim, como abstração social mais simples de uma formação econômica capitalista que é, e válida, portanto para todas as formas sucessivas do seu desenvolvimento, a classe operária só “surge, todavia, praticamente verdadeira nesta abstração” enquanto categoria do capitalismo mais moderno. Quanto mais a produção capitalista agride e desfaz as suas tradições externas, mas é obrigada a por a nu a sua contradição interna. Quanto mais o capital consegue organizar-se, mais é obrigado a organizar, para si, a classe operária. Até que a classe operária não precisa mais espelhar as contradições sociais, podendo espalhar-se diretamente como contradição a sociedade.
            O operaísmo é um movimento político marxista heterodoxo e antiautoritário - ou neomarxista - surgido na Itália, a partir do final dos anos 1950 e início dos anos 1960, trabalhava a renovação do marxismo diante dos impasses do segundo pós-guerra para o movimento operário e para a esquerda. Operaísmo é também reconhecido por “marxismo autonomista”, se refere a uma corrente política e teórica do pensamento marxista que surgiu na Itália no começo dos anos 1960. Uma leitura original de Marx no contexto das lutas radicais dos trabalhadores, ocorridas no país durante toda a década, e que levaram à invenção de novos conceitos teóricos como: composição técnica e política de classe, operário massa, recusa ao trabalho e uma nova metodologia política: a copesquisa, ou investigação militante. As figuras mais conhecidas desta corrente de pensamento são o filósofo Antonio Negri, o cientista político Mario Tronti, ligado ao Partido Comunista Italiano (PCI) e Raniero Panzieri. A análise desses teóricos e militantes começa por observar o poder ativo da classe operária para transformar as relações de produção em práticas de poder. Os elementos principais do operaísmo foram mais elaborados quando este se combina com o movimento autônomo.  
Michael Hardt e Antonio Negri (cf. Nour; Fath, 2006) constroem uma definição do operaísmo a partir da afirmação de Marx segundo a qual o capitalismo reage às lutas da classe operária - ou seja, de que a classe operária é ativa e o capital é reativo, combinando desenvolvimento tecnológico: “seria possível escrever uma história inteira, desde 1830, das invenções que tiveram o propósito único de prover o capital das armas contra a rebelião da classe operária”; e, desenvolvimento político: a legislação da fábrica na Inglaterra foi uma resposta à luta da classe operária sobre a duração da jornada de trabalho. - “Sua formulação, reconhecimento oficial e proclamação por parte do Estado foram o resultado de uma longa luta de classe”. O fundamental do operaísmo é: as lutas da classe operária precedem e prefiguram as reestruturações sucessivas do capital (ismo). Os operaístas deram continuidade a Marx tentando basear sua política em uma investigação da vida e da luta da classe operária. Em 1961, Mario Tronti, Toni Negri e Raniero Panzieri, importantes teóricos operaístas, fundaram, com outros intelectuais comunistas, a revista Quaderni Rossi (Cadernos Vermelhos, 1961-1965), que será o berço de irradiação do pensamento operaísta. Em 1963, do grupo fundador da revista saem Mario Tronti, Alberto Asor Rosa e Massimo Cacciari para fundar Classe Operaia. Em 1969, o pensamento operaísta dá origem a dois movimentos políticos rivais: um mais ortodoxo, Potere Operaio, e outro mais movimentista, Lotta Continua.
Em particular Quaderni Rossi e Classe Operaia (1963-1966) desenvolveram a teoria operaísta, concentrando-se nas lutas proletárias. A esses desenvolvimentos teóricos foi associada uma práxis baseada na organização no lugar de trabalho, adotada principalmente por Lotta Continua. O movimento alcançou seu auge durante o chamado Autunno Caldo (“outono quente”) italiano, em 1969. Após a dissolução de ambos os movimentos em 1976, alguns militantes ingressaram na órbita da luta política tendo como epicentro a Autonomia Operaia, cuja ideologia baseava-se exatamente na centralidade operária autônoma tanto em relação aos partidos como aos sindicatos. O Maio de 1968 e o “outono quente” dos trabalhadores de 1969 conduziram a uma nova divisão no operaísmo italiano. Mario Tronti e outros decidiram continuar sua atividade  intelectual no PCI, uma vez que estavam convencidos que as lutas dos trabalhadores estruturalmente precisavam de um “suplemento” apolítico, de maneira a multiplicar e consolidar a sua força (uma posição que depois foi elaborada por Mario Tronti na sua teoria da “autonomia do político”). Antonio Negri e outros, por outro lado, estavam convencidos que o nível de poder autônomo exprimido pelos trabalhadores no “outono quente” punha diretamente o problema da ruptura revolucionária. A organização Potere Operaio foi fundada nesta avaliação e se manteve ativa até os fabulosos anos de 1973.
A Classe Operária Vai ao Paraíso, Elio Petri (1971).
        O operaísmo se difundiu na França através do reconhecido movimento Socialismo ou barbárie, e nos Estados Unidos da América (EUA), com a Tendência Johnson-Forest, graças às traduções feitas por Danilo Montaldi e outros. A Johnson-Forest tinha estudado a vida e as lutas operárias na indústria automobilística de Detroit, publicando panfletos como The American Worker (1947), Punching Out (1952) e Union Committemen and Wildcat Strikes (1955). Esses trabalhos foram traduzidos para o francês pelo grupo Socialismo ou barbárie e publicados no seu jornal. Johnson-Forest também estudou e escreveu sobre o que acontecia nos locais de trabalho - no caso, dentro das fábricas de automóveis - e nas empresas de seguros.  Em meados dos anos 1970, todavia, a ênfase do movimento operaísta transferiu-se da fábrica à chamada “fábrica social” - as vidas diárias dos trabalhadores em suas comunidades. O movimento foi-se transformando no que é reconhecido como movimento autônomo ou autonomismo. O obrerismo italiano, como fato histórico, ocorreu na Itália no decurso da década dos anos 1960, experiência política agitada pelas grandes lutas operária do Norte e assinalada por marcos de agitação como os Quaderni Rossi, Classe Operaia, La Classe, Potere Operario e jornal Contropiano (1968). 
A indiferença à natureza do seu trabalho é cada vez mais reduzida a trabalho simples, os preconceitos profissionais, não são em si formas de subordinação de planejamento, mas de exploração maledetta capitalista articulada em torno de métodos de trabalho e métodos de produção. Comparativamente, o sindicalismo moderno e o partido político enquanto correia de transmissão do sindicato é o ponto mais lato do reformismo. Resta-nos brevemente classificar o entendimento da categoria nervosismo nas classificações psiquiátricas das primeiras décadas do século XX que não pode prescindir da informação lexical e cultural mais imediata: as representações dos nervos e do sistema nervoso. Só que o objeto, a coisa, o próprio trabalho alienado, tem de ser historicamente determinados. Se atrás da força de trabalho como mercadoria encontramos os operários como classe, o proletariado na sua definição política, com a parte adversa sucede o contrário. Efetivamente para Mario Tronti nenhuma pergunta é mais ideológica do que esta: Mas o que é uma classe social? O sociólogo começa a ler o Capital no fim do Livro III e interrompe a leitura quando se interrompe o capítulo sobre as classes. O essencial do conceito de classe já tinha sido dito em toda a análise do Capital. Aquela interrupção do capítulo sobre o spaltet (racha) diz mais do que a sua possível continuação. Depois do discurso se ter iniciado novamente com a verdadeira separação, - aquela que é regida pela lei do movimento do modo de produção capitalista, entre os meios de produção e trabalho, com a transformação do trabalho em trabalho assalariado  e dos meios de produção em capital, - o corte interno das drei grossen Klassen, regido pela divisão do trabalho social resultava de tal maneira secundário e, até, perigoso, que não podia prosseguir. Aquela interrupção tem todo o ar de uma renúncia imprevista a prosseguir um raciocínio que tomara um caminho errado.

            De resto, não se percebe porque é que o capítulo sobre as classes se encontra na seção sobre os rendimentos, se o próprio Marx exclui que a identidade quanto à fonte de rendimento baste para indicar a pertença a uma mesma classe. O equívoco inicial está  talvez mesmo na “fórmula trinitária”: não se pode dizer – coo Marx diz – que esta encerre todos os segredos do processo social de produção. Se o processo social de produção é o capital em nível de seu pleno desenvolvimento, então não pode ser definido por nenhuma fórmula que tenha mais de dois protagonistas: o próprio capital e, frente a ele, dentro e contra ele, a classe operária. Isto, no que respeita a uma definição que valha para a ciência. No terreno da prática política, é preciso operar uma ulterior. A trindade, por definição, é reconduzida a um. Quando se pergunta por que é que só do ponto de vista operário é que se pode captar o segredo do capitalismo, eis a única resposta possível: porque a classe operária é o segredo do capitalismo. Esse nível superior do desenvolvimento interno ao capital é, justamente, a classe operária. Dever-se-ia concluir que o capital não pode ser compreendido sem a classe operária, mas que esta poderia ser compreendida sem o capital. Quando a verdade é que o capital e a classe operária só podem ser compreendidos conjuntamente, um sempre contra o outro. 
            Em que sentido se pode, então, dizer que só do ponto de vista operário é possível captar o segredo do capitalismo – visto que é exatamente ao contrário que o capital põe a nu a natureza histórica da classe operária? Pode-se, sim, desde que se tenha em mente este fato simplicíssimo: a classe operária não é o segredo capitalismo no sentido de ser a sua explicação, mas no sentido de ser a sua dissolução. O capital pode explicar teoricamente tudo o que quiser sobre a classe operária, mas não pode eliminá-la na prática. A classe operária com a sua ciência, pode não explicar tudo sobre o capital mas pode chegar a destruí-lo com a revolução. Por isso, será sempre uma ilusão, do ponto de vista operário, querer saber mais sobre a sociedade capitalista do que os próprios capitalistas; e toda a forma de gestão operária do capital resulta necessariamente, defeituosa relativamente a uma gestão diretamente capitalística; e talvez descubra em breve que a via realisticamente mais praticável, a via “mais fácil” por parte operária, é justamente a da destruição do processo de acumulação de capital pela revolução.  
Daí a tese segundo a qual se “o capital é a potência econômica da sociedade burguesa que domina tudo”, a classe operária é a única potência política que pode dominar o capital. Se isto é verdade, se a linha de demarcação passa pelo ponto de chegada do processo – derrubamento do capital, ditadura do proletariado – então, de um ponto de vista marxista, do ponto de vista operário, as classes, aluta de classe, só são concebíveis para e dentro da sociedade capitalística. Chamara toda a gente da definição dos recursos históricos para a escolha da práxis política, ou seja, da luta de classes em geral às necessidades particulares da revolução contra o capital – ainda a ser a linha de demarcação entre quem é marxista e quem não é, “o ponto – dizia Lenin - em torno do qual é preciso por à prova a compreensão e o reconhecimento efetivos do marxismo”.  O próprio nascimento do ponto de vista operário, a possibilidade de uma ciência social não ob jetiva e que não visa a objetividade, a praticabilidade de uma síntese unilateral, ete agarrar os fenômenos da sociedade presente “todos juntos de um lado só”, não para os conhecer mas para os derrubar, a “síntese importante” da obra de Marx, não terá a sua  razão de ser material no nascimento da primeira classe social que existiu historicamente, a classe operária? O ponto de vista histórico vê na sociedade capitalista, de um lado, os operários, do outro, o capitalista. É um daqueles fatos que se impõe com a violência da simplicidade. Pode-se falar de capitalista individual; é esta a figura socialmente determinada que presida à constituição da relação de produção capitalista. Esta figura não desaparece, pois, não se extingue nem é suprimida, apenas organiza coletivamente, e assim socializa-se no capital, precisamente, como relação de classe.

É a diferença de qualidade que existe, até no interior de um mesmo movimento operário entre reivindicação sindical e recusa política. Não é o passado de revolta da classe operária que se deve renegar – afirma Tronti, esse passado de “loucuras desesperadas” que foram sempre as suas insurreições, sob o signo da violência. É preciso não cometer os erros dos frios cientistas da história de liquidar, como “revolta popular”, todos os combates de massa em que se levantam barricadas, e ir procurar as verdadeiras lutas unicamente nas últimas formas de contratação do capital coletivo. Os intelectuais orgânicos da classe operária tornaram-se realmente a única coisa que podiam ser: intelectuais orgânicos do movimento operário. É o partido histórico, é a velha forma de organização fora da classe que precisa deles. Eles asseguraram durante decênios a relação entre partido e sociedade sem passar pela fábrica. Agora que a fábrica se impõe, agora que o próprio capital os chama para a produção, tornaram-se mediadores objetivos entre ciência e indústria: é essa a forma que assume a relação tradicional entre intelectuais e partido. O intelectual orgânico, integrado à condição de classe, é aquele que estuda a classe operária, isto é aquele que põe em prática a ciência positivista mais infame que porventura existiu: a sociologia industrial, o estudo dos movimentos dos operários por conta do capitalista.
Também aqui é necessário recusar toda a problemática em bloco, pis não há cultura nem intelectuais fora das necessidades do capital. É necessária uma nova estratégia. É necessário contrapor a isto o princípio oposto: o que é teoricamente justo pode ser politicamente errado. Teoria é compreensão e previsão, isto é, conhecimento, ainda que unilateral, da tendência objetiva do processo. Política é a vontade de  transformar, portanto, recusa global da objetividade e ação subjetiva para que esta não passe nem vença. Teoria é antecipação. Política é intervenção. Dever de intervenção, não sobre o que se antecipou, mas sobre o que precede: eis as necessidades da tática. Neste sentido, teoria e política são sempre contraditórias. A sua identidade e não contraditoriedade é precisamente o oportunismo, o reformismo, a obediência passiva à tendência objetiva, só conhecida e obtida pela ciência que, por sua vez, se dissolve numa inconsciente mediação operária do ponto de vista capitalista. O discurso direto sobre a classe operária é, antes de qualquer coisa, portanto, autocrítica do movimento operário organizado. Só passando por este momento autodestruidor será possível realizar a obra de reconstrução estratégica do ponto de vista operário destes anos.
Bibliografia geral consultada.
CELLA, Gian Primo, Divisione del Lavoro e Iniziativa Operaia. Bari: Edizione De Donato, 1972; TRONTI, Mario, Operários e Capital. Porto: Edições Afrontamento, 1976; MARTINS, José de Souza, Sobre o Modo Capitalista de Pensar. São Paulo: Hucitec Editora, 1978; DELEUZE, Gilles, “Lettera aperta ai giudici di Negri”. In: La Repubblica, 10 de maio de 1979; NEGRI, Antonio, Il Dominio e il Sabotaggio Sul Metodo Marxista della Transformazione Sociale. Milán: Multhipla Edizioni, 1979; CANEVACCI, Massimo, “A Experiência da Autonomia Operária”. In: Revista Desvios. São Paulo: Editora Paz e Terra, n°4, pp. 61-71, julho 1985; VINCENT-BUFFAULT, Anne, História das Lágrimas: Séculos XVIII-XIX. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1988; ARROYO, Miguel, “A Universidade, o Trabalho e o Curso Noturno”. In: Estudos e Debates. Brasília. nº 17, 1990; DELEUZE, Gilles, Lettre Ouverte aux Juges de Negri. In. Deux Régimes de Fous: Textes e Entretiens 1979-1995. Paris: Éditions Minuit, 2003; NOUR, Soraya; FATH, Thorsten, “Entre Multitude e Mundo da Vida: A Crítica de Hardt e Negri a Habermas”. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais.  São Paulo, vol. 21, n° 62, 2006; DUARTE, Luiz Fernando Dias, “O Nervosismo como Categoria Nosográfica no começo do Século XX”. In: História, Ciências, Saúde - Manguinhos. Rio de Janeiro, vol.17, supl.2, dez. 2010, pp.313-326; MARX, Karl, Contribuição à Crítica da Economia Política. 4ª edição. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011; STANDING, Guy, The Precariat: The New Dangerous Class. London: Editor Bloomsbury Academic, 2011; BEAUD, Stéphane; PIALOUX, Michel, Retour sur la Condition Ouvrière: Enquete aux Usines Peugeot de Sochaux-Monbéliard. Paris: Éditions La Découverte, 2012; FORTUNATI, Leopoldina, “Aprendendo a Lutar: Minha História entre Operaísmo e Feminismo”. In: https://autonomistablog.com/2016/09/14/; VIEL, Jefferson, A Formação do Conceito de Trabalho Imaterial na Filosofia de Antonio Negri. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Filosofia. Departamento de Filosofia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2017; CASTRONOVO, Valerio, “Consigli di Fabbrica, il nucleo ideato da Gramsci”. In: https://www.ilsole24ore.com/art/2 settembre 2019; MUSETTI, Felipe Ramos, A Questão do Fim do Estado. Confluências e Divergências nas Análises de Marx e Engels”. In: Revista Verinotio, vol. 26, n° 2, 2020; entre outros.